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quinta-feira, 1 de setembro de 2022

Tribunal Permanente dos Povos condena Bolsonaro por crimes contra a humanidade - Rodrigo Rodrigues (G1, TV Globo)

 Júri simbólico do Tribunal Permanente dos Povos condena Bolsonaro por crimes contra a humanidade durante a pandemia


Atuação do TPP não tem atribuição para aplicar penas, mas alerta comunidade internacional e pode informar comissões jurídicas e cortes internacionais sobre a postura do presidente brasileiro frente às mortes por Covid-19 no Brasil.

Por Rodrigo Rodrigues, g1 SP e TV Globo — São Paulo
01/09/2022 11h21  Atualizado há 29 minutos

O júri simbólico do Tribunal Permanente dos Povos (TPP) leu nesta quinta-feira (01) a sentença que condenou o presidente Jair Bolsonaro (PL) por crimes contra a humanidade no Brasil e violação dos direitos humanos durante a pandemia da Covid-19.

Segundo o órgão, Bolsonaro teve contribuição direta para a morte dos 680 mil brasileiros que faleceram até o momento em virtude da doença no país.

"Não há dúvida que milhares de vida foram extintas [no Brasil] por efeitos das decisões do governo presidido por Jair Bolsonaro. (...) não se pode considerar que esse dolo foi eventual, uma vez que houve o resultado das mortes em massa com a intenção de privilegiar a economia em detrimento da vida humana", disse o jurista argentino Eugénio Raúl Zaffaroni, que leu a sentença contra o presidente brasileiro.

"Bolsonaro cometeu dois atos ilegais: grave violação de direitos humanos e crime contra a humanidade ao gerir a política de saúde brasileira sem ouvir as orientações dos cientistas e da Organização Mundial da Saúde", completou Zaffaroni, que é ex-ministro da Suprema Corte da Argentina e atual juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

Na sentença, foi recomendado que o caso seja levado ao Tribunal Internacional de Haia para que Bolsonaro seja investigado por "constante crime de genocídio contra povos nativos do Brasil" (leia a sentença completa aqui).

O TPP é um tribunal de opinião simbólico, que não tem efeito condenatório do ponto de vista jurídico, mas cujas decisões podem ser encaminhadas para organismos internacionais, como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e o Tribunal Internacional de Haia, na Holanda, onde são julgados os crimes contra a humanidade e os genocídios internacionalmente.

O julgamento de Bolsonaro começou em maio e ocorreu simultaneamente em São Paulo, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) – onde a sentença final foi lida nesta quinta (1º), e em Roma, na Itália, e foi transmitido pelas redes sociais ao vivo em várias sessões.

Na acusação, esses grupos afirmaram que o presidente propagou intencionalmente a pandemia de Covid-19 no país ao adotar postura anti-isolamento e contra as vacinas.

"A acusação denuncia o presidente Bolsonaro por ter, no uso de suas atribuições, propagado intencionalmente a pandemia de Covid-19 no Brasil, gerando a morte e o adoecimento evitáveis de milhares de pessoas, em uma escalada autoritária que busca suprimir direitos e erodir a democracia, principalmente da população indígena, negra e dos profissionais de saúde, acentuando vulnerabilidades e desigualdades no acesso a serviços públicos e na garantia de direitos humanos", afirma a Comissão Arns.

A acusação contra o presidente brasileiro foi sustentada nas sessões de 24 e 25 de maio por Eloísa Machado, advogada, professora de Direito Constitucional da FGV Direito-São Paulo e membro apoiadora da Comissão Arns; Maurício Terena, advogado e assessor jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, e Sheila de Carvalho, advogada e articuladora da Coalizão Negra por Direitos.

O júri que condenou Bolsonaro foi presidido pelo ex-juiz italiano Luigi Ferrajoli, professor catedrático da Universidade de Roma, e outros juristas internacionais como Alejandro Macchia e Eugenio Raúl Zaffaroni (Argentina), Joziléia Kaingang, Rubens Ricupero, Vercilene Kalunga e Kenarik Boujakian (Brasil), Boaventura de Sousa Santos e Luís Moita (Portugal), Clare Roberts (Antigua e Barbuda), Jean Ziegler (Suíça), Nicoletta Dentico (Itália) e Vivien Stern (Grã-Bretanha).

O que é o TPP?
Criado em Roma em 1979, o Tribunal Permanente dos Povos (TPP) é considerado um sucessor do Tribunal Russell, que foi estabelecido em 1967 para investigar crimes de guerra no Vietnã.

O júri é composto por especialistas da área do direito, das ciências sociais e de saúde pública e conta com 13 pessoas de diferentes nacionalidades.

Além dos jurados, participaram das sessões que julgou Bolsonaro também testemunhas convocadas pela acusação, que deram depoimentos sobre a atuação do governo federal na pandemia.

"Verificamos uma estratégia federal na disseminação da Covid-19", disse a professora da Faculdade de Saúde Pública da USP Deisy Ventura, uma das testemunhas que se pronunciou em maio.

Questionada sobre o julgamento do presidente Jair Bolsonaro, a Advocacia Geral da União (AGU) havia declarado no início do julgamento que "não existe Tribunal Permanente dos Povos no sentido jurídico do tema, muito menos ao qual o Brasil tenha aderido por meio de tratado internacional" e que, "sendo assim, não há atuação da AGU".

Também em nota, o Itamaraty disse à época que "o Tribunal Permanente dos Povos (TPP) constitui iniciativa criada pela sociedade civil. Seu exercício não se confunde com atuação de tribunais internacionais, constituídos pelos Estados, perante os quais o Itamaraty tem competência para representar a União".

"Por esse motivo, não seria atribuição deste Ministério enviar representante a evento dessa natureza, particularmente quando realizado em território nacional", completou o Ministério em maio.

https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2022/09/01/juri-simbolico-do-tribunal-permanente-dos-povos-condena-bolsonaro-por-crimes-contra-a-humanidade-durante-a-pandemia.ghtml