Decisões, consequências, revisão das posturas: três momentos diferentes, talvez similares
Paulo Roberto de Almeida
O Brasil sempre me angustiou. Talvez por ter vindo de uma família pobre, ter começado a trabalhar muito cedo, ter também começado a ler muito cedo sobre os problemas do Brasil, o fato é que eu liguei muito cedo meu destino pessoal aos destinos do Brasil. Os motivos de minha angústia eram muito claros: quando è que cessaria aquela situação de penúria, não só a de minha família, mas a de quase todos à nossa volta, e isto não tanto por uma situação de miséria comprovada, mas de simples pobreza relativa (que foi aos poucos sendo corrigida, graças ao ingente trabalho de meus pais, de meu irmão maior e meu próprio).
O que me incomodava, ao estudar o Brasil, era o fato de avançarmos muito lentamente, a preservação da pobreza generalizada e também da miséria: aquela sensação de impotência aos erros, injustiças, desigualdades persistentes. Como disse alguém, o Brasil não perdia oportunidade de perder oportunidades. Daí a minha revolta.
Redescobri hoje, 18 de março de 2022, um texto que escrevi um ano e meio atrás, em outubro de 2021, ainda em meio ao pior governo que tivemos a desventura de enfrentar em toda a nossa história, relatando três momentos em que tive de tomar decisões, a primeira relativamente à minha vida de iniciante de graduação em meio à ditadura militar, as duas seguintes já no quadro da carreira diplomática, quando decidi expressar minha opinião quanto aos rumos da política externa, tendo por isso sofrido retaliações, que impactaram, todas as três ocasiões, minha vida e minha carreira. Não me arrependi, e provavelmente teria tomado as mesmas decisões em outras circunstâncias, pois elas não dependeram apenas do momento, pois responderam a questões de princípios e valores, a uma questão de caráter: opor-se a uma ditadura militar, apontar deformações na diplomacia e na política externa e com isso sofrer as consequências do ostracismo funcional.
Transcrevo abaixo esse texto, e me pergunto se a angústia com nova sensação de perda de oportunidade pelo Brasil não me obrigará, novamente, a expressar minha opinião e minhas considerações refletidas e ponderadas sobre os presentes descaminhos na política interna (sobretudo econômica e parlamentar) e na política externa e na diplomacia. Numa fase de escritura de memórias, rememorar decisões anteriores também constituem uma forma de testemunho pessoal sobre eventos e processos que impactaram todos, no Brasil e, no meu caso, no Itamaraty.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 18 de março de 2023