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quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Dia do Diplomata (atrasado) no Itamaraty: política externa sem ideologia? Ainda não, orgulho de ser pária

O discurso do chanceler acidental no Dia do Diplomata confirmou muito do que já sabíamos: a política externa sem ideologia, prometida pelo candidato a presidente, só tem ideologia, e com furor, e o chanceler acidental exibe até certo orgulho pelo fato de o Brasil ter de ficar sozinho no mundo.

Paulo Roberto de Almeida

Se atuação do Brasil nos faz um pária internacional, que sejamos esse pária, diz Ernesto

Durante pandemia, chanceler abre Itamaraty para evento com centenas de pessoas e ataca 'covidismo'

Ricardo Della Colletta
Folha de S. Paulo, 22/10/2020

Em uma defesa da atuação do governo Jair Bolsonaro, o chanceler Ernesto Araújo disse nesta quinta (22) que, se a nova política externa do Brasil “faz de nós um pária internacional, então que sejamos esse pária”.

As declarações de Ernesto, que comanda o Itamaraty desde o início do mandato de Bolsonaro, ocorreram durante a cerimônia de formatura do Instituto Rio Branco, a escola de formação de diplomatas.

A fala foi marcada por queixas contra o multilateralismo e o que ele chamou de "covidismo", além de críticas a um marxismo sem Deus e ao globalismo —slogan político usado por movimentos populistas de direita para denunciar, entre outros temas, a suposta perda de identidade nacional.

“Nos discursos de abertura da Assembleia Geral da ONU, por exemplo, os presidentes Bolsonaro e [Donald] Trump [dos EUA] foram praticamente os únicos a falar em liberdade. Naquela organização que foi fundada no princípio da liberdade, mas que a esqueceu”, disse Ernesto, em uma fala de 40 minutos.

“Sim, o Brasil hoje fala em liberdade através do mundo. Se isso faz de nós um pária internacional, então que sejamos esse pária.” A política externa conduzida por Ernesto —marcada por um alinhamento estreito com o governo Trump, a antagonização com a China e a defesa de pautas conservadoras em fóruns multilaterais— é criticada por analistas e até mesmo por embaixadores aposentados.

Um dos principais argumentos levantados por críticos é o de que posturas radicais adotadas pela diplomacia brasileira podem deixar o país em situação de isolamento. “Talvez seja melhor ser esse pária deixado ao relento, do lado de fora, do que ser um conviva no banquete do cinismo interesseiro dos globalistas, dos corruptos e dos semicorruptos”, acrescentou Ernesto.

“É bom ser pária. Esse pária aqui, esse Brasil; essa política do povo brasileiro, essa política externa Severina —digamos assim— tem conseguido resultados”, emendou, listando entendimentos comerciais com União Europeia e EUA e a aproximação com países como Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos.

Ainda que o chanceler tenha capitalizado o acordo comercial assinado entre Mercosul e a União Europeia, a ratificação do trato enfrenta resistência em diferentes países europeus, principalmente devido à política ambiental do governo Bolsonaro.

Ernesto fez ainda referência à obra-prima do poeta e diplomata João Cabral de Melo Neto (1920-1999), escolhido pelos formandos como homenageado da turma. Ao lembrar de uma trabalhadora doméstica que sua família empregou nos anos 1980, o chanceler fez alusão ao personagem do livro "Morte e Vida Severina", lembrado como símbolo do brasileiro mais pobre e sofrido. Segundo o ministro, essa trabalhadora, chamada Severina, “odiava o comunismo”, porque eles “são contra Deus”.

Se Ernesto fez elogios à obra de João Cabral, não poupou críticas ao próprio autor, por, segundo ele, ter se dirigido “para o lado errado, para o lado do marxismo e da esquerda”.

“Sua utopia, esse comunismo brasileiro de que alguns ainda estão falando até hoje, constituía em substituir esse Brasil sofrido pobre e problemático [retratado na obra de João Cabral] por um não Brasil. Um Brasil sem patriotismo, sujeito naquela época aos desígnios de Moscou, e hoje, nesse novo conceito de comunismo brasileiro, sujeito aos desígnios sabe-se lá de quem”, afirmou o chanceler.

Esse tipo de acusação não é nova na história de João Cabral. Em 1952, o poeta, então servindo em Londres, foi acusado de liderar uma célula comunista dentro do Itamaraty. Após uma campanha na imprensa, ele foi afastado da chancelaria sem receber vencimentos. Só seria reintegrado em 1955, após ser absolvido pelo STF (Supremo Tribunal Federal) no ano anterior.

A formatura de alunos do Rio Branco conta todo ano com a presença do presidente e dos principais ministros do governo. A realização da edição deste ano em plena pandemia da Covid-19, no entanto, gerou polêmica, uma vez que participaram da solenidade dentro do Palácio do Itamaraty centenas de pessoas, entre diplomatas, autoridades, familiares e homenageados. Muitos não usavam máscaras.

O Sinditamaraty (Sindicato Nacional dos Servidores do Ministério de Relações Exteriores) publicou nota em que “manifesta preocupação com a organização de um evento presencial de grande porte, uma vez que os casos e as mortes por infecção da Covid-19 ainda não estão controlados no Brasil”.

Num discurso em que se queixou por ser tratado como "ideológico", Ernesto também acusou a esquerda de reduzir tudo a “conceitos como gênero e raça” e de querer promover “a ditadura do politicamente correto e da criação de órgãos de controle da verdade”.

“Todo isentão é escravo de algum marxista defunto”, disse. "Tratar os conservadores de ideológicos é o epítome da prática marxista-leninista: chame-os do que você é, acuse-os do que você faz”.

Para o chanceler, movimentos marxistas de esquerda têm a “utopia de um Brasil sem Deus”, de um povo “arrancado aos braços da sua fé cristã”, citando como exemplo protestos sociais no Chile em que manifestantes colocaram fogo em igrejas. Em outra denúncia do que chama de “estratégia marxista”, Ernesto disse que esse movimento toma preocupações legítimas em temas como o meio ambiente e mudanças climáticas e as transforma em "ismos" —no caso, ambientalismo e climatismo.

Fez alusão semelhante à Covid-19, usando o termo "covidismo". “Tomam uma doença causada por um vírus, a Covid, e tentam transformá-la num gigantesco aparato prescritivo, destinado a reformatar e a controlar todas as relações sociais e econômicas do planeta, o covidismo”.

A Covid-19 soma até o momento mais de 5,2 milhões de infectados no Brasil e 155,4 mil mortos.

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‘Se falar em liberdade nos faz um pária internacional, que sejamos um pária’, diz Ernesto Araújo

Ministro das Relações Exteriores defendeu a orientação do "novo Itamaraty" e afirmou que a diplomacia brasileira estava vivendo conceitos ultrapassados

Por Rafael Bitencourt e Matheus Schuch, Valor — Brasília
22/10/2020 13h32  Atualizado há 2 horas

Em formatura de diplomatas no Itamaraty, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, disse que a diplomacia brasileira, representada pela pasta, ficou muito tempo presa “dentro de si mesma, vivendo conceitos ultrapassados, cantando glórias passadas, lustrando troféus antigos e esquecendo de jogar o campeonato deste ano”.

Para ele, o Itamaraty, antes de sua chegada, cultivava conceitos “ultrapassados e superficiais, satisfeito com a própria fala”.

No discurso, o chanceler voltou a dizer que o país, antes do atual governo, flertava com o “marxismo” e o “globalismo”, como forma de explorar ainda mais os trabalhadores, se valendo de instrumentos para “corromper e estraçalhar a fé”, sem considerar as reais necessidades da sociedade.

Araújo lembrou que, na última Assembleia-Geral das Nações Unidas (ONU), somente o presidente americano Donald Trump e Jair Bolsonaro falaram em liberdade. “O Brasil fala em liberdade através do mundo, se isso nos faz ser um pária internacional, então que sejamos um pária”, afirmou.

O ministro ressaltou que considera guardar semelhanças com o homenageado na solenidade, o poeta e ex-diplomata João Cabral de Melo Neto. “Modestamente também me considero poeta e diplomata”, comentou.

Para Araújo, a diplomacia, assim como a poesia, serve à busca da liberdade. “A diplomacia pode ajudar a libertar o pensamento, libertar a língua, libertar a grande nação brasileira e o próprio mundo da pobreza material e espiritual”, disse o chanceler.

“A diplomacia pode ser lírica, dramática e pode ser épica, pode ter bandeira e pátria. A diplomacia pode pensar, pode falar. Para mim, isso foi uma descoberta transformada e quero compartilhar com vocês”, completou Araújo, ao dirigir a palavra aos formandos, que, segundo ele, chegam a um “Itamaraty que se renova".

Por fim, o ministro das Relações Exteriores rejeitou a referência a ele atribuída de ser uma autoridade do governo que integra a ala ideológica. “Aqueles que nos acusam de ideológicos são aqueles que idealizam toda a vida para concentrar poderes”, afirmou. Para ele, a mídia faz parte de um “esquema” que distorce conceitos.

Como resultado do “novo Itamaraty”, Araújo destacou ter concluído acordos comerciais com as maiores economias do mundo, europeia e americana, restaurado as relações com países de alta tecnologia, como Israel e Japão, feito parcerias com países onde estão grandes centros de capital, como Arábia Saudita e Emirados Árabes, entres outras medidas no campo das relações internacionais.

https://valor.globo.com/politica/noticia/2020/10/22/se-falar-em-liberdade-nos-faz-um-paria-internacional-que-sejamos-um-paria-diz-ernesto-araujo.ghtml

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Chanceler de Bolsonaro critica João Cabral de Melo Neto, patrono da turma, em formatura no Itamaraty

Ernesto Araújo afirmou que escritor e diplomata, perseguido na ditadura Vargas e depois reabilitado, foi parar 'do lado errado do marxismo e da esquerda'

Victor Farias

O Globo, 22/10/2020 - 14:19 / Atualizado em 22/10/2020 - 15:46

BRASÍLIA — O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, afirmou nesta quinta-feira que o Itamaraty ficou "muito tempo dentro de si mesmo, cantando glórias passadas, lustrando troféus antigos e esquecendo-se de jogar o campeonato deste ano". Segundo ele, com a eleição do presidente Jair Bolsonaro, isso mudou. A declaração foi dada durante formatura do Instituto Rio Branco.

— Em seu discurso da noite da vitória, quase exatamente dois anos atrás, em 28 de outubro de 2018, o presidente Jair Bolsonaro, então recém-eleito, proclamava: vamos liberar o Itamaraty, e era disso que nós precisávamos, presidente: libertação. Precisamos de libertação, libertação para que despertemos e voltemos a enxergar o Brasil e o mundo — disse.

Em um longo discurso de mais de 30 minutos, Araújo fez críticas ao globalismo, ao comunismo, aos "isentões" e ao "estranho hipermoralismo da atualidade". Ele afirmou que, durante a abertura da Assembleia Geral da ONU, Bolsonaro e o presidente americano, Donald Trump, foram "praticamente os únicos" a falarem em liberdade. E disse que, se falar de liberdade faz do Brasil um "pária", "que sejamos esse pária".

— Naquela organização que teria sido, que foi fundada no princípio da liberdade, mas que a esqueceu. Sim, o Brasil hoje fala de liberdade através do mundo. Se isso faz de nós um pária internacional, então que sejamos esse pária, que sejamos esse severino que sonha e essa severina que reza  — disse, citando "Morte e Vida Severina", obra de João Cabral de Melo Neto, escolhido como patrono da turma. — Talvez seja melhor ser esse pária deixado ao relento, deixado de fora, do que ser um conviva no banquete no cinismo interesseiro dos globalistas, dos corruptos e semicorruptos.

Ao comentar a escolha do escritor e diplomata João Cabral de Melo Neto como patrono da turma, o chanceler afirmou que o escritor tinha uma "grande sensibilidade para o sofrimento do povo brasileiro", mas disse que ele, talvez, tenha ido para o "lado errado do marxismo e da esquerda".

— Sua utopia, esse comunismo brasileiro de que alguns ainda estão falando até hoje, consistia em substituir esse Brasil sofrido, pobre e problemático por um não-Brasil, um Brasil sem patriotismo, sujeito naquela época, anos 50, 60, aos desígnios de Moscou, e hoje, nesse novo conceito de comunismo brasileiro, sujeito ao desígnios sabe-se lá de quem — afirmou.

Durante a ditadura de Getúlio Vargas, o escritor, que era diplomata, foi acusado de comunista, e o Itamaraty o colocou em disponibilidade inativa, sem remuneração. Ele, no entanto, foi absolvido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), e reintegrado ao Itamaraty, em 1955.

O chanceler disse, ainda, que "todo isentão é escravo de algum marxista defunto" e que "pessoas com baixa capacidade intelectual descobriram que podem parecer inteligentes chamando de ideológico tudo aquilo que não compreendem".

— Tachar os conservadores de ideológicos é a epítome da prática marxista-leninlista: chame-os do que você é, acuse-os do que você faz. O grande complexo marxista-isentista cria ideologias todos os dias, ou seja, agarra pedaços da realidade sempre complexa e cambiante e os transforma em sistemas de locuções fechados, que nao admitem questionamentos — disse, acrescentando: — Assim, tomam o meio ambiente e as preocupações legítimas com esse tema e o transformam em ambientalismo, tomam a mudança climática e a transformam em climatismo, tomam a ciência e a transformam em cientificismo, tomam a iluminação e a transformam em iluminismo.

https://oglobo.globo.com/mundo/chanceler-de-bolsonaro-critica-joao-cabral-de-melo-neto-patrono-da-turma-em-formatura-no-itamaraty-24706541