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sábado, 15 de junho de 2024

'Boom' de pedidos à Argentina pode esbarrar em leis de extradição (O Globo)

 'Boom' de pedidos à Argentina pode esbarrar em leis de extradição

O Globo | Política
15 de junho de 2024

Os pedidos que o governo deverá apresentar à Argentina para extraditar os 47 foragidos do 8 de janeiro representam 83% do número de solicitações que o Brasil fez à nação vizinha nos últimos dois anos e meio (56). Quando o trâmite for formalizado, o país governado por Javier Mi lei passará para a segunda colocação no ranking dos que mais recebem requisições brasileiras, atrás apenas de Portugal. A ofensiva da Polícia Federal na busca, no entanto, deve esbarrar em obstáculos no país vizinho, legais e políticos.

Os dados são do Ministério da Justiça e obtidos pelo GLOBO via Lei de Acesso à Informação. Na terça-feira, o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, disse que a Argentina tem colaborado para a localização de investigados e condenados pela participação nos atos antidemocráticos.

- Atuamos em uma rede de cooperação internacional. É a polícia conversando com a polícia para tentar localizar essas pessoas que são do interesse do Poder Judiciário explicou Rodrigues.

Segundo as investigações, esse grupo deixou o país pela fronteira a pé ou de carro e, alegando perseguição política, buscava pedir refúgio. Além da Argentina, é possível que alguns foragidos tenham entrado por via terrestre no Uruguai e no Paraguai.

RELAÇÃO DELICADA

O provável pedido de extradição acontece em meio a um momento delicado entre os dois países, já que a Argentina é comandada por Javier Milei, aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro, adversário político de Lula. Conforme informou o colunista Lauro Jardim, autoridades diplomáticas e do Executivo estão preocupadas com a possibilidade de uma "crise diplomática" se Milei negar a extradição.

Apesar da relação ruim, integrantes do governo confiam que a distância não terá inuência na posição. De acordo com autoridades brasileiras ouvidas pelo GLOBO, o sinal de que a Argentina está disposta a cooperar com a PF foi uma declaração do porta-voz da Casa Rosada, Manuel Adorni, que disse que o governo argentino seguirá o que a lei indica, inclusive o repasse de informações ao governo brasileiro.

Um dos obstáculos no horizonte é o tratado de extradição firmado em 1968, que prevê que não será concedida a extradição quando a infração cometida "constituir delito político ou fato conexo deste delito". O tratado, no entanto, ressalta que a "alegação do fim ou motivo político não impedirá a extradição se o fato constituir, principalmente, infração da lei penal comum".

A lei argentina que regula a cooperação internacional, de 1997, vai no mesmo sentido, afirmando que não será realizada a extradição quando o delito que motiva o seu pedido é um "delito político". O argumento do governo Lula para rebater o uso da "infração política" como escudo será que se tratam de pessoas que descumpriram decisões judiciais e medidas cautelares, e que as leis internacionais protegem a atividade política - o que é diferente de promover depredação e destruição. Ainda assim, a questão tende a ser controversa, segundo especialistas.

- O problema é que a decisão cabe à Argentina. Se as autoridades entenderem que os atos praticados constituem um crime político, isso, de fato, vai dificultar o pedido de extradição - aponta a professora de direito internacional da Busca a golpistas Invasores de prédios públicos em Brasília são presos em 8 de janeiro do ano passado: parte dos condenados fugiu para outros países

ETAPAS DO PROCESSO

Polícia Federal

Prepara uma lista com o nome dos foragidos, que é enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF).

STF

0 Supremo recebe o pedido e decide se aprova ou não. Caso seja aprovado, o documento é repassado para o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI). vinculado ao Minis tério da Justiça.

Ministério da Justiça

0 DRCI analisa a documentação para verificar se está de acordo com o previsto no Tratado específico ou na Lei 6.815/1980 (Esta tuto do Estrangeiro). Em caso positivo, o pedido pelas extradições é repassado ao Ministério das Relações Exteriores (MRE).

Relações exteriores

Itamaraty. por sua vez. remete o caso para o órgão homólogo ao DRCI na Argentina, que avalia.

Judiciário argentino

Pedido é repassado pelo DRCI argentino à Justiça do país. 0 caso é repassado para análise de um juiz de primeiro grau. que também ficará responsável pela análise de eventual pedido de prisão da Justiça brasileira.

Presidente

Decisão da Justiça é encaminhada ao presidente. Javier Milei, que é responsável pela decisão sobre o processo de extradição ou não.

Além disso, a Lei Geral de Reconhecimento e Proteção ao Refugiado da Argentina afirma que a discussão sobre o refúgio deve ser feita anteriormente à decisão de extradição. Ou seja, se os brasileiros fugitivos tiverem solicitado refúgio, o país primeiro tem que analisar esses pedidos antes de decidir sobre a extradição. Nesse caso, os investigados teriam que demonstrar que fugiram do Brasil por perseguição política. Ainda não se sabe se alguns deles pediram refúgio, porque a tramitação é sigilosa.

O advogado Acácio Miranda da Silva, mestre em Direito Penal Internacional, afirma que, apesar de os processos serem legislados por tratados ou acordos internacionais, a geopolítica acaba sendo um fator determinante para o aceite e agilidade dessas requisições:

- As regras existem e devem ser seguidas, mas não são tudo. A geopolítica acaba influenciando bastante.

PEDIDOS DISPARARAM

Dados do Ministério da Justiça mostram um salto no número de pedidos de extradição no âmbito do governo brasileiro seja como solicitante ou destinatário da requisição. Em 2023, foram registrados 454, um aumento de 39% em relação a 2022, com 326 pedidos. Especialistas apontam que esse aumento está relacionado à expansão de facções brasileiras em outros países.

Portugal e Estados Unidos, com grande quantidade de imigrantes brasileiros, foram os países que mais receberam pedidos de extradição do Brasil. Tráfico de drogas, homicídios, roubo e extorsão e organização criminosa são a maioria entre os crimes relacionados aos pedidos feitos pelo governo brasileiro a outros países,e somam 54% desses registros nos últimos anos.

Especialista no tema e integrante do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Berlinque Cantelmo conta que o PCC tem expandido suas operações pelo mundo. Na Europa, por exemplo, países como Portugal e Espanha são usados como portas de entradas para o tráfico de drogas. Como O GLOBO mostrou, a facção já atua em 24 países e envia droga aos cinco continentes.

Enquanto isso, no caso dos pedidos feitos por outras nações ao governo brasileiro, Argentina, Uruguai, Portugal, Itália e Peru são os que mais solicitaram a extradição de cidadãos foragidos ou presos no Brasil. Tráfico de drogas, homicídios, estelionato e estupro são a maioria (53%) dos crimes relacionados a essas solicitações de cooperação.

Para se realizar a extradição entre dois países, é necessário que os governos tenham firmado um compromisso para delimitar as regras do procedimento. Atualmente, o Brasil é signatário de mais de 30 acordos internacionais relacionados à extradição, com alguns deles envolvendo dois ou mais países.

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Itamaraty: comeco de uma nova gestao; e de uma nova era?

Decisão sobre asilo ou extradição de Molina é de Dilma, diz ministro

O GLOBO, 28/08/2013
O novo ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo Machado, disse, nesta quarta-feira, 28, que "não há uma crise com a Bolívia" e que a decisão sobre a manutenção do asilo ou uma possível extradição do senador boliviano Roger Pinto Molina cabe à presidente Dilma Rousseff.
"Quem conduz essa questão é a presidente Dilma. Os dois governos estão em contato permanente, portanto não há uma crise com a Bolívia em si. Há conversas em curso e será feito o que a presidente determinar", disse o chanceler em entrevista coletiva, poucas horas após ser empossado por Dilma em cerimônia no Palácio do Planalto.
Nesta quarta, o presidente da Bolívia, Evo Morales, disse que o Brasil deveria "devolver" o senador ao país. "O que cabe ao Brasil é devolver Roger Pinto para que ele se submeta à Justiça boliviana. Seria a melhor forma de contribuir com a luta contra a corrupção", afirmou o presidente boliviano em declaração à imprensa, sobre o senador, opositor ao seu governo.
Figueiredo Machado substituiu Antonio Patriota, demitido após Pinto Molina sair da embaixada brasileira em La Paz e chegar ao Brasil no fim de semana sem o conhecimento do governo.
Investigação
O novo ministro não quis se manifestar diretamente sobre o episódio, alegando que uma comissão está investigando a ação, planejada pelo encarregado de negócios da embaixada brasileira na Bolívia, Eduardo Saboia.
"Você pode imaginar que tudo o que o ministro disser nesta hora, de alguma forma, pode dirigir o trabalho da comissão. Não é porque eu não tenha opinião, eu tenho. Mas acho que não seria adequado , neste instante, eu dizer algo", declarou o chanceler. Ele garantiu que será dado "o pleno direito à defesa" para Saboia e que não é possível determinar quando a investigação será concluída.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Caso Battisti: um criminoso e a lei de extradicao - Paulo Brossard

Um artigo de um jurista que não serve a causas ideológicas, como certos paus-mandados da PR.

"Caso Battisti, questão de somenos?"
Paulo Brossard *
Zero Hora, 31/01/11

Em matéria de extradição, em lei alguma se reserva atribuição à Advocacia-Geral da União. De mais a mais, convém lembrar que o presidente da República não é parte do processo de extradição. Partes são o requerente e o extraditando

Ainda não se passou um mês do termo do maior e melhor governo da história do Brasil, segundo a versão de seu protagonista, assoalhada aos quatro ventos, e sua sucessora continua a ter de digerir capítulos indigestos da herança recebida.

O caso da extradição do italiano Battisti é um deles e não é dos menos expressivos. Curiosamente, o presidente expirante aguardou até o último dia de seu mandato para, louvando-se em parecer da Advocacia-Geral da União, e com base nele, negar a extradição. Nesse entretempo, não cessaram manifestações de entidades de alta responsabilidade. Uma delas do Parlamento Europeu... outra do chefe de Estado da República Italiana dirigida à presidente da República do Brasil.

Não quero e não devo rediscutir teses que o Supremo Tribunal Federal já enfrentou, decidiu, e que poderá ter de voltar a pronunciar-se à vista e consequência do conflito arquitetado, mas posso e devo fazê-lo como cidadão e como estudante de temas jurídicos, a fim de opinar acerca da singularidade da emergência; contudo desejo limitar o campo de apreciação aos seus termos mais singelos e objetivos.

Tendo sido encaminhado ao Supremo Tribunal Federal o pedido de extradição formulado pelo Estado italiano, processada a querela, a decisão derradeira seria da Corte Suprema, como se lê na Constituição, artigo 102, "compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente a guarda da Constituição cabendo-lhe: I - processar e julgar originariamente g) a extradição solicitada por Estado estrangeiro". Foi o que se deu, tendo o Supremo Tribunal determinado que, quanto à entrega do extraditando, o presidente da República tinha obrigação de agir nos termos do tratado firmado entre o Brasil e a Itália.

Ora, tratando-se de competência originária e cabendo ao Tribunal Supremo processar e julgar a extradição, nele começa e termina o julgamento da extradição requerida, pois só a ele compete processar e julgar a extradição requerida. Em matéria de extradição, em lei alguma se reserva atribuição à Advocacia-Geral da União. De mais a mais, convém lembrar que o presidente da República não é parte do processo de extradição. Partes são o requerente e o extraditando.

Quando o ex-presidente, no último dia de seu mandato, praticamente "recorreu" da decisão do Supremo Tribunal Federal para um serviço de assessoramento do Poder Executivo, embora não houvesse recurso, na prática "cassou" o acórdão do Supremo Tribunal, prolatado em processo originário e portanto irrecorrível. Ainda mais, o então presidente da República deixou de observar o expresso na ementa do acórdão da extradição, aliás, transitado em julgado:

"(...) Obrigação apenas de agir nos termos do Tratado celebrado com o Estado requerente. (...) Decretada a extradição pelo Supremo Tribunal Federal, deve o Presidente da República observar os termos do Tratado celebrado com o Estado requerente, quanto à entrega do extraditando."

Ainda mais, o Executivo atribuiu-se a prerrogativa de ignorar o julgamento do Supremo e, ignorando-o, a ele atribuir o caráter de mera opinião. Ora, o Supremo Tribunal Federal não dá opiniões a ninguém; sendo órgão máximo do Poder Judiciário, não lhe cabe emitir pareceres para fins acadêmicos, mas processar e julgar conclusivamente.

Para encerrar, se bem me lembro, em nenhuma das extradições requeridas, processadas e julgadas pelo Supremo Tribunal Federal, a douta Advocacia-Geral da União teve acesso. Esta parece-me a situação a que o país foi jogado, como se a questão fosse de somenos.

* Paulo Brossard é jurista, ministro aposentado.