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terça-feira, 9 de julho de 2013

Gastos publicos: um debate (indireto) entre Mansueto Almeida e AndreLara Resende

Setor Público e Consumo: o que mostram os números?

Não iria entrar diretamente nessa polêmica chata sobre gasto público, mas dado que estou recebendo consultas sobre um parágrafo do artigo do economista André Lara Resende no valor vou explicar rapidamente aqui e, depois, vou fazer algo mais detalhado. Vou escrever um artigo com Samuel Pessoa para explicarmos em detalhe isso e colocar posts no blog sobre Finanças Públicas 101. O parágrafo polêmico do André Lara Resende é o seguinte:
“Apesar de extrair da sociedade mais de um terço da renda nacional, o Estado perdeu a capacidade de realizar seu projeto. Não o consegue entregar porque, apesar de arrecadar 36% da renda nacional, investe menos de 7% do que arrecada, ou seja, menos de 3% da renda nacional. Para onde vão os outros 93% dos quase 40% da renda que extrai da sociedade? Parte, para a rede de proteção e assistência social, que se expandiu muito além do mercado de trabalho organizado, mas, sobretudo, para sua própria operação. O Estado brasileiro tornou-se um sorvedouro de recursos, cujo principal objetivo é financiar a si mesmo. Os sinais dessa situação estão tão evidentes, que não é preciso conhecer e analisar os números. O Executivo, com 39 ministérios ausentes e inoperantes; o Legislativo, do qual só se tem más notícias e frustrações; o Judiciário pomposo e exasperadoramente lento.” 
Olha só. Eu gostaria que o  André Lara estivesse correto porque todo mundo detesta governo gastador e, assim, seria mais fácil fazer uma reforma fiscal para valer, reduzindo gasto com a manutenção da máquina para reduzir carga tributária e aumentar investimento. Mas isso está errado. É tão óbvio que “nem precisa analisar os números”.
Primeiro, a ideia de que o aumento do numero de ministérios é o grande responsável por um aumento excepcional do gasto é uma falácia. Isso atrapalha muito a coordenação do governo mas não é o motivo da expansão do gasto público desde 2003. Alguém quer apostar comigo? eu topo colocar $$ nesta aposta. Vários dos atuais ministérios já existiam e foram transformados de secretarias para ministérios. Por exemplo, nessa conta entra o Banco Central e a Advocacia-Geral da União. Os titulares dessas pastas não eram ministros e foram transformados em ministros. Será que isso aumentou o gasto? Nos outros casos é possível que tenha ocorrido aumento de gasto mas poderíamos até acabar com essas pastas que o ganho em economia fiscal seria mínimo.
Segundo, no mundo todo, países que gastam mais como % do PIB são aqueles que gastam mais com politicas sociais: transferência de renda, educação e saúde. Gasto do governo como % do PIB entre países e ao longo do tempo é explicado por esse tipo de gasto. Leiam o livro do Peter Lindert de 2004 “Growing Public”. Eu não conheço base alguma que explique tamanho de setor público em um país baseado em gastos com manutenção da máquina pública.
Terceiro, alguém me falou que pelos dados do Banco Mundial o consumo do governo no Brasil (que exclui transferências) é de 21% do PIB. Como o gasto total do setor público no Brasil é cerca de 38% a 40% do PIB, mais da metade do gasto seria então gasto do leviatã com a sua própria existência. Isso está ERRADO. Nesse dado do Banco Mundial, consumo do governo inclui pagamento de pessoal e compra de bens e serviços pelo setor público. O que concordo é que o valor não é pequeno; é alto. Mas aqui há coisas que para se resolver é preciso entrar no debate político: focalização dos gastos com saúde e educação.
Pelos dados do próprio Banco Mundial, o gasto com saúde pública no Brasil é de 4,1% do PIB e o gasto com educação pública é de 5,8% do PIB. Os dois juntos somam 9,9% do PIB. O investimento público total no Brasil é de 2,5% do PIB. Vamos supor (exageradamente) que metade seja para áreas de educação e saúde. Assim, gastos com custeio e pessoal nas áreas de educação e saúde no Brasil seriam de 8,7% do PIB.  Assim, a conta de 21% do PIB seria reduzida para 12% do PIB se excluirmos gasto com pessoal e custeio das funções  saúde e educação. Gasto com saúde é na sua grande maioria pagamento de internações, compras de remédios, etc. feitas pelo SUS e o gasto com educação inclui desde merenda escolar a pagamento de funcionários. Acho difícil alguém falar que merenda escolar é “gasto do governo com a sua manutenção” mas isso entra na estatística de consumo do governo.
Talvez haja um número excessivo de trabalhadores na área de educação não ligado as atividades de ensino, o que é verdade (ver esse excelente artigo do Gustavo Ioschpe). Mas isso não significa um bando de burocratas nos gabinetes em Brasilia dar a entender o texto do André Lara Resende (mas talvez essa não tenha sido a intenção do André). Na verdade, os dados com despesa com pessoal do link acima isso mostram que temos algum espaço para melhorar a oferta de serviços de educação sem precisar aumentar o gasto total (% do PIB).
Quarto e último ponto, é fácil ver como está dividido o gasto por nível de governo (municípios, estados e governo federal) a partir do balanço do setor público nacional. Aqui é preciso dois cuidados. Primeiro, não é possível somar os dados das três esferas de governo porque nessa base há problemas de dupla contagem. Assim, o correto é identificar por nível de governo como os recursos fiscais são gastos por função. Segundo, o gasto do setor público é dividido em 28 funções. A função 28 – encargos especiais- é onde aparece várias despesas de subsídios, pagamento de juros e amortização da dívida. Assim, na análise que faço abaixo vou deixar essa função de fora para que os dados de juros e refinanciamento da dívida não atrapalhem a análise.
Os dados abaixo são para 2011 e a divisão do gasto por função soma os três tipos de despesa (pessoal, custeio e investimento). O que os dados mostram?
Tabela 1 – Gasto Público por Função – Municípios, Estados e Gov Federal – % do PIB – 2011
FUNCAO01
Fonte: Balanço do Setor Público Nacional
Na tabela acima identifiquei as funções que mais pesam no orçamento de cada nível de governo. Vou começar a análise pelo governo federal. Os nomes não precisam de explicação, mas vale lembrar que as funções previdência (pública e privada), assistência social (LOAS, Bolsa-Familia) e trabalho (seguro-desemprego e abono salarial) são contas que envolvem transferências para as famílias. No caso do Governo Federal, essas três funções ligadas à transferências representaram 10,6% do PIB em 2011, que é 61% do gasto total do governo federal no ano (10,6% do PIB dividido por 17,34% do PIB). Se acrescentarmos gastos com as funções saúde e educação, quase 80% do gasto do governo federal (13,63% do PIB dividido por 17,34% do PIB) passa a ser explicado pelas contas de transferência+ saúde+ educação.
No caso dos estados, pesa a conta de educação, saúde, previdência social e segurança pública. Essas quatro contas somam 6,3% do PIB, que é 66% do gasto total dos estados (6,3% do PIB divido por 9,60% do PIB). Aqui, se você quiser falar em desperdício no âmbito dos estados tem que entrar na conta da educação, saúde e segurança pública. É possível que o dinheiro esteja sendo mal gasto, mas não é com passagens de avião ou xerox.
No caso dos municípios, tem um ponto interessante. Os três maiores gastos concentram-se em educação, saúde, e administração. Aqui parece que, finalmente, André Lara Resende parece ter acertado. Mas os 0,88% do PIB gasto com a função administração está longe de ser mais da metade do gasto dos municípios. Adicionalmente, se olharmos o crescimento da despesa para este nível de governo de 2002 a 2011, o que se destaca é o crescimento do gasto com educação e saúde como seria o esperado, pois são gastos com vinculação constitucional.
Tabela 2 - Gasto Público por Função nos Municípios- % do PIB – 2002 e 2011
FUNCAO02
Resumindo, a tese do André Lara Resende está errada. O setor público no Brasil gasta muito porque gasta muito com transferências (assistência social, previdência, e trabalho) e com educação e saúde. Essas cinco funções explicam muito mais de 50% do gasto do setor público e as ruas querem ainda mais!!!
O que precisamos discutir é porque os gastos com educação e saúde que tem crescido muito não dão o retorno esperado. Esse debate vai deixar claro que o problema não é apenas falta de dinheiro. Assim, ao invés de falar em “gasto do governo para financiar a si mesmo”, Lara Resende deveria ter sugerido um pente fino nos gastos com saúde e educação. Mas não se enganem. Se o SUS for mais eficiente, eu cancelo na mesma hora o meu plano de saúde privado de modo que a economia esperada nessa área é dúbia.
Por fim, não há como continuar fazendo mais do mesmo com os programas de transferências de renda- turbinando todas as políticas de transferências. Aqui o debate é tentar convencer à sociedade de que vale a pena concentrar esforços nos programas mais baratos e focalizados nos mais pobres. Independentemente de minha ou da sua vontade, o Brasil não escapará de uma reforma da previdência, mesmo que a mesma seja feita a conta-gotas. Se a sociedade não quiser fazer, paciência. Mas neste caso teremos que criar um novo imposto.
De qualquer forma, a ideia que podemos contratar um SUPER administrador que vai solucionar o problema do gasto público no Brasil é equivocada. É o tipo de proposta que muita gente faz e a culpa aqui não é apenas do André (um economista que admiro muito). Escuto isso de amigos meus. Infelizmente, o mundo nem sempre funciona de acordo com a nossa percepção. Eu tenho a percepção que sou tão bonito quando o Tom Cruise e o Brad Pitt, mas com exceção da minha esposa, ninguém mais acha isso.

  1. Creio haver uma falha quanto aos custos com o SUS tenderem a aumentar, caso houvesse mais eficiência no setor público de saúde. A renúncia fiscal com as despesas com planos de saúde dedutíveis do IRPF. Se quem tem plano de saúde abandoná-los e deixar de pagá-los e de deduzir respectivamente os pagamentos feitos do IR devido, deve haver acréscimos de receita na faixa de alguns bilhões de reais.

    • Não há falha alguma. Se as pessoas puderem confiar que serão atendidas no SUS e não morrerão na sala de emergência, as pessoas não pagariam plano de saúde privado e demandariam serviços do SUS. A demanda aumentaria e o a renuncia fiscal das despesas com planos de saúde seria menor. Acontece que, em 2012, a renuncia fiscal em benefício de usuários de planos de saúde privados foi R$ 12 bilhões, sendo que a renúncia via imposto de renda foi de R$ 10 bilhões. Isso é 0,25% do PIB. O gasto privado com saúde no Brasil é perto de 5% do PIB. Se metade dessa turma fosse para o SUS o governo precisaria recriar a CPMF e mesmo assim não poderia garantir que o serviço iria melhorar para todo mundo – poderia até cair a qualidade a depender do crescimento da demanda. Assim, os seus bulhões de reais são R$ 12 bilhões – o que não seria suficiente.
      A proposito, o calculo da renuncia fiscal em benefício de usuários de planos de saúde privados é da economista do IPEA Luciana Servo, especialista no assunto.

  2. como economistas tão notáveis não escrevem uma única linha sobre gastos com encargos financeiros? E ainda clamam pela elevação da selic! Da mesma forma, não compreendo pq o economista de Londres em seu longo artigo escreveu apenas duas linhas sobre os anos de 1990? Amnésia, sociopatia intelectual ou hipocrisia?

    • Porque não era isso que estava em discussão e porque a conta de juros vem na verdade caindo. Essa conta no inicio da década de 2000 bateu perto de 9% do PIB – 8,51% do PIB em 2003. Ano passado, 2012, ela foi para 4,83% do PIB. Ou seja uma queda de 43% no período.
      Por que não a reduzimos essa conta para 0%? porque não dá para fazer calote e nos últimos cinco anos o governo vem aumentando fortemente as novas emissões de títulos públicos (divida bruta) para acumular reservas e fazer operações subsidiadas com bancos públicos. Só para bancos públicos foram emissões de 9% do PB de 2008 a 2012.
      Assim, é provável que essa conta fique elevada – entre 4,5% e 5% do PIB- e não temos como baixar na marra. A não ser que estejamos dispostos a emprestar dinheiro para o governo sem cobrar nada e ninguém está disposto a isso.
      Resumo, a carga tributária do Brasil subiu e o gasto aumento desde 2003 apesar da forte queda da taxa de juros. Ou seja, não há nada de hipocrisia.

  3. O governo arrecada 36% do PIB. Vc explicou onde estao sendo gastos 17%, correto ? E os outros 19%

    • Bom, eu não pretendia explicar a divisão do gasto público. O post foi para rebater uma tese de que o crescimento do gasto vem do inchamento do Estado – uma tese que ficou implicita no argumento do Andre Lara Resende. Mas vamos lá.
      Primeiro, os 17,34% são apenas os gastos do Gov Federal e nessa conta como adverti não está a conta de juros. Fazendo uma conta muito rápida, o gasto público total do setor público no Brasil (três níveis de governo pode ser dividido assim).
      Previdência Publica e Privada + LOAS = 12% do PIB
      Conta de Juros = 5% do PIB
      Programas Sociais = 2% do PIB
      Saúde e Educação = 10% do PIB
      SUBTOTAL das contas acima = 29% do PIB. Todo o resto (segurança pública, saneamento, subsídios, transporte, defesa nacional, habitação, etc.) seria 9% do PIB.
      Total do Gasto do Setor Público no Brasil = 38% do PIB.

  4. Vc. Manzu, com sua cara de Tyson, é mas bonito que o Brad Pitt! Bela análise, parabéns!

    • Obrigado Ricardo, Vamos depois marcar um cerveja em São Paulo em agosto. Te aviso com antecedência quando for por lá. Abs,

  5. em 08/07/2013 às 7:59 PM | Resposta
    iconoclastas
    ainda que apenas um supergestor não seja suficiente para resolver todos os problemas, na margem, sem dúvida, ajuda.
    os problemas de gestão são reais, os desperdícios inegáveis – equipamentos e instalações se deteriorando e etc.; as licitações carimbadas são o padrão; as preferências pelo fornecedor nacional – com sobrepreço – institucionalizadas por lei; as questionáveis escolhas na alocação dos recursos (ensino superior x básico).
    além disso, o custo de manutenção tanto de Brasília como dos estados e municípios, nas três esferas de poder, são relativamente altos dada a renda per capta.
    concordo que a substancial parte do orçamento dirigida a transferências são respostas às demandas da sociedade, refletem a preferência do eleitor/pagador de impostos, mas os pontos listados acima, e muitos outros, estão fora do controle da maior parte do eleitorado e, portanto, não correspondem às suas escolhas. aparentemente têm mesmo a ver com rent-seeking.
    daí pode vir parte do tal questionamento da representatividade políticos x sociedade.

    • Iconoclastas, sim! sem dúvida ajuda. Mas acho que ajuda porque uma boa gestão mostraria os problemas que existem com os gastos, inclusive nas áreas de saúde e educação. A partir dessa constatação, um bom gestor poderia tentar mostrar os dados para a sociedade para que ela decidisse via seus representantes eleitos as regras do gasto fiscal nas áreas de educação, saúde, previdência, etc.
      Mas mesmo um bom gestor não conseguiria apenas com medidas administrativas resolver os nossos grandes problemas do gasto. Por exemplo, o Brasil gasta muito por aluno com ensino superior. Será que o um gestor conseguiria modificar unilateralmente a redução do gasto por aluno do ensino superior? ou começar a cobrar de quem pode pagar e estuda nas universidades públicas? Na Inglaterra, que tem um serviço de saúde universal e gratuito, as universidades públicas são todas pagas.
      Ou seja, um bom gestor não escaparia do debate político e essas decisões teriam quer ser negociadas e discutidas no Congresso.
      No caso da politica de conteúdo nacional, também não gosto mas o governo conseguiu aprovar e o Congresso aprovou. Um bom gestor faria diferente, mas essa politica foi aprovada pelo Congresso. Sempre tem rent-seeking até porque hoje em dia, principalmente nos países desenvolvidos, o gasto público como % do PIB é elevado. Assim, setor privado tem forte incentivo para capturar o Estado. Aqui não é diferente Mas novamente não sei como um bom gestor vai resolver isso.
      Em resumo, um bom gestor é muito importante mas não vamos conseguir mexer no gasto público sem entrar no debate político. Abs,

  6. em 08/07/2013 às 8:04 PM | Resposta
    marco bittencourt
    Assim, na análise que faço abaixo vou deixar essa função de fora para que os dados de juros e refinanciamento da dívida não atrapalhem a análise.
    Não me parece adequado.

    • Por que não? voce acha que refinanciamento da dívida é gasto? por exemplo, se o governo emite R$ 50 bilhões para resgatar outros R$ 50 bilhões de títulos que estão vencendo você considera isso gasto? foi por isso que tirei da análise.
      Mas se voce estiver interessado na conta de juros do setor público a novidade é que essa conta caiu brutalmente como % do PIB de 2003 a 2012. Essa conta foi de 8,51% do PIB, em 2003, e no ano passado, 2012, foi para 4,83% do PIB. Ou seja uma queda de 43% no período.
      Apesar disso, a despesa total do setor público cresceu e a carga tributária aumentou, E como estamos agora (desde 2008) aumentando muito a divida bruta, essa conta não vai mais cair – deve fiver entre 4,5% e 5% do PIB.

  7. em 08/07/2013 às 9:27 PM | Resposta
    Francisco Salgado
    vamos aguardar o artigo que será escrito conjuntamente com o também excelente Samuel Pessoa prá poder avaliar melhor essa “caixa preta” dos gastos públicos.

    • Vamos tentar escrever em julho ou agosto. Vai ser algo simples apenas para tentar deixar mais claro o debate e chegarmos a um consenso nesse debate eficiência versus conjunto de regras que regula a despesa pública. Abs

  8. Mansueto seu post é excelente, mas quero acrescentar uma análise mais qualitativa. Brasília tem o 2º maior PIB per capta do país entre as capitais, o quê ela produz ? Tem gente servindo cafezinho e apertando botão de elevador ganhando mais de R$10 mil/mês. Os nossos senadores e deputados tem a hora trabalhada (e mal) mais cara do mundo. Temos mais de 22.000 cargos comissionados e funcionários públicos com mais de 3 aposentadorias. Vale lembrar ainda que o setor público não é só Federal, existem municípios com menos de 2.000 habitantes, mais de 35% deles vivem de repasses do poder central e dos estados. Para concluir o fato é que realmente temos cerca de 40% do PIB passando pelo Governo, dos quais menos de 3% vai pra investimento. Como resolver isto ? Mais imposto ninguém aguenta. Já temos nas empresas privadas milhões de funcionários, que no fundo trabalham para o governo, apurando e pagando impostos às custas do empresário. Isso tudo sem entrarmos nos preciosos custos de oportunidade e dos problemas de agência que a nossa Versailles tupiniquim gera aos agentes da economia.

    • Sim, concordo com você que tem um bocado de ineficiência e coisas desnecessárias que poderíamos controlar. Mas esse seu ponto para vale para quase todo setor público no mundo, inclusive, EUA. O problema é que a economia com isso é pequena (mas nem por isso devemos menosprezar) frente ao gasto que seguem regras.
      Por exemplo, vinculação de gastos é um convite ao desperdício. Uma vez Delfim Netto escreveu sobre isso. Mas vinculamos constitucionalmente gastos com educação e saúde, agora queremos criar impostos específicos para transporte público e ainda temos uma regra de indexação do salário mínimo.
      O que um bom gestor pode fazer por exemplo, para contrabalançar o efeito fiscal da regra de reajuste do salário minimo? cada R$ 1 a mais são R$ 300 milhões de gastos correntes adicionais. Por exemplo, de 2012 a 2013 o salário minimo passou de R$ 622 para R$ 678 – aumento de R$ 56. O impacto desse reajuste nas contas públicas = R$ R$ 16,8 bilhões. Não dá para compensar cortando cafezinho e passagem de avião.
      Os funcionários públicos com mais de 3 aposentadorias é um bom exemplo de que não vamos resolver o problema apenas com gestão. Para mexer nisso vamos precisar mudar regras. Muito do que o FHC tentou fazer e é xingado até hoje foi porque encarou o vespeiro e propos mudanças de regras com as reformas.
      Um bom gestor pode ser essencial para começar avaliação consistente de políticas publicas e mostrar para a sociedade os dilemas, além de cortar onde for possível. Mas terá que entra no debate político de como e com o que gastar.
      Por fim, novamente, os nossos milhares de municipios que forma criados foram aprovados pelo Congresso no jogo político. Seria ótimo acabar com vários municípios mas gestor algum conseguiria fazer isso. Vai depender do poder do executivo de convencer a sua base e da vontade do executivo de fazer essa reforma.
      Sim, ninguém quer pagar mais imposto. Mas temos que resolver esse problema no debate politico e achar que um gestor com algumas canetadas vai evitar o debate político é ilusão.

domingo, 19 de maio de 2013

Gastos publicos e dilemas das politicas publicas no Brasil - Mansueto Almeida


O problema da carga tributária no Brasil

Recomendo a leitura de duas matérias interessantes neste domingo dia 19 de maio de 2013. Uma das matérias é do jornal O Globo é tem como foco o custeio do governo federal (clique aqui). A outra matéria é do jornal Folha de São Paulo e, a partir da análise da carga tributária de um litro de vinho, analisa porque a carga tributária é tão elevada no Brasil (clique aqui).
As duas matérias estão boas (parabéns as jornalistas Luiza Damé e Catarina Alencastro do Globo, e ao jornalista Ricardo Mioto da Folha), mas passam mensagens diferentes. Na matéria do Globo, a manchete fala de “inchaço de ministérios no governo Dilma” e mostra que: “Manter a estrutura e os funcionários das atuais 39 pastas do governo Dilma Rousseff, instaladas na Esplanada dos Ministérios e em outros prédios espalhados pela capital, custa pelo menos R$ 58,4 bilhões por ano aos cofres públicos. Esta verba, que está prevista no Orçamento Geral da União de 2013 para o custeio da máquina em Brasília, é mais que o dobro da que foi destinada ao maior programa social do governo, o Bolsa Família, que custará R$ 24,9 bilhões este ano”.
Os números estão corretos, mas é preciso ter cuidado com a interpretação que se tira da matéria. Explico. Esses R$ 58,4 bilhões representam algo como 1,2% do PIB. Pelos meus cálculos, esse número como percentual do PIB não sofreu grandes oscilações desde 2002. Assim, como o gasto público não financeiro do governo federal foi, em 2012, 18,2% do PIB; o custeio é algo como 7% da despesa primária do governo federal.
O que exatamente isso significa? Duas coisas. Primeiro, é claro que devemos criticar o governo federal pelo número excessivo de ministérios e, em um país como o Brasil com carga tributária de país desenvolvido, qualquer economia é importante. Segundo, não devemos, no entanto, achar que um controle do custeio seria suficiente para controlar a expansão do gasto público. Infelizmente não é. Não há como controlar a expansão de gasto público no Brasil sem modificar a dinâmica do crescimento dos gastos sociais.
Um programa de choque de gestão é importante para melhorar o resultado –eficácia das políticas- e pode até gerar uma grande economia na casa de bilhões de reais. Mas o melhor gestor do mundo não conseguirá compensar com medidas administrativas o crescimento dos gastos sociais, o impacto da regra da reajuste do salário mínimo nas contas públicas e o efeito demográfico nas contas da previdência (sobre esse último ponto leiam a coluna do jornalista Ribamar Oliveira do Valor da ultima sexta-feira- clique aqui).
Apenas para lembrar, reproduzo abaixo a divisão de despesa primária do governo federal de 2012. O custeio (não inclui gasto com pessoal nem investimento) eu divido em quatro grupos: (i) custeio dos programas de saúde e educação; (ii) custeio dos programas sociais (bolsa-família, seguro desemprego, abono salarial e LOAS); (iii)  gastos do INSS; e (iv) custeio administrativo – custos com aluguel, conta de luz, xerox, pasagens de avião, material de escritório, etc.
Gráfico 1 – Para onde vai a despesa primária do Governo Federal? – 2012
repartição despesa
Fonte: SIAFI. Elaboração: Mansueto Almeida
Infelizmente, o custeio administrativo é por volta de 7% da despesa não financeira do governo federal. Digo infelizmente porque seria mais fácil controlar o gasto público aqui e no resto do mundo se a dinâmica dos gastos fosse determinada por gastos de custeio (administrativo). Como se observa no gráfico acima, 63% das despesa não financeira paga pelo  governo federal, em 2012, foi para três tipos de gasto: INSS (39,3%), gastos sociais (11,3%), e custeio de saúde e educação (12,1%).
No caso da matéria do jornal Folha de São Paulo, a análise do repórter está perfeita ao mostrar o dilema de  controlar a carga tributária. A evolução da carga tributária, no Brasil, pode ser resumida resumida em 3 períodos: (i) 1947-1965 quando a carga tributária era inferior a 20% do PIB; (ii) 1966-1993, quando após a reforma financeira de Campos e Bulhões a carga tributária cresce para 25% do PIB e permanece em torno desse valor até 1993; e (iii) 1993-2012, quando a carga tributária passa de 25% para 36% do PIB, puxada pela necessidade de cobrir o Estado de Bem Estar Social estabelecido na nossa Constituição de 1988 e pela necessidade de economia do governo federal (superávit primário). 
Gráfico 2 – Carga Tributária do Brasil – 1947-2012 – % do PIB
carga tributária
Fonte: IBGE: 1947-2009 e IBPT: 2010-2012
A matéria da Folha de São Paulo fala corretamente que: “Para reduzir tal mordida, quantificada na relação entre impostos e PIB, é possível: 1) Cortar impostos. Mas vamos desistir do Estado de bem-estar social de 1988? 2) Aumentar o PIB. Mas o números mostram que estamos tendo dificuldade nisso. Assim, o cenário não é de otimismo. Se não for possível cortar a carga tributária, é razoável fazê-la ao menos deixar de ser o Frankenstein atual.”
Esse é exatamente o nosso grande dilema. Eu não quero passar a impressão que sou contra choque de gestão. Sou a favor, mas isso não vai controlar o crescimento do gasto público no Brasil. Enquanto essa questão não ficar clara para o eleitor, vamos continuar sendo um país de carga tributária elevada.

Brasil: um governo balofo, gastador e ainda assim incompetente - O Globo


A conta do inchaço de ministérios no governo Dilma
Custo para manter o número recorde de 39 ministérios é de R$ 58 bilhões
LUIZA DAMÉ
O Globo, 18/05/13

BRASÍLIA - Manter a estrutura e os funcionários das atuais 39 pastas do governo Dilma Rousseff, instaladas na Esplanada dos Ministérios e em outros prédios espalhados pela capital, custa pelo menos R$ 58,4 bilhões por ano aos cofres públicos. Esta verba, que está prevista no Orçamento Geral da União de 2013 para o custeio da máquina em Brasília, é mais que o dobro da que foi destinada ao maior programa social do governo, o Bolsa Família, que custará R$ 24,9 bilhões este ano.
No total, o orçamento para custeio de toda a engrenagem federal chega a R$ 377,6 bilhões, quando são incluídos, por exemplo, órgãos técnicos, empresas públicas, universidades, escolas e institutos técnicos federais. Este valor representa mais do que o PIB (a soma de todos os bens e serviços) de países como Peru, Nova Zelândia ou Marrocos.
A maior despesa nesse bolo é justamente com os salários dos funcionários, tanto os de Brasília quanto os espalhados país afora: o Executivo federal fechou a folha de pagamentos de 2012 em R$ 156,8 bilhões. O número de ministérios passou de 24, em 2002, para 39 este ano. A quantidade de servidores ativos e aposentados também cresceu: passou de 809.975 em 2002, para 984.330 no fim de 2011, segundo dados do próprio governo.
A título de comparação, a verba total destinada a investimentos do governo federal, prevista no Orçamento Geral da União deste ano, é de R$ 110,6 bilhões. Para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), menina dos olhos da presidente, estão previstos R$ 75 bilhões em 2013.
O ministério que mais gastará para manter sua estrutura este ano é o da Saúde: R$ 18,2 bilhões. Os dados foram extraídos de um levantamento feito pelo DEM a pedido do GLOBO, com base no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), do governo federal. Os gastos incluem despesas com custeio, ou seja, pagamento a funcionários civis e militares, compra de material de consumo dos ministérios, e contratação de serviços como água, luz, aluguel, transporte e hospedagem.
O número de pastas, que nem sequer cabe na Esplanada dos Ministérios, é alvo de críticas de políticos aliados, da oposição e de especialistas no setor público.
O empresário Jorge Gerdau Johanpeter, presidente da Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade — criada pela presidente justamente para propor modos de aperfeiçoar os serviços públicos, com redução de gastos —, é um dos maiores críticos da estrutura gigante do governo federal. Em recente entrevista ao portal UOL, Gerdau chamou de “burrice e irresponsabilidade” a criação de novos ministérios. Para ele, o governo funcionaria a contento com “meia dúzia” de pastas.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deixou 24 pastas no fim de seu mandato, em 2002. Luiz Inácio Lula da Silva inchou a máquina e deixou 37 pastas, incluindo secretarias que até então eram vinculadas a outros ministérios, como Direitos Humanos, Portos e Pesca, e que, sob a gestão petista, ganharam estrutura própria. Lula também deu ao presidente do Banco Central o status de ministro. A presidente Dilma Rousseff criou, então, as secretarias de Aviação Civil e de Micro e Pequena Empresa, atingindo a marca recorde de 39 ministérios.
só este ano, R$ 21,5 milhões com aluguéis
Na Esplanada dos Ministérios desenhada por Oscar Niemeyer e Lúcio Costa há 19 edifícios. Muitos deles abrigam mais de uma pasta, mas, ainda assim, falta espaço e o governo aluga mais prédios. O Ministério do Meio Ambiente, por exemplo, divide um edifício na Esplanada com o da Cultura, mas teve de alugar salas em outro local em Brasília, onde instalou secretarias.
O Ministério da Cultura também aluga salas e gasta R$ 1,3 milhão ao mês com locação de imóveis. No total, a pasta desembolsa R$ 141,7 milhões somente com o custeio de sua máquina. Segundo o Portal da Transparência, este ano o governo federal já pagou R$ 21,5 milhões para o aluguel de prédios em todo o país.
Procurado, o Ministério do Planejamento afirmou que as despesas da União com a criação de novas estruturas e com a manutenção das já existentes têm como objetivo “responder às necessidades de investimentos no país; melhorar a qualidade dos serviços prestados à população; atender à expansão de políticas públicas no território nacional e atender demandas da população por novas políticas públicas”.
No entanto, para o cientista político Valdir Alexandre Pucci, professor do Centro Universitário do Distrito Federal, o aumento da máquina pública é decorrência da maneira como se faz política no país, em que os aliados são atraídos por cargos no governo. Ele afirmou que esse processo foi ampliado depois do escândalo do mensalão, em 2005, porque Lula foi obrigado a ampliar sua base de apoio no Congresso.
— Esse inchaço não começa com a presidente Dilma. Vem da forma como se faz política no Brasil: as pessoas são chamadas para compor o governo. É claro que, com o mensalão, houve uma necessidade de ampliar a base no Congresso, provocando um inchaço ainda maior — argumentou Pucci.
Na posse de seu último ministro, Guilherme Afif Domingos, da Micro e Pequena Empresa, Dilma justificou a criação de mais um ministério afirmando que antes é preciso expandir, “para depois abrir um processo de redução”. Segundo a presidente, determinadas áreas necessitam de estrutura política própria para se desenvolver. No governo Dilma, chegou-se a analisar, inclusive, a criação do Ministério da Irrigação.
— Isso faria sentido se os ministérios de fato funcionassem, mas gasta-se muito, e muito mal. Por exemplo, na discussão da medida provisória dos portos, alguém ouviu falar do ministro de Portos (Leônidas Cristino)? Se o ministro de Portos não aparece no debate da principal medida do governo na área, fica evidente que (a criação da pasta) foi uma acomodação política — criticou Pucci.
O cientista político diz ainda que são poucos os resultados das pastas criadas nos últimos tempos, e que algumas funções acabaram se sobrepondo. Segundo ele, a recém-criada Secretaria da Micro e Pequena Empresa — que terá de ocupar salas cedidas pelo Exército, no anexo do prédio principal —, tem funções combinadas com os Ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.
— São incipientes as conquistas para justificar esse crescimento da máquina. O número de ministérios é exagerado ao extremo, e sem necessidade. A necessidade é melhorar a eficiência da máquina pública.
O grande número de ministérios e ministros no primeiro escalão do governo federal provoca, além das contumazes críticas, muito desgaste para o governo. O projeto de lei de criação da Secretaria de Micro e Pequena Empresa, por exemplo, ficou por mais de dois anos em tramitação no Congresso, não só por má vontade dos parlamentares, mas também por indefinição do Palácio do Planalto, que chegou a pensar em abortar a ideia.
PT tem o maior número de ministros: 18
Dilma vive uma situação irônica com seu time de primeiro escalão. Tida como técnica, gestora e pouco dada a uma relação muito próxima com a classe política, ela tem um Ministério eminentemente político: dos atuais 39 ministros, 31 são políticos ou indicados por partidos da coligação governista que a elegeu em 2010. O primeiro Ministério de Lula tinha 26 ministros, sendo 21 da cota dos políticos.
O PT, partido da presidente, lidera o ranking de ministros: são 18, considerando, inclusive os da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Miriam Belchior. O segundo maior partido da coalizão governista, o PMDB, tem o comando de cinco ministérios. Na primeira equipe de Lula, em 2003, dos 26 ministros, apenas seis não eram do PT.
A formação de uma equipe que representa os partidos vitoriosos nas urnas junto com o presidente é comum, e sempre aconteceu em todos os governos. Não foi diferente nos dois mandatos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que também enfrentou disputas entre aliados por cargos na Esplanda.
Mas essa predominância é maior nos governos petistas, especialmente porque tanto o governo Lula como o de Dilma criaram pastas para agregar partidos à base aliada — caso da Micro e Pequena Empresa, destinado ao PSD do ex-prefeito Gilberto Kassab.

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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Constituicao "cidada" de 1988: a conta esta' chegando...

Em 1987 e 1988, a sociedade brasileira, embalada nos discursos demagógicos da maioria dos constituintes, achava que tinha descoberto a chave do Tesouro: se colocaria na Constituição todas as benesses, bondades, direitos e privilégios que os cidadãos se achavam no direito de gozar, sempre as custas daquilo que Bastiat chamava de a grande mentira: o Estado, um ente coletivo, através do qual todos esperam viver às custas dos demais.
Assim, foram inseridos dezenas e dezenas de direitos sequer sonhados nos países mais ricos, como se o Brasil fosse um oasis maravilhoso de riqueza e produtividade (aliás, um conceito que não aparece na CF, ao lado de setenta e tantos direitos).
Os mais evidentes, saúde e educação, estão sempre garantidos gratuitamente pelo Estado: "A saúde (ou a educação) é um direito do cidadão e um dever do Estado...", e por aí vai.
Na ilusão de que tudo possa ser fornecido pelo Estado, a CF não assegurou que o mercado também pudesse fazê-lo. O que ocorreu, como sabem os economistas, foi um "overuse"  desses serviços, e assim a sociedade tem de pagar cada vez mais para que o Estado possa fornece-los. Como o Estado não prima pela eficiência, boa parte dos recursos acabam na própria burocracia, são desviados pelo sobre-faturamento ou simplesmente pela corrupção, ou simplemente não alcança a demanda potencial. Ocorrem então o não provimento de serviços essenciais à população, os atrasos, calotes, ou o pagamento insuficiente desses serviços, e a consequência, para os pobres, é racionamento, filas, delongas, não atendimento, etc. 
Na ilusão de que tudo isso pode e deve ser fornecido pelo Estado, o que vai ocorrer é uma extração fiscal cada vez mais rigorosa e crescente da sociedade, e uma perda paralela desses recursos em todos esses desvios apontados. 
Provavelmente, a sociedade brasileira estaria melhor servida com um provimento via mercado, deixando-se apenas para os mais pobres os serviços via Estado. 
Não parece que estejamos perto de chegar nesse tipo de solução.
Preparem-se, pois, para pagar mais e não usar serviços públicos nesses setores...
Paulo Roberto de Almeida 

Santas Casas asfixiadas

18 de fevereiro de 2013
EditoriO Estado de S.Paulo

A despeito do imenso problema social que causará e do caos que provocará no Sistema Único de Saúde (SUS), um eventual colapso das Santas Casas e dos hospitais filantrópicos decorrente de dificuldades financeiras crescentes não surpreenderá quem acompanha a situação da saúde pública no País. Trata-se de um problema antigo, de causas perfeitamente diagnosticadas, e que se agrava a cada dia, mas para o qual as autoridades responsáveis - em boa parte por comodismo - não deram e continuam a não dar a atenção que merece. O preço que o País terá de pagar, caso os problemas se agravem a ponto de a situação se tornar insustentável num futuro próximo, certamente será maior do que o custo de uma solução racional, que ainda é possível adotar.

A Constituição estabeleceu que a saúde é um direito fundamental do cidadão e, para garanti-lo, sem dispor de estrutura própria suficiente para isso, o Estado brasileiro estabeleceu o que deveria ser uma parceria com as instituições filantrópicas. Estas responderam bem à proposta de parceria e, por isso, sua presença nas operações do SUS é cada vez maior.
Em 2004, por exemplo, os hospitais públicos respondiam por 41,4% das internações pelo SUS, os hospitais privados sem fins lucrativos (Santas Casas e instituições filantrópicas), por 39,9% e os privados lucrativos, por 18,7%. Por causa da remuneração inadequada dos serviços, os hospitais particulares reduziram sua participação para 10,2% do total das internações em 2011, de acordo com dados do Ministério da Saúde utilizados no relatório da subcomissão especial da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados, que discutiu o problema. Em contrapartida, aumentou a participação dos hospitais públicos e dos privados não lucrativos, para, respectivamente, 45,0% e 44,8%.
Hoje, as Santas Casas e os hospitais filantrópicos têm a mesma importância dos hospitais públicos no atendimento aos pacientes do SUS. Os dados recentes mostram também o que poderia acontecer no sistema público de saúde caso as Santas Casas deixassem de operar por absoluta incapacidade financeira.
A crise nas finanças das Santas Casas é conhecida há vários anos, e, sem medidas adequadas por parte dos responsáveis pelos programas de saúde pública, só piora. Em 2005, a dívida dessas instituições era estimada em R$ 1,8 bilhão, em 2009 saltou para R$ 5,9 bilhões e, em 2011, alcançou R$ 11,2 bilhões, de acordo com o relatório da subcomissão formada na Câmara dos Deputados. Mantido o ritmo de crescimento anual desse período, de cerca de 35% ao ano em valores nominais, deve ter alcançado R$ 15 bilhões no fim do ano passado (os dados consolidados ainda não foram divulgados).
O simples exame dos custos dos serviços prestados pelas entidades filantrópicas ao SUS em 2011 e da receita com os serviços prestados não deixa dúvidas quanto à causa do crescimento da dívida. Em 2011, essas entidades gastaram R$ 14,7 bilhões com os serviços, mas sua remuneração, pelo SUS, ficou em R$ 9,6 bilhões. Isso quer dizer que o pagamento do SUS cobre apenas 65% dos gastos desses hospitais. Só em 2011 (não há dados para 2012), o déficit foi de R$ 5,1 bilhões. A defasagem é maior para procedimentos considerados de média complexidade.
Reportagem do jornal O Globo (10/2) mostra que, sem recursos financeiros, hospitais têm adiado cirurgias, enfrentam ameaças de greve, carecem de materiais e chegam a suspender suas operações.
Essenciais para o SUS, as Santas Casas são insubstituíveis em muitas comunidades. Do total de 2,1 mil estabelecimentos hospitalares sem fins lucrativos, 56% estão em cidades com até 30 mil habitantes e são o único hospital em quase mil cidades.
Evitar o agravamento de sua crise exige o reajuste imediato da tabela de pagamento do SUS para cerca de 100 procedimentos, mas, até agora, não há previsão do governo para a correção desses valores, reconheceu o secretário de Atenção à Saúde, Helvécio Magalhães. O governo abriu uma linha de crédito no BNDES para esses hospitais, mas, já muito endividados, eles temem contrair novas dívidas. Sua saúde financeira aproxima-se do ponto crítico.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Veja como torram o seu dinheiro, caro leitor; alias, desde o começo...

Não pense que as obras serão retomadas e terminadas, caro leitor; apenas lamente o dinheiro gasto inutilmente, especialmente se você for nordestino, ou sobretudo se você confiava em que o governo pode fazer coisas sensatas, com base em decisões insensatas...



Por Eduardo Bresciani 
Estado de S.Paulo, 4/12/2011

Entre Betânia e Custódia, obras estão paralisadas e placas de concreto começam a se soltar

Cenário de propaganda eleitoral da presidente Dilma Rousseff e responsável por parte de sua expressiva votação recebida no Nordeste, a transposição do Rio São Francisco foi abandonada por construtoras e o trabalho feito começa a se perder. O Estado percorreu alguns trechos da obra em Pernambuco na semana passada e encontrou estruturas de concreto estouradas e com rachaduras, vergalhões de aço abandonados e diversos trechos em que o concreto fica lado a lado com a terra seca do sertão nordestino.
O Ministério da Integração Nacional afirma que é de responsabilidade das empresas contratadas a conservação do que já foi feito e que caberá a elas refazer o que está se deteriorando. Informa ainda que vai promover novas licitações em 2012 para as chamadas obras complementares, trechos em que a pasta e as empreiteiras não conseguiram chegar a um acordo sobre preço. Segundo o ministério, as obras estão paralisadas em 6 dos 14 lotes e em um deles o serviço ainda será licitado.
Marcada por controvérsias, a obra da transposição começou a sair do papel em 2007 e, no ano seguinte, com os canteiros em pleno funcionamento, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua então ministra-chefe da Casa Civil e mãe do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) fizeram uma vistoria pela região para fazer propaganda da ação. Os dividendos eleitorais foram colhidos no ano passado por Dilma. Em Pernambuco, Estado onde começa o desvio das águas, ela obteve mais de 75% dos votos válidos no segundo turno da eleição. Nas cidades visitadas pelo Estado, onde as obras estão agora abandonadas, o desempenho foi ainda melhor. Em Floresta, a presidente obteve 86,3%; em Cabrobó e Custódia, 90,7%; e em Betânia, 95,4%.
Prometida para o final do governo Lula, a obra tem seu prazo de entrega sucessivamente adiado. A nova previsão é concluir os 220 quilômetros do eixo leste, de Floresta a Monteiro (PB), até o fim de 2014 e terminar no ano seguinte os 402 quilômetros do eixo norte, que sai de Cabrobó para levar água ao Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte.
A obra está atualmente orçada em R$ 6,8 bilhões, 36% a mais do que a projeção inicial. Segundo o ministério, foram empenhados R$ 3,8 bilhões para a obra e pagos R$ 2,7 bilhões às construtoras.
Abandono
Durante três dias, a reportagem percorreu cerca de 100 quilômetros da extensão dos canais da obra. O abandono foi a tônica da viagem, com canteiros completamente parados. As únicas exceções foram as partes da transposição sob responsabilidade do Exército.
Em um dos trechos visitados, na divisa das cidades pernambucanas de Betânia e Custódia, cerca de 500 metros de concreto estão totalmente quebrados, com pedaços se soltando do solo. Esse trecho terá de ser refeito para a água do São Francisco passar. O padre Sebastião Gonçalves, da diocese de Floresta, foi quem encontrou o trecho destruído durante vistoria frequente que faz pelas obras. “As empresas abandonaram as obras e já começou a se perder o trabalho feito. É um desperdício inexplicável.”
A parte que aparece com as maiores avarias está no lote 10 da obra, que teve as obras iniciadas pelas construtoras Emsa e Mendes Júnior.