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quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

O modelo companheiro de regulacao energetica e a revolucao em curso nos EUA e no mundo - Celso Ming

Revolução ignorada

08 de janeiro de 2014 | 2h 06
Celso Ming - O Estado de S.Paulo
Um dos maiores acontecimentos da economia global em 2013, com graves consequências para o Brasil e enorme impacto estratégico, foi praticamente ignorado pelo governo Dilma. Trata-se da revolução energética que, em apenas seis anos, deverá tornar os Estados Unidos não apenas autossuficientes em petróleo e gás, mas fortes exportadores em potencial.
O assunto não chega a ser novidade, mas é preocupante que não esteja sendo levado em conta pelo governo Dilma em suas formulações de política econômica. Quando se referiram à economia mundial, os dirigentes brasileiros têm olhos voltados para a crise europeia, para a persistência de altos riscos no mercado financeiro global e para os problemas que poderiam ser produzidos pelo desmonte da política monetária altamente expansionista dos Estados Unidos. Mas tendem a ver a revolução energética nos Estados Unidos somente como aposta de alguns, ainda sujeita a confirmações. Quando acordarem, pode ser tarde.
E, no entanto, como consta no relatório do Departamento de Energia dos Estados Unidos divulgado no dia 23 de dezembro, a produção de petróleo e gás subirá nada menos que 800 mil barris diários a cada ano até 2016, quando atingirá 9,6 bilhões de barris diários. Será, então, batido o recorde de 1970.
Há poucos anos, os Estados Unidos importavam 50% do petróleo que consumiam. Esse número já caiu para 37% e, em 2016, o país deverá trazer de fora apenas 25%. Em 2020, aponta a Agência Internacional de Energia (EIA, na sigla em inglês), os Estados Unidos serão autossuficientes.
A revolução energética está sendo obtida graças ao emprego de nova tecnologia de exploração das reservas de xisto, que são rochas fortemente impregnadas de petróleo e gás. Essa tecnologia consiste em um bombardeio a alta pressão das camadas de xisto por uma mistura de água, areia e produtos químicos, que liberta o óleo e o gás aprisionados na rocha.
Os impactos econômicos serão impressionantes. O relatório do Departamento de Energia dos Estados Unidos prevê que o preço médio do barril (159 litros) de petróleo, que esteve em US$ 112 em 2012, baixará para US$ 92 em 2017, queda de 17,9%.
Os baixos preços do gás, que começam a ser negociados a US$ 4 por milhão de BTU (ante os US$ 14 a US$ 16 por milhão de BTU vigentes aqui e na Europa), deverão atrair novos projetos de indústria, não apenas na petroquímica, mas também nos setores eletrointensivos, como química básica, cimento, vidro, cerâmica e metalurgia eletrolítica.
Do ponto de vista da indústria brasileira, que já está alijada dos grandes centros de suprimento global, se for confirmada, essa revolução não implica apenas perda de competitividade em relação à indústria americana. Implica, também, risco de migração da indústria brasileira para lá ou desistência de projetos no Brasil.
Do ponto de vista estratégico, a independência energética dos Estados Unidos forçará mudanças importantes na política voltada para o Oriente Médio, grande centro exportador de petróleo. O atual equilíbrio de forças na região parece ameaçado. O impacto sobre a Venezuela, maior exportador da América Latina, também poderá ser dramático. Hoje, a economia está altamente dependente do faturamento com petróleo, cujos preços cairão em três anos.
O governo do México, outro grande exportador, entendeu o que está em jogo e tratou de criar as bases de sua própria revolução do petróleo. Acabou com o monopólio estatal exercido pela Pemex e também vai tratando de explorar suas reservas de xisto.
Enquanto isso, o governo brasileiro segue excessivamente confiante com as descobertas de petróleo no pré-sal e seus dirigentes preferem desconversar a respeito das consequências sobre a economia brasileira. Alegam que os problemas ambientais causados pela tecnologia do craqueamento hidráulico do xisto acabarão por desencorajá-la. Provavelmente não serão, porque a tecnologia do craqueamento hidráulico está sendo aperfeiçoada. Pode ser mais uma grave omissão do governo Dilma.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Gas, uma energia revolucionaria, mas nao exatamente para o Brasil - Adriano Pires, Marcio Balthazar

O preço do gás natural no Brasil


O Estado de S.Paulo, 17 de julho de 2013

ADRIANO PIRES E MARCIO BALTHAZAR *
Nos últimos dez anos, o mercado mundial de gás natural passou por uma série de mudanças, como o desenvolvimento da produção do gás não convencional nos EUA e o aumento do comércio internacional de gás natural liquefeito. Essas mudanças transformaram a dinâmica mundial do mercado de gás natural. Uma revolução impensável há 20 anos que viabilizou a oferta de gás a partir de formações de shale no miolo do sistema de transporte e do denso mercado de gás natural americano e fez com que os preços do gás despencassem de cerca de US$ 11/MMBTU, em meados de 2008, para algo em torno de US$ 4/MMBTU, em 2013, e abandonassem qualquer correlação com os preços do petróleo.

O alerta geral no Brasil veio na forma do questionamento do nível de preços do gás natural. E imediatamente se assumiu, convenientemente, um cenário de abundância do produto. Mas será de fato abundante? Talvez. Aos preços nos níveis do mercado americano atuais, muito improvável.

Há de observar que, apesar de reunir condições únicas no mundo em termos de recursos de produção e regulatórios para realização do fracking, mesmo nos EUA os produtores de gás natural não associado a partir de shale lidam com baixas remunerações aos investimentos. Assim, se, no início, a questão ambiental dominava as discussões sobre o uso do fracking na produção, atualmente está mais centrada nas possibilidades de viabilização econômica desse tipo de empreendimento, nos EUA e em outras partes do mundo.

No Brasil, o preço do gás se mantém elevado e se tornou um ingrediente a mais a limitar a competitividade da indústria. Segmentos industriais que dependem do gás natural lidam com dificuldade para manter suas atividades e reclamam políticas específicas e preços diferenciados. Outros segmentos, que poderiam usar o gás natural, fazem a opção por fontes alternativas com relação de preços mais favorável.

Duas questões são colocadas: o preço do gás natural no Brasil está caro? Ou seria a instabilidade na relação de preços de combustíveis a causa prima de quebra de expectativas entre consumidores industriais?

É notável constatar que, ao longo do tempo, preços de derivados e gás natural deixaram de guardar uma referência estável de substituição e eficiência energética para flutuar à conveniência da política econômica de ocasião e ceder às pressões de lobbies de categorias industriais em defesa de seu segmento.

Já no que toca à política de preços para o gás natural, a Petrobrás manteve para o gás boliviano a metodologia de reajuste atrelada a uma cesta de óleos e ao câmbio, uma postura que amplia a distorção no mercado brasileiro de gás no que se refere à política de preços em relação aos demais combustíveis.

Adicionalmente, ainda há que considerar a distorção estabelecida pela coexistência de formas distintas de precificação: uma para o gás de origem nacional e outra para o gás boliviano. Quase 15 anos depois do início de operações do gasoduto Bolívia-Brasil e com a capacidade plenamente ocupada, não haveria atualmente uma razão objetiva para uma distinção de preços entre o gás natural de origem doméstica e o importado. Seria o equivalente a definir duas classes de consumidor para o mesmo produto. Os consumidores da Região Sul e os de São Paulo são penalizados duplamente pela imprevisibilidade cambial aplicada ao gás boliviano e pela diferença absoluta em relação aos preços do produto nacional. E São Paulo é o maior Estado consumidor, representando 29% do mercado.

Atualmente, o mercado de gás natural no Brasil, não bastassem as questões apontadas referentes à competição e o desarranjo de preços relativos citados acima, se encontra imerso em suas próprias idiossincrasias, marcado pela imaturidade regulatória que impõe barreiras de acesso e inibe a expansão da infraestrutura e do mercado. É hora de parar e repensar, em especial, uma nova política de preços para o gás natural. 
* ADRIANO PIRES É DIRETOR DO CBIE.
* MARCIO BALTHAZAR É SÓCIO DA NATGAS ECONOMICS.