Mini-reflexão sobre o problema estrutural brasileiro
Paulo Roberto de Almeida
O Brasil se encontra atualmente (mas desde vários anos) ante impasses muito graves, em todos os setores.
O governo, hoje, é exercido por uma facção de novos bárbaros com o apoio da milicada. Desculpem os orgulhosos representantes das FFAA, mas eu os considero hoje apenas isto: uma milicada!
Alguns acham que a chave do problema brasileiro estaria em rever o papel das FFAA.
Esqueçam, pois isso não vai acontecer. Melhor seria se concentrar em diminuir as enormes deformações do sistema político e fazer uma reforma tributária racional.
Mas infelizmente nada disso vai ocorrer tampouco. É evidente! Não preciso dar exemplos: fazem mais de 20 anos que se discute reforma tributária, em reduzir o “custo Brasil” (que é, na verdade, o custo do Estado brasileiro), e nada disso se faz, pois que a sociedade, as elites governantes, dirigentes e dominantes se revelam incapazes de se entenderem entre si. Elas apenas partilham um consenso implícito, até inconsciente: vamos deixar como está, pois se mexer estraga.
Ou seja, todos os beneficiários do apodrecido sistema atual pretendem continuar a viver à larga, à custa dos empresários e trabalhadores do setor privado.
Alguma conclusão do que acabo de dizer?
Apenas uma: continuaremos afundando, mas lentamente. Apenas isto.
É disso que as nossas elites são capazes, inclusive o PT e a maior parte das esquerdas.
Direita? Não existe: apenas reacionários, ignorantes e saudosistas do regime militar, sobretudo grande parte da milicada.
Liberais? Eles são um punhado muito confuso de pessoas que não tem o menor impacto sobre a sociedade.
Quando falo de elites, não me refiro, portanto, apenas ao Grande Capital, mas ao conjunto das forças políticas, das centrais sindicais ao mais humilde vereador do interior, passando pelas corporações de Estado e pelas forças de “segurança” (não são de defesa, pois o Brasil não tem ameaças externas, só internas).
Esta é a realidade: todos os inimigos de uma sociedade sadia estão aqui dentro, somos nós mesmos, inclusive os altos magistrados que pontificam na defesa da “democracia” e que defendem em primeiro lugar seus muitos privilégios, típicos da aristocracia de Antigo Regime (aliás, até melhores).
De uma forma geral, a hipocrisia corre solta, da extrema-direita à extrema-esquerda: todos conjugados em manter a situação atual, mesmo quando dizem que pretendem mudar, para melhorar a situação do povo humilde. Mentira!
O que pretendem é chegar ao poder!
Resumindo: nosso problema estrutural é que não chegamos ainda a um mínimo entendimento sobre um diagnóstico adequado sobre as origens de nossa condição pré-falimentar. Mas mesmo que chegássemos, não teríamos forças suficientes para alterar a situação, pois muitos interesses estão em jogo, e a força conjugada, ainda que não coordenada, dos setores conservadores impediria que as reformas se façam.
Esse é o impasse atual da nação? Sim!
Mas não há nada de surpreendente nisso, ou de historicamente inédito: outras nações, relativamente recentes, ou mesmo antigas civilizações, já passaram por isso. Só me permito relembrar dois casos, altamente emblemáticos no itinerário dos declínios estruturais: o antigo Império do Meio e a nossa vizinha Argentina.
Agora parece que chegou a nossa vez.
Mas o país não vai acabar: apenas continuar medíocre por mais algum tempo. Quanto tempo? Difícil dizer: enquanto não tivermos consciência de nossos erros, adquirir conhecimento para transformar nossos hábitos declinistas, ou não ocorrer algum desastre maior (quando tudo se precipita, do pior e do possível).
A China mergulhou numa decadência de mais de um século e hoje renasce vigorosa, embora confirmando os seus velhos traços básicos, nunca desfeitos, de “despotismo imperial”.
A Rússia mergulhou, em 1917, num vórtice de violência inominável ainda pior que no antigo regime dos czares, para retornar imperfeitamente para uma democracia de fachada que é apenas um neoczarismo.
A Argentina continua sequestrada e dominada por dois cadáveres insepultos.
E o Brasil?
Um caso historicamente único que nunca eliminou na Independência o peso das deformações coloniais (sobretudo o tráfico e a não-educação), que nunca eliminou no Império (nem na Abolição ou na República) o peso da escravidão, do racismo e da discriminação, que nunca eliminou na industrialização o peso do estatismo, do protecionismo e do dirigismo, que nunca eliminou na redemocratização o autoritarismo inerente à corporação militar, e que continua a não resolver, ainda hoje, os problemas da não-educação e o das desigualdades sociais, estas derivadas daquela (em grande medida, mas não exclusivamente).
Vamos melhorar? Certamente, mas não esperem para já ou no horizonte previsível.
Tudo tem um tempo, tudo tem um preço.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 10/07/2021