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quinta-feira, 4 de novembro de 2021

Mini-reflexão sobre nossa acomodação às misérias do cotidiano - Paulo Roberto de Almeida

 Mini-reflexão sobre nossa acomodação às misérias do cotidiano

Paulo Roberto de Almeida

Nosso sofrimento ainda não terminou: politicos oportunistas ainda veem em Bolsonaro uma chance de continuarem se locupletando. Estamos indo diretamente a uma longa estagflação. 

Também surpreende a resiliência do psicopata perverso, o que depende de eleitores e do Grande Capital. 

A adesão ainda significativa de tantos brasileiros a um mentiroso, a um crápula, a essa escória de gente, a esse genocida confirmado, é um desafio a todos os cientistas políticos; o fenômeno tem mais a ver com traços psicológicos desse povo que ainda idolatra o verme mesmo tendo todas as evidências de que ele está afundando o Brasil e piorando a vida de todos e cada um. Difícil explicar isso.

Políticos e Grande Capital (não todo ele) ainda se entende, pois esperam continuar lucrando em cima do parvo, ainda assim é triste constatar que esses poderosos não têm a mínima consideração pelo futuro da nação e pela situação pré-falimentar da economia do país.

O que leva um povo a estrangular assim suas chances de prosperidade e de bem-estar, ou melhor, como explicar a decisão dos mais privilegiados de continuar a desprezar de maneira tão vil o destino de milhões de brasileiros pobres?

Não sabemos exatamente, mas a América Latina não é exatamente um exemplo de postura racional de aderência a um projeto de desenvolvimento inclusivo e socialmente responsável: sempre fomos desiguais e tolerantes com a opressão, a miséria e a desigualdade. 

Entendo que os principais fatores dessa condição — criada internamente, não imposta de fora — sejam a não educação da massa da população, a corrupção política e a arrogância soberba, mesquinha e egoista das elites dominantes e dirigentes, cujo arbítrio e poder não encontram limites. 

Em outros termos, uma mudança estrutural e sustentada não é provável no curto prazo. Se considerarmos que mais da metade da humanidade ainda vive em condições precárias de equilíbrio econômico e de bem-estar social, submetida a regimes corruptos e pouco democráticos, podemos concluir que o Brasil vive nessa média medíocre de metade da humanidade. 

Em conclusão: não temos capacidade de sermos melhores do que o nosso meio, ou de superar rapidamente o legado de atraso e de ignorância que recebemos de nossos antepassados nos últimos 200 ou 500 anos de formação da nação (sacrificando, diga-se de passagem, os povos originários).

Espero ter interpretado razoavelmente bem, e de maneira objetiva, as razões de nossa condição deplorável. Privilegiado como sou, agora, constrange-me ainda assim ver tantos brasileiros, milhões deles, entregues a uma situação de abandono, parte responsabilidade pessoal, mas a maior parte devido à incúria das elites do poder. Ineptos e desprezíveis, é tudo o que me resta dizer.

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 4/11/2021

terça-feira, 12 de outubro de 2021

Sobre os atuais impasses do Brasil - Paulo Roberto de Almeida

 Sobre os atuais impasses do Brasil 

Paulo Roberto de Almeida

Não me surpreende a existência de loucos que se distinguem na paisagem, e que por isso mesmo atraem os demais (parece que são muitos) desequilibrados que andavam dispersos na sociedade. Essa combinação só aparece nas sociedades em crise, quando a classe média— pois é ela quem determina tudo — resolve se agarrar a alguma solução fora dos padrões para ver se isso estanca o mal desatado pela crise. 

O que me surpreende é a existência de tantas pessoas dotadas de educação, de informação e até de padrões razoáveis de vida que se agarram nessa pretensa “boia salvadora” para salvar a si e ao país de ameaças indefinidas que foram exploradas pelo louco oportunista que subiu na onda da revolta contra a situação.

A existência de tantos bolsonaristas — ou seja, pessoas que incensam, seguem e defendem um psicopata mentiroso, medíocre e perverso — é um fenômeno surpreendente para quem achava, como eu, que o Brasil já tinha chegado a um grau razoável de desenvolvimento para não se enredar novamente nessas fraudes políticas que se abatem sobre o país a intervalos regulares.

E parece que o ciclo não acabou: a sociedade está novamente disposta a eleger um demagogo mentiroso que sempre esteve mais para chefe de gangue do que para estadista reformador. É o que deduzo das pesquisas eleitorais.

Será que tenho de chegar à conclusão de que a deseducação estrutural, a ignorância pura e simples e a total falta de senso — o que junta no mesmo saco bolsonaristas e lulistas, explorados pelos oportunistas de plantão—  estão muito mais presentes na sociedade do que se poderia imaginar?

Olhando para cima, é exatamente o que se assiste na maior potência econômica do planeta, praticamente paralisada por antivacinais e trumpistas true believers. Como uma sociedade supostamente desenvolvida pode emburrecer de repente?

No nosso caso, o fenômeno pode também ser atribuído à existência de elites predatórias que se apoiam em mavericks eleitorais para extrairem ainda mais recurso coletivos. Foi exatamente o que sucedeu com a emergência de lulistas e bolsonaristas, sendo que o segundo “salvador” é, na verdade, um destruidor de instituições, como de quaisquer outros padrões civilizatórios. 

Lula pertence à categoria dos populistas tradicionais da AL, que mantêm seus países num atraso que eles não merecem. Já Bolsonaro pertence ao pequeno grupo de psicopatas capazes de destruir um país na perseguição de miragens impossíveis, como foi o caso de um Hitler. Mas o Brasil não é obviamente uma potência econômica para destruir junto outros países: o mal fica contido nas fronteiras nacionais.

Lula é um Perón de botequim. Bolsonaro é apenas uma contrafação medíocre e estúpida de um Hitler de circo. Pena que tantos militares e capitalistas o apoiaram, por puro oportunismo, como também o fazem os politicos profissionais. Essas três categorias de atores políticos são os verdadeiros responsáveis pela desgraça do Brasil atual, e são eles que podem trazer de volta o demagogo mafioso que promete salvar o Brasil da atual desgraça. 

Estou quase aderindo à falsa teoria de Marcel Eliade sobre o “eterno retorno”. Ela é manifestamente equivocada, mas cabe recordar que todas as pessoas nascem exatamente com a mesma dotação primária, ou seja: 0 km em matéria de conhecimento acumulado, tudo precisa ser aprendido a partir de zero. O que significa que todos os pré-conceitos sociais, equívocos políticos e a ignorância consolidada numa sociedade deseducada como a brasileira vão florescer novamente em momentos de crise como os que já vivemos de forma recorrente desde nossa formação como Estado independente.

De fato, não se pode pedir que as pessoas venham ao mundo educadas, inteligentes e sensatas. Elas são o que o seu background familiar e social-ambiental permitiu que elas fossem, e o nosso manifestamente não é conducente a padrões avançados de desenvolvimento econômico e social, a níveis razoáveis de bem-estar material para aqueles membros da sociedade mais desprovidos pela sorte. 

O fato é que o Brasil é, pelo estoque já razoável de acúmulo de riqueza material obtido ao longo do século XX, um país desproporcionalmente dotado de muitos pobres, milhões deles, e de um contingente insuportavelmente alto de miseráveis, de destituídos pela “sorte”. Esse imenso “exército de miseráveis”, de andrajosos e de ignorantes eu atribuo ao egoísmo e à mediocridade das elites, todas elas, que primeiro preservaram o tráfico e o regime escravo, depois a não educação das massas e a não reforma agrária, em seguida o patrimonialismo e a corrupção política e finalmente a estupidez de acreditarem que o monstro metafísico do Estado seria capaz de, no lugar de uma sociedade livre, resolver os problemas da miséria e da desigualdade. 

Atenção: o Brasil não é pobre porque é desigual; ele é desigual porque é pobre, ou porque tem muitos pobres, um excesso de miseráveis. O problema principal do Brasil não é a desigualdade, é a pobreza. E esta vem da não educação.

Este é o crime, imperdoável, das nossas elites, e estas não são apenas os “ricos”. Sindicatos, magistrados, políticos profissionais, até acadêmicos, entram nessa conta. Os pobres não têm culpa pela nossa pobreza material. Esta é produzida pela indigência mental de nossas elites. A miséria é sobretudo intelectual, ou, como gostava de dizer Millor Fernandes, ela é intelequitual.

Que os atuais membros das elites mais dotadas de poder — capitalistas, militares e políticos— sejam incapazes de se colocar de acordo sobre um programa imediato de superação de nossos atuais impasses e, depois, sobre um programa razoável de desenvolvimento econômico e social, é um testemunho flagrante dessa indigência mental e da mediocridade intelequitual que as caracterizam. 

Não vejo nenhum impulso vigoroso no horizonte de possibilidades imediatas, apenas mais estagnação e mediocridade, ou seja, perspectivas exasperantemente lentas de melhorias necessárias. Ricos e classes médias vão continuar se safando da maneira habitual: os primeiros exportando seus capitais e seus filhos para paragens mais amenas e as segundas dando um duro danado para não refluirem para a pobreza das classes subalternas.

Quanto aos pobres e miseráveis, estes continuaram a soçobrar, a perecer nos escombros produzidos pelo egoísmo e mediocridade daquelas elites.

Sorry pelo excesso de realismo.

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 12/10/2021

sábado, 10 de julho de 2021

Mini-reflexão sobre o problema estrutural brasileiro - Paulo Roberto de Almeida

 Mini-reflexão sobre o problema estrutural brasileiro

Paulo Roberto de Almeida


O Brasil se encontra atualmente (mas desde vários anos) ante impasses muito graves, em todos os setores.

O governo, hoje, é exercido por uma facção de novos bárbaros com o apoio da milicada. Desculpem os orgulhosos representantes das FFAA, mas eu os considero hoje apenas isto: uma milicada!

Alguns acham que a chave do problema brasileiro estaria em rever o papel das FFAA.

Esqueçam, pois isso não vai acontecer. Melhor seria se concentrar em diminuir as enormes deformações do sistema político e fazer uma reforma tributária racional. 

Mas infelizmente nada disso vai ocorrer tampouco. É evidente! Não preciso dar exemplos: fazem mais de 20 anos que se discute reforma tributária, em reduzir o “custo Brasil” (que é, na verdade, o custo do Estado brasileiro), e nada disso se faz, pois que a sociedade, as elites governantes, dirigentes e dominantes se revelam incapazes de se entenderem entre si. Elas apenas partilham um consenso implícito, até inconsciente: vamos deixar como está, pois se mexer estraga.

Ou seja, todos os beneficiários do apodrecido sistema atual pretendem continuar a viver à larga, à custa dos empresários e trabalhadores do setor privado.

Alguma conclusão do que acabo de dizer?

Apenas uma: continuaremos afundando, mas lentamente. Apenas isto.

É disso que as nossas elites são capazes, inclusive o PT e a maior parte das esquerdas. 

Direita? Não existe: apenas reacionários, ignorantes e saudosistas do regime militar, sobretudo grande parte da milicada.

Liberais? Eles são um punhado muito confuso de pessoas que não tem o menor impacto sobre a sociedade.

Quando falo de elites, não me refiro, portanto, apenas ao Grande Capital, mas ao conjunto das forças políticas, das centrais sindicais ao mais humilde vereador do interior, passando pelas corporações de Estado e pelas forças de “segurança” (não são de defesa, pois o Brasil não tem ameaças externas, só internas).

Esta é a realidade: todos os inimigos de uma sociedade sadia estão aqui dentro, somos nós mesmos, inclusive os altos magistrados que pontificam na defesa da “democracia” e que defendem em primeiro lugar seus muitos privilégios, típicos da aristocracia de Antigo Regime (aliás, até melhores).

De uma forma geral, a hipocrisia corre solta, da extrema-direita à extrema-esquerda: todos conjugados em manter a situação atual, mesmo quando dizem que pretendem mudar, para melhorar a situação do povo humilde. Mentira!

O que pretendem é chegar ao poder!


Resumindo: nosso problema estrutural é que não chegamos ainda a um mínimo entendimento sobre um diagnóstico adequado sobre as origens de nossa condição pré-falimentar. Mas mesmo que chegássemos, não teríamos forças suficientes para alterar a situação, pois muitos interesses estão em jogo, e a força conjugada, ainda que não coordenada, dos setores conservadores impediria que as reformas se façam. 

Esse é o impasse atual da nação? Sim!

Mas não há nada de surpreendente nisso, ou de historicamente inédito: outras nações, relativamente recentes, ou mesmo antigas civilizações, já passaram por isso. Só me permito relembrar dois casos, altamente emblemáticos no itinerário dos declínios estruturais: o antigo Império do Meio e a nossa vizinha Argentina.

Agora parece que chegou a nossa vez.

Mas o país não vai acabar: apenas continuar medíocre por mais algum tempo. Quanto tempo? Difícil dizer: enquanto não tivermos consciência de nossos erros, adquirir conhecimento para transformar nossos hábitos declinistas, ou não ocorrer algum desastre maior (quando tudo se precipita, do pior e do possível).

A China mergulhou numa decadência de mais de um século e hoje renasce vigorosa, embora confirmando os seus velhos traços básicos, nunca desfeitos, de “despotismo imperial”. 

A Rússia mergulhou, em 1917, num vórtice de violência inominável ainda pior que no antigo regime dos czares, para retornar imperfeitamente para uma democracia de fachada que é apenas um neoczarismo.

A Argentina continua sequestrada e dominada por dois cadáveres insepultos.

E o Brasil? 

Um caso historicamente único que nunca eliminou na Independência o peso das deformações coloniais (sobretudo o tráfico e a não-educação), que nunca eliminou no Império (nem na Abolição ou na República) o peso da escravidão, do racismo e da discriminação, que nunca eliminou na industrialização o peso do estatismo, do protecionismo e do dirigismo, que nunca eliminou na redemocratização o autoritarismo inerente à corporação militar, e que continua a não resolver, ainda hoje, os problemas da não-educação e o das desigualdades sociais, estas derivadas daquela (em grande medida, mas não exclusivamente).

Vamos melhorar? Certamente, mas não esperem para já ou no horizonte previsível.

Tudo tem um tempo, tudo tem um preço.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 10/07/2021