O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sexta-feira, 11 de outubro de 2019

Ingresso frustrado do Brasil na OCDE: isso pouco importa - Paulo Roberto de Almeida

Ingresso frustrado do Brasil na OCDE
(pelo menos por enquanto).
Paulo Roberto de Almeida

Sabem o que eu acho da matéria abaixo transcrita?

Nada! Ou melhor: não dou a menor importância.
Apoio dos EUA, dos países europeus, ingresso na OCDE, selo de qualidade internacional, tudo isso não tem a menor importância, e talvez seja até melhor.
Não entrando agora, e talvez nem mesmo mais adiante, vai nos poupar alguns milhões de dólares – custos da adesão e das anualidades, que não são baratas –, que podem ser melhor empregados em educação das crianças, aqui no Brasil, para ver se melhoramos nos indicadores do PISA, que por enquanto são uma vergonha para o Brasil.
O Brasil NÃO PRECISA entrar para a OCDE, para FAZER TUDO o que teríamos de fazer entrando e mesmo um pouco mais.
Eu proporia que o Brasil não apenas siga todos os requerimentos, exigências, adesão a normas e protocolos, tudo o que a OCDE nos pediria, e que ele vá mesmo um pouco mais além.
Aproveitar esse período de espera – e talvez até mude de ideia no meio do caminho – para AVANÇAR todas as reformas que está aguardando décadas para fazer, sem que ninguém lhe cobre nada por isso, et pour cause.
Eu acho que deveríamos ir MUITO ALÉM do que está na pauta da OCDE e se tornar um país avançado, com liberdade ecobömica, com liberalização comercial, adepto das normas mais elevadas de qualidade ambiental, social, laboral, respeitador dos direitos humanos, das liberdades políticas e democráticas, com PLENA INSERÇÃO na economia mundial.
Esse é o meu programa: reformas da OCDE SEM OCDE, por nossa própria conta e risco.
Eu, aliás, tinha proposto isso mesmo, em minha tese do Curso de Altos Estudos do Instituto Rio Branco, em 1996, que se chamava justamente "Brasil-OCDE: uma interação necessária" (disponível como abaixo indico). Não propunha a adesão do Brasil, mas propunha que o Brasil seguisse todos os padrões de alta qualidade em suas políticas macroeconômicas e setoriais, sem precisar necessariamente se reportar à OCDE.
Minha tese está disponível no seguinte link:

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 11 de outubro de 2019

EUA recusam apoio ao Brasil no ingresso à OCDE; governo admite frustração
O Globo, 10/10/2019

Apesar de promessas públicas do presidente Donald Trump, os Estados Unidos não formalizaram apoio ao ingresso do Brasil na Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O país foi preterido por Argentina e Romênia, que ganharam endosso do governo americano.
Repercussão: a negativa foi recebida com frustração pelo governo brasileiro. Publicamente, no entanto, autoridades dizem que o apoio americano está mantido, mas Argentina e Romênia têm prioridade. O assessor internacional do presidente Jair Bolsonaro, Filipe Martins, disse que há “histeria” na repercussão sobre a recusa. A embaixada dos EUA em Brasília afirmou, em texto, que o país continua a favor da proposta brasileira.
Por que isso importa: o apoio formal à entrada na OCDE era uma das contrapartidas acertada no encontro entre Trump e Bolsonaro ao pacote de concessões feitos pelo Brasil, como o fim da exigência de visto para turistas americanos, o acesso dos EUA à base de Alcântara (MA) e a decisão brasileira de abrir mão de status especial na Organização Mundial do Comércio.
Opinião: apesar de o governo minimizar, a decisão dos EUA é uma ampla derrota para a administração Jair Bolsonaro, afirma Míriam Leitão.

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Essa Gente: o novo romance de Chico Buarque (Companhia das Letras)

Um escritor decadente passa por um deserto criativo e emocional enquanto o Rio de Janeiro colapsa ao seu redor. Em seu sexto romance, Chico Buarque constrói uma engenhosa trama em cujas entrelinhas se revelam as contradições do Brasil de agora.
Nas livrarias a partir de 14 de novembro.
Há pontos de contato entre Chico Buarque e o protagonista de Essa gente. Além de ser escritor, Manuel Duarte tem esse sobrenome de perfil vocálico idêntico e gosta de bater perna atrás de inspiração nos arredores do Leblon, onde voltou a morar após o fim de seu último casamento. Embora seja quase inevitável buscar alusões autobiográficas no novo romance de Chico — o primeiro após a consagração do prêmio Camões —, o leitor não demorará a descobrir que tal linha de pensamento conduz a um beco sem saída. Na melhor das hipóteses, lhe dá a posse de uma chave que pode abrir uma ou outra porta, mas não todas. Essa não será a única pista falsa antes do ponto-final.
Essa gente é, entre os romances de Chico, o mais áspero e possivelmente o mais enigmático. A história contada em forma de pequenos capítulos de diário, quase todos datados de um passado tão recente que se pode chamar de atualidade, é mais um de seus quebra-cabeças narrativos com fumaças de literatura policial. No entanto, a reflexão sobre a linguagem que é uma dimensão estruturante das ficções buarquianas se ancora desta vez no estilo mais imediato de todos: o do apontamento rápido, feito para auxiliar a memória do próprio apontador no futuro, quando houver distância e lucidez para transformar o tumulto do presente numa história redonda. Sim, estamos no nebuloso país do agora. A parte da brincadeira que cabe ao leitor é mais decisiva do que nunca.
Autor de diversos livros, entre eles um best-seller já entrado em anos chamado O Eunuco do Paço Real, Duarte é um escritor decadente às voltas com uma pindaíba total, tanto financeira quanto afetiva. Tem um filho pré-adolescente com quem é incapaz de trocar uma única palavra. Está sempre em busca de um modo de descolar dinheiro — seja arrancando mais um adiantamento de seu editor paulista, seja apelando à generosidade arisca de um amigo bem-sucedido. Com uma mistura de hiperatividade e inação, ricocheteia entre suas duas ex-mulheres, uma tradutora intelectual e uma decoradora perua, e um número não especificado de putas. Enquanto isso, à sua volta, o Rio de Janeiro sangra e estrebucha sob o flagelo de feridas sociais finalmente supuradas, exibidas por muitos com uma espécie doentia de orgulho.
O distanciamento emocional vagamente camusiano com que Duarte fala dessas ruínas, tanto a pessoal quanto a coletiva, eximindo-se de juízos históricos ou mesmo de indignação, dá ao livro um tom de farsa — não ligeira mas grave, encharcada de humor negro. Logo de saída, a comédia sombria se escancara na subtrama dos castrati: um pastor neopentecostal e um maestro italiano estão castrando jovens pobres dos morros cariocas, com a anuência de suas famílias, a fim de abastecer o mercado do canto lírico internacional.
Será que estamos diante de uma alegoria poderosa da emasculação de um povo? Pode ser, mas talvez isso só exista na ficção que Duarte tenta escrever, alegoria de alegoria, retomando um tema presente em O Eunuco do Paço Real. Essa e outras fronteiras entre vida, imaginação, sonho e delírio vão sendo borradas pelo autor — e aqui falamos de Chico Buarque — com um sorriso que quase se deixa entrever nas páginas.
A montagem do quebra-cabeça se complica mais um pouco quando outros narradores se apresentam, das ex-mulheres de Duarte a uma vizinha enxerida que lhe é uma completa estranha, sem falar de uma voz que narra em terceira pessoa. Vai ficando claro que o “diário” é um estratagema literário de Duarte, o próprio livro que ele tenta escrever, embora também essa chave encontre seu limite quando, nas últimas páginas, o formato se prolonga além de toda verossimilhança para dar o toque final numa charada que o autor capricha em deixar sem solução. Uma informação jogada então com sugestiva ausência de ênfase, a de que o computador do protagonista estava vazio de textos, chega a acenar com a não existência do próprio livro que se acabou de ler.
Romance urgente, colado corajosamente na opacidade do agora, Essa gente é, numa primeira leitura, uma comédia de costumes tão divertida quanto cruel. É também um engenho narrativo feito para empurrar até o futuro possível — algum momento após o fim da leitura — o caimento da ficha derradeira: a compreensão de que, enquanto Duarte nos conduzia pelas tortuosas vielas literárias de sua história mundana, alegórica, metalinguística, o mais importante ocorria ao seu redor. O foco se desloca então da “literatura” para a paisagem, a chapa quente carioca compartilhada pela classe média alta do Leblon e pela mistura de classe média baixa, pobreza e miséria da vizinha favela do Vidigal. Terminada a leitura, o livro nos intima a virá-lo do avesso, transformando fundo em forma e desviando os olhos da história para a História.
Nessa nova perspectiva, os personagens principais se tornam com clareza dolorosa a violência letal da polícia contra “essa gente”, a humilhação dos porteiros, o espancamento gratuito do mendigo pelo sócio do Country Club, o bullying sofrido na escola pelo filho de esquerdistas, o alagamento apocalíptico das ruas em dias de chuva, as pedras que ameaçam deletar o morro, a falência material e moral de uma cidade que já foi símbolo de uma nação — talvez ainda seja. Que a única redenção possível venha do olhar de uma ruiva gringa apaixonada pela fantasia do Orfeu do Carnaval é parte do humor dilacerante da primeira obra literária de vulto a encarar o tema do Brasil bolsonarista. Pensando bem, essa gente somos todos nós.
 
Sérgio Rodrigues
Ouça um trecho do livro, com narração de Marília Garcia
SOBRE O AUTOR
Francisco Buarque de Hollandanasceu no Rio de Janeiro, em 1944. Compositor, cantor e ficcionista, publicou, além das peças Roda viva(1968), Calabar, escrita em parceria com Ruy Guerra (1973), Gota d’água, com Paulo Pontes (1975), e Ópera do malandro (1979), a novela Fazenda modelo (1974) e os romances Estorvo (1991), Benjamim (1995), Budapeste (2003), Leite derramado (2009) e O irmão alemão (2014).
OBRAS DE CHICO BUARQUE PUBLICADAS PELA COMPANHIA DAS LETRAS

Churchill & Orwell: unidos da defesa da liberdade

Churchill & Orwell


Zahar Editora

A fascinante história de dois homens com posições políticas diferentes, aliados pelo mesmo princípio: a defesa da liberdade individual

Figuras essenciais na luta contra as ameaças do autoritarismo de esquerda e de direita em um momento crítico do século XX, Churchill e Orwell surgem aqui como fonte de inspiração e exemplo para os dias de hoje. Filho de aristocratas, Winston Churchill (1874-1965) era um liberal conservador alinhado ao governo colonialista britânico. George Orwell (1903-1950), que vinha da classe média baixa, era militante socialista e anti-imperialista. 
Escrita pelo vencedor do Prêmio Pulitzer Thomas E. Ricks, essa atualíssima biografia dupla se concentra no período crucial da vida de Churchill e de Orwell: os anos 1930 e 1940, da ascensão dos nazistas até o rescaldo da Segunda Guerra Mundial. Hoje, impressiona testemunhar quão solitária era a posição de Churchill e de Orwell num momento em que a Europa parecia destinada à ditadura, fosse nazifascista ou comunista.
Apresentados como um par complementar, o político marginalizado em busca de redenção e o grande escritor ainda em formação trabalharam pelo mesmo objetivo, embora nunca tenham se encontrado.

"Leitura agradável e compulsiva, Churchill & Orwell impressiona pelo compromisso feroz que ambos tinham com o pensamento crítico." The New York Times Book Review
"Os dois nunca se encontraram, mas suas vidas e suas visões sobre como deveria funcionar a sociedade, noções de liberdade individual e limitações da política convergiam - pensamentos extraordinariamente harmoniosos em lugares diferentes. Realmente muito impressionante."John Le Carré

Relações internacionais do Brasil na era militar - Paulo Roberto de Almeida

Meu texto publicado mais recente: 



1322. “As relações internacionais do Brasil na era militar (1964-1985)”, In: Jorge Ferreira e Lucilia de Almeida Neves Delgado (orgs.), O Brasil Republicano 4: o tempo do regime autoritário; ditadura militar e redemocratização; Quarta República (1964-1985). (Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 2019, pp. 287-312; ISBN: 978-85-200-1360-1). Relação de Originais n. 3078.

Da corrupção como um estilo de vida - Paulo Roberto de Almeida

As pessoas em geral acham que a corrupção política sempre existiu. Aceitam isso como uma fatalidade: “Ah, todos fazem...”. Correto. Mas elas — sobretudo simpáticas ao PT — se recusam a admitir que, sob essa organização criminosa travestida de partido político, chefiada por um mafioso, a corrupção mudou de natureza, passando do modo artesanal de produção da corrupção, que é o modo normal dos políticos, para o modo industrial de ampliação da corrupção, que se tornou sistêmica, abrangente, não mais de oportunidade ou nos interstícios da administração, mas a mola central, o coração do mecanismo, a perpetuação da corrupção pela corrupção, a invenção de coisas sem qualquer outra finalidade a não ser a de roubar por roubar, ou seja, o moto perpétuo da roubalheira generalizada e contínua, o deus ex machina da patifaria despudorada.
Fica muito difícil entender isso?
Seria impossível admitir essa simples verdade, já revelada por inúmeras investigações e pela confissão (ainda incompleta) do tesoureiro-mor da quadrilha travestida de partido?
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 9/10/2019

quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Rio Branco, a diplomacia e o conhecimento da história - Cesar Maia

Conhecer a história é essencial. Melhor, em todo caso, do que ficar repetindo o que disseram filósofos alemães que não têm absolutamente nada a ver com a nossa diplomacia ou política externa...

RIO BRANCO E O PRATA!Da coluna de Cesar Maia, 9/10/2019

(José Alfredo Vidigal Pontes, historiador, autor dos livros ‘A Política do Café com Leite: Mito ou História?’ E ‘1932: O Caráter Nacional de um Movimento Democrático’ - O Estado de S. Paulo, 07)

“Um diplomata não serve a um regime e sim a um país”
Barão do Rio Branco

Nada mais atual e oportuno do que essa frase em epígrafe de José Maria da Silva Paranhos Júnior, mais conhecido como barão do Rio Branco. Monarquista convicto, serviu a cinco presidentes republicanos. Graças a ele resolvemos exemplarmente nossos problemas fronteiriços, propiciando boa coexistência e frutíferas relações.

No sul do País as trocas entre os povos antecederam o próprio estabelecimento das fronteiras, numa época em que eram apenas domínios espaciais ainda indefinidos dos impérios coloniais ibéricos. O comércio platino fortaleceu tanto os hispânicos como os luso-brasileiros, numa relação mútua de prosperidade, em meio a pontuais conflitos armados.

Apesar de seu passado monarquista, o barão foi convidado em 1893 por Floriano Peixoto a defender o Brasil numa querela fronteiriça com a Argentina, a qual envolvia boa parte da região oeste dos atuais Estados do Paraná e Santa Catarina. Em alguns meses preparou um estudo de seis volumes, A Questão de Limites Entre o Brasil e a República Argentina, e o enviou a Grover Cleveland, o então presidente norte-americano e árbitro da questão. Esse litígio, conhecido na época com a Questão de Palmas, foi decidido inteiramente a favor do Brasil por decisão de Cleveland, acatando os sólidos argumentos de Rio Branco. Pois ele não só conhecia profundamente os termos do Tratado de Madri (1750), como também a minuciosa e sigilosa cartografia hidrográfica luso-brasileira acumulada sucessivamente pelos brilhantes diplomatas Luís da Cunha e Alexandre de Gusmão.

O barão demonstrou claramente que não existe diplomacia eficiente sem conhecimento histórico, nem História sem embates diplomáticos.

Outra questão tratada na época por Rio Branco, ainda como embaixador especial, foi a do condomínio de acesso dos uruguaios ao Rio Jaguarão e à Lagoa Mirim, com civilizadas concessões da parte do Brasil. Três anos depois, em 1902, o barão era convidado a assumir o Ministério das Relações Exteriores, no governo Rodrigues Alves, sendo confirmado por todos os presidentes até sua morte, em 1912.

Como ministro, resolveu satisfatoriamente as questões do Acre e do Amapá, mas, anteriormente, ainda como advogado, deu prioridade às questões pendentes no Prata, pois tinha plena consciência de sua vital importância geopolítica para o Brasil. A partir da independência das antigas colônias sul-americanas, no século 19, foram realizadas as últimas grandes definições de fronteiras platinas mediante conflitos armados: a Questão Cisplatina, que resultaria na formação do Uruguai, e a Guerra do Paraguai. Na última década ainda restavam a Questão de Palmas, citada cima, e a da Lagoa Mirim para resolver e nesse momento Rio Branco foi convocado dado seu notório saber acerca dos antecedentes históricos das relações platinas.

A partir de 1580 houve um grande fluxo de comércio entre Buenos Aires e o Rio de Janeiro, durante a união das coroas ibéricas. Os luso-brasileiros levavam açúcar, tabaco, tecidos e escravos africanos em troca de prata e couros. Porém, a partir de 1640, com a restauração da independência portuguesa, essas transações diminuíram. O império português estava vulnerável e descapitalizado, tendo como inimigos os espanhóis e os holandeses. Foi dentro desse contexto de penúria monetária que, em 1680, o Conselho Ultramarino, em Lisboa, decidiu fundar Colônia do Sacramento, atrevida cidadela na banda oriental do Prata, bem defronte a Buenos Aires, a qual procurava retomar o fluxo de comércio com a América espanhola e o consequente acesso a pagamentos em moeda.

Enfrentamentos bélicos nessa região começaram a partir de então, mas também um próspero comércio entre as duas praças. Nessa época Buenos Aires era um pequeno porto com cerca de 8 mil habitantes, atrofiado pelo centralismo de Lima, que monopolizava a aduana da prata de Potosí.

Quase um século depois, quando Colônia do Sacramento passou para o domínio espanhol, o censo de 1778 apontou 24 mil habitantes em Buenos Aires, o triplo. Era então uma cidade bem equipada de serviços, cuja atividade comercial havia favorecido a expansão urbana.

De outro lado, a existência de Colônia do Sacramento contribuiu para a formação de uma identidade local portenha, a qual seria o embrião de um sentimento regional, aumentando a importância relativa de Buenos Aires no império espanhol e resultando na criação do Vice-Reinado do Prata.

A cidadela portuguesa do Prata, além de ter criado condições geopolíticas para a assinatura do Tratado de Madri, estimulou a ocupação dos atuais Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul: gado selvagem dos pampas começou a ser levado para o abastecimento de Minas Gerais e Rio de Janeiro por tropeiros paulistas. O tropeirismo passou, então, a se constituir num fator estrutural no desenrolar de nossa história econômica, tornando viável a ocupação do sul do País, o abastecimento das minas de ouro e acumulando capital privado em São Paulo, que se imbricaria posteriormente com o açúcar, o café, as ferrovias e a indústria.

É curioso registrar que essa contribuição é originária inicialmente de muares, equinos e bois soltos pelos hispânicos que haviam retornado à vida selvagem. Rio Branco era ciente de todo esse histórico do processo de ocupação da Bacia do Prata, no qual o comércio foi o grande protagonista.

Uma reflexão sobre esse passado nos remete à importância da saudável integração econômica entre países vizinhos sem barreiras tarifárias.

O barão demonstrou que não há diplomacia eficiente sem conhecimento histórico...