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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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quarta-feira, 6 de março de 2019

Nova repercussao da exoneracao, depois do Carnaval: Poder 360

Pois é, já que estava prevista desde muito tempo antes, como alegado pelo Itamaraty, essa substituição de chefias, podiam pelo menos ter esperado a Quarta-feira de Cinzas para fazê-lo, não é?
Precisava ser numa Segunda-Feira de Carnaval, logo pela manhã, com requintes de crueldade?
Atrapalhou a folia de muita gente, especialmente os jornalistas, que tiveram de trabalhar nessa coisa chata, em lugar de cair na folia, não é mesmo?
Em todo caso, jornalistas que, sim, brincaram o Carnaval, retomam agora as matérias sobre o caso, trazendo novas evidências sobre a minha exoneração.
Vou comentar, numa postagem seguinte, alguma das palavras do guru pretensamente "filosófico" do atual governo, aquele a quem eu chamo de "sofista da Virgínia", uma pessoa especialmente inepta em matéria de relações internacionais, mas que ainda assim pretende arvorar-se a especialista nisso também. Seria apenas patético se não fosse simplesmente ridículo.
Aqui o Poder 360, um dos melhores blogs de política nacional, junto com o Antagonista, sediado na capital federal. 
Uma reclamação contra seus editores: acho terrivelmente estúpido substituir, a cada vez, as palavras "um" e "uma" pelo número 1. Estão com falta de espaço nos servidores? Isso não faz nenhum sentido; fiz a substituição, pois a leitura se torna horrível com os dígitos em lugar das palavras corretas.
Ainda uma correção: eu não estava na "presidência" do IPRI, e sim era seu Diretor.
Paulo Roberto de Almeida
6 de março de 2019

Demissão de Paulo Roberto de Almeida expõe conflito no Itamaraty

Embaixador comentou caso nas redes
Fez críticas ao escritor Olavo de Carvalho
Governo diz que decisão estava tomada
Afastado, ele passará os dias na biblioteca
Paulo Roberto de Almeida foi afastado na presidência do IpriReprodução/Facebook
Poder 360
05.mar.2019 (terça-feira) - 21h01
atualizado: 06.mar.2019 (quarta-feira) - 1h42

A demissão do embaixador Paulo Roberto de Almeida da presidência do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (Ipri), anunciada nesta 2ª feira (4.mar 2019) pelo Ministério das Relações Exteriores, expôs uma situação de conflito no Itamaraty. O caso ganhou tração nas redes sociais na 3ª feira (5.mar), após os comentários do próprio embaixador.
Em texto publicado no seu blog pessoal, Almeida sugere que seu afastamento foi motivado por uma postagem anterior no site, em que havia replicado textos críticos à condução da política externa pelo atual chanceler Ernesto Araújo, assinados pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e pelo ex-ministro Rubens Ricupero.
Almeida reproduziu também uma reportagem da Folha de S.Paulo com a resposta de Araújo a Ricupero e FHC, a qual chamou de “mais um episódio de um ‘não-debate’ sobre a diplomacia brasileira e sua política externa”.

Em entrevista ao Estado de S.Paulo, Almeida conta ter recebido um telefonema do chefe de gabinete do ministro Ernesto Araújo, Pedro Wollny, em que as publicações foram mencionadas. “Ele ligou reclamando das postagens”, afirmou.
O embaixador também atribui a sua demissão a críticas fez ao escritor Olavo de Carvalho, tido como “guru” do governo Bolsonaro, influente nas nomeações de Ernesto Araújo e do ministro Ricardo Vélez Rodriguez (Educação). Para Paulo, Olavo é “uma personalidade bizarra do momento político brasileiro, totalmente inepta em matéria de relações internacionais, mas ao que parece grande eleitor nas circunstâncias atuais”.

O QUE DIZ O GOVERNO BOLSONARO

O governo tem outra versão para o afastamento de Almeida. Em nota, o Itamaraty afirmou que a mudança “já estava decidida e foi comunicada ao atual titular”. O assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais, Filipe Martins, detalhou em sua conta no Twitter que a decisão teria sido antecipada “por uma série de ofensas pessoais”.
Também por meio de sua conta na rede social Twitter, Olavo de Carvalho afirmou que não influiu na exoneração do diplomata. “Não fui eu quem cortou a cabeça do Paulo Roberto de Almeida. Não posso cortar o que não existe”, disse na 2ª feira (4.mar), às 16h03.
Em outro post seguintes, o escritor disse que Almeida não o teria o perdoado por expor em um debate a “ignorância e incompetência” do embaixador “em matéria de globalismo”.

O Paulo Roberto de Almeida jamais me perdoou por ter demonstrado, num debate, a sua total ignorância e incompetência em matéria de globalismo. Como vingancinha, apelou aos xingamentos da moda e à proteção do FHC. Só faltou rezar: São George Soros, socorrei-nos.
Almeida diz que não fez sentido, ainda que a exoneração já estivesse prevista, a demissão ter sido em uma 2ª feira de Carnaval. “Não podiam esperar a 4ª feira de Cinzas?”, questionou nas redes sociais. Diz ainda estar “esperando a demonstração”das ofensas alegadas por Filipe Martins.

O DIA SEGUINTE

Paulo Roberto de Almeida é diplomata de carreira. Ao deixar o cargo no Ipri, retorna ao Ministério das Relações Exteriores de Ernesto Araújo. A intenção declarada do embaixador é “fazer da Biblioteca do Itamaraty o [seu] escritório de trabalho”.
Almeida também é ligado ao Instituto Millenium, um think tank que estuda e defende ideias ligadas ao liberalismo econômico. O ministro Paulo Guedes (Economia) é um dos fundadores.

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Volto em postagem seguinte apenas para comentar o tweet acima do sofista da Virgínia. PRA

Agradecimentos sensibilizados por todo o apoio recebido

Escrevo já em meio à madrugada da Quarta-Feira de cinzas, depois de dois dias intensos de correspondência, postagens, entrevistas, redação de artigos e muitos, muitos contatos telefônicos, em dois aparelhos e no computador.
Nas últimas 48 hs minha vida, e atividades foram dominadas por um único assunto: minha exoneração do cargo de Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI), vinculado ao Itamaraty, determinada pelo ministro de Estado das Relações Exteriores, segundo sua soberana vontade, aparentemente em resposta a postagens neste meu blog Diplomatizzando que não foram do seu agrado.
Toda a história já está contada e recontada nas várias entrevistas que concedi e textos que escrevi nestes últimos dois dias.
Aproveito para um momento de distensão.
As autoridades poderiam ao menos ter deixado a exoneração para ocorrer na tarde da Quarta-Feira de cinzas, poupando o Carnaval de tanta gente, especialmente os jornalistas.
Gente sem humor...

Mas, escrevo esta última postagem da noite por uma razão muito simples: não tive condições de responder, atender, agradecer a todos de maneira adequada, pois fiquei literalmente submergido por dezenas de mensagens, dezenas de telefonemas, postagens em três ou quatro apps de redes sociais e o que mais existe nessa matéria. Não só do Brasil, mas de outros países também.
Confesso que sinto até uma ponta de vergonha, ou remorso, por ter provocado tanto barulho e tanta preocupação em tanta gente, mas a culpa não foi minha, obviamente.
Foi involuntário ou provocado, digamos assim, por gestos atrabiliários de quem tem o poder de decidir do emprego ou desemprego de simples burocratas do serviço público, o que sou, nas últimas quatro décadas (além de professor quase esse tempo todo também). 
Meu "desemprego" é parcial: perco um cargo em comissão e a remuneração correspondente, e ganho a liberdade, com renda reduzida, mas um imenso alívio por não ter mais sobre mim os olhos (e outras coisas também) de espíritos tacanhos que não sabem admitir o dissenso.
Como já disse algumas vezes, assim como James Bond tinha uma permissão especial para matar, eu adquiri, à custa de várias punições numa carreira sempre movimentada, a permissão especial, auto-atribuída, para dissentir, ou divergir. Disso não abro mão.

Mas, como também já me manifestei a respeito, personalidades autoritárias não apreciam espíritos libertários como o meu…
Minha constatação elementar é a seguinte. A atual chefia do Itamaraty pretende denegar ao meu blog a mesma liberdade de que desfrutou, na campanha presidencial de 2018, um blog manifestamente improvisado com objetivos eleitoreiros, dedicado a fazer campanha para um dos candidatos, ao mesmo tempo em que se empenhava em atacar candidaturas adversas, usando para isso todo tipo de ofensas político-ideológicas. Como diria Marx, em relação esse tipo de espírito sectário, “houve História, mas já não há”.

Tudo isso passará, e a partir de agora meu "endereço oficial" passa a ser a Biblioteca do Itamaraty, onde vou retomar meus esportes favoritos: ler, anotar, refletir, escrever e publicar (eventualmente). 
Durante os meus quase 14 anos do "exílio" anterior a 2016, aproveitei para ler muito e refletir muito, e também para escrever bastante.
Aliás, tenho de agradecer a meus "algozes", que me possibilitaram o lazer forçado e o tempo disponível para escrever.
Desse ostracismo involuntário, retirei vários livros, entre os quais destaco os seguintes: 

O Moderno Príncipe: Maquiavel revisitado (2010)
Nunca Antes na Diplomacia...: a política externa brasileira em tempos não convencionais (2014)

No exercício de uma intensa atividade no IPRI – cujo relatório pode ser consultado aqui: https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/03/relatorio-de-atividades-do-diretor-do.html – ainda encontrei tempo de compor dois livros: 

O Homem que Pensou o Brasil: trajetória intelectual de Roberto Campos (2017)
A Constituição Contra o Brasil: ensaios de Roberto Campos sobre a Constituinte e a Constituição de 1988 (2018) 

Nos dois meses de "férias" das atividades do IPRI, desde dezembro de 2018 e até aqui (quando estou ainda impedido de empreender qualquer atividade por determinação superior), aproveitei para coletar alguns de meus textos do período decorrido desde o último livro sobre a diplomacia brasileira (Nunca Antes...), e compus um novo livro, que deve estar sendo publicado proximamente: 

Contra a Corrente: ensaios contrarianistas sobre as relações internacionais do Brasil, 2014-2018 (2019)

Acredito que com a exoneração, vou ter ainda mais tempo para continuar escrevendo e publicando coisas que imagino possam ser úteis aos mais jovens, especialmente em temas de diplomacia brasileira e política externa. Acho até que vou acelerar a produção, se a tanto me for dada oportunidade nesta nova fase aparentemente sans Dieu, ni Maître...

Meu muito obrigado a todos os que me contataram, escreveram, telefonaram, twitaram, mandaram mensagens, ou me encontraram diretamente.
 Não pude agradecer ou cumprimentar a todos pessoalmente, diretamente, adequadamente, mas faço desta postagem minha expressão de reconhecimento sensibilizado.

O grande abraço a todos
Paulo Roberto de Almeida
Brasília 6 de março de 2019

Meu amigo Sergio Florencio me escreve lamentando a exoneracao

O embaixador Sergio Florêncio é uma das almas mais puras que já encontrei na carreira, não no sentido espiritual, ou religioso, mas num sentido simplesmente humano, demasiadamente humano, como diria Nietszche.
Tomando conhecimento de minha exoneração, ele imediatamente escreveu a mim e ao embaixador Ricupero, que também acompanhou a novela, e ainda remeteu ao texto que ele leu na homenagem que me prestou em agosto de 2018, quando de minha promoção tardia (por obras e artes do congelamento a que fui submetido durante o lulopetismo).
Sem que ele me tenha autorizado, mas sabedor de seu espírito aberto, tomo a liberdade de postar sua mensagem, com o meu agradecimento enfático a tão grande amigo.
Paulo Roberto de Almeida

Queridos Paulo e Ricupero,

Confesso meu sentimento de profunda revolta e frustração com o exoneração do Paulo do IPRI.
Fui testemunha e participante do que considero a mais inspirada e criativa gestão desse importante instituto de pesquisa do Itamaraty.
A revolta vem naturalmente da injustiça com um diplomata que soube,  com o sacrifício pessoal e familiar, transformar um instrumento de pesquisa de uma instituição oficial em um verdadeiro celeiro de ideias. Um Think Tank  com a participação de  renomados professores e pesquisadores do Brasil e de diversas partes do mundo. Esse enorme esforço pessoal traduzia  o compromisso mais profundo do Paulo com o debate democrático, aberto e plural.
Essa " chama da alma"  junguiana do Paulo jamais será apagada.  As tentativas foram muitas e com colorações ideológicas diversas. No passado recente, o respeito ao contraditório sempre exercido pelo  Paulo foi golpeado com o ostracismo praticado no período Lula/Dilma/ Celso Amorim.
O curto período da gestão Aloysio Nunes teve a grande virtude de resgatar a melhor tradição do Itamaraty - o respeito às diferenças e o convívio com o contraditório. Esse resgate teve o apoio decisivo de jovens diplomatas, como Eduardo Saboia - ele próprio vítima do furor repressivo do governo Dilma, após o ato corajoso de defender os direitos humanos do senador boliviano exilado em nossa Embaixada em La Paz pro mais de 400 dias - e Marcos Galvão - digno e virtuoso Secretário Geral do Itamaraty. O Chanceler resgatou a  tradição da Casa e promoveu Paulo Roberto a Embaixador, além de designá-lo Diretor do IPRI.
Esse gesto mereceu ampla aclamação. Promovi então um encontro dos muitos que apoiaram esse resgate da justiça na nossa instituição e daqueles que foram os artífices dessa importante mudança de rumos. Procurei traduzir esse sentimento em uma saudação ao amigo Paulo.
Ontem esse sentimento de júbilo que marcou o reconhecimento institucional do valor do Paulo foi novamente golpeado - foi afastado  de forma injustificável do cargo de Diretor do IPRI. O júbilo cedeu lugar à frustração. 
Uma vez mais a chama do Iluminismo cede lugar às trevas.
Minha frustração  é imensa e certamente traduzo - na qualidade de  Embaixador aposentado e atual Professor de História da Política Externa do Instituto Rio Branco -  a desolação dos muitos que não estão em condições de dar transparência a essa indignação.
Nesta madrugada me lembrei muito do momento em que Paulo teve o reconhecimento da instituição e foi galgado a seu mais alto posto. Esse resgate da memória provocou um sentimento de profunda frustração ao ver uma vez mais erguida a bandeira das trevas. Mas também fez ressurgir em mim  a consciência de que a alma genuína da instituição falará mais alto e a trajetória de virtudes do passado superarão os vícios obscurantistas do presente.
Com muito afeto para vocês do
Sergio

Histórias 2018   Paulo Roberto Embaixador.  
Encontro em nossa Casa.
 Brasília, 9 de agosto de 2018.

Sônia, Carmen Lícia e eu somos muito gratos à presença de todos vocês aqui. Essa confraternização tem no seu íntimo o coração e a razão de cada um de vocês. Vocês produziram o significado desse encontro.
A promoção do Paulo para mim se situa entre as mais tardias e injustamente adiadas  que conheci em mais de 40 anos de Itamaraty.  Por isso mesmo, ao receber a bela notícia, me veio um sentimento muito profundo: não é a promoção do Paulo, é o Itamaraty que está sendo promovido.
Assim, o significado desse encontro é louvar essa conquista, que resgata para  a nossa instituição aquilo que ela tem de mais nobre e digno – a excelência, o convívio com as diferenças, a aceitação do pluralismo, do contraditório e do debate interno de onde nasce a luz.
Paulo representa para mim a  inteligência contestatária – essa vertente que a instituição teve a sabedoria de preservar ao longo de sua história. Mas que infelizmente esqueceu na última década  e meia.  E o Paulo simbolizou – mas não mais simboliza – esse esquecimento.
Hoje é, portanto, um dia de celebração, de júbilo, de encontro de uma instituição consigo mesma, com o melhor de sua trajetória.
Todos que aqui estamos temos uma enorme identidade com essa vocação tão genuína do Itamaraty.  Mais que isso, muitos que aqui estão são os atores que viraram a página da história e retomaram o capítulo que resgata o fio da meada e o sentido do enredo.
Conheci Paulo no início do Mercosul, ele  assessor do Rubens Barbosa, e eu Chefe da primeira Divisão do Mercosul, junto com dois que aqui estão – Eduardo e Ernesto – e outros,  com João Mendes, Haroldo e Mauro. Já ali era visível sua obstinação pelo conhecimento multidisciplinar, pela pesquisa, pela rebeldia esclarecida e pela irreverência intelectual que corre nas suas veias e estimula seus neurônios.


Sempre admirei essa essência anímica do Paulo – essa junguiana “ chama da alma” -   apesar de algumas  visões discordantes  e de o ter aconselhado muitas vezes a arrefecer a chama, mas jamais extingui-la.  Na verdade meu receio maior não derivava daquela essência anímica  do Paulo, mas dos  Bombeiros de Farenheit 451, que  poderiam inverter a direção das labaredas.
Num sentido mais remoto, a admiração por essa essência do Paulo tem suas origens na minha infância. Meu pai era nordestino do Sertão do Seridó e veio para a Capital Federal de pau de arara.  Minha mãe estudou no Sacré Coeur, tocava piano e falava francês.  Ela gostava de valsa, ele amava o baião. Sou produto dessa miscigenação cultural. 
Miscigenação que talvez tenha gerado em mim  -  depois de tantos anos de análise – uma individuação de tom conciliatório. Mas também gerou uma afinidade eletiva bem maior com a vertente nordestina, irreverente. Essa afinidade que toda a vida me identificou muito mais com a simplicidade da terra do nordeste do que com a estética educada e refinada do sul.
Na casa de vila da nossa infância, todas as semanas tínhamos o convívio com cantadores, violeiros, repentistas, trovadores , poetas do nordeste. A miscigenação entre o rapaz nordestino e a moça do Sacré Coeur produziu em mim um gosto pelas diferenças, pelos contrastes.  Mas, talvez pela força do apelo telúrico, a irreverência  do baião sempre pulsava mais alto que a delicadeza da valsa.  Por isso, nunca alcancei o teclado do piano, não cheguei aos pés – nem às mãos – de um violino.  Mas gosto muito de tocar um pandeiro. Irreverência freudianamente sublimada? Talvez.
Por isso,  creio que no meu sangue pulsa também esse inconformismo que o Paulo simboliza.  Mas no meu caso prevaleceu muito mais  o traço de uma irreverência emocional.  Não tanto a  obstinação intelectual, que é  a marca da vida e da alma do Paulo. Obstinação que alimenta uma irreverência iluminista, a destruição criadora do admirado Schumpeter, um Grande Sertão que precisa conviver com as Veredas do nosso Itamaraty.
Bom. Vou ficando por aqui. Uma vez mais, minha gratidão – e a de Sônia e de Carmen Lícia – pela presença de vocês.  Vocês que resgataram a alma da instituição, construíram o encontro com seu self mais verdadeiro, ao  virar a página da sombra e saudar o sol da convivência com os contrários, ao abraçar o pluralismo – a marca maior das grandes instituições.
Minhas desculpas por esse monólogo absurdamente longo.  E que me fez desrespeitar o conselho de nosso terceiro filho Thiago, quando comemorava nove anos de idade.  Nessa época eu chefiava a Divisão de Estudos e Pesquisas Econômicas do Itamaraty. Mas tinha também um encargo adicional e absorvente de preparar conferências e discursos para o então Secretário Geral, nosso brilhante e sempre inspirado Marcos Azambuja.  Isso me impedia, em muitos fins de semana, de jogar o futebol que tanto amo com os filhos.  O Thiago se ressentia muito.
Assim, quando perguntaram, naquele aniversário, o que ele queria ser quando crescer, ele simplesmente ficou calado.  Depois de tanta insistência, ele finalmente respondeu. Uma resposta  à la Paulo Roberto de Almeida. Ele simplesmente disse: “ Eu não sei o que vou ser quando crescer. Mas eu sei o que não quero fazer quando crescer. Não quero fazer conferência e discurso.” 
Nossa gratidão – minha, da Sônia e da Carmen Lícia - a todos vocês por estarem na intimidade conosco num momento tão rico de significados para o Paulo, para todos nós e para a nossa instituição.

Sergio Abreu e Lima Florêncio

Brasília, 9 de agosto de 2018.

Francisco Seixas da Costa: um embaixador da grande diplomacia lusitana

Francisco Seixas da Costa é um embaixador não burocrata. Desculpem-me os burocratas, pois também temos necessidades deles, mas não são exatamente do tipo que eu mais aprecio.
Rato de biblioteca por deformação da primeira infância, quando ainda não sabia ler, eu me afeiçoei tanto aos livros que chegada a etapa do letramento, na tardia idade dos sete anos, nunca mais larguei dos livros, um só instante na vida.
Quando me vi constrangido a um longo exílio voluntário na Europa, nos anos de chumbo da ditadura militar no Brasil, arrastei comigo uma pequena biblioteca que deve ter intrigado vários guardas aduaneiros, cada vez que eu tinha de transpor as fronteiras da Guerra Fria. Mas sobrevivi, com os meus livros, ainda que os amaldiçoasse, cada vez que, tendo de mudar de casa para viver mais barato, o que fiz frequentemente, tinha de arrastar escada abaixo e escada acima, caixas e mais caixas de livros que foram se acumulando ao sabor das viagens e da vida nas livrarias e biblioteca.
Mas, eu me perco. O que eu quero dizer é que, aos diplomatas burocratas, eu prefiro os intelectuais não pretensiosos, aqueles sabedores da modéstia do seu saber, e que procuram aumentá-lo sempre, pelas leituras, pelas viagens, pelo contato com as pessoas, pela abertura de espírito. Pois é de uma pessoa assim que eu quero falar, e agradecer o seu gesto.
O embaixador mais intelectual (que eu conheço) da excelente diplomacia lusitana, que nos legou a nossa boa diplomacia nacional – por vezes maltratada por sectários e aloprados – faz neste artigo uma pequena digressão sobre as minhas desventuras diplomáticas (elas são frequentes) entre um regime e outro. Francisco Seixas da Costa repercute no mais importante jornal português a minha exoneração do IPRI, o que converte o fato em ato internacional, como convém a um diplomata. Muito obrigado embaixador Seixas da Costa, grande amigo de tertúlias brasilienses, quando eu já estava na geladeira sob o lulopetismo diplomático. Parece que volto a ela, mas requentado por suas palavras generosas. Recomendo, por sinal, seu excelente blog Duas ou Três Coisas, que combina tudo o que gosto: cultura refinada, bom humor, curiosidade pelo que é novo, ou diferente, tolerância na política e uma leve ponta de contestação, que é disso que eu também gosto: https://duas-ou-tres.blogspot.com/ 
Paulo Roberto de Almeida

Opinião

Paulo Roberto de Almeida

Jornal de Notícias (Portugal), 5/03/2019

Paulo Roberto de Almeida é um embaixador brasileiro. Conheci-o quando por lá chefiei a nossa missão diplomática e ganhou a minha admiração pelo seu empenhado estudo da política externa do seu país.
É autor de uma bibliografia impressionante e mantém o blogue "Diplomatizzando", para mim de consulta diária.
O PT nunca gostou de Paulo Roberto de Almeida. A corrente dominante no Itamaraty, durante os anos de Lula e de Dilma, não apreciava minimamente o seu espírito independente, a sua leitura do que entendia serem os interesses permanentes brasileiros na ordem externa e da postura diplomática que considerava que melhor os defenderia. E ele pagou, em termos de carreira profissional, onde já tinha tido postos muito importantes, um forte preço por isso. A defesa de uma diplomacia não ideológica não caía bem num Itamaraty que, manifestamente, não ia por esse caminho.
Em face da nova situação instalada no Brasil, após as últimas eleições, fiquei curioso sobre qual iria ser o futuro de Paulo Roberto de Almeida. Desde cedo, tive um pressentimento: se, com a Esquerda no poder, o Paulo fora adepto de uma diplomacia não sectária e sem viés ideológico, seguramente que o não via a favorecer o enviesamento extremo, mas de sinal contrário, que agora passou a dominar o discurso e a prática da política externa brasileira.
Não me enganei. Paulo Roberto de Almeida, um democrata corajoso e um cidadão que pensa pela sua cabeça, tem uma perspetiva elaborada sobre a postura brasileira na ordem externa, que não passa pela adesão a ondas cíclicas de fervor ideológico. A sua conhecida liberdade e independência de pensamento não parecem compatíveis com a orientação, extremada e radical, a que o Itamaraty está a ser sujeito nos últimos tempos.
O embaixador Paulo Roberto de Almeida acaba de ser demitido pelo Governo Bolsonaro do cargo de diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, horas depois de ter reproduzido no seu blogue, sem comentários, três artigos sobre a atual política externa do Brasil face à Venezuela: um de Rubens Ricupero, uma imensa figura da diplomacia brasileira, outro do antigo presidente Fernando Henrique Cardoso e, finalmente, um outro do atual ministro das Relações Exteriores.
Deixo ao Paulo Roberto de Almeida o meu abraço amigo e solidário, num tempo que imagino difícil. Ele sabe bem, contudo, que eu respeito sempre a velha quadra popular portuguesa: 
"Por me veres em baixo agora / 
Não me negues a tua estima. / 
Os alcatruzes da nora / 
nem sempre andam por cima".




Chanceler exerce "autoritarismo inedito no Itamaraty", diz diplomata punido - Jamil Chade

Chanceler exerce "autoritarismo inédito no Itamaraty", diz diplomata punido

Jamil Chade
Blogosfera, 5/03/2019
Em entrevista ao blog, Paulo Roberto de Almeida diz que foi exonerado por ter questionado Olavo de Carvalho e aponta que existe um clima de "temor" dentro do Itamaraty. Para ele, diplomatas continuam sem saber qual é a política externa do chanceler Ernesto Araújo.
GENEBRA – Os diplomatas brasileiros até agora não sabem qual é a política externa do governo de Jair Bolsonaro. Quem faz o alerta é Paulo Roberto de Almeida, embaixador que foi demitido nesta segunda-feira do cargo de diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (Ipri), entidade ligada ao Itamaraty.
A exoneração ocorreu depois de o diplomata publicar, em seu blog pessoal, textos em que se questionava a ação do Brasil na Venezuela. Oficialmente, o Itamaraty argumentou que a mudança já estava prevista. Mas a história não foi a mesma relatada em um telefonema em plena segunda-feira de carnaval ao embaixador.
Em entrevista ao blog, Almeida fez uma análise das diretrizes atuais da política externa e relatou o clima de medo que se vive hoje dentro de uma das instituições mais tradicionais do País. O embaixador também ataca Olavo de Carvalho, o acusa de "inepto" e "nefasto" para a política externa brasileiro e aponta que foi afastado de suas funções justamente por tê-lo questionado. "Eu ofendi aquele a quem o ministro de Estado deve seu cargo", lançou.
Mas ele também aponta: o atual chanceler Ernesto Araújo pratica uma espécie de "autoritarismo inédito" dentro da casa de Rio Branco.
Eis os principais trechos da entrevista:
P – Qual foi o argumento usado para sua exoneração?
Almeida – Eu fui despertado na manhã de segunda-feira de carnaval por uma chamada do chefe-de-gabinete do ministro de Estado. Na semana anterior, eu havia conversado com ele sobre meu futuro no Ipri. Com a mudança de governo, eu imaginava que haveria o desejo da administração, como é normal, de escolher novos assessores. Fui informado de que, naquele momento, não haveria mudança alguma. Ainda se aguarda o próximo presidente da Funag, que deve assumir em breve. E que Depois falaríamos sobre o Ipri. Devo dizer que, desde o início do ano, todas as atividades foram interrompidas por instruções expressas da nova chefia. O Ipri não deveria empreender nenhuma atividade até a aprovação de um novo programa de trabalho. Na ligação da segunda-feira, me foi dito que o ministro estava muito descontente com as minhas postagens, especialmente a última que foi feita no domingo. Eu tinha reunido os textos mais importantes de política externa, incluindo uma palestra de Rubens Ricupero, um artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e uma postagem do chanceler Araújo em seu blog, respondendo e atacando ambos. Coloquei isso no meu blog Diplomatizzando e convidei a um debate sobre a política externa, ou aquilo que poderia ser chamado de política externa desse governo.
P – E o que foi dito na conversa ao telefone?
R – Que eu teria extravasado os limites e que diplomatas, mesmo tendo certa liberdade de expressão, precisam guardar alguma disciplina nas manifestações públicas. Eu acho isso correto. Mas há uma alegação, que veio a posteriori, de que eu teria ofendido o ministro (Araújo) e de que fiz acusações pessoais. Não me lembro de ter feito isso. O que eu fiz, sim, foi dirigido ao Olavo de Carvalho, que eu considero uma presença nefasta na política externa. Trata-se de uma pessoa inepta em relações internacionais e que aparentemente tem influenciado algumas vertentes da política externa, como a questão do antiglobalismo, a luta contra o marxismo cultural, o "climatismo" e outras bobagens. É muito negativo o Itamaraty ter entre suas pessoas "inspiradoras" e mestre uma pessoa tão destrambelhada como o quem eu chamo de "sofista da Virgínia". Eu ataquei a pessoa que foi talvez mais influente na designação do ministro atual.
P – Como o sr. avalia essa influência de Olavo de Carvalho?
R – Eu não estou sendo punido por ter colocado artigos do Fernando Henrique ou palestras do Ricúpero. É apenas um pretexto. Isso de que eu tenha feito ofensas pessoais ao ministro é uma acusação indevida. Eu fiz sim ofensas a Olavo de Carvalho e isso é que motivou a punição. Eu acredito que essa seja a razão real. Eu ofendi aquele a quem o ministro de Estado deve seu cargo.
P – Como o pensamento de Olavo de Carvalho pode continuar a afetando a carreira diplomática e o Itamaraty? 
R – Olavo de Carvalho é um ser primitivo em relações internacionais, rústico mesmo. Exibe um estado de confusão mental. Ele explora esses jovens sedentos de alguma instrução filosófica ou política. Ele teve um papel importante na denúncia do Foro de São Paulo e o marxismo vulgar das nossas academias. Mas hoje ele tem um papel nefasto na política externa. Ele surfou na onda da crítica da direita à corrupção do PT e na onda anti-petista. Mas eu não vejo nenhuma influência boa para a política externa brasileira. Apenas um debate estéril sobre conceitos vagos, esse monstro metafísico do globalismo. São pessoas absolutamente ignorantes em relações internacionais.
P – Houve uma primeira nota do Itamaraty dizendo que a exoneração do sr. já estava planejada e depois, nas redes sociais, o assessor de política externa, Filipe Martins, indicou que, de fato, teria sido por supostas ofensas. 
R – Eu gostaria de saber quais são essas ofensas, por que não as fiz: falei dos eflúvios olavistas sobre a política externa. Essa talvez seja a razão do rancor do chanceler contra mim: ele se sentiu pessoalmente atingido por eu te depreciado o seu guru.

Foto: Vivi Zanatta/ Folhapres
Olavo de Carvalho

P – Outros embaixadores também já foram exonerados no atual governo. Qual o clima que se vive hoje dentro do Itamaraty?
R – É um clima deprimente. Desde o final de novembro, tivemos vários desencontros entre o chanceler designado e os diplomatas. O primeiro foi na própria montagem dos convidados à posse (de Jair Bolsonaro). O Cerimonial do Planalto convidou todos os países com os quais o Brasil tem relações diplomáticas. O chanceler mandou desconvidar Cuba, Venezuela e depois Nicarágua. A Convenção de Viena indica que se deve tratar todos os países com os quais temos relações diplomáticas de forma igual, sem discriminação com base em ideologia. Isso é sem precedentes na história do Itamaraty e o chefe do Cerimonial do Planalto foi defenestrado antes mesmo de começar o governo. Depois tivemos alguns casos de embaixadores que foram "despromovidos". Os subscretários-gerais, todos embaixadores, foram dispensados a partir de 1 de janeiro. As novas secretarias foram ocupadas por ministros de segunda classe, algo compatível com o chanceler, que é, por assim dizer, um embaixador júnior. Isso também é inédito no Itamaraty, por representar uma quebra de hierarquia. São coronéis mandando em generais. Em segundo lugar, houve uma espécie de isolamento dos assessores de Araújo e eles começaram a reformar o Itamaraty sem nenhuma consulta à casa. Isso foi especialmente chocante. O clima, portanto, é de desalento, de passividade, de inércia, de bastante temor. Ninguém ousa dizer nada. Houve uma espécie de acomodação mútua. A quebra da hierarquia e a imposição de uma reforma pelo alto são elementos chocantes. Mas o chanceler Ernesto vem exercendo uma espécie de autoritarismo inédito no Itamaraty.
P – E qual a percepção do que é a política externa do atual governo?
R – No plano substantivo, todos estão esperando para saber qual é de fato a política externa. O discurso de posse de Araújo foi extremamente decepcionante, pois não trouxe quaisquer indicações sobre o que seria, efetivamente, a política externa.
P – O sr. já tinha notado alguma indicação de que a preparação dos diplomatas seria modificada?
R – Sim, fui até mesmo consultado sobre isso e me recusei a participar desse exercício. Aleguei que não tinha conhecimento suficiente, por não ser professor do Instituto Rio Branco. Eu já previa, pelos discursos e artigos, que viria uma tempestade sobre o Rio Branco. Imaginei que fariam as transformações ideológicas que eu julgava nefastas. A única consideração que eu fiz foi a de consultar em primeiro lugar os alunos, depois o próprio Instituto Rio Branco e insistir mais na formação profissional. Soube que o estudo da América Latina saiu do currículo.
P – Existe hoje um espaço para um debate sobre política externa dentro do Itamaraty?
R – Não, não há. E isso fica evidenciado pelo tema principal atual, que é a Venezuela. Ele está sendo tratado pelo gabinete e sem os responsáveis pela área. No passado, era comum diplomatas "da base" serem chamados ao gabinete para debater os temas do momento com o chanceler. No caso da Venezuela, não há notícia de que esteja havendo uma interação política a partir da base.
P – Hoje, a política externa é resultado da avaliação do interesse nacional ou de uma ideologia?
R – É uma questão difícil de responder. Vemos um amalgama de influências espúrias sobre a política externa. O processo de tomada de decisões no Itamaraty foi sempre alvo de consultas, até fora da chancelaria. Isso foi muito alterado sob Lula. A presidência e o partido ditavam as grandes orientações. A base esperava a decisão da cúpula. Lembro-me de casos envolvendo barreiras da Argentina a produtos brasileiros. Sob FHC, o Itamaraty tinha uma posição clara de acionar os mecanismos de solução de controvérsias no Mercosul ou o GATT. Sob Lula não se fez isso, para "poupar" a Argentina. Pode ser que esse tipo de distorção venha a ocorrer novamente. Mas o mais importante é saber se existe realmente uma política externa. Essa é a questão mais importante. Eu me pergunto: qual é a política externa do atual governo? Eu não sei. Até hoje eu não sei. Aliás, os diplomatas também não sabem.
P – Mas Venezuela é uma questão concreta.
R – Claro. Mas aparentemente está sendo resolvida pelo Conselho de Defesa, com a cúpula militar. Há certa tutela dos militares sobre a política externa.
P – Como essa falta de clareza pode impactar o Brasil no exterior?
R – O Brasil já se submeteu ao ridículo de anunciar sua retirada – depois recuando – do Acordo de Paris, como também anunciou a mudança da embaixada para Jerusalem. Tivemos ainda a proposta de uma base americana no Brasil. A "desassinatura" do Pacto Global de Migrações também é outra medida que confronta nossa história e é ridícula.
P – Ao longo de sua carreira, o sr. também foi alvo de um isolamento por parte do governo do PT. Qual a diferença agora?
R – A forma é a mesma. São dois governos autoritários, ideologicamente motivados que afastam dissidentes. Desde sempre, expressei minhas opiniões. Nunca deixei meu cérebro em casa ao ir trabalhar. Eu sofri punições antes do lulopetismo por publicar artigos sobre a política externa sem autorização. Depois, sob o lulopetismo fiquei "congelado", sem qualquer função, sem nenhum cargo por treze anos. A biblioteca foi meu escritório por muitos anos e agora volto para lá. Ou, como se diz, o Departamento de Escadas e Corredores. Formalmente, não há diferenças. Mas, desta vez, houve uma animosidade pessoal e ideológica. Os petistas sabiam quem eu era e eu escrevia o que eu achava antes mesmo de eles tomarem posse. O ex-chanceler Celso Amorim me ofereceu uma embaixada no exterior, que eu recusei. Mas eu escrevia contra a política externa. Hoje, eu apenas sofro de uma animosidade pessoal dos atuais chefes da casa.

terça-feira, 5 de março de 2019

“Isso de limpar o petismo do Itamaraty é uma grande bobagem”, diz Paulo Roberto de Almeida

Os olavistas vão "adorar" que eu transcreva o Diário do Centro do Mundo, os petistas menos, mas o fato é que eles selecionaram justo a minha frase fetiche que os deixa contentes. 
Como é que eu, um marxista cultural, poderia concordar com essa limpeza dos petistas do Itamaraty, justo nós que seguimos escrupulosamente a Convenção Internacional de Proteção das Espécies Ameaçadas de Extinção (Cites)?
Eu acho mesmo que os petistas devem ser protegidos. Como é que a gente iria se divertir, sem eles? Onde é que a Direita iria encontrar os inimigos ideais?
Eu, todo ano, escrevia as minhas previsões imprevidentes, que eram aquelas apostas sobre o NÃO iria acontecer durante o ano. Por exemplo: o governo petista se render ao liberalismo (ou até ao capitalismo), o MST apoiar o agronegócio, essas coisas. Sem os petistas tudo ficou sem graça. Vamos preservar os petistas...

Paulo Roberto de Almeida

“Isso de limpar o petismo do Itamaraty é uma grande bobagem”, diz Paulo Roberto de Almeida

Diário do Centro do Mundo, 5/03/2018

Em entrevista ao Estadão, o embaixador exonerado pelo ministro Ernesto Araújo, Paulo Roberto de Almeida, falou sobre sua saída a qual ele diz ter sido por conta de seu “espírito libertário”, mas que já esperava que isso fosse acontecer.
O chefe de gabinete então deixou claro que a exoneração tinha relação com as postagens?
Sim, claro. Com meu blog, sem dúvida nenhuma. Mas isso já era previsível. Eu já estava preparado. Porque o ministro de Estado demitiu todos os chefes da Casa. Desde antes de tomar posse, em dezembro, eles estavam anunciando que todos os subsecretários, os embaixadores, estavam dispensados.
E no lugar, hoje, os embaixadores estão obedecendo a ministros de segunda classe no Itamaraty. E todas as secretarias são ocupadas por funcionários juniores, ou menos antigos dos que estavam antes. Há muito embaixador sem função, o que vai ser meu caso agora também.
Por que o senhor acredita que isso ocorreu?
Isso ocorreu porque o chanceler Ernesto Araújo também é um embaixador júnior. E ele está usando um critério geracional, digamos assim, para renovar a chefia. O que pode ocorrer em determinadas circunstâncias, mas o fato é que houve uma quebra de hierarquia muito clara no Itamaraty desde janeiro. Houve também uma ruptura dos procedimentos quanto à reforma na Casa, totalmente sem consulta, sem nenhuma preparação.
Como o senhor vê o desempenho do chanceler até este momento?
Não sou eu que estou vendo. Os jornalistas todos têm feito comentários sobre as posturas anti-globalista, anti-climatista, essas questões envolvendo a Venezuela. Os militares parecem também terem visto isso e adotaram uma espécie de “cordão sanitário” ao redor do chanceler.
(…)
O senhor acredita que ainda podem haver novas exonerações no Itamaraty?
Vários embaixadores já foram exonerados de seus cargos que estão sem função. Então, acho que há essa perspectiva geracional. Não conheço nenhum diplomata petista. Talvez tenha dois ou três, mas devem estar quietos. Essa coisa de limpar o petismo do Itamaraty, o marxismo cultural, isso é uma grande bobagem. Porque o Itamaraty é feito por profissionais, que, claro, atendem ao presidente, seguem a política externa do Palácio. Algumas medidas tomadas recentemente são pouco compatíveis com a chamadas tradições do Itamaraty.