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sexta-feira, 17 de junho de 2011

iCloud: uma gigantesca nuvem musical (Economist)

USA internet: Apple ascendant
FROM THE ECONOMIST INTELLIGENCE UNIT
June 13th 2011

With the major record labels on its side, Apple's dominance of the digital music industry looks set to last.

Apple is not in the business of disappointing its fans, but more than a few have felt somewhat let down by the company's latest offering. Before last week's launch of iCloud, hopes were that Apple would unveil a subscription-based deal akin to Spotify's existing European service, which provides unlimited streaming of all labels' catalogues for a fixed monthly fee. Instead, fans got a service geared towards ensuring Apple's devices can access a user's music library from the cloud via downloads, not streaming. It appears a lot less ambitious.

But while iCloud may appear less innovative than earlier Apple offerings, the Cupertino-based company has undoubtedly shifted the ground in the music industry and created a platform that has the blessing of the record labels—something neither Google nor Amazon were able to do. Unlike its rivals' offerings, iCloud does not require customers to upload their music to the cloud. Instead, the service can automatically scan a user's music collection and match it to the iTunes store, which contains more than 18m tracks (users can upload tracks not available in the store). Known as iCloud Match, this feature will be available for an annual subscription fee of US$25 from this autumn (minus iCloud Match the service is free but limited to tracks bought from iTunes). Without the approval of the record labels, iCloud Match would not have been possible.

Yet the decision to allow all existing tracks to be included in Apple's new service has raised concerns about music piracy. Many observers have suggested the service could provide an amnesty for those who have previously engaged in illegal file-sharing activity. Conversely, some customers may worry that by handing over details of their listening habits and music collections they are being lured into a trap by Apple and the music industry. Clearly, this is the kind of information the Recording Industry Association of America (RIAA) would love to get its hands on if it was compelled to pursue further legal action. Apple, however, has insisted it will not provide specific details of users' libraries to the record labels—only aggregate information about total download volumes. More importantly, the fact the major labels have agreed the terms of the deal with Apple suggests they are ready to forget about the past and focus on the future.

Money for nothing?
That future looks promising. In his keynote speech at Apple's recent Worldwide Developer Conference, chief executive Steve Jobs noted that the era of the personal computer is coming to an end. The future, he reckons, will be all about mobile devices. That means the iPhone and iPad if Mr Jobs continues to get his way. With iCloud intended to run over these devices, the record labels are undoubtedly happy to ride on the back of Apple's current success and expected growth in this market. The four major labels have already secured an advance of around US$150m from Apple and will take a 58% share of subscription revenues from iCloud (music publishers will take 12% and Apple will keep the remaining 30%), giving them a substantial boost.

Clearly, if Apple remains dominant in the mobile devices market, then the record labels look set to benefit, and with little exertion on their own part. A survey conducted last year by market-research company NPD indicated that around 25% of iTunes users were interested in a cloud-based service, and that around half of those would be willing to pay US$10 a month for an unlimited streaming service supporting multiple devices.

With the record labels on board, Apple might soon be able to deliver the more ambitious music service that many were hoping to see launched last week. And if today's iCloud can deliver the user experience for which Apple is renowned, then a lot more people will be accustomed to paying for such a subscription service when Apple and the record labels feel ready to provide it. No doubt, Google and Amazon will be trying to get back into the game somehow, but for now iCloud looks by far the biggest and whitest musical cloud in the sky.

Novo Codigo Florestal do Brasil: muito barulho, sem dados...

Um artigo que esclarece as reais dimensões da questão:

Novo Código Florestal: uma guerra de números e de interpretações
Osvaldo Ferreira Valente*
portal EcoDebate, em 31/05/2011

Nesse período de discussão do novo Código Florestal, temos convivido com um festival de números e de interpretações dos seus significados; uma verdadeira guerra entre ambientalistas, de um lado, e ruralistas, do outro, já que infelizmente tem sido assim entendida, quando não deveria passar de divergências. E as divergências são próprias da democracia. Quando um grupo tenta impor sua vontade, seja de que lado for, ele manifesta comportamento ditatorial.
Como a discussão enveredou, também, para o lado da paixão e da emoção, os números perderam os parâmetros reais e passaram a flutuar de acordo com os interesses e as necessidades momentâneas de justificar posições e/ou de defender trincheiras. E tudo acabou virando um grande novelo de dúvidas e incertezas, que a sociedade não conseguiu conscientemente desfiar. As tentativas de entrar no jogo foram prejudicadas pelos palpites, boatos e informações desencontradas, tanto de um lado quanto do outro.
Feita esta introdução, vou desenvolver este artigo usando dados do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), da estrutura do Ministério do Meio Ambiente. O SFB publicou, em 2010, a obra intitulada “Florestas do Brasil”, com 152 páginas, muito bem ilustrada e com riqueza de informações sobre os nossos Biomas e as florestas naturais neles existentes (obra disponível em www.florestal.gov.br). Resolvi trabalhar um pouco com as informações ali existentes e compus um resumo para analisar aqui, que está no quadro abaixo. São, portanto, informações oficiais, de um órgão público ligado ao principal agente ambiental brasileiro.

O primeiro número que chama a nossa atenção é a porcentagem de florestas naturais existentes no país. Se depois de tantos anos de destruição desenfreada, conforme propalado constantemente, o Brasil ainda tem 59,8% de seu território coberto por florestas naturais, eu acho que continuamos muito bem na foto mundial. Ou deveríamos ter 70/80%, transformando nosso país em santuário natural da humanidade? Bem, tudo no mundo é relativo e cada um tem o direito de defender posições, mesmo que radicais, mas só não pode impô-las à sociedade. Se alguém acha que devemos ter mais do que temos, à luz dos números do SFB, deve defender sua posição com base em tal realidade e não na suposição de que já destruímos tudo. Abrindo um parêntese, e para não ficar em cima do muro, eu não acredito ser viável nenhuma proposta que venha a tornar intocável muito mais do que 50% do nosso território, numa composição entre Biomas, resguardando suas peculiaridades ambientais e suas necessidades socioeconômicas. E os 50% só alcançáveis porque eu aceito que a Amazônia merece um tratamento especial, com índice maior de proteção.
Quando passamos a analisar as situações dos Biomas, vale lembrar, inicialmente, que pela parafernália da legislação atual, eles deveriam ter as seguintes porcentagens de florestas naturais, como reserva legal: 80% na Amazônia, 35% no Cerrado e 20% nos outros quatro. Se imaginarmos, agora: 1) que todas as propriedades rurais brasileiras passem, em pouco tempo e como temem os ambientalistas, a se enquadrarem, por desmembramento, em pequenas (até quatro módulos fiscais), de acordo com a proposta do novo Código e, por isso, possam considerar a soma de APPs com reservas legais; e 2) que mesmo tendo tais possibilidades, elas estão proibidas, pelo novo texto aprovado na Câmara, de desmatar o que já existe. Chegaremos, então, à conclusão que já temos garantidos os 59,8% atuais de florestas naturais. Mas como muitas pequenas propriedades, mesmo que resultantes de desmembramentos, ainda terão que recompor parte de suas faixas ciliares e se adequarem, também, às exigências dos Biomas Cerrado e Pampa, que estão com percentuais menores do que os exigidos (Quadro 1), a tendência, portanto, é de futuro aumento das florestas naturais.
Aí estão os números oficiais, analisados sob os conceitos do antigo Código Florestal e do novo texto em andamento. Gostaria que pessoas contrárias às reformas viessem analisar estes dados dentro de suas visões e diversas da minha. Estou pronto para uma discussão em torno deles. As pessoas poderão até mesmo contestar os dados apresentados, apontando os erros ao SFB. Há na mídia a reprodução de dados muito diferentes, saídos não sei de que fontes. Talvez procedentes de meras especulações, do ouvir dizer etc.
Gostaria, finalmente, de deixar algumas dúvidas referentes a afirmações que tenho visto em artigos, depoimentos, manifestos, notas técnicas e outras formas de manifestação, sobre o seguinte:
1) Quanto à necessidade de recompor apenas 15 metros de área ciliar de cada lado de curso d’água de até 10 metros de largura (mas se já houver 30 metros, eles terão que ser mantidos). Não entendo, portanto, quando vejo muitas afirmações de que isso irá provocar desmatamento, pois o que vejo é o possível aumento das áreas florestadas. Ou estou errado? Onde está o meu erro? Quais as fontes que têm fornecido os números de 22 e até de 70 milhões de hectares que serão desmatados com a aplicação das novas regras propostas para as áreas ciliares?
2) Quanto à soma de APPS com reserva legal. O texto em andamento prescreve manter a situação atual consolidada, mas proíbe cortar florestas já existentes, ou seja, se uma pequena propriedade, no Cerrado, ao somar o que tem protegido encontrar mais do que 35%, mesmo assim estará proibida de cortar a floreta natural existente. Ou não é isso que está escrito lá? Onde tal princípio irá aumentar o desmatamento?
3) Se trabalharmos os dados do quadro, de maneira a deixar a Amazônia com 80% de área protegida e a Mata Atlântica com 20%, corrigirmos o déficit do Cerrado e do Pampa e conservarmos os valores para a Caatinga e o Pantanal, teremos 487,9 milhões de hectares, representando 57,3% do nosso território. Se, além disso, optarmos por conservar os atuais 26,8% da Mata Atlântica, chegaremos a 58,2% do território brasileiro. Precisamos de mais do que isso? Já não estaremos dando um ótimo exemplo para o mundo? Quais as justificativas reais para querermos mais do que 58/59%, isentas de emoção ou de viés apenas ambiental?
4) Por fim, há uma imagem estrangeira, principalmente na Europa, resultante de informações passadas por pessoas e organizações brasileiras ou aqui radicadas, de que o país está tomado por plantações de eucalipto. Aproveitando a publicação do SFB, ela traz, também, a informação de que as floretas plantadas ocupam apenas 0,8% do território nacional. De onde vem, então, a falsa percepção levada ao estrangeiro?
Este artigo é uma tentativa de trazer a discussão para os números reais, pois sinto que não tem havido esse interesse. Temos ficado num certo mundo virtual, exigindo (não propondo) a implantação de um modelo ambiental perfeito, que é um sonho difícil de ser sonhado. O mundo real é o mundo do possível e a conservação ambiental tem outros apelos fora das exigências legais, pois já existem muitas tecnologias de uso racional disponíveis e um corpo de profissionais competentes para novos desenvolvimentos e inovações.

* Engenheiro florestal, professor titular, aposentado, da Universidade Federal de Viçosa e especialista em hidrologia e manejo de pequenas bacias hidrográficas.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

A educacao no Brasil nao corre nenhum risco de melhorar... ao contrario, so pode piorar, e da pior forma possivel...

A educação no Brasil é a própria lei de Murphy: o que tiver de dar errado, vai dar, e da pior forma possível.
Por isso, eu sempre digo: sou moderadamente pessimista quanto ao itinerário da economia no Brasil. Acho que vamos continuar crescendo pouco e de forma medíocre, ou seja, sem muita inovação e com distorções se acumulando progressivamente, à medida que o Estado pretende fazer bondades para industriais amigos do rei (com o nosso dinheiro, claro).
Mas eu sou ABSOLUTAMENTE pessimista quanto aos caminhos da educação, já que acho que o que é ruim vai continuar piorando, da pior forma possível.
Para melhorar os péssimos indicadores de educação que exibimos hoje, seria preciso que as pessoas -- sobretudo as novas saúvas do MEC, as pedagogas freireanas -- tivessem consciência do que está errado e começassem a reformar essas coisas agora haver alguma chance de melhora dentro de 10 ou 15 anos. Como isso não ocorre, eu continuo a dizer: não há nenhuma chance de melhorar; ao contrário, só pode continuar piorando, para maior desgraça das crianças pobres e remediadas (aliás até dos ricos, já que os professores de escolas privadas e públicas não são muito diferentes, e foram formados pelas mesmas saúvas malucas que pululam por aí nos últimos 40 anos).
Desculpem, mas isso não é um ataque de pessimismo repentino. Isto é uma manifestação absolutamente realista sobre a ruindade da nossa educação, que se estende do pré-primário à pós-graduação.
O Brasil está se atrasando mentalmente, e a mediocrização do ensino é uma realidade palpável, em todos os níveis, em todos os lugares...
Paulo Roberto de Almeida

Outra disciplina no ensino básico
Editorial - O Estado de S.Paulo
16 de junho de 2011

Em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado, o representante do Conselho Nacional de Educação (CNE), Raimundo Feitosa, anunciou que o órgão está estudando a inclusão no currículo do ensino básico, a partir de 2012, de uma disciplina sobre direitos humanos. A proposta é prevista pelo polêmico Programa Nacional de Direitos Humanos, lançado em 2009 pelo governo Lula, e tem por objetivo disseminar valores escolares "livres de preconceitos sociais e raciais, violência, abuso sexual e intimidação".

Para facilitar a elaboração e a implementação dos contornos da nova disciplina, a Secretaria Nacional de Direitos Humanos encomendou a uma organização não governamental pernambucana - o Gabinete Jurídico de Apoio às Organizações Populares - um panorama do ensino de direitos humanos no País feito a partir de levantamentos nas 5.565 Secretarias Municipais da Educação. Iniciado em fevereiro, o trabalho deverá estar concluído em setembro e, segundo as estimativas de seus coordenadores, os princípios básicos de direitos humanos já estariam sendo ensinados em 40% dos municípios.

Se for aprovada pelo Congresso, essa será a quinta disciplina incluída no currículo do ensino médio nos últimos anos. As demais são filosofia, sociologia, música e espanhol. Quase todas foram introduzidas com apoio de movimentos sociais, ONGs e entidades corporativas, sob a justificativa de que tornam as aulas mais atrativas e ajudam na formação intelectual e cívica das crianças e adolescentes.

Para a maioria dos pedagogos, no entanto, a introdução dessas disciplinas não passa de modismo político e pedagógico. Segundo eles, quanto mais "inchado" for o currículo do ensino básico, mais o ensino das matérias consideradas fundamentais - português, matemática, ciências, história e geografia - é prejudicado. Como a carga horária não é elástica, para que novas disciplinas sejam oferecidas é preciso diminuir o número de aulas das matérias já existentes. Além disso, o número excessivo de disciplinas de desigual importância tende a tornar dispersivas as atividades em sala de aula e a sobrecarregar os professores - o que piora a já baixa qualidade da rede escolar pública.

Determinada mais por iniciativas políticas do que por critérios pedagógicos, a ampliação do número de disciplinas do ensino básico também dificulta a gestão escolar e compromete o planejamento educacional. Como não há professores especializados em número suficiente para lecionar as novas disciplinas, as escolas - principalmente as da rede pública - precisam improvisar, recorrendo a docentes de outras áreas do conhecimento, que vão lecionar matérias que não dominam.

Esse expediente está agravando o problema do déficit de professores das disciplinas tradicionais, especialmente de física, química, biologia e matemática, nas quais a situação é crítica. Há cerca de dois anos, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), vinculado ao Ministério da Educação, divulgou um levantamento que mostrava a necessidade de contratação de mais de 23,5 mil docentes de física e de química somente para as três séries do ensino médio. O quadro era tão grave que os conselheiros da Câmara de Ensino Básico do Conselho Nacional de Educação pediram medidas emergenciais - como o aproveitamento de estudantes universitários para suprir a carência nas áreas onde o déficit de professores é maior e concessão de incentivos para que os professores aposentados voltassem a lecionar. Em 2007, os conselheiros do CNE já haviam advertido para o risco de um "apagão escolar", caso o governo federal não investisse na expansão dos cursos de licenciatura dessas disciplinas e adotasse uma política de valorização docente, para estimular os formandos a ingressar no magistério público.

Se a qualidade do ensino fundamental e do ensino médio já é ruim, a introdução atabalhoada de novas disciplinas pode piorá-la ainda mais.

Na Bolivia, a realidade supera a ficcao (e como!: as nossas custas...)

Imagino que os roteiristas de cinema e os escritores de novelas tenham muita criatividade, sobretudo em nossos países, onde nada parece impossível não acontecer, por vezes das maneiras mais malucas que se poderia esperar.
Mas creio que a Bolívia supera a imaginação de qualquer escritor surrealista, já que lá é o próprio governo que comete loucuras.
Se fosse um dramalhão mexicano, ou uma novela indiana, não seria tão maluco.

A trapaça boliviana
Editorial - O Estado de S.Paulo
14 de junho de 2011

Contando, como sempre, com a passividade dos países vizinhos, o presidente da Bolívia, Evo Morales, inventou uma forma surrealista de aumentar a arrecadação de impostos. Decreto promulgado em La Paz na semana passada premia com a legalização os ladrões e receptadores de veículos sem documentação que circulam naquele país, se pagarem um tributo especial no prazo de 15 dias. Com isso, estima-se que o governo boliviano poderá arrecadar o equivalente a R$ 320 milhões. Bem a seu estilo populista-confiscatório, Evo Morales justificou a medida como um benefício para os mais pobres, pois "todos têm direito a ter seu próprio carro". Trata-se de um claro incentivo à criminalidade, que não pode passar sem protesto por parte do Brasil, de onde provém a imensa maioria dos carros e caminhões furtados ou roubados.

Veículos roubados em todo o País, quando não são recuperados pela Polícia, vão para o desmanche de peças ou acabam na Bolívia ou no Paraguai. A ação policial nessa área está longe de ser satisfatória. Segundo cálculos da Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados (Fenaseg), 377.250 veículos foram furtados no Brasil em 2010, sendo resgatados 47%, ou 176.381. Com isso, milhares de cidadãos são prejudicados, alguns deles, como os caminhoneiros, perdendo o seu meio de subsistência. Além disso, as indenizações que as seguradoras devem pagar estão em contínuo crescimento. Preocupada, a Fenaseg encaminhou ofício ao Itamaraty salientando que a decisão tomada pelo governo boliviano representa uma ameaça à segurança pública, contribuindo para o aumento da violência, já que equivale a um salvo-conduto para veículos roubados em outros países.

Informa-se que os governos do Brasil, Chile, Paraguai e Peru vão enviar listas de veículos roubados para evitar que sejam legalizados. Mas isso pouco ou nada valerá. Os veículos contrabandeados não têm a placa original e os ladrões raspam os números de identificação dos chassis. Na realidade, as autoridades policiais preveem que o contrabando aumente a curto e longo prazos. Nos últimos dias, notícias vindas da Bolívia dão conta de que cresceu o fluxo ilegal de carros para o país vizinho provenientes do Brasil e do Chile. A expectativa é de que, com o precedente aberto, o governo de La Paz promova, de tempos em tempos, outros festivais de legalização de veículos roubados para cobrir rombos nos cofres públicos. A alegação do governo boliviano de que, depois dessa "anistia", agirá com mais rigor contra o contrabando de carros não passa de desculpa esfarrapada.

O roubo e contrabando de carros está estreitamente ligado ao tráfico de drogas e de armas, inclusive o que é comandado de dentro dos presídios, com ramificações em vários Estados. Os veículos funcionam menos como meio de transporte de drogas do que como moeda de troca para aquisição de cocaína.

A situação é particularmente delicada em Mato Grosso, que tem 953 km de fronteira com a Bolívia, sendo 750 km de fronteira seca, em zonas urbanas e rurais. Lá foram registrados 2.568 furtos e 2.030 roubos de veículos em 2010. Além disso, é por Mato Grosso que os carros surripiados em outros Estados atravessam as fronteiras. O comandante do Grupo Especial de Fronteira, que atua em municípios vizinhos à Bolívia, informa que 300 veículos foram recuperados em 2010, mas, se persistir o indulto de Morales aos criminosos, a recuperação de carros será comprometida.

O ato malandro do presidente Evo Morales é contestado em seu próprio país. A oposição pretende recorrer ao Tribunal Supremo de Justiça e motoristas profissionais, que se sentem lesados, prometem greve. Os já frágeis pilares da economia de mercado na Bolívia também serão abalados. Os importadores e revendedores de veículos praticamente não terão mercado. Será extremamente difícil encontrar clientes dispostos a pagar o preço normalmente praticado de um automóvel ou caminhão enquanto existir oferta de carros roubados, vendidos com desconto e, ainda por cima, legalizados.

Uma prova modelo (2): agora veja como você poderia ter respondido...

OK, já respondeu às perguntas do post anterior?
Não trapaceie, dirija-se primeira à janela abaixo e tente responder às perguntas feitas, sem recorrer às respostas que figuram aqui.
Bem, para ajudá-lo a conferir se suas respostas foram as "boas", eu me permito aqui colocar um modelo de como poderiam ter sido as suas respostas.
Paulo Roberto de Almeida

ECONOMIA POLITICA
Prova de Avaliação

Prova Modelo (ou como poderia ser respondida a prova aplicada)

1 – Assinale se Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( F ) Uma crise fiscal numa economia qualquer pode ser precipitada pela constante valorização de sua moeda. Nesse sentido, a grande valorização do Real leva maior número de brasileiros a viajar ao exterior, além de aumentar o volume global das importações, que foram justamente tornadas mais baratas pela valorização do real. Essa situação aumenta o risco iminente de uma crise fiscal.
Justifique sua opção e comente o que sabe sobre a questão fiscal no Brasil:


Cabe em primeiro lugar fazer as necessárias e indispensáveis distinções entre políticas fiscais e políticas cambiais, e entre crises fiscais e crises cambiais.
Toda e qualquer política fiscal tem a ver com as contas públicas: orçamento, déficit público, dívida pública, sistema tributário, etc., e uma crise fiscal envolve necessariamente o acúmulo de déficits orçamentários, crescimento da dívida pública, juros altos e eventual impossibilidade para o governo honrar sua dívida, ou aumentar o risco dos tomadores, por ter de pagar juros muito elevados por uma dívida pública excessiva e incorrer assim num eventual risco de calote (ou de produzir inflação, para diminuir o peso de suas obrigações).
Tudo isso não tem absolutamente nada a ver com problemas cambiais ou uma crise cambial, que sempre é, por definição, uma crise de balanço de pagamentos. A valorização de uma moeda nacional indica que existe maior procura por essa moeda, ou seja, de que o país está atraindo capitais externos. Essa valorização também pode resultar no “sucesso” das suas exportações, que podem ser de alta tecnologia (como Alemanha, Japão, EUA, por exemplo), de simples manufaturas industriais (como a China), ou de produtos primários (petróleo, no caso dos países árabes, agrícolas como o Brasil, etc.). Se um país exporta muito, e tem saldos crescentes na sua balança comercial, ele pode, eventualmente, ter a sua moeda valorizada, mas isso depende também se ele importa muito, ou exporta capitais, como investimento direto no exterior.
O problema da valorização da moeda é que suas exportações – com exceção das commodities, que têm seu preço fixado internacionalmente – ficam mais caras e por isso pouco competitivas. É o que está ocorrendo com o Brasil, que tem diminuição de suas exportações industriais, ainda que as commodities estejam aumentando, em volume e muito mais em valor.
Ora, se algum dia ocorrer uma desvalorização das commodities no plano externo, e se o país não tiver mais nada para exportar, ele entrará em déficit comercial. Isso não é um problema se – como os EUA, a Suíça e outros países ricos – ele tiver outra rendas de serviços ou de investimentos seus no exterior e se ele receber muitos investimentos em seu território para compensar o déficit. Se ele não tiver nenhuma compensação, vai ter de reduzir suas importações para compensar as perdas, e se não o fizer pode entrar em crise de balanço de pagamentos. Se ele não tiver uma moeda aceita internacionalmente (como é o caso dos EUA, que conseguem transferir suas perdas para o mundo simplesmente exportando dinheiro, embora desvalorizando o dólar), esse país vai entrar em crise cambial.
Pode ser a ameaça atual para a economia brasileira, se a China parar de comprar, as commodities se desvalorizarem e se os capitais externos pararem de afluir.
Em qualquer hipótese, a crise cambial NÃO TEM NADA A VER com os problemas internos, de contas públicas desse país. Um país pode ter contas públicas internas perfeitamente em ordem e ainda assim ter uma crise cambial, que tem a ver com suas relações de troca com o mundo, não com a situação de suas contas internas. Inversamente, um país pode ter suas contas internas totalmente desequilibradas e ainda assim ter relações externas perfeitas, sem nenhum déficit ou ameaça de crise. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. A resposta portanto só pode ser esta: FALSA!
Se formos, então. comentar a situação brasileira, a resposta poderia ser mais ou menos esta.
A moeda brasileira está, de fato, valorizada, tanto por causa das constantes desvalorizações do dólar no plano mundial – o que não tem nada a ver com o Brasil, e sim com as relações dos EUA com o mundo; eles estão exportando uma parte de sua crise para os outros países, jogando dólares no mercado internacional, e assim forçando sua baixa, o que tornará suas exportações mais competitivas, assim resolvendo em parte seus problemas de balança comercial, embora encarecendo suas importações, de petróleo e outros produtos que compram fora – como em razão da valorização inédita das commodities no plano internacional, o que traz muitos dólares para o Brasil, que chegam também para serem aplicados internamente, por causa dos juros altos. Isso poderá, se houver reversão, provocar uma crise cambial no futuro, mas não pode ser a causa de uma crise fiscal, que tem outras razões.
As contas públicas brasileiras, apesar de relativamente equilibradas atualmente, apresentam tendência à deterioração, já que o governo gasta sistematicamente mais do que arrecada, produzindo déficit orçamentário nominal, a despeito de produzir um superávit primário (que é a diferença entre receitas e despesas, menos o pagamento dos juros da dívida pública). Todo ano parte dos juros não pagos, por falta de recursos para isso, é incorporado ao total da dívida pública (geralmente interna), que aumenta gradativamente. O ritmo disso pode ser modulado, em função do crescimento do PIB (e portanto das receitas), mas se continuar aumentando como estão, podem apresentar um problema, na medida em que os tomadores de títulos do governo vão exigir juros maiores e com isso aumentarão as obrigações de pagamentos internos do governo. Se houver uma recessão, perda de receitas, desconfiança na economia brasileira, podem ser criadas as condições para uma crise fiscal, que é sempre uma inadimplência do governo em relação a suas obrigações de pagamentos correntes.
O único ponto de contato entre os problemas cambiais e os fiscais está na questão dos juros: se eles forem muito elevados, vão atrair capitais externos que, se por um lado podem financiar o governo, por outro exigem pagamento, e por isso pressionam ainda mais as contas fiscais. Mas a valorização da moeda em si, apenas ela não parece capaz de produzir uma crise fiscal.
Surpreendeu-me, por isso, encontrar tantas respostas indicando ser possível essa crise fiscal por causa da valorização da moeda brasileira. Algumas respostas indicam a valorização como causando inflação, o que justamente é o contrário, pois produtos importados concorrem com os nacionais, evitando que a inflação se acelere. Mesmo que aumente as importações, isso não é capaz de produzir crise fiscal, que só ocorrerá se o governo for muito irresponsável com as contas internas (orçamento e despesas).

2 – Assinale se Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( F ) A China se tornou, desde o início de 2010, o principal parceiro comercial do Brasil, superando os EUA individualmente, e ameaçando tomar o lugar da UE, em bloco. Exportações e importações do Brasil e da China se equiparam, pelos produtos intercambiados (que são da mesma natureza), pelo equilíbrio dos fluxos nas duas direções e também pela dimensão similar das duas economias, que se beneficiam, assim, de uma relação perfeitamente simétrica e amplamente igualitária.
Justifique sua escolha e escreva o que sabe sobre as características das duas economias:


Falso, porque as relações entre o Brasil e a China estão longe de serem simétricas e igualitárias, sendo, ao contrário, caracterizadas por muitas desigualdades. A composição das trocas é perfeitamente inversa: 90% de produtos primários do lado brasileiro, e 90% de manufaturados do lado chinês, com séria concorrência exercida contra os produtos industriais brasileiros. A única coisa verdadeira na questão é que a China se tornou o principal parceiro comercial brasileiro.

3 – Dentre as medidas que um governo pode adotar, em termos de políticas macroeconômicas ou setoriais, para combater a inflação, uma se afigura como NÃO funcional ou NÃO adequada para tal finalidade. Indique a que lhe parece inconveniente para esse fim e comente em seguida:
(a) proibição de empréstimos bancários entre o país em causa e agentes do exterior;
(b) monitoramento dos preços dos produtos e incentivos à limitação de aumentos no setor privado;
(c) aumento da liquidez (meio circulante) no sistema para atender ao crescimento da demanda;
(d) regulamentação do mercado de crédito, para evitar sobre-endividamento dos consumidores;
(e) elevação da taxa de juros de referência e ampliação da proporção de depósitos compulsórios.
Justifique sua opção e fale o que sabe sobre política monetária:


Aumento da liquidez é justamente o ato de inundar a economia de dinheiro, o que é expressamente contrário aos objetivos de controlar a inflação. Todas as outras medidas são tendentes a esse objetivo, ou seja: evitar o excesso de entrada de capitais (que aumentam a oferta de dinheiro interno e obrigam o governo a enxugar uma parte desse dinheiro, emitindo títulos públicos, por exemplo); políticas de seguimento dos preços, para evitar, por exemplo, formação de cartéis e comportamentos monopolistas, sem precisar cair nos antigos congelamentos e tabelamento de preços; regras estritas para a oferta de crédito, reduzindo, por exemplo, os prazos (ou o número de prestações) na compra de bens duráveis (como automóveis e eletrodomésticos); e simplesmente elevar os juros para desaquecer a demanda.
Isso leva, naturalmente a falar de política monetária, como solicitado acima. Política monetária é feita justamente para preservar o valor de compra da moeda e evitar inflação e seu instrumento mais usado é a taxa de juros. Mas o Banco Central, ou as autoridades monetárias, também podem recorrer a outras medidas, como as restrições ao crédito, a elevação dos depósitos compulsórios dos Bancos (o volume dos depósitos à vista que eles não podem usar para novos empréstimos, e que precisa ficar congelado), a proibição ou taxação de empréstimos externos, etc. Ou seja, a única coisa que o governo NÃO PODE fazer, para combater a inflação, é elevar a massa monetária na economia.

4 – O Fundo Monetário Internacional tem, desde Bretton Woods, diversas competências em questões monetárias e financeiras. Indique uma competência que NÃO figura atualmente em seu mandato constitucional, embora possa ter figurado entre as suas funções no passado:
(a) monitoramento da conjuntura econômica dos países e elaboração de relatórios de seguimento;
(b) emissão de moeda escritural (DES/SDR) que pode ser usada em programas de ajuda;
(c) padrão oficial para a paridade das moedas nacionais e controle de suas variações cambiais;
(d) empréstimos emergenciais em caso de desequilíbrios de balanço de pagamentos;
(e) promoção da mais ampla liberalização das transações correntes, com abandono de restrições.
Comente sua opção e diga o que sabe sobre o FMI e suas operações:


O FMI já teve, no passado, competência para administrar taxas de câmbio, ou seja, paridades entre as moedas, mas isso ele perdeu quando o sistema criado em Bretton Woods, em 1944, entrou em crise e foi unilateralmente rompido pelos EUA, em 1971. Desde então, o FMI não tem NENHUMA competência sobre as políticas cambiais dos países e nem indica qualquer regime cambial. Justamente, quando um país tem crise de balanço de pagamentos, que é uma crise cambial, o FMI geralmente recomenda a desvalorização da moeda, o que antes era contido ou até proibido (os países precisavam pedir permissão ao FMI para desvalorizarem suas moedas, teoricamente, pelo menos, embora muitos não o fizessem, e o Brasil até administrava um regime de minidesvalorizações, de 1966 a 1994, que ele abandonou pela referência estável ao dólar, no Plano Real, complementado por uma banda cambial de 1995 a 1999, e desde então com o regime de flutuação.
Todas as outras competências são perfeitamente legítimas e em uso pelo FMI, inclusive o recurso aos Direitos Especiais de Saque para ajuda aos países que tenham, porventura, desequilíbrios de balanço de pagamentos e necessitem empréstimos emergenciais. Ele também administra a liberalização os pagamentos correntes.

5 – Agora uma questão aberta, que você responderá com base no conhecimento adquirido nas aulas e em leituras. O presidente do país – se desejar, você pode escolher um país real, concreto – acaba de lhe designar ministro(a) das Finanças; você quer alcançar os objetivos normalmente esperados em tal função: crescimento sustentado (se possível sustentável), maior oferta de empregos, aumento da renda, maior igualdade social, etc. Quais seriam suas prioridades pessoais e quais mecanismos, medidas e políticas (macro e setoriais) que você utilizaria para atingir seus objetivos e quais eventuais dificuldades existiriam para tal?

Um ministro de Finanças, ou de Economia, qualquer um, tem sempre esses objetivos genéricos descritos acima. Mas ele precisa administrar políticas concretas, macroeconômicas e setoriais, em situações de normalidade ou de crise (externa, ou interna) e por isso precisa estar atento a todos os dados da realidade, armado de boas estatísticas conjunturais e de bons estudos sobre efeitos de políticas econômicas.
Suas políticas na área social podem variar muito, dependendo se o país já tem alta renda, se ele é muito desigual, ou se tem ampla classe média, se os sistemas de saúde e educação são satisfatórios, etc., ou seja, as políticas variam muito e função do país.
Mas, existe um núcleo central de políticas que não variam muito, ou quase nada, independentemente se o país é rico ou pobre, se ele é desigual ou não, nos planos social e regional, se ele é mais ou menos aberto aos intercâmbios internacionais, etc.
Esse núcleo de políticas estão na área monetária e fiscal, e têm a ver com a estabilidade macroeconômica. Qualquer que sejam os demais problemas do país, não pode haver crescimento, ou distribuição de renda, se houver muita instabilidade macroeconômica no país, ou seja, se houver alta inflação, depreciação do poder de compra da moeda, baixos investimentos (em face das incertezas e dos riscos existentes), desvalorização da moeda nacional (porque as pessoas preferem se defender trocando o seu dinheiro por alguma outra moeda mais estável, etc.). Então, o que um ministro econômico tem de fazer em primeiro lugar é preservar a estabilidade básica do sistema, mas não ao custo da estagnação da economia, e sim com crescimento sustentado.
Para haver crescimento sustentado tem de haver estabilidade macroeconômica, que tem a ver com inflação baixa, contas fiscais do governo em ordem (ou seja, equilibradas, ou com um nível de déficit muito baixo, pois o governo pode investir um pouco mais do que arrecada em receitas tributárias, se essas despesas extra forem para investimentos produtivos, e não para gastos correntes), um bom ambiente de negócios para facilitar o investimento privado (o que geralmente quer dizer regras estáveis e baixa tributação, boa infraestrutura de comunicações, transportes, etc.) e certa abertura internacional (pois as boas tecnologias existem dispersas no mundo e é bom aproveitar o que vem de fora). De preferencia, o governo deveria fazer com que os juros fossem os de equilíbrio de mercado, ou seja, nem muito baixos que desestimulem a poupança (e induzam a consumo exagerado) e nem muito altos que desestimulem os investimentos (sobretudo os de longo prazo). A política cambial, da mesma forma, deveria ser neutra, ou seja, a de equilíbrio dos mercados, com o câmbio nem muito alto que estimule muito as importações (e exerça muita concorrência contra produtos nacionais, mas aqui tem de ver também o papel dos tributos internos), nem muito baixo que represente um prêmio para os exportadores que não precisam, assim, realizar ganhos de produtividade para ganhar mercados externos.
Essas são as regras básicas, macroeconômicas, sobre as quais vão se sobrepor todas as demais políticas setoriais que conduzem um país a uma fase de crescimento satisfatório, sustentado (ou seja, constante e regular) e sustentável (ou seja, sem afetar os recursos naturais, produzir poluição, desmatamento, etc.). Essas políticas setoriais são muitas, e podem ser industriais (estimular a inovação, por exemplo, é ter universidades que pesquisem coisas práticas, aplicadas na vida diária e nas linhas de produção das indústrias), fiscais (baixa tributação, sistema tributário simplificado, crédito amplo para investimento, etc.); agrícolas (aqui o melhor a fazer é ter uma agricultura competitiva em bases de mercado, e não com proteção e subsídios, que só distorcem as regras do jogo, mas com crédito e seguro agrícola, medidas de defesa animal e vegetal, sistemas de irrigação, assistência técnica, etc.); tecnológicas (e aqui tem muito a ver com educação de qualidade, com pesquisa de ponta, vínculos empresas-universidades, etc.).
Na parte social, temos medidas diretas e indiretas para trazer prosperidade ao maior número de pessoas. Em primeiro lugar, no plano tributário, seria excelente ter um sistema o menos regressivo possível, ou seja, taxando menos os pobres (que não costumam pagar muito imposto de renda, ou nenhum, mas que podem ser taxados indiretamente, se os bens de primeira necessidade tem muitos impostos), apoiando os impostos sobre o consumo, mas com alíquotas maiores sobre bens supérfluos e de luxo, antes que sobre os insumos básicos da população. Cabe ao governo dar chances iguais a todas as pessoas, independentemente de elas terem nascido ricas ou pobres; para isso, o país precisa ter um sistema de educação pública de qualidade, para fazer com que, do pré-primário ao ensino médio e técnico-profissional, TODOS possam estudar em uma escola de qualidade. Boas universidades públicas também são importantes para um país, mas estas custam caro, muito caro, como tudo o que é de mais alta qualidade, para manter e aperfeiçoar; o razoável seria que as universidades fossem pagas, com bolsas para os que não pudessem pagar (reembolsáveis depois, na vida profissional, para dar chance a outros).
A educação de qualidade é a melhor política de distribuição de renda que um bom governo pode oferecer aos seus cidadãos, pois ela dá chances a que as pessoas disputem bons empregos no mercado, e que os pobres se libertem da assistência pública (que aliás, não deveria existir). A pior política que um mau governo pode oferecer ao seu povo é manter esses imensos programas de assistência pública, que distorcem os mercados laborais e criam um exército de assistidos, que podem ser manipulados para fins políticos. Governos enormes, que criam muitos empregos públicos, geralmente de baixa qualificação, também são uma praga para a sociedade, pois desviam recursos que poderiam ser empregados para consumo dos cidadãos ou investimentos das empresas, apenas para pagar gastos correntes do próprio governo (por razões políticas). Os empregos devem ser oferecidos pelo setor privado, que cria renda e riqueza com base no trabalho individual, sempre com mais alta produtividade do que no setor público, que tende a ser ineficiente e excessivamente burocrático.
As desigualdades sociais podem ser combatidas com educação, infraestrutura de saneamento e atendimento médico preventivo, um sistema tributário progressivo e a maior liberdade de empreendimento possível, pois as pessoas tendem naturalmente a ser criativas, para ficar ricas justamente. Assistência pública deve ser reservada apenas aos efetivamente incapazes de proverem sua subsistência.
Finalmente, um sistema econômico aberto ao mundo – aos intercâmbios comerciais, financeiros, tecnológicos, culturais – sempre será melhor do que países protegidos e fechados aos movimentos de capitais. Competição, externa e interna, é essencial para que um sistema se modernize e se aperfeiçoe.
Resumindo: se você quiser ser um bom ministro da área econômica promova isto:
1) Estabilidade macroeconômica: monetária, cambial, fiscal; regras estáveis, etc.;
2) Competição microeconômica: ambiente regulatório tendente à concorrência empresarial;
3) Boa governança: instituições enxutas, funcionando, Justiça ágil, baixa corrupção, etc.;
4) Alta qualidade dos recursos humanos: boas escolas, universidades competitivas, etc.;
4) Abertura à competição internacional: sem protecionismos, investimentos estrangeiros.
E lembre-se, SEMPRE: quem produz riqueza são os trabalhadores e os empresários, não os governos. Governos muito extensos são uma praga para qualquer país...

Brasília, 15 de Junho de 2011
Professor Paulo Roberto de Almeida

Uma prova modelo (1): tente você responder a estas perguntas...

Abaixo figura uma pequena prova de economia elementar, dessas que poderiam ser aplicadas por qualquer professor iniciante para alunos iniciantes (pelo menos esta é a minha opinião).
Ela não foi feita para cursos de economia, ou seja, não se destina a medir conhecimento e perícia de graduandos de economia, num típico exercício de Economics 101.
Ela foi feita para alunos que não vão ser economistas, e que pretendem apenas ter uma cultura econômica regular, ou seja, aquela que se obtém com a leitura diária dos jornais e revistas de informação.
Tente você também responder a esta prova.
Paulo Roberto de Almeida

ECONOMIA POLITICA
Prova de Avaliação

1 – Assinale se Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( ) Uma crise fiscal numa economia qualquer pode ser precipitada pela constante valorização de sua moeda. Nesse sentido, a grande valorização do Real leva maior número de brasileiros a viajar ao exterior, além de aumentar o volume global das importações, que foram justamente tornadas mais baratas pela valorização do real. Essa situação aumenta o risco iminente de uma crise fiscal.
Justifique sua opção e comente o que sabe sobre a questão fiscal no Brasil:

2 – Assinale se Verdadeiro (V) ou Falso (F):
( ) A China se tornou, desde o início de 2010, o principal parceiro comercial do Brasil, superando os EUA individualmente, e ameaçando tomar o lugar da UE, em bloco. Exportações e importações do Brasil e da China se equiparam, pelos produtos intercambiados (que são da mesma natureza), pelo equilíbrio dos fluxos nas duas direções e também pela dimensão similar das duas economias, que se beneficiam, assim, de uma relação perfeitamente simétrica e amplamente igualitária.
Justifique sua escolha e escreva o que sabe sobre as características das duas economias:

3 – Dentre as medidas que um governo pode adotar, em termos de políticas macroeconômicas ou setoriais, para combater a inflação, uma se afigura como NÃO funcional ou NÃO adequada para tal finalidade. Indique a que lhe parece inconveniente para esse fim e comente em seguida:
(a) proibição de empréstimos bancários entre o país em causa e agentes do exterior;
(b) monitoramento dos preços dos produtos e incentivos à limitação de aumentos no setor privado;
(c) aumento da liquidez (meio circulante) no sistema para atender ao crescimento da demanda;
(d) regulamentação do mercado de crédito, para evitar sobre-endividamento dos consumidores;
(e) elevação da taxa de juros de referência e ampliação da proporção de depósitos compulsórios.
Justifique sua opção e fale o que sabe sobre política monetária:

4 – O Fundo Monetário Internacional tem, desde Bretton Woods, diversas competências em questões monetárias e financeiras. Indique uma competência que NÃO figura atualmente em seu mandato constitucional, embora possa ter figurado entre as suas funções no passado:
(a) monitoramento da conjuntura econômica dos países e elaboração de relatórios de seguimento;
(b) emissão de moeda escritural (DES/SDR) que pode ser usada em programas de ajuda;
(c) padrão oficial para a paridade das moedas nacionais e controle de suas variações cambiais;
(d) empréstimos emergenciais em caso de desequilíbrios de balanço de pagamentos;
(e) promoção da mais ampla liberalização das transações correntes, com abandono de restrições.
Comente sua opção e diga o que sabe sobre o FMI e suas operações:

5 – Agora uma questão aberta, que você responderá com base no conhecimento adquirido nas aulas e em leituras. O presidente do país – se desejar, você pode escolher um país real, concreto – acaba de lhe designar ministro(a) das Finanças; você quer alcançar os objetivos normalmente esperados em tal função: crescimento sustentado (se possível sustentável), maior oferta de empregos, aumento da renda, maior igualdade social, etc. Quais seriam suas prioridades pessoais e quais mecanismos, medidas e políticas (macro e setoriais) que você utilizaria para atingir seus objetivos e quais eventuais dificuldades existiriam para tal?

Brasília, 15 de Junho de 2011
Professor Paulo Roberto de Almeida

Mercosul 20 anos: revista Universitas - artigo Paulo Roberto de Almeida

Acabo de receber o aviso de que a revista Universitas - Relações Internacionais, do programa de relações internacionais do Uniceub, acaba de publicar um número especial sobre os 20 anos do Mercosul, cujo sumário reproduzo abaixo.
Meu artigo pode ser visto neste link.
A revista pode ser vista na integralidade neste link.

Universitas: Relações Internacionais, Vol. 9, No 1 (2011)

Sumário
Artigos
A incorporação das normativas mercosulinas e as constituições dos estados-partes: o desafio das superações da normatividade estatal 10.5102/uri.v9i1.1347
Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha
Seria o Mercosul reversível? Especulações teóricas sobre trajetórias alternativas concretas10.5102/uri.v9i1.1360
Paulo Roberto de Almeida
A Construção da Defesa da Concorrência no Mercosul 10.5102/uri.v9i1.1357
Luiz Rodolfo Cruz e Creuz
As relações exteriores do mercosul: análise das negociações com a união européia10.5102/uri.v9i1.1359
Jamile Bergamaschine Mata Diz, Roberto de Almeida Luquini Luquini
L’influence de la Cour de Justice de l’Union européenne dans le projet constitutif d’une Cour de Justice pour le Mercosud 10.5102/uri.v91.1370
Paula Wojcikiewicz Almeida
Cronologia Analítica das Relações Externas do MERCOSUL 10.5102/uri.v9i1.1376
Marco Antônio Alcântara Nascimento
Parlamento do Mercosul: formação, características e desafios 10.5102/uri.v9i1.1377
Pedro Araújo Pietrafesa
Itaipu: uma entidade sui generis 10.5102/uri.v9i1.1378
Leopoldo Faiad da Cunha
A sul-americanidade da política externa brasileira no governo de Fernando Henrique Cardoso10.5102/uri.v9i1.1379
Tamara Gregol de Farias
A opção intergovernamental do Mercosul e a reforma do Protocolo de Ouro Preto10.5102/uri.v9i1.1382
Maria Claudia Drummond
Paradigmas da atuação brasileira no mercosul 10.5102/uri.v9i1.1375
Elisa de Sousa Ribeiro, Felipe Pinchemel Cotrim dos Santos
A teoria dos jogos e o mercosul 10.5102/uri.v9i1.1387
Romeu Costa Ribeiro Bastos
Estratégias mercadológicas de empresas transnacionais em um mercado global marcado por diferentes níveis de desenvolvimento das nações: um estudo de caso da the coca-cola company10.5102/uri.v9i1.1339
Luciana Cantuária Lôbo, Selma Carvalho

Ensaios
O caso dos pneus perante a OMC e o Mercosul 10.5102/uri.v9i1.1361
Adriana Macena Silva Savio
As Fronteiras no âmbito do MERCOSUL: apontamentos sobre a formação da agenda política de integração fronteiriça 10.5102/uri.v9i1.1368
Renata de S. Furtado
A questão da triangulação tributaria no mercosul 10.5102/uri.v9i1.1371
Cristiana Campos Mamede Maia, Vinícius Coelho Ferreira
A atual pouco compreendida política externa brasileira 10.5102/uri.v9i1.1332
Eduardo Rezende
The Middle East – A [very] Cautious Evaluation 10.5102/uri.v9i1.1391
Ely Karmon
A lex mercatoria e sua aplicação no mundo contemporâneo 10.5102/uri.v9i1.1338
Erick Vidigal
O Brasil e a não-indiferença à crise haitiana: solidariedade ou retórica do discurso?10.5102/uri.v9i1.1388
Renata de Melo Rosa, Amanda Sanches Daltro de Carvalho

Contribuição Discente
O futuro MERCOSUL 10.5102/uri.v9i1.1373
Cristiana Campos Mamede Maia, Caroline Debatin Bastos
Tarifa externa comum - TEC: estrutura, definição e histórico de mudanças 10.5102/uri.v9i1.1374
Rafael Battella de Siqueira, Ariane Costa Guimarães
__._,_.___

Mercosul 20 anos: revista Universitas - artigo Paulo Roberto de Almeida

Acabo de receber o aviso de que a revista Universitas - Relações Internacionais, do programa de relações internacionais do Uniceub, acaba de publicar um número especial sobre os 20 anos do Mercosul, cujo sumário reproduzo abaixo.
Meu artigo pode ser visto neste link.

Universitas: Relações Internacionais, Vol. 9, No 1 (2011)

Sumário
Artigos
A incorporação das normativas mercosulinas e as constituições dos estados-partes: o desafio das superações da normatividade estatal 10.5102/uri.v9i1.1347
Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha
Seria o Mercosul reversível? Especulações teóricas sobre trajetórias alternativas concretas10.5102/uri.v9i1.1360
Paulo Roberto de Almeida
A Construção da Defesa da Concorrência no Mercosul 10.5102/uri.v9i1.1357
Luiz Rodolfo Cruz e Creuz
As relações exteriores do mercosul: análise das negociações com a união européia10.5102/uri.v9i1.1359
Jamile Bergamaschine Mata Diz, Roberto de Almeida Luquini Luquini
L’influence de la Cour de Justice de l’Union européenne dans le projet constitutif d’une Cour de Justice pour le Mercosud 10.5102/uri.v91.1370
Paula Wojcikiewicz Almeida
Cronologia Analítica das Relações Externas do MERCOSUL 10.5102/uri.v9i1.1376
Marco Antônio Alcântara Nascimento
Parlamento do Mercosul: formação, características e desafios 10.5102/uri.v9i1.1377
Pedro Araújo Pietrafesa
Itaipu: uma entidade sui generis 10.5102/uri.v9i1.1378
Leopoldo Faiad da Cunha
A sul-americanidade da política externa brasileira no governo de Fernando Henrique Cardoso10.5102/uri.v9i1.1379
Tamara Gregol de Farias
A opção intergovernamental do Mercosul e a reforma do Protocolo de Ouro Preto10.5102/uri.v9i1.1382
Maria Claudia Drummond
Paradigmas da atuação brasileira no mercosul 10.5102/uri.v9i1.1375
Elisa de Sousa Ribeiro, Felipe Pinchemel Cotrim dos Santos
A teoria dos jogos e o mercosul 10.5102/uri.v9i1.1387
Romeu Costa Ribeiro Bastos
Estratégias mercadológicas de empresas transnacionais em um mercado global marcado por diferentes níveis de desenvolvimento das nações: um estudo de caso da the coca-cola company10.5102/uri.v9i1.1339
Luciana Cantuária Lôbo, Selma Carvalho
Ensaios
O caso dos pneus perante a OMC e o Mercosul 10.5102/uri.v9i1.1361
Adriana Macena Silva Savio
As Fronteiras no âmbito do MERCOSUL: apontamentos sobre a formação da agenda política de integração fronteiriça 10.5102/uri.v9i1.1368
Renata de S. Furtado
A questão da triangulação tributaria no mercosul 10.5102/uri.v9i1.1371
Cristiana Campos Mamede Maia, Vinícius Coelho Ferreira
A atual pouco compreendida política externa brasileira 10.5102/uri.v9i1.1332
Eduardo Rezende
The Middle East – A [very] Cautious Evaluation 10.5102/uri.v9i1.1391
Ely Karmon
A lex mercatoria e sua aplicação no mundo contemporâneo 10.5102/uri.v9i1.1338
Erick Vidigal
O Brasil e a não-indiferença à crise haitiana: solidariedade ou retórica do discurso?10.5102/uri.v9i1.1388
Renata de Melo Rosa, Amanda Sanches Daltro de Carvalho
Contribuição Discente
O futuro MERCOSUL 10.5102/uri.v9i1.1373
Cristiana Campos Mamede Maia, Caroline Debatin Bastos
Tarifa externa comum - TEC: estrutura, definição e histórico de mudanças 10.5102/uri.v9i1.1374
Rafael Battella de Siqueira, Ariane Costa Guimarães
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A insustentavel posicao cambial brasileira - Francisco Lopes

A advertência é clara: a atual configuração da política econômica brasileira é insustentável no longo prazo, segundo Chico Lopes, ex-presidente do Banco Central. Segundo ele: "A bolha de acumulação de reservas vai estourar em algum momento entre 2013 e 2015.

Sobre risco cambial, besouros e borboletas
Francisco Lopes
(recebido: 15/06/2011)

A macroeconomia só terá uma configuração sustentável quando a taxa Selic for compatível com o padrão internacional.

É fácil ser otimista sobre a evolução da macroeconomia brasileira no curto prazo. A combinação de juros elevados, taxa de câmbio praticamente estabilizada e menor pressão nos preços internacionais de alimentos e petróleo, reduzirá a inflação em 12 meses do IPCA já a partir de outubro próximo. A inflação de 2012 deverá ficar abaixo de 5%, com a economia mantendo o crescimento na faixa de 4% a 4,5%.

Será, porém, uma vitória de Pirro já que em algum momento ocorrerá uma inevitável correção para cima na cotação do dólar, com alta probabilidade de se transformar numa traumática "parada súbita". A pressão desse ajuste vai trazer de volta a inflação e exigir nova elevação da taxa Selic. Se for um ajuste súbito, haverá também uma freada no crescimento.

A atual configuração da política econômica brasileira é insustentável no longo prazo. Forte crescimento com apreciação cambial no contexto de uma economia mundial com expansão moderada produz inexorável deterioração do balanço de pagamentos. Em algum momento, teremos que interromper o crescimento e ajustar a taxa de câmbio. Com o agravante de que, a despeito do aumento do déficit em transações correntes, a acumulação de reservas internacionais também ganhou velocidade vertiginosa, algo como US$ 100 bilhões por ano. Isso configura uma autêntica "bolha especulativa" que poderá ter graves consequências quando estourar.

"A bolha de acumulação de reservas vai estourar em algum momento entre 2013 e 2015."

O Brasil, ao contrário da China, não acumula reservas internacionais porque produz superávit nas transações de bens e serviços com o exterior. No nosso caso, a acumulação de reservas resulta apenas do ingresso de capital estrangeiro e, nos últimos doze meses, apenas 20% desse movimento consistiu em aporte direto de capital para empresas, isto é, em ingresso com uma motivação nitidamente de longo prazo. O resto, incluindo aplicações em ações, renda fixa e os empréstimos intercompanhias (que o Banco Central imprecisamente classifica como investimento direto) são certamente ingressos com motivação mais de curto prazo e de natureza bem mais volátil.

O que faz esse capital estrangeiro ter tanta gana de vir para o Brasil? O Banco Central anuncia oficialmente que o regime cambial é de livre flutuação e que só opera no mercado de câmbio para "reduzir a volatilidade". Na prática, nas condições atuais, isso significa que a cotação do dólar fica estável ou realiza um movimento de queda gradual. O que temos então é um verdadeiro paraíso para o especulador estrangeiro que pode facilmente se beneficiar do diferencial nas taxas de juros. Não é uma possibilidade de arbitragem perfeita, como ficou claro em 2008, mas é uma bela oportunidade de ganho com risco reduzido. Como o Brasil ainda não aboliu o forte efeito motivador da possibilidade de arbitragem (mesmo imperfeita) sobre o movimento de capitais, o resultado é o ingresso maciço que estamos observando.

Esse movimento adquire todas as características de uma bolha especulativa quando começa a gerar um mecanismo de retroalimentação. Quanto mais capital entra tanto maior é a pressão de baixa sobre a cotação do dólar e tanto maior a garantia de que o Banco Central vai continuar aplicando sua política de redução da volatilidade para produzir estabilidade ou apreciação gradual. Isto, por sua vez, torna ainda mais atraente o ingresso de capital para arbitrar juros. Na realidade para o especulador a apreciação em si não é importante. Seu ganho principal resulta do diferencial entre as taxas de juros e para isso só é necessário que não ocorra uma desvalorização significativa da taxa de câmbio.

O resultado é a anomalia de um mercado cambial em que tipicamente apenas o Banco Central e os importadores atuam na ponta compradora, com todos os demais operam como vendedores. Isso não resulta apenas da atuação de especuladores profissionais. Considere, por exemplo, o processo de decisão do diretor financeiro de uma grande multinacional que administra o caixa da empresa dentro de uma perspectiva global. Naturalmente vai querer ficar credor no Brasil, ganhando remuneração superior a 12% ao ano e devedor em outros países com custo financeiro muito menor. Isto significa que vai operar como vendedor no mercado cambial brasileiro. Curiosamente esse executivo vai ficar ofendido se lhe disserem que está operando como especulador: afinal, para ele, está apenas fazendo o seu trabalho de administração do caixa. O espaço aqui não me permite citar diversos outros casos concretos que confirmam a natureza especulativa da bolha que se desenvolve agora no nosso mercado de câmbio. Todo mundo enxerga uma possibilidade de ganho aparentemente fácil e quer tirar uma casquinha.

"Controlar a entrada de capital pode simplesmente antecipar o momento de ruptura da bolha."

Bolhas especulativas são fenômenos complexos que não entendemos bem, mas com certeza sabemos que sempre evoluem para o colapso. Nosso palpite é que essa nossa bolha de acumulação de reservas vai estourar em algum momento entre 2013 e 2015. É impossível saber o momento exato e a sequência exata dos eventos na ruptura, apenas sabemos que ela se tornará mais provável quando o mercado de câmbio transitar da atual posição de excesso permanente de oferta para uma posição de equilíbrio ou de excesso de demanda. Isto inevitavelmente vai resultar da deterioração continuada do déficit no balanço de pagamentos em transações correntes.

Na ruptura, os primeiros a sair tipicamente são os especuladores profissionais. A eliminação do excesso de oferta tira o Banco Central do papel de disciplinador do movimento de apreciação e tende a aumentar a volatilidade do mercado. O especulador sabe que nosso regime de livre flutuação na prática tem sido um regime de flutuação amortecida assimétrica, isto é, a atuação do governo no mercado de câmbio é muito mais decidida para evitar apreciações do que para evitar depreciações. A maior volatilidade do câmbio torna menos favorável a relação risco-retorno e induz o especulador a reduzir sua posição vendida na moeda brasileira. Esse ajuste é muito facilitado pela dimensão do nosso mercado de derivativos de dólar, que é inusitadamente grande para uma economia emergente. A grande liquidez desse mercado torna muito fácil travar qualquer posição vendida em dólar, e isso vale tanto para os especuladores profissionais como para qualquer empresa ou investidor.

Como em todo colapso de bolha, o movimento pode ser iniciado por um pequeno grupo de profissionais, mas depois se alastra rapidamente e ganha amplitude e intensidade. O resultado é uma forte e rápida depreciação da taxa de câmbio.

Idealmente o Banco Central pode tentar administrar esse ajuste, produzindo uma transição lenta e suave da taxa de câmbio para o novo patamar sustentável de equilíbrio e dessa forma evitando o "overshooting" característico dos colapsos de bolha. Para isso terá que operar com determinação e intensidade na ponta vendedora tanto no mercado de dólar à vista como no mercado de derivativos através de futuros e swaps. Naturalmente, a venda de dólar num mercado cambial em movimento de alta produzirá prejuízo para o erário público, mas isso será mais do que compensado pelos benefícios de se evitar a parada súbita.

De fato uma das poucas coisas que o governo pode fazer agora diante da perspectiva de um inevitável ajuste cambial no futuro é preparar seus planos de contingência para uma operação desse tipo, isto é de amortecimento da desvalorização.

Em particular, tanto o Banco Central como outras áreas mais politizadas do governo têm que estar psicologicamente preparadas para entregar aos "malditos especuladores" o botim resultante de suas operações cambiais no país, sendo que isso poderá significar a perda de um grande e imprevisível volume de reservas internacionais (metade das reservas, por exemplo?).

É importante entender, porém, que não existem alternativas viáveis de controle de capitais para escapar de uma bolha que já se instalou e se desenvolve a pleno vapor. A introdução de controles sobre a entrada de capital, como tem sido tentado recentemente, apenas bloqueia alguns canais de entrada e redireciona o movimento para outros canais. Por outro lado uma aplicação muito ampla desses controles pode simplesmente antecipar o momento de ruptura da bolha. A alternativa de controles sobre a saída de capital poderá parecer tentadora quando a bolha começar a estourar, mas ela nunca é eficaz se adotada em apenas um segmento do mercado. Ou seja, a opção de controle sobre a saída de capitais é na realidade uma opção pela centralização total do câmbio, o que seria um lamentável retrocesso na política econômica brasileira.

Será possível promover uma saída ordenada da bolha e um ajuste gradual da taxa de câmbio? Temos que torcer que sim, mas qualquer operador com experiência em mercados especulativos provavelmente dirá que não. Ou seja, é bom estar preparado para um comportamento do mercado de câmbio semelhante ao que ocorreu em 2008 (ou mesmo 2003), desta vez possivelmente com ainda maior overshooting em virtude dos grandes montantes envolvidos.

É interessante notar que 2008 foi uma oportunidade perdida para se obter uma nova configuração sustentável para nossa macroeconomia. A crise mundial produziu forte desvalorização cambial e o Banco Central reagiu corretamente baixando a Selic de 13,75% ao final de 2008 para 8,75% em junho de 2009, uma redução de 5 pontos percentuais. Na realidade, porém, essa redução resultou muito tímida, principalmente considerando que no mesmo período o banco central americano também se moveu na mesma direção. Como a taxa do Federal Reserve (Fed, banco central americano) caiu de 5,25% em meados de 2007 para praticamente zero ao final de 2008, a redução da Selic foi inferior à do juro americano.

A cotação do dólar voltou a cair rapidamente e em outubro de 2009 já tinha voltado para próximo de R$ 1,70, praticamente anulando toda a desvalorização anterior. A operação correta naquela ocasião teria sido reduzir a taxa Selic muito mais agressivamente, ainda que ao custo de uma taxa de inflação um pouco maior num período transitório.

Não é nossa intenção aqui fazer uma crítica à atuação do BC no contexto de crise internacional de 2008, já que naquele ambiente de incerteza não seria fácil adotar uma tática de atuação muito diferente de seu padrão tradicional. Devemos lembrar também que algumas das pré-condições necessárias para uma redução mais agressiva da taxa de juros não estavam presentes, entre elas a eliminação do piso imposto pela regra atual de remuneração da caderneta de poupança. Na realidade, como sugeri no artigo "A Estabilização Incompleta", do livro Novos Dilemas da Política Econômica (editado por Edmar Bacha e Mônica Bolle, LTC 2011), o trabalho de construção do arcabouço institucional necessário para a consolidação da estabilidade ainda está longe de concluído.

Essas considerações nos levam ao que parece ser a questão central. Só vamos ter uma configuração sustentável de nossa macroeconomia quando a taxa Selic for compatível com o padrão internacional, admitindo-se um pequeno prêmio de risco. Isso seria talvez algo como 3% a 4% ao ano agora, e algo como 6% a 7% quando a taxa de juros do Fed voltar para o patamar de 4% a 5% daqui a alguns anos. Essas taxas de juros poderiam ser ainda menores com uma meta de inflação menor.

Um nível "normal" de taxa de juros é pré-condição para que possamos adotar uma verdadeira flutuação cambial, com o governo se abstendo de qualquer interferência no mercado de câmbio. Só então vamos descobrir qual é realmente a taxa de câmbio de equilíbrio da nossa economia, e só então o regime de metas de inflação poderá operar da forma como foi teoricamente desenhado para operar, produzindo uma trajetória de crescimento econômico sustentável com inflação controlada.

Para evitar mal entendido quero enfatizar que sou totalmente favorável à ideia do tripé estabilizador, composto por austeridade fiscal, flutuação cambial e regime de metas de inflação. As vantagens do tripé, introduzido ainda no governo FHC, são inequívocas. Sabemos que funciona muito bem nos países desenvolvidos que o adotam, como Suécia ou Inglaterra.

No Brasil, porém, o tripé estabilizador é meio de mentirinha. Teoricamente existe flutuação cambial, mas na prática o movimento da taxa de câmbio é inibido pela intervenção rotineira do Banco Central. Por outro lado, nosso principal instrumento de política monetária, a taxa Selic, tem impacto muito reduzido sobre o nível de atividade e a inflação. A austeridade fiscal existe mais no discurso do que na prática. Ou seja, o regime se apresenta como de metas de inflação, mas alguns de seus pressupostos básicos não estão presentes.

Um comentário final sobre o título deste artigo. A evolução atual da macroeconomia brasileira me faz lembrar o voo de um besouro. A primeira vista a aerodinâmica do besouro não devia permitir que voasse, não obstante ele é capaz de voos curtos. São voos deselegantes que mais parecem sequências de saltos. Certamente um besouro não tem a capacidade de voo de uma borboleta. Muitos analistas quando discutem nossa macroeconomia parecem acreditar que estão analisando uma borboleta, com toda sua beleza e complexas piruetas. Não se pode negar que são elegantes e divertidos os debates sobre a delicada calibragem da taxa Selic, os ciclos de ajuste e relaxamento da política monetária, o papel das medidas macroprudenciais, a coordenação das políticas monetária e fiscal, o impacto do "dólar index" sobre a taxa de câmbio real-dólar e tudo mais. Os analistas parecem esquecer, porém, que as importantes deformidades que ainda existem em nossa economia nos permitem no máximo pensar em um voo de besouro. Infelizmente um besouro voador não se transforma automaticamente numa aerodinâmica borboleta. É fundamental ter em mente que o trabalho de construção das precondições institucionais para a consolidação da estabilidade ainda está longe de concluído e, na verdade, avançou muito pouco nos governos petistas. Isto ficará novamente claro na próxima crise cambial.

O autor agradece os comentários de Edmar Bacha, sem naturalmente implicá-lo em suas heterodoxias.
Francisco Lopes é sócio principal da consultoria Macrométrica

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Comentários do economisa Ricardo Bergamini:

O que o Chico Lopes escreveu abaixo venho demonstrado de longa data:

1) Mesmo com o saldo de reservas de US$ 288,6 bilhões o Brasil está no limite da crise cambial em função do déficit nas transações correntes.

2) O Brasil está sendo financiado pelos investimentos externos em função dos juros altos, não pelo seu comércio exterior. Qualquer susto do mercado financeiro a explosão será inevitável.

3) O atual governo terá que resolver a difícil dicotomia da política externa brasileira, qual seja: juros altos atraem investimentos externos que valorizam o real, diminuindo a competição dos produtos brasileiros no exterior, e consequentemente aumentando os déficits nas transações correntes.

Deficit fiscal do Brasil maior do que anunciado oficialmente

Era o que eu desconfiava, sem poder afirmar expressamente por falta de dados ou de metodologia adequada, mas podia-se perceber uma nítida deterioração nas contas públicas brasileiras e um intenso movimento (heterodoxo) do governo em esconder esse fato, maquiando a contabilidade das transferências do Tesouro a bancos públicos.
Paulo Roberto de Almeida

Estatística subestima deficit público, diz ex-presidente do BC
GUSTAVO PATU
Folha de S.Paulo, 15 de junho de 2011

Rombo em contas é maior quando usados os mesmos critérios de países desenvolvidos

BRASÍLIA - A real dimensão do desequilíbrio das contas do governo é mascarada pela metodologia adotada no país para apurar o deficit público, diz estudo assinado pelo economista Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central no governo FHC.
Se calculado por critérios do mundo desenvolvido, o deficit de União, Estados e municípios chegaria no ano passado ao equivalente a 12% do PIB, segundo o trabalho. As estatísticas oficiais apontam deficit modesto, de 2,55% do PIB, em 2010.
O estudo -uma versão preliminar, ressalva o autor- foi preparado para o seminário "A taxa de juros no Brasil", promovido anteontem em São Paulo pelo CLP (Centro de Liderança Pública) e pela Casa do Saber.
Franco associa a anomalia dos juros brasileiros, desde os anos 90 entre os mais altos do mundo, a um desequilíbrio nas contas públicas, que passa despercebido porque a contabilidade nacional considera as despesas com juros, mas não amortizações da dívida pública.
As amortizações estão fora da conta desde os tempos da superinflação, quando o governo tinha de trocar diariamente os títulos de sua dívida. Como a compra de um papel equivale contabilmente a uma amortização, a prática inflava e distorcia os números do deficit.
Para o economista, a metodologia que escolheu é "imperfeita e enviesada como de resto todas são", mas chama a atenção para o problema dos prazos ainda muito curtos da dívida pública.
"Os governos preferem versões adocicadas dos problemas que realmente têm e relutam em reconhecê-los em sua verdadeira dimensão. Sem esse reconhecimento, porém, prevalece a noção de que não há nada a fazer nesse terreno."
Entre os cinco debatedores do seminário -Franco, André Lara Resende, também da equipe do Plano Real, Luiz Gonzaga Belluzzo, da Unicamp, Yoshiaki Nakano, da FGV, e Samuel Pessoa, da consultoria Tendências- houve quase consenso em atribuir os juros recordes do país à fragilidade fiscal.
Se houve convergência no diagnóstico, os presentes não pareceram confiantes na viabilidade política das alternativas de tratamento.
Belluzzo defendeu que o governo busque um superavit nominal. Hoje só há superavit primário, ou seja, sem considerar os encargos com juros da dívida.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Seminario Cindes: Agenda internacional e Brasil

Participei, na sexta-feira 10 de junho do seminário em comemoração aos 5 anos do Cindes:

A agenda econômica internacional do Brasil – desafios para os próximos anos

cujo programa, acompanhado das apresentações segue abaixo.
Cada uma delas pode ser visualizada a partir deste link.

Programa - A agenda econômica internacional do Brasil – desafios para os próximos anos

Apresentação PPT- Dinâmica das Potências Climáticas, Governança Global e Transição para o Baixo Carbono
por Eduardo Viola, Jun 2011
Apresentação PPT - The Global Shift in Wealth
por Régis Avanthay, Jun 2011
Apresentação PPT - A agenda econômica internacional em transformação e o Brasil
por Paulo Roberto de Almeida, Jun 2011
Apresentação PPT - Índia (e China): Oportunidades, Lições e Desafios para o Brasil
por Mauricio Mesquita Moreira, Jun 2011
Apresentação PPT - Large Devaluations, Foreign Direct Investment and Exports
por Daniel Lederman, Jun 2011
Apresentação PPT - A agenda econômica internacional do Brasil
por José Roberto Mendonça de Barros, Jun 2011
Apresentação PPT - Indicadores de rentabilidade e desempenho das exportações de manufaturados
por Roberto Iglesias, Jun 2011

Os debates, infelizmente não transcritos, foram mais estimulantes ainda.
Alguns participantes apreciariam minha colocação sobre as novas saúvas do Brasil, as pedagogas freireanas concentradas no MEC que estão destruindo a educação no Brasil.

Paulo Roberto de Almeida

A China ainda pode fracassar - Martin Wolf

Um século atrás, o Brasil tinha uma renda per capita que era aproximadamente 12% da renda per capita dos americanos, ao passo que os argentinos exibiam mais de 70% dessa proporção. Depois de termos alcançado cerca de um quarto daquela renda, na fase de maior crescimento, recuamos hoje para menos de 20%, enquanto os argentinos recuaram absoluta e relativamente, caindo para cerca de 30% da renda per capita dos americanos, ou seja, um fracasso rotundo, ao passo que nosso "sucesso" foi muito modesto.
Desde o século 18, a China passou de maior economia mundial (33% do PIB global, mas é verdade que pouco disso realizado no comércio internacional), para menos de 5% do PIB, no auge dos delírios econômicos maoistas, que aliás foram responsáveis por uma mortandade pavorosa de dezenas de milhões de pessoas.
A China cresce espetacularmente a cerca de 10% do PIB e mais de 8% per capita anual, desde os anos 1980, o que JAMAIS foi visto na história econômica mundial, e que jamais será visto novamente por qualquer outro país. Com isso, a China saiu de uma miséria execrável para uma pobreza aceitável, mas com muita desigualdade também: ilhas de abundância e de luxo, e muitos camponeses pobres, ainda. Em todo caso, ela parece ter conseguido fazer o seu "dever de casa", ainda que com traços autoritários que não merecem ser imitados por nenhum outro país, com desrespeito dos direitos humanos, censura total e autocracia política que, felizmente, evoluiu do totalitarismo comunista para um autoritarismo monopolístico sem muita ideologia aparente.
Desejamos sucesso aos chineses, e sobretudo que eles possam sair da autocracia do PCC para um regime aberto e pluralístico, com vigência total das liberdades democráticas.
Paulo Roberto de Almeida

Como a China ainda pode fracassar
Martin Wolf
Valor Econômico, 15/06/2011 (Financial Times)
Plano prevê desaceleração do crescimento para apenas 7% por ano.

Até 1990, o Japão era a grande economia mais bem-sucedida do mundo. Quase ninguém previa o que aconteceria ao país nas décadas seguintes. Hoje, as pessoas mostram-se ainda mais assombradas com os feitos da China. É concebível que esse colosso possa descobrir que êxitos espetaculares sejam precursores de fracassos surpreendentes? A resposta é "sim".

O Produto Interno Bruto (PIB) do Japão per capita (pela paridade do poder de compra), que em 1950 era de 20% do verificado nos Estados Unidos, saltou para 90% em 1990. Essa convergência espetacular, porém, passou a andar para trás: em 2010, o PIB per capita japonês havia caído para 76% do registrado nos EUA. O PIB per capita na China passou de 3% do americano em 1978, quando Deng Xiaoping iniciou a "reforma e abertura", para 20% do verificado nos EUA de hoje. Será que o país prosseguirá de forma tão impressionante nas próximas décadas ou será que a China, também, surpreenderá com uma queda?

É fácil apresentar argumentos otimistas. Primeiro, a China tem histórico comprovado de sucesso, com taxa de crescimento médio da economia de 10% entre 1979 e 2010. Segundo, a China está muito distante dos padrões de vida dos países de alta renda. Em relação aos EUA, seu PIB per capita está no ponto em que estava o do Japão em 1950, antes do que viria a ser um período de 25 anos de crescimento elevado. Se a China igualar o desempenho do Japão, seu PIB per capita será de 70% o dos EUA em 2035 e sua economia será maior que a dos EUA e União Europeia somadas.

Há, entretanto, contra-argumentos. Um é o de que o tamanho da China é uma desvantagem: em particular, torna sua ascensão muito mais dramática para a demanda por recursos do que qualquer coisa já vista antes. Outro é que os efeitos políticos decorrentes de tal transformação podem ser impactantes para um país comandado por um partido comunista. Também é possível propor argumentos puramente econômicos para a ideia de que o crescimento poderia desacelerar-se de forma mais abrupta do que a maioria presume.
É muito difícil para um país investindo metade do PIB desacelerar suavemente. A transição para uma expansão econômica mais lenta será um caminho bastante esburacado. O governo chinês é hábil. Mas não consegue andar sobre as águas.

Tais argumentos apoiam-se em duas características da situação chinesa. A primeira é que é um país de renda média. Economistas admitem, cada vez mais, a "armadilha da renda média". Portanto, é difícil sustentar fortes aumentos na produtividade e administrar grandes mudanças estruturais, à medida que a economia se torna mais sofisticada. Nos últimos 60 anos, Japão, Coreia do Sul, Taiwan, Hong Kong e Cingapura foram praticamente as únicas economias a conseguir o feito nos últimos 60 anos.

O próprio primeiro-ministro da China, Wen Jiabao, descreveu a economia como "instável, desequilibrada, descoordenada e, no fim das contas, insustentável". A natureza do desafio ficou evidente para mim durante as discussões do 12º plano quinquenal do país, no Fórum de Desenvolvimento da China 2011, realizado em Pequim, em março. O novo plano defende uma mudança profunda no ritmo e estrutura do crescimento econômico. Em particular, prevê-se desaceleração do crescimento para apenas 7% por ano. Mais importante, espera-se que a economia se reequilibre em relação ao forte peso dos investimentos, movendo-se mais em direção ao consumo e, em parte como resultado disso, da indústria para o setor de serviços.

Os investimentos de fato cresceram bem mais que o PIB. Entre 2000 e 2010, o crescimento médio da formação bruta de capital fixo, indicador dos investimentos, foi de 13,3%, enquanto o aumento médio do consumo privado foi de 7,8%. Ao longo do mesmo período, a participação do consumo privado no PIB caiu de 46% para menos 34%, enquanto a dos investimentos subiu de 34% para 46%.

O professor Michael Pettis, da Guanghua School of Management, da Universidade de Pequim argumenta que a supressão dos salários, a imensa expansão do crédito barato e taxa de câmbio reprimida foram formas de transferir renda das famílias para as empresas e, subsequentemente, do consumo ao investimento. Dwight Perkins, de Harvard, argumentou no Fórum de Desenvolvimento da China que o volume de capital necessário por unidade adicional do PIB (Icor, na sigla em inglês) subiu de uma relação de 3,7 para 1 na década de 90, a uma de 4,25 para 1 na de 2000. Isso também indica que os retornos vêm diminuindo.

Se o padrão de crescimento for revertido, como deseja o governo, a expansão dos investimentos precisa ser menor que a do PIB. É o que ocorreu no Japão nos anos 90, com resultados sombrios. A tese proposta pelo professor Pettis é que uma estratégia de investimentos forçados normalmente acabará com um golpe. A questão é quando. Na China, isso pode ocorrer antes, dentro do processo de crescimento, do que no Japão, porque os investimentos são altos demais. Grande parte dos investimentos agora em andamento será deficitária sem um suporte artificial, argumenta. Um indicador, sugere, é o forte crescimento do crédito. George Magnus, do UBS, também destacou no "Financial Times", em 3 de maio, que a intensidade de crédito no crescimento chinês aumentou acentuadamente. Isso também lembra o Japão do fim dos anos 80, quando a tentativa de sustentar o crescimento em uma demanda doméstica que era puxada pelos investimentos levou a uma expansão de crédito destrutiva.

À medida que o crescimento desacelerar, a demanda por investimentos certamente encolherá. Com uma expansão de 7%, a taxa necessária de investimentos poderia cair para até 15% do PIB. Mas a tentativa de transferir renda para as famílias poderia forçar a um declínio ainda maior. De motor de crescimento, o investimento poderia tornar-se fonte de estagnação.

A visão otimista é que o crescimento potencial da China é tão grande que o país pode administrar a transição planejada com tranquilidade. A visão pessimista é que é muito difícil para um país investindo metade do PIB desacelerar suavemente. Suponho que a transição para uma expansão econômica mais lenta e para uma maior dependência em relação ao consumo será um caminho bastante esburacado. O governo chinês é hábil. Mas não consegue andar sobre as águas. As águas pelas quais terá de andar na próxima década serão bem agitadas. Cuidado com as ondas.

Martin Wolf é editor e principal comentarista econômico do FT

Grupo de inteligencia antidumping: uma contradicao nos termos?

A rigor, grupo e inteligência me parecem um pouco antinômicos, mas digamos que pessoas podem ser inteligentes conjuntamente, o que é teoricamente possível, mas raro na prática.
Agora, aplicados os procedimentos a comércio exterior, o resultado só pode ser desinteligência e protecionismo, pois dificilmente alguém, nesse grupo, baterá no peito para dizer:

"Eu sou a favor do livre-comércio, da concorrência irrestrita, da abertura unilateral".

Acho que ainda não nasceu o louco capaz de dizer isso, e se nasceu, não está certamente no governo, e se estiver, vai ficar quieto.
Em suma, acho que vem mais protecionismo por aí.
Brasileiras e brasileiros: vocês vão começar a pagar mais caro por certos bens, estejam certos disso. Não foi por falta de aviso meu...
Paulo Roberto de Almeida

Grupo combaterá dumping e importações fraudulentas
Luciana Otoni e Marta Watanabe
Valor Econômico, 15/06/2011

De Brasília e São Paulo - O governo federal vai criar até o fim do mês um grupo de inteligência antidumping que terá por alvos preferenciais as importações suspeitas de preços fraudulentos e de adulteração de origem. Integrado por representantes do Ministério do Desenvolvimento e da Receita Federal, o grupo também atuará com o suporte de informações aos diferentes órgãos federais ligados ao comércio exterior, como Ministério da Agricultura, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Inmetro. A proposta é criar uma plataforma de dados para auxiliar o Ministério do Desenvolvimento e a Receita na identificação e combate às importações suspeitas de dumping.

O grupo também terá por atribuição auxiliar os setores mais expostos à concorrência externa a apresentar ao governo pedidos consistentes de abertura de investigação para adoção de medidas antidumping. Em outra frente, atuará para fazer com que o governo acelere a abertura e a conclusão de investigações sobre casos de circunvenção - operações que tentam contornar barreiras antidumping por meio da adulteração do país de origem das mercadorias.

O setor têxtil é, ao lado do de calçados, um dos alvos das importações irregulares feitas por adulteração de origem. Em maio, o Ministério do Desenvolvimento abriu a primeira investigação de circunvenção para apurar denúncias relacionadas à importação de cobertores de fibras sintéticas. Desde abril de 2010, os cobertores fabricados na China estão submetidos a sobretaxa de US$ 5,22 por quilo.

As medidas antidumping provocam também a estocagem de produtos assim que a investigação é iniciada. De 11 investigações em curso, abertas em 2010, em seis delas - panelas de inox, tubos de aço, papel cuchê leve, laminados planos, vidros incolores e sal grosso - houve aumento no valor importado. O movimento de antecipação de compras nesses casos foi detectado pelo Ministério do Desenvolvimento, que colocou sob licença prévia de importação os itens submetidos a investigação. Outra arma eficaz, diz Tatiana Prazeres, secretária de Comércio Exterior, é intensificar o uso do direito antidumping provisório - a aplicação da penalidade antes da conclusão do processo.

Estudantes de RI: estagios na OMA e na OMC

O desafio das parcerias acadêmicas com a OMA e a OMC
LEONARDO CORREIA LIMA MACEDO *
Aduaneiras, 14 Junho 2011
Blog Direito Aduaneiro e Comércio Exterior

Os Acordos, Convenções e demais instrumentos existentes na Organização Mundial do Comércio (OMC) e na Organização Mundial de Aduanas (OMA) trazem à tona importantes questões para os estudantes e profissionais brasileiros: Qual o perfil dos cursos de comércio exterior e relações internacionais para o mercado de trabalho? Como os estudantes e profissionais podem adquirir tais conhecimentos? Como funcionam as parcerias ofertadas por esses organismos?

A discussão das parcerias acadêmicas com os organismos internacionais é oportuna, pois, apesar do excelente nível das instituições brasileiras, o País carece de representação nas iniciativas acadêmicas existentes em ambos os organismos multilaterais.

A OMA tem buscado uma maior aproximação com o setor acadêmico por intermédio do Programa de Parcerias para a Pesquisa e Desenvolvimento Acadêmico Aduaneiro (Picard), criado em 2006 para estabelecer um marco de cooperação entre as Aduanas e a comunidade acadêmica.

Graças ao Picard foi estabelecida a Rede Internacional de Universidades Aduaneiras (INCU). A rede conta com a adesão de mais de 50 centros e publica regularmente o Jornal Mundial da Aduana (World Customs Journal).

Uma conquista importante do Picard foi a definição de um padrão profissional com o conjunto de disciplinas e assuntos de interesse para a área aduaneira. As instituições aptas a ministrar cursos em conformidade com as normas curriculares do Picard podem se candidatar para o reconhecimento da OMA. As Universidades de Canberra, Lausanne, Leeds, Münster e a Universidade Técnica de Riga fizeram progressos diversos nessa direção. O padrão profissional deveria ser analisado para adoção no Brasil.

O Picard realizou com sucesso sua conferência de 2010 em Abu Dhabi. A conferência reuniu profissionais e acadêmicos interessados na matéria aduaneira para discutir os seguintes temas: a colaboração Aduanas-Empresas, as ferramentas para mensuração dos processos aduaneiros, a arrecadação de impostos aduaneiros e as implicações das mudanças climáticas na gestão aduaneira.

Nessa mesma linha, a OMC promove o programa Chairs cujo objetivo é apoiar instituições de ensino e pesquisadores, em especial de países em desenvolvimento, na realização de cursos, pesquisas e outras atividades relacionadas aos temas do comércio internacional. Para receber o apoio do programa foi instituída uma seleção. Na primeira fase do programa foram selecionados 14 centros de ensino pertencentes, dentre outros, aos seguintes países: Argentina, China, Chile, Indonésia e Rússia.

Apesar de direcionado às instituições acadêmicas de países em desenvolvimento, o programa também é aberto a instituições de países desenvolvidos, particularmente àquelas que cooperam estreitamente com países em desenvolvimento.

Os selecionados pelo Chairs são convidados a assumir a liderança na preparação de eventos, discussão de temas e estabelecimento de parcerias com outros centros. Em contrapartida, a OMC passa a fornecer o suporte necessário para a discussão dos temas, inclusive com o envio de representantes. A médio e longo prazo os participantes devem adquirir os conhecimentos necessários para liderar outras discussões inseridas no contexto da governança global, economia internacional e direito do comércio internacional.

Além do programa Chairs, outras atividades, tais como a organização de seminários regionais para professores, a organização de atividades acadêmicas nacionais, o suporte a bibliotecas, o apoio a programas de estudo de doutorado e o apoio a pesquisadores visitantes, fazem parte do programa de assistência técnica e fortalecimento de capacidades da OMC.

Mesmo as instituições mais conservadoras devem admitir que a dimensão internacional é de grande importância para o reconhecimento acadêmico. E que existe um amplo espaço para o crescimento na área. O desafio das parcerias está ao alcance de todas as instituições universitárias e pode ajudar a comunidade acadêmica a ampliar seus horizontes.

Para tanto, o primeiro desafio é tomar conhecimento dos programas disponíveis e direcionar esforços de forma a harmonizar os cursos e pesquisas com os padrões dos organismos multilaterais de maior interesse para a instituição. As instituições do futuro precisam ser localmente relevantes e globalmente engajadas. A tarefa deverá render bons frutos a todos.

* Auditor-Fiscal, Oficial Técnico da Organização Mundial de Aduanas (OMA), facilitador da Organização Mundial de Comércio (OMC) e autor do livro: Direito Tributário no Comércio Internacional.

E por falar em censura...: Brasil esconde fatos históricos...

Na verdade, eu pessoalmente considero toda essa conversa em torno da guerra do Paraguai e de supostos documentos diplomáticos sensíveis uma balela e uma desculpa esfarrapada, a começar pelo fato de que nenhum -- repito NENHUM - dos que se utilizam desse argumento saberia explicitar o que exatamente se está protegendo, em relação a quais fatos do passado e quais países, exatamente.
Tudo isso é um subterfúgio para evitar a transparência sobre fatos muito presentes ainda na memória dos brasileiros, ocorridos menos de uma geração atrás...
Paulo Roberto de Almeida

Presidente Dilma, anote o nome deles!
Luiz Cláudio Cunha*
Congresso em Foco, 14/06/2011

"A presidente deveria respeitar mais sua própria história, bem mais exemplar do que a de seus dois oblíquos aliados e antecessores. Dilma combateu de armas na mão o regime militar que Collor e Sarney apoiaram sem peias, nem meias medidas"

Presidente Dilma, que coisa feia, hein?

Resistiu bravamente à pressão do ex-presidente Lula e agora está sucumbindo vergonhosamente à pressão combinada dos ex-presidentes Fernando Collor e José Sarney.

Semana passada, apesar do bafo salvador de Lula, que carimbou Antônio Palocci como “o Pelé da Economia”, Dilma defenestrou o poderoso ministro-chefe do Gabinete Civil, aquele que caiu no governo passado por estuprar o sigilo do caseiro e que voltou a cair neste governo pela comovente defesa da virgindade de seu próprio sigilo.

Esta semana começa com Dilma se dispondo a manter o abjeto ‘sigilo eterno’ (sic) sobre documentos oficiais, uma ignomínia que atravessou incólume os 16 anos de governo somados do sociólogo FHC e do metalúrgico Lula, uma dupla que garantia ter um pé na cozinha da esquerda mais consciente.

Presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Fernando Collor sentou em cima do projeto original de Dilma, que quebrava a eternidade do sigilo e permitia o máximo de 50 anos de segredo.

“É temerário”, repudiou o senador das Alagoas, alegando “constrangimentos diplomáticos” para fatos como a ditadura militar (1964-1985), o Estado Novo getulista (1937-1945) e até a Guerra do Paraguai (1864-1870), episódio este ocorrido há século e meio e que levou à morte 50 mil brasileiros.

Presidente do Senado Federal, José Sarney vem agora em socorro de seu temerário sucessor no Palácio do Planalto, alegando que segredos eternos evitariam lesões nas relações diplomáticas do Brasil com seus vizinhos.

“Documentos que fazem parte de nossa história diplomática, que tenham articulações como Rio Branco teve que fazer muitas vezes, não podem ser revelados, senão vamos abrir feridas”, explicou, sem explicar nada, o cuidadoso Sarney, que nasceu 18 anos após o falecimento do Barão do Rio Branco (1845-1912).

Diante da curiosidade geral, cabe a pergunta: que feridas, cara-pálida?

O que poderia sangrar tanto nossa diplomacia? Que bobagens teria cometido o bom barão, o homem que redesenhou nossas fronteiras, para merecer esta santa proteção do bem informado Sarney?

Dias atrás Sarney expurgou da exposição oficial do ‘túnel do tempo’ do Senado o glorioso impeachment de Collor — o único afastamento legal de um presidente em 122 anos de República —, relegado por seu solidário colega de sigilo como um simples ‘incidente’, talvez uma ferida a ser escondida.

É sempre bom lembrar que, dentro de 48 dias, completam-se dois anos em que o jornal O Estado de S.Paulo vive sob a censura patrocinada pela família Sarney, que deseja um sigilo eterno para as estripulias do filho do senador, Fernando, indiciado na (agora secreta) ‘Operação Boi-Barrica’ da Polícia Federal por formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e caixa 2.

Sabemos todos o que teme no presente o senador Sarney, mas ninguém imagina o que no passado pode assustar tanto o senador Collor, que aparenta um personagem bifronte da política brasileira.

Na tribuna, com voz grave e empostada, porte ereto e ternos sem vinco que parecem recém saídos da lavanderia, Collor pode ser confundido com um lorde inglês desavindo num parlamento qualquer ao sul do Equador. De repente, porém, Collor pode perder a compostura, o palavreado e a elegância para revelar seu lado mais tosco, mais agreste, mais indecoroso.

Como fez em 2009, quando ganhou a imortalidade dos anais para um fétido discurso, no plenário do Senado, onde confessava que estava ‘obrando, obrando e obrando” na cabeça de um colunista da revista Veja. Como fez em 2010, quando ameaçou enfiar a mão na cara de um repórter da IstoÉ, num telefonema gravado onde o polido senador distinguia o jornalista como “filho da puta”.

Sabemos todos o que são Sarney e Collor. O que não se sabe, porém, é o que pretende Dilma Rousseff ao capitular diante de argumentos tão pífios de uma dupla de ex-presidentes tão contestados por episódios tão polêmicos no passado e no presente.

Dilma fez muito bem ao seu governo ao se livrar, em boa hora, de Palocci. Dilma faz muito mal à sua biografia ao se render tão facilmente aos desígnios pouco claros de Collor e Sarney.

A presidente da República deveria respeitar mais sua própria história, bem mais exemplar do que a de seus dois oblíquos aliados e antecessores. Dilma combateu de armas na mão o regime militar que Collor e Sarney, no verdor da idade e no fervor da utilidade, apoiaram sem peias, nem meias medidas.

Um foi jovem da ARENA, outro foi cacique da velha ARENA. Dilma foi ao limite do sangue para combater essa gente e aquele regime.

Agora mesmo, 39 documentos sustentam uma ação civil pública na 4ª Vara Cível de São Paulo contra três oficiais do Exército e um da PM paulista, integrantes da Operação Bandeirante (OBAN), mãe do DOI-CODI da rua Tutóia, símbolo maior da repressão da regime.

O grupo é acusado pela morte de seis presos políticos e pela tortura em outros 20. Um dos acusados pelo suplício é o tenente-coronel reformado do Exército Maurício Lopes Lima, uma das presas torturadas é uma guerrilheira de 22 anos da VAR-Palmares chamada Dilma Rousseff.

Com o cinismo típico de sua turma, o coronel Lopes Lima deu uma entrevista, em novembro passado, logo após a eleição de Dilma: “Se eu soubesse naquela época (1970) que ela seria presidente, eu teria pedido – ‘Anota aí meu nome, eu sou bonzinho’”, admitiu ao jornal Tribuna de Santos.

O coronel teve o seu nome anotado pela história, como queria, mas com certeza não era bonzinho — apesar da fantasia de pacato veranista que hoje desfila nas águas mansas da praia das Astúrias, no Guarujá do litoral paulista, onde vive.

O frade dominicano Tito de Alencar Lima, o Frei Tito, sobreviveu a terríveis torturas no DOPS do delegado Fleury. O que restava dele foi levado ao DOI-CODI do coronel Lopes Lima, que o deixou sob o trato de seis homens de sua equipe e do inefável pau-de-arara. No seu depoimento, frei Tito contou: “O capitão Maurício veio me buscar em companhia de dois policiais: ‘Você agora vai conhecer a sucursal do inferno’, ele me disse”.

Meses depois, cada vez mais atormentado pelos fantasmas da tortura, frei Tito foi para o exílio e acabou se enforcando numa árvore de um mosteiro nos arredores de Lyon, França, em 1974, um mês antes de completar 30 anos.

Agora, com a candura dos impunes, o coronel que teve seu nome anotado por Dilma e frei Tito reconhece: “Tortura no Brasil era a coisa mais corriqueira que tinha. Toda delegacia tinha seu pau-de-arara. Dizer que não houve tortura é mentira, mas dizer que todo delegado torturava também é mentira. Dependia da índole”.

Dilma conhecia bem a índole da turma do capitão Lopes Lima, que ela mesma impugnou como testemunha de acusação no seu processo da Justiça Militar: “O capitão é torturador e, portanto, não pode ser testemunha”, alegou Dilma, com lógica exemplar e o nome do bonzinho Lopes Lima devidamente anotado.

Apesar da natureza de seu algoz, Dilma sobreviveu a 22 dias de tortura e superou o trauma da dor. Quatro décadas e uma ditadura depois, em vez de escalar os galhos do balouçante desespero de Tito, Dilma subiu a rampa do Planalto como primeira mulher eleita presidente sobre o chão sólido da democracia.

Os homens que machucaram e atormentaram gente como Tito e Dilma eram simpatizantes, aliados, partidários e defensores do regime sustentado pela ARENA de gente como Sarney e Collor.

Entende-se, claramente, porque Sarney e Collor defendem o sigilo eterno.

O que não se entende, presidente Dilma, é como a senhora possa estar ao lado dessa gente, depois de tudo o que a senhora fez, depois de tudo o que eles fizeram.

Os nomes deles, presidente Dilma, estão todos anotados.

Sarney e Collor, presidente, não eram bonzinhos. Nunca foram.

Por favor, anote aí!

*Luiz Cláudio Cunha é jornalista.