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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 10 de agosto de 2024

Surprise Attack in Kursk - Mick Ryan (Futura Doctrina)

Surprise Attack in Kursk

How Did Ukraine Surprise Russia…Again?

Ukrainian soldiers of the 61st Brigade at the Gazprom offices in Sudzha, Russia. Image: Twitter / X

Surprise lies at the foundation of all undertakings without exception, only in very different degrees according to the nature of the undertaking and other circumstances. Clausewitz, On War, Book 3, Chapter IX

As a principle of war surprise is a combat multiplier that amplifies the effects of the other principles of war. Its effective use allows friendly units to strike at a time and place or in a manner that the enemy is unprepared for, which induces shock and causes hesitation.  US Army Tactics Manual 2023

The past few days in Ukraine have demonstrated, yet again, how surprise plays a major role in human competition and conflict. Regardless of the many technological developments which might inform or speed up decision-making in military and national security endeavours, surprise is an enduring feature of war.

Achieving surprise means that one can execute a plan that is unexpected by the enemy. Whether achieved through physical or virtual approaches, surprise generates a cognitive effect in one’s adversary. This feeling of perplexity, shock, and uncertainty in individuals as well as in teams, is designed by those seeking to achieve surprise to undermine an enemy’s cohesion and morale.

Soldiers, citizens and politicians have been surprised, consistently, over thousands of years of history. The writings of ancient historians such as Thucydides, Polybius, and Herodotus contain examples of nations or city states achieving victory by employing surprise, ruses and deception.

British military officer and military theorist J.F.C. Fuller wrote extensively on surprise as one of his most important principles of war.  In his 1926 book, The Foundations of the Science of War, Fuller described surprise as having mental, moral and/or physical dimensions. He wrote in The Foundations of the Science of Warthat:

In war, surprise is omnipresent, wherever man is there lurks the possibility of surprise. If he wishes to understand war, (he) must examine the nature of surprise in its thousand and one forms. Surprise should be regarded as the soul of every operation.” 

In the past century, surprise (or at least the attempt at surprise) was foundational in the operations of the belligerents in all major wars. Pearl Harbor, Korea, the Arab attacks on Israel in 1973, the 9/11 attacks on America and the 7 October 2023 Hamas attacks on southern Israel feature examples of the successful achievement of surprise in modern conflict.

Surprising the opponent is an important method of seizing the initiative on the battlefield or at the strategic level. But the impacts of surprise are transient. As such, exploitation must be executed quickly against surprised – and shocked – enemy forces before they can regain coherency in their command and control and respond effectively. Military operations demand not just one but a succession of surprises. As the Russians are discovering, with their reinforcement convoys being ambushed on the way to Kursk, the initial surprise attack is just the first of a series of compounding surprises at the different levels of war.

The aim of this article is to explore surprise in modern war, in particular, the role it has played during the war in Ukraine since 2022. Importantly, I explore here just how the Ukrainians were able to deceive the Russians in the lead up to the Kursk operation this week and achieve such a stunning military surprise.

Ditaduras de esquerda, de direita, autocracias no mundo - Augusto de Franco

A EXTREMA-DIREITA ESTÁ GOVERNANDO QUANTOS REGIMES DITATORIAIS NO MUNDO DE HOJE?

Augusto de Franco, 10/08/2024

Vamos pegar cerca de 40 regimes ditatoriais atuais para mostrar que é falsa essa conversa de que a extrema-direita (os regimes populistas-autoritários, iliberais) é a única (ou principal) ameaça à democracia. Adicionalmente, o levantamento abaixo mostra como é impotente em termos analíticos o esquema interpretativo direita x esquerda.

1 Azerbaijão | Ilham Aliev e seu Partido Novo Azerbaijão orbitam na esfera de influência da ditadura russa. Mas não podem ser classificados como extrema-direita.

2 Barein| Salman bin Hamad bin Isa Al Khalifa é o primeiro-ministro do Barein, uma monarquia islâmica sem partidos. O regime não pode ser classificado como de esquerda ou de direita.

3 Bielorrússia | Aleksandr Lukashenko e seu Partido Independente da Bielorússia não são de extrema-direita. O regime da Bielorrússia  faz parte do eixo autocrático (Rússia, China, Coreia do Norte, Irã etc.) articulado contra as democracias liberais.

4 Burkina Faso | Ibrahim Traoré e seu Movimento Patriótico para a Salvaguarda e Restauração (a junta militar que governa o país depois de um golpe de Estado de 2022) não podem ser classificados como direita ou esquerda.

5 Camboja | Hun Sen – um ex-comandante do Khmer Vermelho que mudou de lado – que governa o Camboja há quatro décadas, e o seu Partido Popular do Camboja, alinharam a sua ditadura à ditadura chinesa. Obviamente, não são de extrema-direita.

6 Catar | Mohammed bin Abdul Rahman Al Thani é uma monarquia absolutista islâmica. Não tem partidos. A família Al Thani governa o país com mão de ferro desde 1825. Não tem o menor sentido classificar esse regime como extrema-direita. Aliás, o Catar dá abrigo à direção atual do Hamas e financia esse grupo terrorista.

7 Chade | Mahamat Déby é o chefe da junta militar que governa o Chade. Ele e seu Movimento de Salvação Patriótica estão sendo capturados pela ditadura russa de Vladimir Putin. Tal como no caso da Rússia, não faz sentido classificá-los como direita ou esquerda.

8 China | Xi Jinping e seu Partido Comunista da China não são de extrema-direita. Eles se declaram de esquerda. E o nome e a história do partido estão dizendo por quê. A China também está no BRICS, uma articulação política de autocratas e populistas de esquerda disfarçada de bloco econômico.

9 Coreia do Norte | Kim Jong-un e seu Partido dos Trabalhadores da Coreia não são de extrema-direita.Eles se declaram de esquerda. E o nome e a história do partido estão dizendo por quê.

10 Cuba | Díaz-Canel e seu Partido Comunista de Cuba não são de extrema-direita. Eles se declaram de esquerda. E o nome e a história do partido estão dizendo por quê.

11 El Salvador | Nayib Bukele e seu partido Nuevas Ideas são nacional-populistas ou populistas-autoritários que podem, sim, ser classificados como de extrema-direita. Antes Bukele integrou a FMLN, Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional, de extrema-esquerda.

12 Emirados Árabes Unidos | Xeique Mohammed bin Rashid Al Maktoum é um monarca absolutista de uma ditadura islâmica (sunita). Como em outros casos de regimes autoritários islâmicos não faz muito sentido classificá-lo como de direita ou de esquerda. Mas os EAU estão no BRICS, uma articulação política de autocratas e populistas de esquerda disfarçada de bloco econômico.

13 Eritreia | Isaias Afewerki governa um Estado de partido único na Eritréia. Ainda que não faça muito sentido classificar seu regime totalitário como sendo de direita ou de esquerda, o ditador está na esfera de influência de autocracias (como a Turquia e a Venezuela) e de regimes eleitorais parasitados por governos populistas (como o Brasil).

14 Essuatini | Mswati II (o rei), Ntfombi (a rainha-mãe) e Russell Diamini (o primeiro-ministro) governam essa ditadura africana. Os partidos políticos são proibidos no reino de Essuatini (antiga Suazilândia). Não há política propriamente dita no país. Não faz sentido classificar o regime como de direita ou de esquerda.

15 Gaza | Ismail Haniya (agora morto) e Yahya Sinwar e seu partido, o Hamas, embora de orientação sunita, estão a serviço do regime teocrático xiita iraniano na sua ofensiva contra as democracias liberais (em especial as de Israel e dos EUA). São hoje teleguiados pelo eixo autocrático para fazer o serviço sujo de inflamar as populações contra a democracia. Não podem ser classificados como de extrema-direita, pelo contrário: são apoiados pela esquerda (populista, classista e identitarista) em todo o mundo.

16 Guiné Equatorial | O ditador Teodoro Obiang Nguema Mbasogo e seu Partido Democrático da Guiné Equatorial estão sendo caputurados pela ditadura chinesa. Obviamente não pode ser classificado como de extrema-direita.

17 Haiti | É uma autocracia mergulhada no caos político e social. Não se sabe exatamente quem governa o país.

18 Hungria | Viktor Orbán e seu partido Fidesz governam a autocracia eleitoral húngara, chamada de “democracia iliberal”. Aliadas de Vladimir Putin, as forças políticas dominante na Hungria são, claramente, populistas-autoritárias ou nacional-populistas de extrema-direita.

19 Iémen | O Iémen é um país em guerra civil onde se configura dualidade de poder. Os terroristas Houthis, financiados pelo Irã, controlam parte significativa do país. Mohammed Ali al-Houthi, chefe do comitê revolucionário supremo, é um vassalo do eixo autocrático na sua investida contra as democracias liberais.

20 Irã | Ali Khamenei e seu partido Associação dos Clérigos Combatentes não podem ser considerados de extrema-direita. O Irã faz parte do eixo autocrático (juntamente com Rússia, China, Coreia do Norte – todos autodeclarados de esquerda), articulado contra as democracias liberais. O Irã também está no BRICS, uma articulação política de autocratas e populistas de esquerda disfarçada de bloco econômico.

21 Jordânia | O rei Abdullah II bin Al Hussein controla a monarquia jordaniana de devoção islâmica sunita. Não faz sentido classificar o regime como de extrema-direita.

22 Kuwait | Mishal Al-Ahmad Al-Jaber Al-Sabah é o atual Emir do Kuwait, uma ditadura islâmica. Não faz sentido classificar o regime monárquico como extrema-direita.

23 Laos | Sonexay Siphandone e seu Partido Popular Revolucionário do Laos (PPRL) que governam essa república socialista de partido único estão bem longe de ser de extrema-direita. Pelo contrário, historicamente são de esquerda.

24 Líbia | Mohamed al-Menfi e Abdul Hamid Mohammed al-Dabaib com seu movimento Libya al-Mustakbal tentam controlar o país. É uma ditadura islâmica (sunita). Vários grupos jihadistas e tribais controlam partes do país. Não cabe classificar o regime como extrema-direita.

25 Mali | Choguel Kokalla Maïga e seu Movimento Patriótico pela Renovação governam o país. O Mali está sendo capturado pela ditadura russa (o que também está ocorrendo com Mauritânia e Niger).

26 Marrocos | O rei Maomé VI e o primeiro-ministro Aziz Akhannouch e seu Partido Nacional dos Independentes controlam essa monarquia islâmica.

27 Myanmar | Min Aung Hlaing e seu Partido de Solidariedade e Desenvolvimento da União (USDP), ligado aos militares que desfecharam um golpe de Estado, controlam essa ditadura asiática.

28 Nicarágua | Daniel Ortega e seu partido, a Frente Sandinista de Libertação Nacional, não são de extrema-direita. Eles se declaram de esquerda. E o nome e a história do partido estão dizendo por quê.

29 Omã | Haitham bin Tariq Al Said é o sultão da monarquia absolutista islâmica que governa Omã.

30 Rússia | Vladimir Putin e seu partido Rússia Unida são nacional-populistas, mas não podem ser considerados de extrema-direita. Pela simples razão de que apoiam todas as ditaduras que se declaram de esquerda. A Rússia também está no BRICS, uma articulação política de autocratas e populistas de esquerda disfarçada de bloco econômico.

31 Síria | Bashar al-Assad e seu Partido Socialista Árabe Baath não podem ser considerados de extrema-direita. O regime ditatorial sírio é apoiado ostensivamente pela Rússia e faz parte do eixo autocrático articulado contra as democracias liberais.

32 Somália | Hassan Sheikh Mohamud e seu Partido da União para Paz e Desenvolvimento, anterior Partido Paz e Desenvolvimento (ligado à Irmandade Muçulmana), são operadores de um regime islâmico.

33 Sudão | O general Abdel Fattah al-Burhan e seu partido Independente são islâmicos militarizados.

34 Sudão do Sul | Salva Kiir Mayardit e seu partido Movimento Popular de Libertação do Sudão são aliados da ditadura de Angola, que se declara de esquerda (do MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola). Não podem ser considerados de extrema-direita.

35 Tajiquistão | Emomali Rahmon, Kokhir Rasulzoda e seu Partido Democrático Popular do Tajiquistão são nacionalistas, estatistas e autoritários. Orbitam na área de influência da ditadura russa e se alinham ao Partido Comunista Chinês. Nada, portanto, de extrema-direita.

36 Turquemenistão | Serdar Berdimuhamedow e seu Partido Democrático do Turquemenistão - no poder  há mais de trinta anos – têm profundas raízes comunistas. O partido foi liderado pelo ex-líder do Partido Comunista, Saparmyrat Nyýazow, desde a dissolução da União Soviética. São populistas que orbitam na área de influência da ditadura russa. Nada de direita.

37 Turquia | Recep Tayyip Erdoğan e seu Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP) poderiam, com algum esforço, ser considerados de extrema-direita (ou seja, nacional-populistas ou populistas-autoritários). O AKP é defensor do neo-otomanismo e do nacionalismo econômico. Politicamente, se alinha ao eixo autocrático contra as democracias liberais.

38 Uzbequistão | Shavkat Mirziyayev e seu Partido Liberal Democrático do Uzbequistão são nacionalistas que orbitam na área de influência da ditadura russa. Têm uma ideologia que se poderia considerar de direita na medida em que esposa o liberalismo-econômico, mas não o liberalismo político, quer dizer, a democracia. Esse partido surgiu de um movimento de empreendores e empresários para dar a aparência de multipartidarismo, mas na verdade é controlado pelo Partido Democrático Popular.

39 Venezuela | Nicolás Maduro e seu Partido Socialista Unido da Venezuela não são de extrema-direita. Eles se declaram de esquerda. E o nome e a história do partido estão dizendo por quê.

40 Vietnam | Pham Minh Chính é o chefe do Partido Comunista do Vietnam. Não é necessário dizer que não têm nada de direita. O Vietnam é uma ditadura socialista unitária unipartidária.

CONCLUSÃO | De extrema-direita mesmo (entendendo-se por isso os populistas-autoritários ou nacional-populistas iliberais) temos três governantes de regimes autocráticos: Nayib Bukele (de El Salvador), Viktor Orbán (da Hungria) e Recep Erdoğan (da Turquia).

A EXTREMA-DIREITA NÃO É A ÚNICA (OU PRINCIPAL) AMEAÇA À DEMOCRACIA

Espancando uma mentira da esquerda

1 - De extrema-direita mesmo (entendendo-se por isso os populistas-autoritários ou nacional-populistas iliberais) temos três governantes de regimes autocráticos:

Nayib Bukele (de El Salvador), Viktor Orbán (da Hungria) e Recep Erdoğan (da Turquia).

2 – De esquerda ou extrema-esquerda temos (historicamente ou de forma declarada) sete governantes de regimes autocráticos:

Xi Jinping (da China), Kim Jong-un (da Coreia do Norte), Díaz-Canel (de Cuba), Sonexay Siphandone (do Laos), Daniel Ortega (da Nicarágua), Nicolás Maduro (da Venezuela), Pham Minh Chính (do Vietnam).

3 – Os ditadores na esfera de influência das ditaduras russa e chinesa (ou do eixo autocrático - incluindo o Irã) governam cerca de vinte regimes autocráticos:

Além de todas as sete ditaduras declaradamente de esquerda, temos Ilham Aliev (do Azerbaijão), Aleksandr Lukashenko (da Bielorrússia), Hun Sen (do Camboja), Mahamat Déby (do Chade), Ismail Haniya e Yahya Sinwar (de Gaza), Teodoro Obiang Nguema Mbasogo (da Guiné Equatorial), Choguel Kokalla Maïga (do Mali), Vladimir Putin (da Rússia), Bashar al-Assad (da Síria), Salva Kiir Mayardit (do Sudão do Sul), Emomali Rahmon e Kokhir Rasulzoda (do Tajiquistão), Serdar Berdimuhamedow (do Turquemenistão), Shavkat Mirziyayev (do Uzbequistão).

4 – Os ditadores islâmicos governam cerca de quatorze regimes autocráticos:

Hibatullah Azhundzada (do Afeganistão), Mohammad bin Salman (da Arábia Saudita), Salman bin Hamad bin Isa Al Khalifa (do Barein), Mohammed bin Abdul Rahman Al Thani (do Catar), Xeique Mohammed bin Rashid Al Maktoum (dos Emirados Árabes Unidos), Mohammed Ali al-Houthi (do Iémen), Ali Khamenei (do Irã), Abdullah II bin Al Hussein (da Jordânia), Mishal Al-Ahmad Al-Jaber Al-Sabah (do Kuwait), Mohamed al-Menfi e Abdul Hamid Mohammed al-Dabaib (da Líbia), Maomé VI e Aziz Akhannouch (do Marrocos), Haitham bin Tariq Al Said (de Omã), Hassan Sheikh Mohamud (da Somália), Abdel Fattah al-Burhan (do Sudão).

Note-se que muitos ditadores islâmicos estão na esfera de influência do eixo autocrático e, portanto, são adversários ostensivos das democracias liberais.

5 - Ditaduras não-classificadas:

Burkina Faso, Eritréia, Essuatini, Haiti, Myanmar.

Um esboço de conclusão

O eixo autocrático é tendencialmente de esquerda ou extrema-esquerda e não de extrema-direita, ainda que dele participem regimes ditatoriais dúbios (como o russo) e islâmicos (como a teocracia iraniana, suas ditaduras aliadas, como a Síria e seus braços terroristas no Oriente Médio, na Ásia e na África). Ora, esse eixo, hoje, é a principal ameaça à democracia no mundo e não a chamada “internacional fascista” de extrema-direita (embora essa última também seja uma ameaça, porém menor ou secundária em comparação com a primeira).


Há 50 anos morria Frei Tito, mártir da ditadura - Edison Veiga (DW)

 HISTÓRIA BRASIL

Há 50 anos morria Frei Tito, considerado mártir da ditadura

Deutsche Welle, 10/08/2024

Dominicano, preso e torturado pelo regime, estava exilado na França quando provavelmente buscou a morte. A saga do "frade que leu Marx" se tornou emblemática na luta pelos direitos humanos no Brasil sob ditadura militar.

Frade dominicano cearense, Tito de Alencar Lima morreu aos 28 anos, não conseguindo conviver com o trauma das sevícias sofridas nas mãos da ditadura militar.

Depois que o frade dominicano Tito de Alencar Lima (1945-1974) foi encontrado morto por enforcamento nos arredores de Lyon, na França, em 10 de agosto de 1974, seus amigos acharam uma anotação sintomática em seu surrado exemplar da Bíblia. "É preferível morrer do que perder a vida", ele escrevera.

Embora a causa de sua morte nunca tenha sido esclarecida completamente, tudo indica que Frei Tito, como se tornou conhecido, tenha cometido suicídio por não suportar as sequelas físicas e psicológicas das longas e constantes sessões de tortura a que foi submetido, entre novembro de 1969 e janeiro de 1971, período em que esteve preso pelas forças do regime ditatorial que comandava o Brasil.

"É muito importante comemorar – que significa 'fazer memória' – os 50 anos do martírio de Frei Tito. É uma forma de não admitir que se apaguem a história das atrocidades cometidas pela ditadura militar ao longo de 21 anos, de 1964 a 1985, e alertar as novas gerações para o risco de o Brasil voltar a perder a sua frágil democracia e, de novo, cair em mãos de neofascistas", comenta o frade dominicano e escritor Carlos Alberto Libânio Christo, conhecido como Frei Betto, que era amigo de Tito e esteve preso junto com ele.

Neste sábado (10/08), ele comanda um evento em homenagem a Tito na Escola Nacional Paulo Freire, no Ipiranga, em São Paulo.

Juventude católica e movimento estudantil

Nascido em Fortaleza, Tito começou a participar de encontros da Juventude Estudantil Católica (JEC) na adolescência. O organismo era um braço social da Igreja, com engajada preocupação política. A partir do ensino médio, passou a integrar o movimento estudantil — postura que se consolidou quando, estudante de filosofia da Universidade de São Paulo (USP) e já residindo na capital paulista, filiou-se à União Nacional dos Estudantes (UNE).

A essa altura, ele já havia ingressado para a ordem religiosa dos frades dominicanos. "Conheci o Tito quando ainda éramos estudantes do ensino médio, no início da década de 1960. Entre 1962 e 1964 eu era dirigente nacional da JEC e ele, dirigente do Nordeste. Várias vezes nos encontramos em encontros regionais e nacionais da JEC. E como nós dois tinham o propósito de abraçar a vida religiosa, ingressar na ordem dominicana, nos tornamos confidentes", recorda Betto. "Entrei no convento em 1965, e ele, em 1966. A partir de 1967 passamos a conviver no convento do bairro das Perdizes, em São Paulo. Estudávamos filosofia."

Em 12 de outubro de 1968 Frei Tito foi um dos participantes do famoso Congresso da UNE em Ibiúna. Assim como outros 600 estudantes, acabaria preso pela primeira vez, fichado, e liberado em seguida.

Capa do livro 'Um homem torturado – Nos passos de Frei Tito de Alencar', de Leneide Duarte-Plon e Clarisse Meireles
Biografia 'Um homem torturado – Nos passos de Frei Tito de Alencar', de Leneide Duarte-Plon e Clarisse MeirelesFoto: Leneide Duarte-Plon

A segunda, mais longa e mais cruel detenção viria no ano seguinte. "Não tínhamos medo", diz Frei Betto. "Éramos viciados em utopia, acreditávamos na queda da ditadura e no restabelecimento da democracia. O medo veio quando fomos presos em novembro de 1969, acusados de 'terroristas'."

"Pessoas como Tito foram presas pelo regime porque o regime prendia quem era considerado subversivo, que se opunha, com armas ou não", diz a jornalista Leneide Duarte-Plon, autora, em parceria com Clarisse Meireles, da biografia Um homem torturado – Nos passos de Frei Tito de Alencar.

Para o historiador Paulo Henrique Martinez, professor na Universidade Estadual Paulista (Unesp), uma das razões dessa prisão é que ele era um personagem "com dupla identidade", já que representava tanto uma militância estudantil quanto um grupo de religiosos que constituía uma "rede integrada de apoio a uma das organizações que adotaram a luta armada como forma de oposição, a ALN". Essa Ação Libertadora Nacional "era a mais dinâmica, a mais agressiva, a mais organizada e mais bem preparada em termos técnicos e militares", ressalta.

Dos oito frades presos, quatro foram logo libertados, por falta de provas. E quatro ficaram na prisão: além de Tito e Betto, os também dominicanos Fernando de Brito (1936-2019) e Ivo Lesbaupin (* 1946).

De acordo com Frei Betto, eles participavam do movimento estudantil e adotavam "uma postura de esquerda", engajados na luta contra a ditadura. "Aderimos ao grupo Ação Libertadora Nacional, comandado por Carlos Marighella [político e guerrilheiro marxista]. Nunca pegamos em armas", frisa o dominicano. "Nosso papel era dar apoio aos guerrilheiros urbanos: escondê-los, tirá-los do país clandestinamente, acolhê-los quando feridos em ações armadas etc.."

Sobre o amigo, Betto comenta que "tinha alma de poeta": "Escrevia poemas, tocava violão e dedicava longas horas à oração."

Torturas violentas

O período de prisão de Tito pode ser dividido em duas partes. No início, ele ficou numa cela no Presídio Tiradentes, assim como seus outros colegas religiosos. Até então, pairava sobre ele a acusação de ser aliado da ALN de Marighella. "Ele foi violentamente torturado pelo [delegado] Sérgio Fleury", enfatiza Duarte-Plon.

A situação ficou mais complicada quando se descobriu que ele tinha sido um dos intermediadores mais importantes para os universitários conseguirem o sítio de Ibiúna onde o congresso da UNE havia sido realizado. No início de 1970, Tito passou então a ser um caso Operação Bandeirantes, definida pelos próprios torturadores como "sucursal do inferno" para os opositores do regime.

"Além de ter sido muito torturado ao ser preso, em novembro de 1969, voltou às torturas em fevereiro de 1970, quando a repressão descobriu que ele conseguira o sítio do congresso da UNE", conta Frei Betto.

Em fevereiro de 1970 ele escreveu e conseguiu que vazasse uma carta em que detalhava os métodos de tortura que vinha sofrendo, com direito a instrumentos de sevícia, choques elétricos, pauladas e pontapés. No texto, revela a vontade de se matar, entendendo que no suicídio estaria a única solução para seu sofrimento e para dar visibilidade internacional às atrocidades cometidas pela ditadura.

"O governo [de Emílio Garratazu] Médici sofria pressão no exterior para justificar a prisão de frades acusados de terrorismo", lembra Betto. "Isso nunca havia ocorrido. Então durante três dias torturaram Tito de todas as maneiras, para que assinasse um documento confessando que havíamos participado de operações armadas: choques elétricos, pele queimada por cigarro aceso, pancadas na cabeça, etc.. Ele resistiu. Não assinou."

Seu martírio parecia ter chegado ao fim quando, em janeiro de 1971, acabou liberado porque constava na lista dos presos políticos trocados pela libertação do embaixador suíço que havia sido sequestrado por guerrilheiros. Do Brasil, foi para o Chile, em seguida passou alguns dias na Itália. E, depois, com o apoio de dominicanos, fixou-se na França.

Duarte-Plon conta que lá, ele primeiro se instalou num convento dominicano de Paris e chegou a ingressar na Universidade de Sorbonne. "Mas ele não tinha condições mais de seguir os estudos", comenta. Então foi mandado para o convento Sainte-Marie de La Tourette, em Éveux, perto de Lyon.

Ali passou um ano, até se suicidar", relata a biógrafa. "Ele vivia em desespero, com alucinações, sonhos e visões. A morte era a única saída." Antes, ele já havia tentado o suicídio outras duas vezes: ainda na prisão, cortou os pulsos; na França, intoxicou-se com medicamentos. Em ambas as ocasiões acabou hospitalizado e salvo.

Lápide de Frei Tito no convento Sainte-Marie de la Tourette, mais tarde transferida para o Brasil
Lápide de Frei Tito no convento Sainte-Marie de la Tourette, mais tarde transferida para o BrasilFoto: Leneide Duarte-Plon

Um frade marxista

Seu caso se tornou simbólico. Mas, depois da prisão, Tito jamais ficaria bem. "As sequelas do que ele passou foram muito profundas, abalando sua própria personalidade. Tito passou a ter uma introspecção e um certo pânico incontrolável. Ele se sentia permanentemente ameaçado de sofrer nova prisão, novas torturas", acrescenta o historiador Martinez. "E isso provocou uma destruição psicológica do indivíduo."

Duarte-Plon ressalta que Tito "se declarava um frade que tinha lido Marx e encontrava no marxismo muitas linhas que estariam na mensagem de Cristo": "Ele sempre se declarou marxista. Trabalhava para libertar o povo brasileiro da ditadura e para encontrar a democracia. Foi barbaramente destruído nas salas de tortura. Eles não tinham limite, torturavam até o insuportável."

Dez anos após sua morte, o então cardeal arcebispo de São Paulo, Paulo Evaristo Arns (1921-2016), em celebração litúrgica na Catedral da Sé, afirmou que "Frei Tito não se matou, mas buscou do outro lado da vida a unidade perdida deste lado".

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A DW evita noticiar suicídios, pois há indícios de que relatos sobre o assunto podem incitar a imitar tais ações. Se enfrenta problemas emocionais e tem pensamentos suicidas, não deixe de procurar ajuda profissional. Você pode buscar ajuda no site www.befrienders.org/portugese.


sexta-feira, 9 de agosto de 2024

A ofensiva da Ucrania em Kursk (Rússia) - Mick Ryan

 War in the Future 

From: Mick Ryan AM August, 9/08/2024

Now that we have had a couple of days to observe the new Ukrainian cross-border attack into Kursk, I wanted to offer a quick assessment of what we know, as well as Ukraine's potential objectives and the challenges it faces. 1/23 🧵

2/ Surprise is an important continuity in human competition and warfare. The aim is to shock an adversary and overwhelm them when they are their weakest or when they least expect it. That shock, and the accompanying break down in enemy cohesion & ability to effectively respond, can then be used to seize ground and destroy enemy formations.

3/ It appears that yet again, the Ukrainians have surprised Russia, and observers in the west, with their latest operation. Over the past 72 hours, we have watched as Ukraine has launched a significant cross-border assault into Russia’s Kursk region.

4/ Initially viewed as another raid into Russia, similar to the previous Ukrainian operations in May 2023 and March 2024, it has become clear that this is something different. Despite our ability to only see a small part of what is occurring in Kursk, there are several aspects of this new Ukrainian operation which are apparent.

5/ First, this is a multi-brigade operation. At least two Ukrainian brigades have been identified so far: the 22ndMechanized Brigade and the 82nd Air Assault Brigade. These are both quality formations. It appears that unlike in the 2023 southern counteroffensive where fresh brigades were employed, the Ukrainians have allocated experienced formations to this attack.

6/ Second, the Ukrainians have attacked with a highly mobile, mechanised force. This is different to the Russian dismounted attacks into Kharkiv in recent months. A high level of mobility is essential to creating or exploiting gaps in enemy defences, and rapidly exploiting such gaps. Speed and shock action are vital.

7/ Third, the Ukrainians appear to have deployed a significant amount of air defence capability. At least one Russian fighter aircraft and two helicopters have been claimed to have been shot down by the Ukrainians. There has been, as of this point, limited reports of Russia being able to use glide bombs or even large numbers of drones to counter the Ukrainian assault. This is indicative of a more effective air defence environment for the Ukrainians than was created for their 2023 counter offensives.

8/ Fourth, Ukraine has penetrated a good distance into Russia on at least two axes of advance. Main and supporting efforts are unclear. However, the situation remains very unclear and Ukrainian forces could be much deeper into Russia than we know. This constitutes the biggest advance by any side in this war since late 2022.

9/ Fifth, Ukraine has achieved surprise. This is an important theme to note given the obsession of some with describing this war as a ‘transparent battlefield’. This, again, shows that the battlefield is far from transparent, and that deception activities, good intelligence, and surprise are crucial elements of modern war.

10/ More importantly, the Ukrainian cross-border attack shows that surprise is still possible, and that offensive operations are also possible despite the prevalence of the defence in the past year.

11/ So, what might Ukraine's objectives - tactical, operational, strategic and political - be for their Kursk operation?

12/ At the most basic tactical level, this operation will be about seizing ground and destroying Russian ground and aerial forces. That is the central role of ground forces in war.  But it is the operational and strategic purpose of conducting operations to seize ground and destroy the enemy that is interesting.

13/ There are a couple of possible operational objectives for this Ukrainian attack. First, Ukraine may be seeking to draw Russian forces away from its attacks on the Niu-York and its advances on Toretsk and Pokrovsk. This might be possible, but given Russia’s advantage in manpower, one would have to assess that this outcome is probably unlikely.

14/ Another operational objective, which is more likely to be realised, is to force the Russians to reconsider their force dispositions elsewhere on the front line. The Russians will have to respond, and even they do not have a bottomless pit of resources to do so. To respond to the Ukrainian attack on the Kursk region, they will have to stop defending somewhere else. 

15/ Ukraine may have some specific operational objectives in mind which are related to ground. The Kursk nuclear power station may be one objective, but that still lies 60 kilometres from the border with #Ukraine, well beyond where Ukraine is currently thought to be operating. Key road and railway lines might also be interrupted.

16/ The strategic objectives of this attack can only be estimated at this early stage. First, the attack might be an attempt to slow or kill Russian momentum in its offensives which have lasted for the duration of 2024. Ukrainian planners will understand that even Russia can’t remain on the offensive forever.

17/ A 2nd strategic objective might be to shift the narrative on the war to one more positive for Ukraine and counter Russian misinformation about their ‘inevitable victory’ in Ukraine. The 2022 offensive in Kharkiv not only stunned the world but shifted the narrative on Ukraine’s ability to prosecute the war and resulted in a significant change in the west’s approach to providing aid.

18/ A 3rd strategic objective may be to boost morale in the Ukrainian population. Given the past 8 months of defensive operations, constant aerial attacks on infrastructure and ongoing power shortages, the will of the people will be at the forefront of the Ukrainian government’s considerations about the trajectory of the war.

19/ A 4th strategic objective for Ukraine might be to do what the Russians are doing in eastern Ukraine at the moment – grab as much territory as possible in case Ukraine is forced into some kind of negotiated settlement at the end of 2024 or in early 2025. Negotiating with some of your enemy’s territory is much better than negotiating without it.

20/ Ukraine faces a daunting array of issues as it moves forward with this operation. These include tactical, operational, strategic and political challenges. I explore these in detail in my new (free) article at Futura Doctrina, which can be read at the link. mickryan.substack.com/p/the-battle-o…

21/ Time will tell whether using these Ukrainian brigades to attack into Russia rather than defending eastern Ukraine has been the most strategically effective use of their forces.

22/ At a time when Ukrainian defenders in the east are being pushed back on several axes, the use of highly capable Ukrainian combat forces in Kursk is either a brilliant countermove to shift the momentum in the war, or a strategic error which compounds the challenges in Ukraine’s eastern Ukraine defensive operations.

23/ There is no way yet to make this assessment, however. As with all war, there is an abundance of uncertainty at the early stage of this Ukrainian offensive. Not only are we unsure about just how far the Ukrainians have penetrated, but we are also unsure of the strategic & political objectives of this operation. There is much more to learn in the coming days. End.


quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Ação bilionária contra Vale em Londres tem ajuda dentro do Palácio do Planalto - Claudio Humberto (Diário do Poder)

 Ação bilionária contra Vale em Londres tem ajuda dentro do Palácio do Planalto

Enquanto o governo negocia com Vale e BHP o valor da indenização relativa ao desastre de Mariana, o presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência da República, Manoel Caetano Ferreira Filho, tem auxiliado a banca Pogust Goodhead (PG) para que o acerto pelos danos causados no Brasil seja pago via justiça de Londres, que pode render obesas comissões. Ferreira Filho, que defendeu Lula na Lava Jato e o visitava na prisão, não deve ver conflito de interesse em sua conduta.

Fundos abutres

Comissões de éticas examinariam com lupa servidor aliado a um projeto de interesse de fundos abutres caçadores de desastres pelo mundo. 

Torcida pelo exterior

Ferreira Filho chegou a declarar que os tribunais do Reino Unido seriam mais apropriados que os brasileiros para resolver a celeuma ambiental.

Caminho das pedras

Thomas Goodhead, CEO do PG, tem portas abertas: acompanhado de Ferreira Filho, até visitou o gabinete do Procurador-Geral da República.

Ferreira Filho confessa que trabalha para britânico PG

O presidente da Comissão de Ética da Presidência da República respondeu aos questionamentos da coluna apenas duas horas após o fechamento. Em seus esclarecimentos, o advogado que participou da defesa de Lula na Lava Jato confessa que, de fato, trabalha para o escritório britânico de advocacia PG, que tenta faturar indenização bilionária da Vale na Justiça do Reino Unido. Leia a íntegra das alegações de Ferreira Filho: "Em resposta ao seu pedido feito à Comissão de Ética Pública, presto os seguintes esclarecimentos: 1. Os membros da Comissão de Ética Pública ocupam CARGO HONORÍFICO, SEM REMUNERAÇÃO, que não os impede de continuarem exercendo normalmente suas respectivas profissões de origem; 2. Os membros da Comissão de Ética Pública não exercem cargo abrangido pela legislação específica que exija consulta prévia à própria Comissão para o exercício regular de suas respectivas profissões de origem, ficando impedidos de atuarem nos processos em que houver interesse de pessoas com quem mantenham relações profissionais; 3. Não compete, portanto, à CEP autorizar ou impedir que seus membros continuem a exercer regularmente suas atividades profissionais; 4. Por tais razões, eu, como os demais membros da CEP, não preciso consultá-la previamente para continuar exercendo normalmente minha profissão, desde que não gere situação caracterizadora de conflito de interesses; 5. ⁠Faço parte da equipe do escritório Pogust Goodhaed, assessorando-o quanto ao Direito Material Brasileiro, aplicável ao processo que tramita perante a Justiça Inglesa, em que as vítimas do desastre de Mariana pleiteam indenização dos danos que sofreram."