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sábado, 7 de fevereiro de 2009

1023) Ser diplomata: para os candidatos à carreira

Um correspondente interessado na carreira diplomática escreveu-me hoje, 7.02.2009, para dizer que tinha se sentido inspirado por um texto meu, de quase três anos atrás, do qual eu sequer me lembrava mais.
Como pode eventualmente interessar a outros, e como ele tinha sido apenas objeto de palestra e divulgação muito discreta em meu site pessoa, acredito que uma nova transcrição facilite o conhecimento e a leitura por um número maior de eventuais interessados na carreira.
Eis a ficha do trabalho, seguida do próprio:
1591. “O Ser Diplomata: Reflexões anárquicas sobre uma indefinível condição profissional”, Brasília, 2 maio 2006, 3 p. Reflexões sobre a profissionalização em relações internacionais, na vertente diplomacia. Palestra organizada pela Pacta Consultoria em Relações internacionais, em cooperação com o Instituto Camões, realizada na Embaixada de Portugal, em 4/05/2006 (anúncio). Disponível no site pessoal (link).

O Ser Diplomata
Reflexões anárquicas sobre uma indefinível condição profissional


Paulo Roberto de Almeida
(pralmeida@mac.com; www.pralmeida.org)
Reflexões sobre a profissionalização em relações internacionais,
na vertente diplomacia, para palestra em 4 de maio de 2006
(Ciclo de Debates da Pacta Consultoria, Brasília, dia 4/05, às 19h30).


1) Não se é diplomata, acredito, como se é economista, ou advogado, ou médico. Nós, diplomatas, não pertencemos a nenhuma guilda medieval, a nenhuma corporação de ofício, a nenhuma ordem feita de requisitos estanques, ainda que muitos nos comparem a uma casta, ou a um estamento social, numa acepção bem mais difusa deste conceito weberiano. Ou seja, ser diplomata não é simplesmente uma questão de profissão; é uma vocação, uma questão de status, quase que uma missão, o chamado calling, examinado por Weber em seu famoso estudo sobre a ética protestante e o espírito do capitalismo.
2) Ser diplomata não é apenas uma questão de nomadismo, de gostar de viajar ou de viver fora do país; ser diplomata é ser, antes de mais nada, um ser com raízes na sua terra, um servidor público na acepção mais completa dessa palavra, um funcionário do Estado, antes que de um governo e, como tal, estar identificado com a nação ou com a sociedade da qual se emergiu, na qual nos formamos e para a qual desejamos legar uma situação melhor do que aquela que recebemos de nossos pais e antecessores.
3) Ser diplomata não resulta, simplesmente, de um treinamento ad hoc, adquirido num desses cursinhos preparatórios de seis meses ou um ano, feitos de muita decoreba, alguma simulação para os exames e uma leitura sôfrega da bibliografia recomendada, por mais que ela seja ampla. Ser diplomata resulta de uma preparação de longo curso, adquirida no contato constante com uma cultura superior à da média da sociedade, no cultivo da leitura descompromissada com a aquisição de qualquer saber instrumental, resulta da curiosidade atemporal por todas as culturas e sociedades, passadas ou presentes e, sobretudo, da contemplação ativa da realidade, daquilo que um dramaturgo brasileiro famoso, Nelson Rodrigues, chamava de “a vida como ela é”.
4) Ser diplomata não é estar ou viver obcecado pela diplomacia, fazer dessa atividade o seu último ou supremo objetivo de vida, a sua única ocupação possível ou imaginável, sem outros afazeres ou hobbies. Ser diplomata, ser um bom diplomata significa, também, fazer algo mais no seu itinerário de vida, ter uma outra ocupação, uma distração, um divertissement, ou hobby, outras obsessões e amores na existência, de maneira a poder enfrentar a diversidade da vida, inclusive os altos e baixos da própria diplomacia, quando descobrimos que nem todo diplomata é exatamente um diplomata, naquela acepção que emprestamos ao termo. Ser um bom diplomata é se ver imaginando que, “se eu não fosse diplomata, o que mais, exatamente, eu gostaria de ser?; de onde mais eu poderia tirar motivos de satisfação, aonde mais eu poderia colaborar, com pleno gosto, com a sociedade na qual me formei, no país onde vivo?”. Se soubermos bem responder a esta questão, “o que eu faria se não fosse diplomata?”, já se tem meio caminho andado para ser um bom diplomata...
5) Ser diplomata é saber se colocar acima das paixões e dos modismos do presente, transcender interesses políticos conjunturais, em favor de uma visão de mais longo prazo, afastar posições partidárias ou de grupos e movimentos com inserção parcial ou setorial na sociedade, em favor de uma visão nacional e uma perspectiva de mais longo prazo. Significa, sobretudo, contrapor às preferências ideológicas pessoais, ou de grupos momentaneamente dominantes, ou dirigentes, uma noção clara do que sejam os interesses nacionais permanentes.

Muito bem, uma vez dito o que acabo de expor, o que mais eu poderia dizer a vocês, ávidos de uma legítima curiosidade sobre os segredos da carreira diplomática, sobre o que é ser diplomata, enquanto profissão, enquanto vocação?
É claro que tudo começa em poder ser diplomata, em poder ingressar na carreira, em passar pelo crivo dos exames de entrada, dos requisitos de desempenho na soleira da profissão, ou seja, ultrapassar a porteira da entrada do concurso público: aberto, secreto, universal (ou quase).
Para isso, minha primeira e principal recomendação seria: pense numa preparação de longo curso, de longue haleine, diriam os franceses. E, sobretudo, pensem numa formação essencialmente autodidata. Isto por uma razão muito simples: por melhor que seja um curso universitário, e certamente existem dos bons, dos maus e dos feios, as “faculdades Tabajara”, como dizemos, por melhores que sejam esses cursos, eles nunca vão dar a vocês tudo aquilo de que vocês necessitam para entrar e para ser, já não digo um diplomata prêmio Nobel, mas um bom diplomata, de primeira linha. Quem vai prover o essencial da formação de vocês, são vocês mesmos, é o esforço individual, é o empenho pessoal no auto-aperfeiçoamento, no estudo voluntário, na pesquisa constante.
Em segundo lugar, eu diria que o recomendável seria ter a diplomacia como uma aspiração e, ao mesmo tempo, preparar-se para uma profissão “normal” – não que a diplomacia seja “anormal”, mas ela é relativamente excepcional, só uns poucos são chamados a exercê-la e seria uma pena que todos os demais, não chamados a servir o país nessa área, vivam uma existência de adultos frustrados, de profissionais desgostosos com o que foram levados a trabalhar. Por isso, eu colocaria a diplomacia numa espécie de Gólgota algo inatingível, uma montanha escarpada à qual se ascende com certo sacrifício pessoal (em alguns casos familiar, também), uma recompensa depois de muita labuta. Profissionais que já conheceram experiências diversas na vida civil costumam fazer bons diplomatas; o que não quer dizer que aqueles jovens saídos dos bancos universitários diretamente para a carreira não façam, ou não sejam, bons diplomatas; ao contrário: bem vocacionados, eles farão tudo o que estiver ao seu alcance para bem servir ao Estado e à nação. Mas, alguém dotado de competências outras que não as simples artes diplomáticas – que são as da representação, da informação e da negociação, todos sabem – alguém assim saberá servir ao país com vários outros instrumentos e ferramentas adquiridos na vida prática, seja na veterinária, na engenharia, na agronomia, na economia doméstica ou no corte e costura, whatever...
Em terceiro lugar, eu diria que existem muitas formas de trabalho profissional e de expressão individual dentro das relações internacionais, dentro e fora da diplomacia, estrito senso. Existe a diplomacia empresarial, existe uma diplomacia do agronegócio, uma diplomacia das ONGs, dos jogadores de futebol – hoje um dos principais itens de exportação da pauta brasileira –, assim como existe uma diplomacia na própria academia, mas ela costuma ser das mais chatas, com suas vaidades e torres de marfim. Tudo é uma questão de competência e de dedicação. Sendo competentes na atividade que escolheram e estando contentes no desempenho quiçá temporário daquilo que estão fazendo, vocês serão felizes na vida, farão os outros felizes, e lutarão, talvez, pelo ingresso na carreira com a tranqüilidade que um exame desse tipo requer, não com o desespero ou a obsessão de uma batalha de vida ou morte. Sejam competentes e desempenhem as tarefas nas quais se encontram engajados e vocês já serão bons diplomatas, em qualquer hipótese e em qualquer profissão onde estiverem efetivamente colocados.
Minha mensagem central é justamente esta: o diplomata já é um ser realizado na vida, feliz consigo mesmo, confiante em seus estudos e em sua capacidade; conhecedor do mundo, mesmo que nunca tenha viajado de avião; curioso de todas as artes, mesmo que tenha estacionado num escritório durante vários anos; crítico dos seus professores, mesmo que nunca tenha ousado contestá-los em classe; anotador de livros; recortador de notícias de jornal e de páginas de revista; invasor de bibliotecas; delinqüente reincidente na arte de ler livros em livrarias – o que eu já fiz milhares de vezes –, enfim, uma pessoa totalmente à vontade nas artes do impossível e apaixonada por novos desafios.
Se vocês são um pouco assim, mesmo de forma distraída, desajeitada, totalmente sbagliatta, como diriam os italianos, se vocês também acham que sabem mais do que o chefe, então vocês já são diplomatas, só falta agora ingressar na carreira. Mas isso é uma mera formalidade.

Por fim, e termino aqui esta preleção, caberia abordar a carreira pelo lado prático: uma vez dentro da diplomacia, o que fazer exatamente? Ao lado, das missões clássicas, e tradicionais, do diplomata – que são as de informar, representar e negociar, sobre as quais não me estenderei por sua obviedade elementar –, existem aqueles que acreditam que o diplomata deve igualmente participar de uma espécie de projeto nacional, e aí sua missão seria, não apenas participar e contribuir para o processo de desenvolvimento do país, mas também engajar-se ativamente na transformação do mundo, de maneira a que este sirva, de maneira mais adequada, aos objetivos nacionais de desenvolvimento.
Sou cético quanto a essa extensão indevida das funções do diplomata, ainda que eu reconheça que nossas capacidades analíticas e por vezes executivas possam ser tão boas quanto as de qualquer especialista em políticas públicas. Defendo que o diplomata seja excelente nas suas funções tradicionais e, se possível, agregue valor ao seu trabalho pela dedicação paralela a atividades de pesquisa, similares, em grande medida, às que são conduzidas no âmbito da academia. Existe, obviamente, grande interface e uma notável similitude de métodos entre o trabalho acadêmico e o diplomático, naquilo que se refere à elaboração de estudos, position papers, diagnósticos de situação, reflexões prospectivas e tudo o mais que possa identificar-se com o processamento de informações. O diplomata, contudo, à diferença do seu colega de academia, não se limita a processar informações, ele as utiliza para elaborar posições negociadoras, para propor posturas práticas que o seu país deva assumir nos foros mundiais, nas relações bilaterais, nos desafios do sistema internacional.
Em determinadas instâncias negociadoras, o diplomata pode até ficar, no terreno de batalha, sem instruções precisas da capital quanto a que atitude adotar. Ele deverá portanto contar com todo o seu tirocínio e conhecimento do problema em causa, de molde a poder defender o interesse nacional da melhor forma possível. Na capital, ele deverá, na elaboração de posições, mobilizar todos os recursos técnicos e humanos de diferentes agências governamentais e alguns até privados, de maneira a extrair, na postura negociadora, o máximo de benefícios para o país num determinado contexto negociador.
Em última instância, a matéria-prima essencial do diplomata é a inteligência, e isso não depende de nenhuma fonte externa, mas de sua própria capacidade em acolher todo tipo de conhecimento e colocar essa informação a serviço de seu país.
Abraçando a carreira diplomática, vocês abordam uma carreira aberta sobretudo à inteligência. Cada um deve confiar em sua própria capacidade de trabalho e abrir-se o tempo todo a novos conhecimentos.
Muito obrigado...

Vôo São Paulo-Brasília (Gol 1778), 2 maio 2006, 4 p.
Revisão em 4.05.06. (1591).

1022) Revisitando Maquiavel

Para os que gostam do Principe, ou que simplesmente se interessam por uma visao diferente de um classico da literatura politica, fiz uma releitura, ou uma reescritura, da parte inicial da obra fundadora do moderno pensamento politico.

O moderno príncipe: Uma releitura maquiaveliana do poder contemporâneo
Revista Temas & Matizes (Cascavel/PR, Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Unioeste, a III, n. 5, ISSN: 1519-7972; p. 1-15)
link: http://e-revista.unioeste.br/index.php/temasematizes/article/download/548/459

1021) Falacias Academicas: novo artigo da serie publicado

Gostaria de informar os eventuais interessados que foi publicado o mais recente artigo da série "Falácias Acadêmicas", assim registrado:

Falácias acadêmicas, 5: O mito do complô dos países ricos contra o desenvolvimento dos países pobres
Brasília, 20 janeiro 2009, 11 p., 1976. Continuação da série, tratando desta vez das teses do economista Ha-Joon Chang. Publicado em Espaço Acadêmico (ano 8, n. 93, fevereiro 2009; link: http://www.espacoacademico.com.br/093/93pra.htm).

Transcrevo aqui o comentário simpático recém recebido de um jovem leitor:

"Prezado prof. Paulo Roberto de Almeida,
Eu desejaria congratulá-lo pelo artigo da série "Falácias Acadêmicas" - "O mito do complô dos países ricos contra o desenvolvimento dos países pobres". Foi um artigo espetacular, excelente, muito criativo, e, sobretudo, necessário. Já tive discussões com colegas a respeito daquele livro que o sr. citou, do autor coreano, assim como já até possuí um livro chamado "Communism and Nationalism - Karl Marx versus Friedrich List", de Roman Szporluk, que, confrontando as respectivas teorias destes dois teóricos com dados históricos de regimes comunistas, tenta mostrar como se dava, dentro do bloco comunista, a divergência de conduta entre regimes mais nacionalistas, protecionistas, portanto mais obedientes à teoria de List, e regimes mais internacionalistas, mais afeitos à teoria marxista. O livro, muito embora ostente um elogio editorial feito pelo conselheiro político Zbigniew Brzezinski, não me interessou muito no fim das contas, mas, incentivando-me a pesquisar mais sobre Friedrich List, economista menos conhecido, me fez descobrir que uma certa edição de uma de suas obras no Brasil contou com apresentação de Cristovam Buarque, o que acrescenta ainda mais fundamentos à tese das "falácias acadêmicas", mostrando o quanto falácias da política podem estar intrinsecamente ligadas a falácias acadêmicas (ou vice-versa).
Bem, é isso. Obrigado, e até mais.
André"

Agradeci e já anotei o nome do livro recomendado na minha lista de "Books To Read", que vou buscar na próxima vez que for aos EUA. Transcrevi esta mensagem, não por qualquer orgulho inadequado, mas apenas para estimular o debate intelectual em torno das teses de que tratamos, eu e o meu distante contendor, da universidade de Cambridge.
Não pretendi, no curto espaço de um artigo, aprofundar meus argumentos históricos sobre os problemas ali tratados, mas prometo fazê-lo num estudo mais aprofundado, que estou, aliás, elaborando...

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

1020) Um questionário liberal-libertário

Alguns comentários pessoais
Paulo Roberto de Almeida

Um amigo economista, Claudio Shikida, mandou uma mensagem a donos de blogs liberais-libertários para que respondessem a um questionário que preparou que deve fundamentar um trabalho de pesquisa sobre a blogosfera liberal-libertária e/ou conservadora (ou mesma não-alinhada), para ser respondida online (aqui, para os que se também animarem a fazê-lo: http://www.polldaddy.com/s/56845037A142B50B/).
Eu não me considero um liberal-libertário, estando mais para independente, mas como sou “dono de blog” (aliás, de vários), resolvi responder. Além de uma série de perguntas clássicas, figuravam algumas que requeriam certa elaboração, cujo teor transcrevo abaixo, seguidas imediatamente de minhas respostas. Talvez interesse a alguém saber quais são minhas posições sobre algumas "coisas" e sobre este nosso país.

Q.2. Você se considera
* liberal clássico
* libertário
* outros (não listados aqui, inclusive, sem alinhamento) (Minha opção)
* conservador

Q.6. Como você entrou em contato com a literatura austríaca e/ou liberal e/ou libertária e/ou conservadora? Conte um pouco de sua história a respeito.
Venho do marxismo, com evolução para a social-democracia e, através do estudo, da reflexão e da comparação, considero-me absolutamente independente, atualmente, sem qualquer tipo de afiliação a qualquer escola em particular. Considero-me basicamente um racionalista, ou seja, alguém que pensa cada problema com os instrumentos da razão (o que inclui um bocado de pesquisa, dados empíricos, reflexão com base em alguns elementos analíticos, e portanto teóricos, mas sem me filiar a uma corrente precisa) e, com base em tudo isso, procura implementar as melhores soluções possíveis para os problema humanos, sendo que algumas serão estritamente market-friendly, outras de cunho dirigista, ou planejada.
Na economia, estou bem mais do lado da liberdade irrestrita dos mercados do que da regulação estatal, mas reconheço que na sociedade moderna soluções estritamente laissez-faire tornaram-se praticamente impossíveis, na medida em que o Estado já avançou demais na regulação econômica e social. Sendo este o ponto de partida, fica muito difícil preconizar-se uma regulação puramente espontânea das questões sociais, posto que a selva regulatória já é uma realidade. Liberais eventualmente conduzidos a posições de mando na esfera política e econômica têm de ater-se a estas realidades, e procurar levar a regulação o mais próximo possível dos princípios liberais, mas tendo uma perfeita consciência de que eles estarão propondo um pouco mais de regulação, eventualmente até libertária, mas ainda assim regulação.
A liberdade de movimentos de capitais, por exemplo, é uma espécie de regulação, posto que garantida pelo Estado, até chegar o próximo colbertiano no seu comando.
Ou seja, sou anarco-libertário, mas absolutamente realista quanto às possibilidades de plena liberdade nas sociedades contemporâneas.
No plano filosófico, hesito em me classificar em qualquer escola que seja, pois elas podem também representar uma espécie de camisa de força conceitual. Melhor ser absolutamente livre na prática, inclusive das escolas libertárias...

Q.9. Como você avalia a atuação de think tanks liberais como o Instituto Liberdade, o Instituto Liberal (IL-RJ), o Ordem Livre ou o Instituto Millenium em prol da divulgação do pensamento liberal? Fique a vontade para elogiar e criticar.
Cada um procura levar sua mensagem num meio intelectual absolutamente hostil, ou talvez até medíocre, como é o do Brasil, onde a inteligência leva de dez a zero contra as conveniências políticas e as espertezas econômicas. O Brasil é, infelizmente, um país no qual, por força da baixa educação formal, inclusive nas chamadas elites esclarecidas, as maiores fraudes intelectuais ainda encontram guarida nas universidades, nos meios políticos e até no comando do Estado, para nada dizer das máfias sindicais, patronais e de trabalhadores.
Esses think-tanks liberais nadam contra a corrente e se eles conseguem influenciar um punhado de jovens, milhares de outros mais estão sendo todos os dias conquistados pelas idéias não apenas antiliberais, mas obviamente medíocres, para não dizer fraudulentas propagadas por certos acadêmicos de sucesso e jornalistas ignorantes.
Creio que eles devem ainda assim persistir na educação dos mais jovens, posto que, eventualmente alguns deles chegarão a posições de mando e poderão, assim influenciar moderadamente o ambiente estatista-dirigista no qual vive o Brasil e diminuir, talvez, o quantum de mediocridade intelectual que percorre todas as instancias publicas do Pais.
Como se vê, sou bastante pessimista quanto às perspectivas o liberalismo econômico e político no Brasil.

Q.10. Há algo mais que queira acrescentar? Por favor, seja breve.
Sim, a despeito de tudo acredito no poder da palavra, da inteligência, do convencimento por vias racionais (do contrário, aliás, não seria professor, posto que essa não é minha atividade principal, da qual não retiro meu sustento essencial). Por isso, creio que os liberais devem persistir em seu esforço, por motivos os mais variados, que acredito, porém, serem os mais nobres possíveis: melhorar a humanidade pela via da liberdade, do livre-arbítrio e da capacidade de iniciativa individual. O mérito próprio sempre deve ser enfatizado, contra o paternalismo estatal e as soluções de favor.

Aqui a mensagem original:
Prezados donos de blogs,
Permitam-me tomar seu tempo com uma observaçào sobre o que enviei ontem: não é necessário fornecer o nome verdadeiro (embora não haja lá muito a comprometer os senhores neste questionário). Também agradeço se - conhecendo outros blogueiros afins - repassarem esta mensagem cujo conteúdo reproduzo abaixo.
Preciso muito de sua ajuda no preenchimento desta pesquisa. Agradeço imensamente sua colaboração. São menos de dez perguntas, muitas de múltipla escolha. Trata-se de uma pesquisa bem simples sobre a blogosfera liberal-libertária e/ou conservadora (ou mesma não-alinhada). O link segue abaixo. Agradeço muito sua participação.
http://www.polldaddy.com/s/56845037A142B50B/
Atenciosamente,
Claudio Shikida
p.s. se você tem ou teve co-blogueiro(s), por favor, repasse o link para ele.
http://shikida.net and http://works.bepress.com/claudio_shikida/

domingo, 1 de fevereiro de 2009

1019) Trabalhos publicados: relacao dos mais recentes

Como escrevo muito (que posso fazer?, é uma mania), mantenho uma relação de trabalhos originais, que deve andar beirando os 2.000 (desde o final dos anos 1960, com algumas perdas pelo caminho), e também uma relação de publicados, isto é, trabalhos terminados que foram efetivamente publicados em algum veículo independente, e não apenas em um dos meus blogs ou site pessoal (com uma ou outra exceção, como livros terminados em edição de autor).
Abaixo, uma relação dos trabalhos publicados mais recentes:

878. To Be or Not the Bric, Inteligência (Rio de Janeiro: Ano: XI - 4º trimestre, 12/2008, p. 22-46). Relação de Trabalhos n. 1920.

879. O problema da universidade no Brasil: do público ao privado?. Via Política (15.12.2008). Relação de Trabalhos nº 1934.

880. Previsões imprevisíveis em tempos de crise global: minha astrologia econômica para 2009 (e mais além), Via Política (22.12.2008). Relação de Trabalhos nº 1963.

881. Fórum Surreal Mundial: Pequena visita aos desvarios dos antiglobalizadores, Mundorama, divulgação científica em relações internacionais (27.12.2008). Relação de Trabalhos nº 1966.

882. Lula's Foreign Policy: Regional and Global Strategies. In: Werner Baer and Joseph Love (eds.), Brazil under Lula (Palgrave-Macmillan, 2008. ISBN: ; p. ). Relação de Trabalhos nº 1811. [Ainda não recebi este livro]

883. Globalizando: ensaios sobre a globalização e a antiglobalização (Brasília: Edição do Autor, 2009, 273 p.), Brasília, 1 de janeiro de 2009, 273 p. Compilação de ensaios sobre a globalização e seus contrarianistas. Disponibilizada no site pessoal e no site NeoReader (link). Relação de Trabalhos n. 1970.

884. Previsões imprevisíveis em tempos de crise global: minha astrologia econômica para 2009 (e mais além). Espaço Acadêmico (ano 8, nr. 92, janeiro 2009). Relação de Trabalhos n. 1963.

885. Fórum Surreal Mundial, 1: Reciclando velhas idéias, Via Política (12.01.2009). Relação de Trabalhos n. 1966.

886. Fórum Surreal Mundial, 2: Pequena visita aos desvarios dos antiglobalizadores, Via Política (19.01.2009) Relação de Trabalhos n. 1966.

887. Brazil, com Denise Gregory, Diretora Executiva do Cebri. In: Growth and Responsibility: The positioning of emerging powers in the global governance system; Gerhard Wahlers, Paulo Roberto de Almeida, He Fan, Denise Gregory, Matthew Joseph, Leaza Kolkenbeck-Ruh, Rajiv Kumar (Berlin: Konrad Adenauer Stiftung, 2009, 126 p.; ISBN 978-3-940955-45-6; p. 11-30; link: ). Titulo original: Brazil's Integration into Global Governance: The rise of the Outreach-5 countries to a G-8 (plus) status. Relação de Trabalhos n. 1868.

Voilà, por enquanto é só (para listas completas ver o site: www.pralmeida.org)

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

1018) FGV cria Centro de Estudos sobre Relações Internacionais

FGV cria Centro de Estudos sobre Relações Internacionais e lança edital

A Fundação Getulio Vargas acaba de criar seu Centro de Estudos sobre Relações Internacionais, sediado no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) e coordenado por Matias Spektor

O CPDOC está também com edital aberto para duas bolsas de pós-doutorado, com início em julho de 2009 e valor de R$ 5.000 mensais.

Os candidatos devem ter defendido o doutorado a partir de janeiro de 2005. Mais informações em http://www.fgv.br/cpdoc

domingo, 25 de janeiro de 2009

1016) Mundorama - Divulgação em Relações Internacionais

Conheça Mundorama

Mundorama é a iniciativa de divulgação científica em Relações Internacionais da Universidade de Brasília, apoiada pioneiramente pelo IBRI.
É uma abordagem ágil sobre os temas da agenda internacional e da política externa brasileira. A iniciativa divulga análises de conjuntura, notas técnicas, teses de doutorado, dissertações de mestrado, artigos científicos, relatórios de pesquisa, notícias de eventos e o acervo em formato digital de periódicos especializados. Tudo desenvolvido em uma abordagem não-exaustiva, mas cuidadosa e atenta aos rumos do desenvolvimento da comunidade especializada em Relações Internacionais no Brasil.

Análise de conjuntura
Artigos de análise de conjuntura sobre os grandes temas da agenda internacional contemporânea, e em especial, aqueles que interessam para a boa compreensão dos desafios da inserção internacional do Brasil. Cobertura de áreas geográficas, países e de temas selecionados, como Política Externa, Política Internacional, Economia Internacional, Defesa e Segurança, Organizações e Regimes Internacionais, entre outros.

Biblioteca
Acervo integral da Revista Brasileira de Política Internacional - RBPI, da revista Cena Internacional, Meridiano 47 - Boletim de Análise de Conjuntura em Relações Internacionais e a outras publicações nacionais. A seção se completa com uma seleção de livros publicados em formato digital disponíveis em bases de dados abertas, teses de doutorado e dissertações de mestrado em Relações Internacionais defendidas em universidades brasileiras, documentos diplomáticos e relatórios técnicos produzidos pela equipe de pesquisadores vinculada ao projeto.

Eventos e recursos de pesquisa
Divulgação de eventos nacionais e internacionais, oportunidades profissionais e de capacitação, e monitoramento de recursos de pesquisa existentes na internet. A seção traz ainda a repercussão do debate científico nacional e internacional sobre os temas da nossa agenda.

Conheça Mundorama - Iniciativa de Divulgação Científica em Relações Internacionais (http://www.mundorama.net).

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

1015) Concurso do Rio Branco: relembrando algumas dicas

De vez em quando, algum candidato faz um comentário sobre algum texto meu, do qual eu já tinha completamente esquecido, soterrado que ele foi no pré-cambriano de minhas camadas geológicas redacionais...
Foi o caso, hoje, com este texto que transcrevo abaixo, do qual já nem tinha mais lembrança.
Pode ser que contenha ainda alguma coisa útil, mas não tenho certeza, pois não o reli. Em todo caso, neste período pré-concurso, que deixa muito candidato nervoso, talvez seja o caso de acalmar o pessoal.
Segue novamente, algo de dois anos atrás...

698) Concurso do Rio Branco: algumas dicas genericas sobre o TPS
Observações puramente pessoais...
Quinta-feira, Fevereiro 08, 2007
Paulo Roberto de Almeida
(pralmeida@mac.com; www.pralmeida.org)

Acredito que cada um dos candidatos ao concurso do Instituto Rio Branco para ingresso na carreira diplomática está dando o melhor de si mesmo nesta fase final. O importante seria que cada um dos candidatos entre na prova confiante naquilo que sabe, não desesperado com o que que eventualmente não sabe. Tranqüilidade na hora de responder me parece importante, assim como saber administrar o tempo disponível da melhor forma possivel. Eu nunca fiz TPS, mas com base no que vejo, leio e ouço, talvez pudesse fazer as seguintes observações.

Uma boa cultura geral, solidamente embasada na história, é essencial para responder às questões -- tanto as de múltipla escolha, quanto as de certo ou errado -- uma vez que o sucesso se mede, não tanto pelo maior número de acertos, mas talvez pelo menor número de erros possível.
Digo isto porque certas questões me parecem fortemente impregnadas de subjetivismo, ou de interpretações divergentes, quanto não duvidosas. Assim, o que cabe é eliminar aquelas opções que são claramente anacrônicas e incongruentes e deixar as opções (duas em cinco, idealmente) plausíveis e possíveis para um exame mais detalhado. História pode diferir de Português, mas acredito que este último está em grande medida impregnado de História e mais ainda de Literatura. Portanto, colocar as leituras em seu devido contexto -- Machado, Graciliano, Freyre etc -- é importante para responder o menos erradamente possível.
Não tenho dicas a dar em matéria de Gramática, e lamento que o exame se apoie em regras formais que não acrescentam muito ao ato da boa escrita e ao da compreensão, mas essa parece a escolha dos examinadores e caberia saber as boas regras da língua. Como geralmente um mesmo texto serve de três a cinco questões, caberia, antes de comecar a responder à primeira do bloco, ler rapidamente todas as questões dessa seção, pois as formulações e argumentos de uma segunda ou terceira questão podem eventualmente ajudar nas respostas das demais.
De maneira geral, uma mirada geral na prova, antes de comecar a respondê-la, pode ajudar a melhor administrar o tempo disponível. Tenho por mim que, ao enfrentar cada questão, o candidato deve, mais do que determinar a resposta certa, de imediato, começar por eliminar aquelas opções que são claramente errôneas, por algum conceito anacrônico, alguma afirmação claramente impossível naquele contexto.
Sempre teremos, num conjunto de cinco opções, três respostas que são claramente deficientes e caberia riscá-las de imediato para se concentrar apenas nas duas outras possíveis. Isto, claro, se o candidato tiver segurança quanto ao que configura um "erro estrutural". Se as duas restantes apresentarem problemas de interpretação, subjetivismos ou impressionismos que derivam de uma compreensão particular de um determinado problema, a solução é tentar se colocar na cabeça do examinador, para saber o que ele espera daquela questão. Nesse particular, a leitura das demais questões do bloco pode ajudar, pois elas orientam para uma determinada direção. Admitindo-se que a maior parte das questões foi preparada por professores da UnB, a "cabeça do formulador" é um pouco a desses livros feitos pelos professores da UnB que estão na bibliografia oficial.
Se uma questão apresentar dificuldades maiores, melhor seguir adiante, para não perder muito tempo com ela, para poder melhor responder às demais e não ter de correr ao final. Meu principio geral seria sempre este: tentar eliminar as erradas, que são as "inconguentes", antes do que tentar acertar na "correta", pois dúvidas quanto ao acertado de uma opção sempre subsistem.
Algumas respostas parecerão óbvias, nos pontos dominados pelo candidato, outras francamente impossíveis de determinar, por pouca preparação do candidato naquela área específica. Então, a única coisa a fazer é avançar rapidamente nas áreas dominadas e voltar depois atrás para tratar das questões mais duvidosas ou mais difíceis. Eventualmente, as respostas das últimas e essa “volta atrás”, depois de ter trabalhado o conjunto da prova, cria uma segurança maior no enfrentamento das questões duvidoas. Então, como última regra, eu diria isto:
Em lugar de "arriscar" no momento alguma resposta duvidosa para passar adiante, para "liquidar", digamos assim, as questões na sua ordem sequencial original, melhor seria passar adiante, continuando a resolver as demais questões, e voltar depois aos problemas mais angustiantes, tentado sempre eliminar as erradas, não acertar a “certa”. Esta restará, talvez, por eliminação das demais.
Estas seriam as minhas observações de caráter geral sobre a prova. Desejo todo o sucesso a cada um dos candidatos, o que vem, em grande medida, com a tranquilidade, a confiança em si mesmo, e a satisfação de ter feito o melhor possível para uma preparação fundamentalmente autodidática. Acumular conhecimentos sempre é bom, para qualquer coisa da vida. Sempre estaremos melhor sabendo mais, tendo empenhado esforços no aperfeiçoamento pessoal.
Boa sorte.

Brasília, 7 fevereiro 2007.

1014) Ainda o FSM de Belém: amadurecendo aos poucos

Um dos principais organizadores do FSM de Belém acha que ele precisa de uma "agenda mais clara", o que eu também acho...
Ele também afirmou que o FSM precisa caminhar para uma "maior 'convergência nos debates' de um fórum que há anos tenta superar a excessiva fragmentação de idéias e atividades", com o que eu não poderia concordar menos.
Proponho que eles leiam algumas de minhas críticas, neste livro, integralmente disponível em meu site: Globalizando: ensaios sobre a globalização e a antiglobalização.

Crise no mundo globalizado motivará debates no Fórum Social Mundial

Um Fórum Social Mundial revitalizado pela crise global, terá sua nova edição entre 27 deste mês e 1º de fevereiro em Belém. A crise na economia mundial promoverá na capital paraense um debate mais concreto sobre "o caráter da crise" e o modelo de desenvolvimento, disse Cândido Grzybowski, diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), e um dos primeiros organizadores do FSM. Está prevista a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no evento nos dias 29 e 30, deixando de lado do Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça.

O Fórum surgiu em 2001 de uma iniciativa "contra a globalização que agora está em crise", disse Grzybowski. "Uma agenda mais clara" sobre alternativas de desenvolvimento deve surgir desse encontro de Belém, afirmou. Isso significa maior "convergência nos debates" de um fórum que há anos tenta superar a excessiva fragmentação de idéias e atividades.

Em Belém espera-se a participação demais de cem mil pessoas em cerca de 2.600 atividades, entre seminários, conferências, assembléias, atos culturais, marchas e outras formas de debate e manifestação, além de reuniões paralelas, como as de autoridades locais e as do Acampamento Intercontinental da Juventude. O fórum termina com o "Dia das Alianças", dedicado a assembléias de coalizões e redes para aprovar ações conjuntas. Este mecanismo pretende estimular aglutinações que avançaram pouco em edições anteriores, reconheceu o diretor do Ibase.

A escolha de Belém, na Amazônia, faz prever também uma ênfase na questão ambiental e climática, além de social. Será a oportunidade de dar voz aos indígenas, ribeirinhos, extratores e outros povos da Amazônia. Os movimentos e as organizações sociais da Amazônia querem discutir modelos de desenvolvimento e alternativas locais.

Na área cultural serão mais de 300 atividades divididas em: artes plásticas; artes cênicas; cinema; cortejos e festas; música; leituras e poesias; oficinas e vivências político-culturais. Destaque para o documentário do cineasta americano Daniel Junge "Eles Mataram Irmã Dorothy", um documentário longa metragem que denuncia a impunidade na Amazônia e analisa o julgamento dos assassinos da missionária Dorothy Stang. Para mais informações sobre o FSM, acesse: http://www.forumsocialmundial.org.br

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

1013) Sobre o discurso inaugural de Obama

What's New Is Old Again
Obama's speech goes for prose instead of poetry.
By John Dickerson
Slate, Tuesday, Jan. 20, 2009

On the west steps of the Capitol, Barack Obama turned his inaugural address into a national locker-room speech. Describing our current crisis and "a nagging fear that America's decline is inevitable," he called on Americans to "pick ourselves up, dust ourselves off, and begin again the work of remaking America." He called for "a new era of responsibility" founded on America's oldest virtues. "Those values upon which our success depends—hard work and honesty, courage and fair play, tolerance and curiosity, loyalty and patriotism—these things are old. These things are true. They have been the quiet force of progress throughout our history. What is demanded, then, is a return to these truths."

It was a good speech but not a soaring one. This may have been because Obama has given so many strong speeches, he's graded on his own special curve—or because he wanted the speech to be thoroughly conventional. His call to responsibility and sacrifice was rooted in American history—from the first settlers through the colonists to America's soldiers. This is a familiar theme in a political speech. In fact, Obama gave his own speech using these themes last June, in which he made a similar call to a new patriotism founded on sacrifice. The use of "I say to you" and "on this day" constructions added to the feeling that this was a speech of the usual order.

Appealing to America's rich heritage makes Obama everyone's president, knitting him into the lineup of the 42 men who have come before him. (Obama is the 43rd man, not the 44th, because Grover Cleveland served as president No. 22 and president No. 24.) But it goes only so far in helping him with his speech's larger aim. His goal was to try to inspire us to give something up and reverse "our collective failure to make hard choices," which he says marked the responsibility-free era that created our current economic mess.

That kind of extraordinary call could have been helped by something more than historical analogies and drive-by references to brave firefighters. It required the kind of personal speechmaking Obama was so good at during the campaign. When he is at his most powerful, Obama makes you feel the connection with his message through either storytelling or references to his personal journey. His wife, Michelle, did the same thing during her convention speech by beautifully outlining how her father refused to give in to the pain and debilitation of multiple sclerosis. When things got hard, she said, "He just woke up a little earlier, and worked a little harder."

Instead of a personal story people could take home, Obama concluded his speech with the story of George Washington fighting for America's independence. It was a perfectly fine story, suitable for treatment in oil and fit for a gilt frame, but it's not a story that's likely to be retold tomorrow at the office.

Though the speech was familiar, there were some poetic high points. He talked about the "risk-takers, the doers, the makers of things," and as he spoke, his words echoed back to him from down the Mall, where they were being broadcast on giant televisions. He framed the new spirit of sacrifice we all must embrace by referring to the extraordinary selflessness of the military. This is a smart thing for a commander in chief to do, particularly one who was portrayed by his opponents as unpatriotic. And by putting out his familiar call for "a new era of responsibility," he has ensured that the phrase will be repeated throughout his tenure. And he hopes that the policies he will promise later, on everything from health care to entitlement reform, will become a part of the larger narrative of his presidency.

He was alternatively humble and commanding. He repudiated Bush's foreign policy. "We reject as false the choice between our safety and our ideals," Obama said. "Our Founding Fathers, faced with perils we can scarcely imagine, drafted a charter to assure the rule of law and the rights of man, a charter expanded by the blood of generations. Those ideals still light the world, and we will not give them up for expedience's sake." He promised humility and restraint. But then, he tempered that new approach with a clear message to America's enemies: "We will not apologize for our way of life, nor will we waver in its defense, and for those who seek to advance their aims by inducing terror and slaughtering innocents, we say to you now that our spirit is stronger and cannot be broken; you cannot outlast us, and we will defeat you." As he spoke, a fighter plane circled overhead, a tiny black spot against unspecific clouds.

How long Obama's words endure is a separate question from the enduring power of the inaugural moment. Though he never mentioned Martin Luther King Jr., Obama faced the Lincoln Memorial from where King articulated a dream that Obama is now helping to fulfill. That monument seemed brighter in the bitter cold, as did all the bleached white buildings that line the Mall. Between them jostled the millions of people who had come to hear and see him, their small American flags creating a blur of red, white, and blue among the museums and monuments.

Watch Obama's inaugural address:

John Dickerson is Slate's chief political correspondent and author of On Her Trail. He can be reached at slatepolitics@gmail.com.
Article URL: http://www.slate.com/id/2209252/

1012) Concurso para a carreira diplomatica 2009

Foi publicado o edital que regula o concurso 2009 para acesso à carreira diplomática, com 105 vagas. Transcrevi o conteúdo do edital neste link do meu blog de textos.
Abaixo, um resumo do calendario de provas:

Primeira Fase em 08 de março

Liberado o edital do Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata (CACD) 2009. Este ano, serão 105 vagas, sendo 6 destinadas aos candidatos portadores de deficiência. Confira mais informações.

INFORMAÇÕES GERAIS
Inscrições: 21 de janeiro a 12 de fevereiro, pelo site do Cespe/UnB.
Taxa de inscrição: R$ 110,00
Divulgação dos locais de prova: 20 de fevereiro.
Resultado final: 23 de julho.

PROVAS
Primeira Fase
08 de março de 2009 (em duas etapas).

Segunda Fase (Prova de Português)
29 de março de 2009.

Terceira Fase
30 de maio de 2009: História do Brasil
31 de maio de 2009: Geografia
06 de junho de 2009: Política Internacional
07 de junho de 2009: Inglês
13 de junho de 2009: Noções de Economia
14 de junho de 2009: Noções de Direito e Direito Internacional Público

Quarta Fase (Alterada)
A quarta fase será composta por provas escritas de Espanhol e de Francês.
07 de junho de 2009: Espanhol
14 de junho de 2009: Francês

Veja aqui o edital: www.cespe.unb.br/concursos/diplomacia2009

Meus votos de pleno sucesso a todos os candidatos...

domingo, 18 de janeiro de 2009

1011) Dez licoes para um presidente, qualquer presidente...

As recomendações abaixo são extraídas de um artigo do jornalista Bob Woodward, do Washington Post, e foram republicadas no jornal O Estado de São paulo, deste domingo, 18.01.2009 (p. J3), no artigo reproduzido sob o título "Dez lições de Bush para Obama".
Trata-se de um conjunto de lições que Woodward recupera da presidencia de George W. Bush, que se encerra melancolicamente nesta terça-feira, 20 de janeiro de 2009, mas que ele pretende contenha alguns ensinamentos para o seu sucessor, Barack Hussein Obama.
Como tal, esse conjunto de ensinamentos são extraídos de episódios dramáticos ou definidores da administração Bush, e o artigo vem com comentários extensos, mostrando exemplos concretos de como cada uma das lições se referem a episódios ou processos efetivamente ocorridos nessa administração.
Não vou transcrever todo o artigo (que pode ser lido neste link), que é relativamente longo, mas vou transcrever apenas as lições, que possuem um caráter quase universal, pelo seu conteúdo genérico, suscetíveis de serem aplicadas, portanto, a todo e qualquer presidente envolvido em processos democráticos de tomada de decisões e de implementação dessas decisões. Elas não valem, assim, para ditadores ou mesmo para regimes parlamentares.
Em todo caso, vale ler e refletir.

Dez lições para os presidentes

1. Os presidentes definem o tom do relacionamento entre os membros da sua equipe. Não se pode ser passivo nem tolerar divisões virulentas.
2. O presidente deve insistir para que todos se pronunciem abertamente uns diante dos outros, mesmo que haja - ou especialmente quando houver - discordâncias veementes.
3. Um presidente precisa fazer a lição de casa para dominar as ideias e conceitos fundamentais por trás das medidas que adota.
4. Os presidentes precisam fazer com que as pessoas exponham seus pontos de vista e se certificar de que as más notícias cheguem ao Salão Oval.
5. Os presidentes precisam fomentar uma cultura de ceticismo e dúvidas.
6. Os presidentes recebem dados contraditórios e precisam confrontá-los com rigor.
7. Os presidentes precisam contar a verdade nua e crua ao público, mesmo que isso signifique dar notícias muito ruins.
8. Motivos justos não bastam para garantir eficácia política.
9. Os presidentes precisam insistir em pensamento estratégico.
10. Os presidentes devem abraçar a transparência.

========

Se ouso acrescentar um comentário, seria este: presidentes que atuam em ambientes democráticos e que se guiam por estas lições, ou ensinamentos, nem por isso serão grandes estadistas ou sequer bons presidentes. É preciso um mínimo de qualidades individuais, fundadas não apenas no conhecimento mas sobretudo no caráter, para ficar na história como grandes líderes. Poucos passam pelo teste, obviamente.
Ouso afirmar que, na história do Brasil, poucos passaram por esse teste.
A história costuma julgá-los severamente, mas a história também é construída pelos nossos conceitos e preconceitos.
Voltarei ao assunto.

1010) The Ascent of Money: uma entrevista com Niall Ferguson

O historiador britânico Niall Ferguson publicou, como se sabe, um livro de história financeira, recuando mais ou menos quatro mil anos na trajetória monetária da humanidade.
O livro tem origem num programa de TV, que será veiculado pela PBS americana no final de janeiro de 2009.
Nesta entrevista à rede de negócios Bloomberg, ele comenta sobre as aventuras monetárias e financeiras.
Ver neste link do YouTube: http://br.youtube.com/watch?v=HiF1YMpTewE

1009) De volta ao debate sobre as cotas raciais no Itamaraty

Permito-me retomar aqui e agora um velho debate, que divide desde alguns anos a sociedade brasileira, e que promete deixar um legado que reputo especialmente nefasto no futuro previsível. Refiro-me ao debate nocivo sobre as cotas raciais, e não preciso obviamente dizer mais uma vez que sou absolutamente contrário a toda e qualquer política de cunho racialista no Brasil, na medida em que ela traz consigo não apenas mais racismo, como também contribuir para criar neste país, desta vez de forma institucionalizada e com o apoio oficial do Estado brasileiro, um regime de Apartheid, o que é obviamente algo inaceitável em qualquer plano moral que se possa conceber como fundamento de uma sociedade sadia.
Como uma leitora, para mim desconhecida, postou mais um comentário a um post de dezembro de 2008, e como isso me levou a retrucar sua postura em favor de cotas raciais, creio ser útil postar novamente, em benefício dos leitores interessados, tanto o post original, como o conjunto de comentários até aqui coletados a esse propósito.
É o que faço a partir de agora.
PRA, 18.01.2009

Cotas no Itamaraty: de volta a um debate complexo

Quarta-feira, Dezembro 24, 2008

979) Bolsas de Acao Afirmativa: preparacao de plano de estudos

Recebi, de um candidato à carreira diplomática, presumivelmente negro, um pedido de ajuda na preparação de um plano de estudos para poder candidatar-se à Bolsa do Programa de Ação Afirmativa do Instituto Rio Branco, que contempla aspirantes afrodescentes com apoio financeiro durante um ano, para a contratação de professores particulares, compra de livros e outros materiais de estudo, pagamento de cursinho, etc.
Devo dizer que sou filosoficamente contrário a esse programa, que me parece inscrever-se num esforço de militantes negros, apoiado pelo próprio governo, para desenvolver uma série de iniciativas de conteúdo racialista, que reputo como especialmente nefasto para o futuro da sociedade brasileira, a introduzir um elemento de apartheid nas relações entre grupos étinicos formadores do povo brasileiro.
Sou a favor de bolsas para aqueles desprovidos de meios, sem qualquer critério racial.
Isso não me impede, contudo, de responder à consulta do candidato, como fiz abaixo, logo em seguida à transcrição da mensagem recebida (devidamente descaracterizada).

PROGRAMA DE AÇÃO AFIRMATIVA DO INSTITUTO RIO BRANCO QUANTO A BOLSAS-PRÊMIO DE VOCAÇÃO PARA A DIPLOMACIA
On 24/12/2008, at 13:14, (XXX) wrote:
Mensagem enviada pelo formulário de Contato do SITE.
Nome: (XXX)
Cidade: São Paulo
Boa Tarde Professor!
Estou escrevendo para pedir um auxilio do senhor quanto ao processo do PROGRAMA DE AÇÃO AFIRMATIVA DO INSTITUTO RIO BRANCO QUANTO A BOLSAS-PRÊMIO DE VOCAÇÃO PARA A DIPLOMACIA.
Defendi meu doutorado em 2007 e desde então venho tentando ingressar nessa honrosa carreira. Desde minha graduação já tinha interesse, mas devido ao meu anseio em terminar meus estudos academicos fui deixando a oportunidade para adiante. Vou fazer o processo agora em 2009 pra tentar uma bolsa, haja visto que infelizmente me encontro desempregado e creio ser uma otima oportunidade para suprir minhas deficiencias (caso consiga). Nesse caso, peço desculpas ao senhor, mas queria saber quanto ao fato de que tenho que montar umn plano de estudos pra enviar ao Instituto Rio Branco, mas não tenho muita segurança de como deve ser esse plano. Se é algo parecido como um plano de pesquisas. Desde já peço desculpas pelo incomodo e agradeço pela atenção dispensada a minha pessoa.
Boas Festas
(XXX)

Minha resposta foi a seguinte:

(XXX),
Eu não tenho muita experiência com esse programa e não sei como e quais são os critérios de selecao, mas suponho, justamente, que muito depende de seu plano de estudos, que deve ser claro, objetivo e conciso.
Creio que uma estrutura ideal seria esta:

A. Informações pessoais
B. Formação academica
C. Avaliação da preparação pessoal ao concurso do IRBr
(pequena avaliacao qualitativa das suas "fortalezas" e "debilidades" em função da formação e das leituras)
D. Plano de Estudos
Dirigidos: curso em SP (custos, tempo, etc)
Pessoais: dedicacação especifica e reforçada em determinadas leituras, em função de C.
Listagem das materias que necessitam preparação reforçada: 1. Portugues; 2. Ingles...etc
E. Custos estimados
(avaliação geral das despesas a serem incorridas com os cursos, compra de livros, professor particular em certas matárias, assinatura de revistas e jornais, internet a cabo, etc)
F. Cronograma tentativo
(distribuição de todas essas atividades ao longo de um ano de bolsa)
G. Declaração final sobre o Programa
(especificar porque e quanto a bolsa seria importante para voce, renda pessoal, situacao familiar, profissional, etc...)
-------------
Paulo Roberto de Almeida

5 Comentários

Blogger Caio Bertoni Viana Rocha disse...
Professor,
Concordo plenamente com sua posição acerca do assunto.
É louvável que o governo tenha a intenção de democratizar o ingresso ao Instituo Rio Branco, visando a diversificação e uma melhor representação da população brasileira nos quadros do MRE.Porém, assim como o senhor já disse, os critérios para a habilitação à concorrência de tais bolsas deveriam ser meramente econômicos e de maneira alguma raciais.
Parabéns pelo blog!
Abraços,
Caio B. V. Rocha
Quinta-feira, Dezembro 25, 2008 2:17:00 PM

Anônimo Glauciane Carvalho disse...
As ações afirmativas são, extremamente, necessárias no Brasil, tendo em vista o débito histórico do governo brasileiro com a comunidade negra.Contudo, a política de cotas adotada, hodiernamente, se apresenta com uma base estrutural deficitária. Pois como o ilustre professor abordou há características de segregação, o que realmente, é maléfico para a sociedade brasileira. Mas nós temos que observar que o problema não se limita às cotas, ele é muito mais complexo, pois também se refere à falta de investimentos na área de Educação, algo que infelizmente o governo não vai resolver da noite do para o dia, por falta de disposição e de comprometimento com suas promessas de campanha frente à população brasileira.
Eu particularmente, acho benéfica esta política de bolsas, mas concordando com o renomado professor, deveria ser adotada para pessoas desprovidas de recursos. Desta forma, teríamos mais igualitarismo nas relações humanas, no contexto histórico brasileiro. Todavia, ainda que eu também seja contra a política de cotas, e deixo claro que sou da raça negra, acho que são necessárias, momentaneamente, para que se possa tentar amenizar os erros do passado.
A política de bolsas para afrodescedentes deveria ser adotada em todas as esferas. Pois existem brancos pobres que não tem condições de se preparem também para a prova do Itamaraty. E esses brasileiros, onde ficam nas políticas de inserção? Quem vai tutelar os seus direitos? Imagine só a situação de política de cotas para brancos ? Com certeza, nós chamaríamos de racismo, então, por que utilizar o nome política de cotas para afro descendentes? Neste sentido, concordo com o prof. Paulo e acho que a solução para as várias mazelas educacionais no Brasil seria investimento acirrado no ensino fundamental e médio,independente da raça, para que se possa, gradativamente, acabar com as prerrogativas, e não privilégios, pois são respaldadas em nossa ordem jurídica e dar mais isonomia e chances a todos os brasileiros. Deixo claro que sou negra e contra a política de cotas, mas neste momento, histórico brasileiro, elas são necessárias.
Quinta-feira, Dezembro 25, 2008 6:45:00 PM

Blogger Mila Donasc disse...
Concordo em Absoluto com o Dr. Paulo Roberto,é verdade que históricamente o Brasil é um país desigual, nada mais comum para um país jovem e que já passou por tantos momentos de instabilidade política. Políticas compensatórias não são definitivamente solução para o problema da desigualdade do Brasil, muito menos num nível como diplomacia, a revolução educacional deve ser feita a partir da base e assim todos terão condições equiparadas para disputar altos cargos como este. Sem citar o fato de que o Brasil não é um país racista e nem precisa desse tipo de estimulo para começar a ser. Quem acha que somos um país racista, nunca viajou nem sequer estudou esse problema em outros países do mundo. É preciso acabar com essa história de que o Brasil é um país muito rico, e entender que os recursos são limitados, quanto mais dinheiro se gasta em politicas "afirmativas" menos dinheiro sobra para se investir em educação de base com qualidade.
Sábado, Dezembro 27, 2008 12:31:00 AM

Anônimo Glauciane Carvalho disse...
Desculpa senhora Mila, mas os investimentos nas ações afirmativas não atingem de forma a prejudicar os investimentos em Educação neste país. Existem muitos outros fatores que comprometem a Educação no nosso país e acho uma grande injustiça afirmar que ações afirmativas comprometem investimentos em Educação.O que para mim acaba em "sofisma hermenêutico" da problemática real enfrentada pelo Brasil. Acabar com o desvio de finalidade pública pode ser uma das grandes soluções para Educação em nosso país. Acabar com ações afirmativas seria no mínimo de absoluta irresponsabilidade de um governo, seja qual for a sua posição no globo. Devemos lutar pela "Revolução Educacional", mas simplesmente ignorar a hecatombe proferida com a escravidão e suas conseqüências nefastas para a formação da sociedade brasileira é no mínimo preocupante, para não dizer temerário.
Domingo, Dezembro 28, 2008 1:02:00 AM

Anônimo Gláucia disse...
O proprietário do blog poderia, sendo um membro da corporação, solicitar o dado empírico: quantos diplomatas negros há hoje no Itamaraty? Melhor: quantos no curso do Instituto? Duvido que passe de 3%. O que acharíamos se todos os diplomatas indianos que encontrássemos fossem brancos, metade deles de olhos claros?
O Itamaraty representa o Brasil, e deve - num país que, evidentemente, ainda não somos - refletir minimamente a composição étnica da população. O governo faz isso, nesse caso, do melhor jeito: não oferecendo vagas automáticas, mas evitando que o poder econômico, como sempre faz, se imponha e impeça os negros de competir em condições de igualdade com os brancos.
O problema a resolver não é o da falta de pobres no Itamaraty, e sim o da falta de negros. Por isso, a ação afirmativa baseada em critérios raciais é a solução correta.
Domingo, Janeiro 18, 2009 4:57:00 PM

PRA: 18.01.2009
Discordo ABSOLUTAMENTE (com perdão pela veemência das maiúsculas) da leitora Glaucia.
Pedir ao Estado brasileiro que verifique, estatisticamente, quantos "negros" são atualmente diplomatas e que, a partir daí, determine uma cota para o ingresso de "negros" na carreira diplomática, é uma tese absolutamente racista, e pretende que o Estado brasileiro seja um ativo promotor do APARTHEID (desculpas, mais uma vez).
A leitora Glaucia está absolutamente enganada, sob todo e qualquer critério que se possa conceber, a começar pelo antropológico, pois seria para ela, e para qualquer pessoa, impossível determinar quem, da MAIORIA de mulatos que compoe a população brasileira, responde, no limite, à condição de "negro", como ela pretende, o que, repito, é uma tese racista e absolutamente inaceitável para qualquer padrão moral que se conceba quanto à unidade fundamental do ser humano.
Certo, ela parte de uma realidade sociológica -- que comprova que os negros e mulatos são a maioria de pobres neste país, e portanto, desfavorecidos no emprego, na educação, na vida profissional em geral -- para tentar fazer justiça social em detrimento de todos os pobres, mulatos ou não, que não poderiam ostentar essa condição racista de "negros" -- que seria obviamente reservada a menos de dez por cento da população brasileira -- para se beneficiarem de um regime de cotas que introduziria oficialmente o Apartheid em nosso país.
Sou FUNDAMENTALMENTE contra qualquer racismo em benefício de quem seja, admitindo, tão somente, que pobres em geral recebam o benefício de bolsas de estudo para tentarem equalizar suas chances de disputa com privilegiados em geral (de qualquer cor) em concursos públicos.
O mundo é injusto -- todos sabemos disso -- mas tal realidade não nos autoriza a criar mais injustiças e imoralidades apenas para corrigir males que convivem conosco por razões históricas e estruturais. Devemos, sim, esforçar-nos para corrigir essas iniquidades da melhor forma possível, atuando sobre os fatores REAIS de iniquidade, que são basicamente os de natureza econômica e social.
Estou plenamente consciente de que fatores racialistas -- ou seja, emergindo do preconceito, mas não fatores raciais, em nosso país -- estão na origem de muito sofrimento e discriminação exercidos contra pessoas negras e mulatas escuras em geral no Brasil, e isso é um resíduo dessa estupidez humana ainda persistente que se chama racismo (que ainda existe, obviamente, como componente inevitável dos comportamentos humanos ao longo do tempo). Apenas tenho a consciência ainda mais acurada de que o Estado não pode se erigir em agente de um outro tipo de racismo, institucionalizado, para corrigir os racismos individuais que existem na sociedade.
Seria a falência moral de uma sociedade construpida sobre a igualdade fundamental do ser humano.
PRA, 18.01.2009

========

Addendum:
O blog, como sempre, continua aberto ao debate neste campo e não tenho nenhuma objeção a publicar toda e qualquer posição pertinente (talvez até impertinente), mesmo as mais abertamente racistas, desde que não sejam meramente ofensivas, visivelmente impertinentes ou ridículas -- sim, eu me dou o direito de julgar -- ou que se coloquem muito fora de um debate civilizado a este respeito.
Creio que todo mundo tem o direito de expressar a sua opinião, mesmo quando ela seja declaradamente racista, desde que não incite, obviamente, à violência e ao ódio racial, o que vai contra princípios mínimos de convivência social ou humana.
Existe, no Brasil, uma quantidade razoável de pessoas, negras, brancas e mulatas, que defendem cotas raciais, como "solução" ao problema da discriminação, da "inferioridade" social ou profissional, ou da falta de oportunidades de ascensão social aos que, tendo vindo de uma herança afro-brasileira, foram de fato discriminados pela pobreza, indiferença do Estado e falta geral de oportunidades de estudo e de trabalho no Brasil. Respeito a posição dessas pessoas, e creio que a maior parte age de boa-fé, mas não creio que políticas racialistas -- para não dizer racistas -- sejam a solução do problema.
Sou, sim, favorável a um imenso esforço do Estado e de toda a sociedade brasileira pela inclusão social de todos os pobres e desfavorecidos via um gigantesco programa de melhoria da qualidade da educação em todos os níveis, a começar pelo pré-primário e por toda a escola fundamental e técnico-profissional (já sou menos favorável ao apoio indiscriminado no ensino superior, achando que este é uma escolha pessoal ou familiar, e não um dever do Estado ou da sociedade).
Portanto, continuarei postando e debatendo essa questão das cotas, com absoluta transparência de posições, de todos os lados que porventura resolvam se expressar neste espaço.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

1008) Uma Liga das Democracias: proposta ingenua, talvez

Transcrevo, apenas. Mais adiante pretenderia comentar esta questão, com a qual estou de acordo no conceito geral, no seu princípio filosófico, digamos assim, mas que reputo irrealizável e até inexequível no plano do próprio entendimento conceitual do que seja uma democracia, ou que esse "animal" possa ser exportado ou importado...

Is a League of Democracies a Good Idea?
Thomas Carothers
Carnegie Endowment
Policy Brief No. 59 May 2008

Influential policy experts on both sides of the U.S. political aisle are proposing a “League of Democracies” as a way for the next administration to restore the credibility of U.S. foreign policy priorities and put democracy promotion efforts back on track. However, in a policy brief, Is a League of Democracies a Good Idea?, Thomas Carothers argues that the proposal rests on a false assumption that democracies share sufficient common interests to work effectively together on a wide range of global issues.

Although the proposed “League of Democracies” reflects a useful recognition of the need to rebuild credibility through greater multilateralism, such a league could aggravate rather than alleviate global sensitivities over U.S. democracy promotion and the U.S. global security agenda. Carothers outlines steps the next U.S. president should take to bolster democracy promotion and foreign policy in general.

Recommendations for the next U.S. President:
* Opt for more flexible, case-by-case partnerships to fit specific issues and contexts.
* Make clear that the United States does not intend to use military force or other means to overthrow governments in the name of democracy.
* Reverse policies that produce U.S. abuses of the rule of law and of basic civil liberties at home and abroad.
* Push not only hostile autocrats, but autocratic allies such as Pakistan and Egypt, to take serious steps toward greater openness and political reform.
* Commit to strengthening existing multilateral institutions that deal with democracy issues, such as the United Nations, the Organization of American States, and the Organization for Security and Co-operation in Europe.

“The idea for a League of Democracies reflects a valid concern with the fact that the overall state of democracy in the world is troubled and that alternative power centers with an authoritarian character are gaining in strength. The best way to respond to this new context and to rebuild the legitimacy of the United States as a global actor is not to circle the ideological wagons. Instead it is to make the United States a better global citizen on numerous fronts and get the country’s own economic and political houses in order.”

About the Author
Thomas Carothers is vice president for studies at the Carnegie Endowment. A leading authority on democratization and democracy promotion, he has researched and worked on democracy-building programs around the world for 20 years with many U.S., European, and international organizations. He has written numerous books on democracy promotion including most recently Confronting the Weakest Link: Aiding Political Parties in New Democracies and Promoting the Rule of Law Abroad: In Search of Knowledge.

Para ler o texto em sua integralidade, em arquivo pdf, siga este link.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

1007) O tamanho (relativo) do Mercosul

Os deputados brasileiros acabam de dar o primeiro golpe de picareta no edificio igualitário do Mercosul, propondo uma representação proporcional do corpo parlamentar do bloco, o que vai ser dificil de engolir pelos demais paises.
Em todo caso, alguém imagina que o Mercosul precisa de 175 representantes para discutir os problemas do bloco?
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Parlasul voltará a discutir número de representantes por País

A composição do Parlamento do Mercosul (Parlasul) voltará a ser discutida no próximo dia 9 de fevereiro, em reunião da Mesa Diretora do Parlamento.

O presidente do Parlasul, deputado Dr. Rosinha (PT-PR), afirmou que é preciso haver acordo sobre o número de parlamentares que cada país-membro terá. Ele disse que, se não houver esse acordo, a eleição direta para os representantes do Parlamento em 2010 está ameaçada.

"Como não tomamos essa definição ainda, eu temo que não dê tempo de, na eleição de 2010, elegermos diretamente todos os parlamentares do Parlamento do Mercosul e acabar sendo por indicação indireta, como é hoje", disse Dr. Rosinha.

Há dois anos, Brasil, Paraguai, Argentina e Uruguai tentam chegar a um acordo sobre a composição do Parlamento. Atualmente, cada um dos quatro países têm 18 representantes. A Venezuela, que está em fase de adesão, tem nove representantes.

A proposta do Brasil é para que o País tenha 75 representantes; Argentina, 33; Paraguai e Uruguai, 18 cada um; e a Venezuela, 27, totalizando 171 parlamentares. O Paraguai defende a manutenção de 18 parlamentares para cada País, em um total de 90, e é o único país do bloco que já escolheu seus representantes de forma direta. Em fevereiro, o Paraguai assume a presidência do Parlasul, que hoje está com o Brasil.

1006) Forum Social Mundial: comentarios adicionais...

Fórum Social Mundial: bom para o turismo de massa
(Addendum em 28.01.02: Breves comentários sobre o Fórum Social Mundial, no seguimento de meu artigo publicado no dia 26.01.2002, objeto do post anterior.)

O FSM constitui, sem dúvida alguma, um enorme sucesso do ponto de vista mediático, uma vez que conseguiu reunir número expressivo de participantes de vários continentes e de vários espectros ideológicos, geralmente identificados com a esquerda anti-globalizadora. Esse sucesso, paradoxalmente, deve ser creditado inteiramente à globalização, em especial às novas formas de comunicação pela Internet e de disseminação de notícias por boletins eletrônicos. Torna-se irônico constatar, assim, que os anti-globalizadores revoltam-se, ingenuamente, contra as próprias condições que tornaram esse movimento não apenas possível e viável, como bem sucedido em termos de organização e de propaganda.
Trata-se, igualmente, de um grande sucesso para os governos respectivos da cidade de Porto Alegre e do estado do Rio Grande do Sul, ambos dominados pelo Partido dos Trabalhadores, plenamente identificado com a causa da anti-globalização. Esse sucesso não deveria manifestar-se em qualquer tipo de apoio politico à atual campanha eleitoral em que o PT se encontra engajado (uma vez que o Foro é, em princípio, a-partidário), mas em um grande retorno turístico para a capital gaúcha, numa época em que seus habitants desertam a cidade em troca das praias do litoral, escapando ao forte verão urbano e à própria morosidade da época de férias. Os comerciantes e hoteleiros – assim como as autoridades locais de coleta de impostos – devem estar plenamente satisfeitos com as receitas auferidas pelo convescote de alguns milhares de visitants estrangeiros.
Em termos substantivos, porém, não se pode acreditar que os resultados do FSM tenham feito avançar um milímetro sequer a resolução de alguns problemas graves que afetam a humanidade como um todo – desigualdades persistentes entre países pobres e ricos e, nacionalmente, entre estratos sociais, deterioração das condições de vida e de meio ambiente em determinados países e regiões, perigos decorrentes do armamentismo, da criminalidade organizada, da corrupção política, discriminação com base em critérios raciais, religiosos ou étnicos – ou mesmo problemas conjunturais que afetam alguns países em desenvolvimento, particularmente (crises financeiras, falta de acesso a mercado para algumas produções primárias, falta de oportunidades educacionais).
Os anti-globalizadores partem da idéia falsa de que a globalização produz miséria e desigualdade, quando são precisamente os países mais inseridos nesse processo que lograram escapar de níveis mais preocupantes de pobreza. Eles também preconizam o apoio a políticas comerciais protecionistas e a políticas agrícolas subvencionistas, quando se trata de dois fatores que têm impedido os países em desenvolvimento de usufruir de melhores condições de acesso aos mercados internacionais, a tecnologias modernas e a níveis mais altos de produtividade (e portanto de maior bem estar).
Suas recomendações são ou paliativos sem qualquer efeito sistêmico de maior impacto (perdão da dívida dos países pobres altamente endividados, defesa do meio ambiente), ou são claramente negativos do ponto de vista da disseminação tecnológica e da inserção produtiva dos países pobres na economia mundial. Desse ponto de vista, Porto Alegre não representou grandes avanços conceituais ou práticos.
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Este pequeno pos-script foi escrito em janeiro de 2002, pouco depois do piquenique de Porto Alegre, então uma capital alternativa...

1005) Forum Social Mundial: antecipando as conclusoes

Em previsão da próxima edição anual do jamboree antiglobalizador, andei dando uma olhada no que, exatamente, eu havia escrito em antecipação de outros eventos do gênero. Encontrei uma peça escrita antes do segundo encontro em Porto Alegre, em janeiro de 2002. Nela eu antecipava as conclusões que eu imaginava seriam aprovadas naquele encontro. Engano meu, pelo menos quanto a conclusões, mas eu estava certo quanto ao conteúdo das "idéias" que estariam sendo ali veiculadas.
Não creio que, sete anos depois, as (poucas) idéias (se ouso usar este conceito inteligente para tão pobres assertivas) dos antiglobalizadores tenha mudado muito: ao contrário, elas permanecem rigorosamente as mesmas.
Por prova, e antecipando-me ao próximo encontro do Fórum Social Mundial de Belém, a realizar-se mais no final deste mês de janeiro de 2009, em Belém, transcrevo aqui meu artigo publicado pouco antes do encontro de Porto Alegre.

A esquerda jurássica marca encontro em Porto Alegre
Paulo Roberto de Almeida
O Estado de São Paulo, 26 janeiro 2002

Num momento em que até os socialistas franceses, bem conhecidos pelos infantilismos com que ainda alimentam seu proverbial anti-imperialismo (doublé de um anti-americanismo primário), arejam suas idéias e publicam livros que ousam constestar algumas das idées reçues (falsos conceitos) de um credo vetusto, num momento em que o bom senso econômico parece enfim ter penetrado o cérebro embotado de alguns anti-capitalistas arcaicos, num momento, emfim, em que até no Brasil o debate político-eleitoral parece encaminhar-se para um pouco de racionalidade, soam estranhos alguns dos slogans que vêm sendo agitados em preparação ao Foro de Porto Alegre.
Pomposamente designado como “Foro Social Mundial” (como se o tradicional foro econômico de Davos fosse infenso ao debate das questões sociais), o jamboree alternativo de Porto Alegre promete muito frisson e pouca sensatez, num mundo já sacudido por impulsos fundamentalistas e ataques simplistas ao neoliberalismo. Até os socialistas franceses que prometem desembarcar en masse, já não dispõem das antigas certezas e não contam mais com a unanimidade do pensamento único socialista.
Recentemente, três (ex-?)esquerdistas franceses, da ala moderna da tecnocracia socialista, publicaram livros que ousam nadar contra a corrente da qual emergiram. Com efeito, Pascal Lamy (atual comissário europeu para questões comerciais) e Jean Pisani-Ferry, com L’Europe de nos volontés (A Europa que nós queremos) e Dominique Strauss-Kahn (ex-ministro socialista da economia), com La flamme et la cendre (A chama e a cinza), acabam de revelar sua discordância (discreta, é verdade) em relação a alguns dos tabus mais entranhados nessa mesma esquerda: o papel do Estado, a extensão do setor público, a defesa da (famigerada, para nós) Política Agrícola Européia e, quelle horreur!, a chamada “exceção cultural”, também conhecida na indústria do audio-visual como exception française. Em seus respectivos livros, eles reconhecem a dificuldade especificamente francesa de aceitar a revisão de algumas idéias bem entranhadas na ideologia estatizante que caracterizou desde sempre o socialismo francês. O francês típico, até mais do que o socialista, tem realmente um bloqueio mental em relação aos chamados droits acquis, também conhecidos entre nós como “direitos adquiridos” (lembram-se perene arenga com que os nossos socialistas e estatocratas agitam a defesa de solenes “princípios constitucionais”?).
Posso estar errado, mas creio que esses três tecnocratas modernistas da esquerda francesa não acompanharão a meia dúzia de seus outros colegas de ministério e dezenas de outros expoentes da gauche française no périplo deste final de mês em Porto Alegre, que promete converter-se temporariamente numa filial da Rive Gauche. Mas o que exatamente eles poderiam vir fazer na capital do socialismo moreno?: veicular suas teses contestadoras das velhas idées reçues da maior parte dos participantes naquele convescote? Que ousadia!. Eles seriam tremendamente vaiados e praticamente escorraçados pelos anti-globalizadores de todos os matizes que estarão reunidos em Porto Alegre, não para lançar as sementes de uma nova reflexão crítica sobre a globalização e eventuais políticas reformistas de cunho social, mas sim para confirmar a aceitação acrítica das mesmas banalidades de sempre.
Estarei exagerando na crítica premonitória? Não creio. Em todo caso, anotemos desde já algumas das “conclusões” e rsoluções que resultarão do piquenique de Porto Alegre e marquemos encontro em fevereiro para conferir a lista efetiva das meias verdades que dali emergirão. Em Porto Alegre, a vanguarda do atraso aprovará, aclamará, confirmará as seguintes contribuições geniais para a análise dos tempos modernos (atenção, a lista não é exaustiva):
1) A globalização produz inevitavelmente crises, desigualdades e retrocesso social, como “demonstrado” pelas turbulências financeiras dos anos 90, pela divergência cada vez maior entre países pobres e ricos e pelo aumento da concentração de renda em todos eles.
2) A estagnação e o colapso de países outrora ricos (como a Argentina) foram provocados pela adesão às regras do “consenso de Washington”, isto é, pela adesão acrítica e incondicional às políticas neoliberais, a começar pela fixação do câmbio, recomendada e sustentadas pelo FMI; essas mesmas políticas também estão causando recessão e retrocessos sociais em outros países da América Latina, a começar pelo próprio Brasil.
3) A soberania nacional precisa ser defendida contra o projeto imperialista de uma zona de livre comércio hemisférica, imposta contra a vontade dos povos latino-americanos pelo capital monopolista americano, que pretende nivelar o terreno para criar um espaço econômico ampliado para a “acumulação ampliada de capital”.
4) Deve-se, sim, defender a legitimidade de políticas públicas de “reserva de mercado” e de apoio a uma “agricultura multifuncional”, inclusive e principalmente os generosos subsídios estatais que marcam essa invenção genial de políticos de direita e tecnocratas de esquerda que é a Política Agrícola Comum.
5) O racismo, a discriminação contra a mulher, a opressão dos povos periféricos e o próprio terrorismo fundamentalista são o resultado da globalização e de um processo histórico marcado pela ocupação imperialista, que insiste em preservar “estruturas de dominação”, inclusive mediante o “terrorismo de Estado”.
6) Mas, como demonstrado pelo Foro de Porto Alegre, um outro mundo é possível e políticas alternativas são, não apenas desejáveis como, necessárias. Essas políticas passam pela promoção dos direitos humanos à frente dos direitos do capital e os fluxos especulativos desse parasita social devem ser adequadamente controlados e reprimidos, se possível pela aplicação universal da Tobin Tax.
Essas são, em síntese, algumas das meias verdades e das velhas mentiras que resultarão do rendez-vous de Porto Alegre. Não acredita? Marquemos rendez-vous em fevereiro para verificar a lista das resoluções (uma comparação com os debates do Foro Econômico Mundial, que este ano se reune em Nova York, não seria despropositada).

Paulo Roberto de Almeida é sociólogo, com especialização em
relações internacionais (www.pralmeida.org).

[Washington: 854: 24.01.02]
Publicado n’O Estado de São Paulo (Sábado, 26 janeiro 2002, seção “Espaço Aberto”; link).
Relação de publicados nº 300.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

1004) Da arte de ser contrarianista

Certos textos nos deixam saudades, e a eles retornamos ocasionalmente, ou ao acaso da organização de trabalhos e papéis, que todo final ou começo de ano enseja. Pois bem, reorganizando agora meus trabalhos publicados ou originais, deparei com um ensaio que leva o título acima.
Comecei a ler e acho que ele merece nova transcrição, pelo menos parcial.

A arte de ser contrarianista
Por Paulo Roberto de Almeida

Já me defini, em algum trabalho anterior, como um “contrarianista”, isto é, alguém que procura ver as “coisas da vida” com um olhar cético, sempre interrogando os fundamentos e as razões de por quê as coisas são daquele jeito e não de outro, ou de como elas poderiam ser ainda melhores do que são, aparentemente a um menor custo para a sociedade ou atendendo a critérios superiores de racionalidade e de instrumentalidade. Ou seja, em linguagem da economia política, o contrarianista é um indivíduo que está sempre procurando aumentar as externalidades positivas e diminuir as negativas, sempre efetuando cálculos de custo-oportunidade do capital empregado, sobre o retorno mais eficiente possível, adequando os meios disponíveis ao princípio da escassez.

O contrarianista não é, a despeito do que muitos possam pensar, um ser que sempre é “do contra”, um caráter negativo ou pessimista. Ao contrário, trata-se, para ele, de buscar otimizar os recursos existentes, indagando continuamente como fazer melhor, eventualmente mais barato, com os parcos meios existentes. Esta é a minha concepção do contrarianismo, uma arte difícil de ser exercitada, mais difícil ainda de ser compreendida. Eu a definiria, segundo uma lição que aprendi ainda na adolescência, como um exercício de “ceticismo sadio”, ou seja, o espírito crítico que não se compraz, simplesmente, em negar as “coisas” como elas são, mas que se esforça, em toda boa-vontade, para que elas sejam ainda melhores do que são, questionando sua forma de ser atual e propondo uma organização que possa ser ainda mais funcional do que a existente.

Por isso mesmo, pretendo, neste curto ensaio, tecer algumas considerações sobre a arte de ser contrarianista, o que, confesso, não é fácil. Sempre nos arriscamos a ser incompreendidos, em aparecer como puramente negativos ou derrotistas, quando o que se busca, na verdade, é reduzir o custo das soluções “humanamente produzidas” (elas sempre são falhas). Talvez, a melhor forma de se demonstrar, na prática, a arte do contrarianismo, seria elaborar uma série de manuais de sentido contrário, isto é, em lugar dos How to do something, escrever sobre “como não fazer” determinadas coisas. Como eu exercito muito freqüentemente a resenha de livros, creio que não seria difícil oferecer algumas observações sobre essa prática corriqueira da vida cotidiana.
(...)

Curiosos, interessados, podem ler o resto neste link.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

1003) De volta ao problema do terrorismo islamico

A terrivel guerra sendo conduzida atualmente (janeiro de 2009) entre as Forças de Defesa de Israel e os terroristas-guerrilheiros do Hamas, na Faixa de Gaza, com imensas perdas humanas e materiais, me levou a novamente refletir sobre a natureza das ameaças atuais às sociedades que cultivam os valores humanos, a vida, o respeito aos direitos fundamentais, e aqueles que colocam em perigo esses mesmos valores.
Lembrei-me de um velho trabalho, escrito e publicado há praticamente dois anos, que talvez permaneça ainda válido.
Ei-lo:

Uma quarta guerra mundial?
Paulo Roberto de Almeida

Os historiadores, os cientistas sociais, os atores políticos e até os simples cidadãos sabem exatamente o que é o terrorismo, ainda que possam divergir quanto à sua exata definição, ou discordar, em função de suas sociedades de origem e de suas preferências ideológicas, quanto ao seu papel na presente etapa da humanidade, supostamente promotora do respeito aos direitos humanos e da legalidade internacional sob a égide da ONU e de convenções internacionais.

Qualquer que seja a definição que possamos dar ao fenômeno terrorista, uma modalidade específica se destaca na atualidade: o terrorismo islâmico-fundamentalista. Não há nenhuma dúvida de que ele constitui uma terrível realidade contemporânea da qual talvez não tenhamos (mas deveríamos ter) a dimensão e a consciência exatas do que ela significa na história da humanidade. Está se constituindo uma modalidade de terrorismo político-religioso sem qualquer precedente na história da humanidade, que promete ficar conosco durante muito tempo ainda: o terrorismo islâmico-fundamentalista, uma nova espécie de barbárie, que precisa ser chamada pelo que ela é, efetivamente.

Essa modalidade de terrorismo está sendo identificado, por alguns analistas, como sendo a Quarta Guerra Mundial (a terceira sendo constituída pela Guerra Fria, que terminou com a implosão do comunismo, que não foi obviamente destruído pelo capitalismo, mas foi eliminado por sua própria incompetência econômica e tecnológica). Alguns dos problemas para definir a sua especificidade e que dificultam sua compreensão e o seu combate eficaz derivam, talvez, dessa própria característica: a de que ele venha sendo designado como uma ameaça militar e que os meios de combatê-lo seriam basicamente de ordem tática. A própria escolha dos termos pode influenciar a estratégia de combate ao terrorismo, como revelado, por exemplo, na preferência do governo Bush por caracterizar suas iniciativas nessa área como sendo a war on terror. Vejamos, contudo, quais são algumas dessas especificidades e por que pode ser extremamente difícil lidar com essa nova realidade.

Esse novo terrorismo, de base inegavelmente e inquestionavelmente (é preciso que se o diga) islâmico-fundamentalista, visa simplesmente a causar o maior número de mortos, de forma indiscriminada (mesmo entre os próprios seguidores da religião islâmica), em nome de objetivos muito difusos, mas que todos têm a ver com a recusa da modernidade ocidental, com a rejeição das conquistas do iluminismo (que foi ocidental, mas é propriamente universal).

Esse terrorismo islâmico-fundamentalista é profundamente reacionário e obscurantista, e alguns observadores o acusaram de fascista, mas não creio que esse conceito apreenda suas características peculiares. O fascismo tem a ver com uma determinada noção de um regime político, com a conquista do Estado e a obtenção de objetivos políticos, econômicos e sociais. O terrorismo islâmico-fundamentalista é mais uma negação do que existe do que a construção de uma nova sociedade.

Esse terrorismo se baseia num estoque infindável de pessoas-bomba, de todos os gêneros e idades. Não é incomum assistir-se, na TV, reportagens que mostram alguma mãe de um pequeno candidato a menino-bomba (existem garotos de dez anos sendo treinados para isso) dizendo se sentir orgulhosa de ver seu filho sendo treinado para ser um combatente contra o inimigo sionista e americano. Pode ser patético, mas é revelador de um certo estado de espírito.

Qual é a sociedade que produz uma mãe que pede, literalmente, que o seu filho converta a si mesmo em bomba humana, levando consigo o maior número possível de inimigos? Não creio que seja uma sociedade “normal”, mas esse tipo de predisposição para o martírio corresponde a um movimento determinado, o do fundamentalismo islâmico, que aparentemente conquistou muita gente. Existem, como se sabe, muitos “meninos-bomba” em preparação, da Palestina ao Paquistão, e talvez mais além.

Não nos enganemos: todos esses candidatos voluntários ao martírio pertencem a um arco civilizatório específico: o do islamismo decadente e fracassado, não enquanto religião, mas enquanto sociedades “normais”. Por várias razões – entre elas a autocracia política e a falta de modernização econômica e social, pelo próprio fracasso dessas sociedades e desses Estados autoritários em prover meios de vida decentes a uma massa considerável de jovens desesperançados (e alimentados no ódio ao Ocidente, como se ele fosse responsável pelos fracassos) –, o movimento do terrorismo fundamentalista-islâmico dispõe hoje de um estoque infinito de candidatos a pessoas-bomba.

O que o Hezbollah, o Jihad, o Hamas e outros movimentos assemelhados fazem hoje, da Palestina à Índia, passando pelo Iraque e pelo Afeganistão, é exatamente isso: uma nova modalidade de terrorismo inaceitável na perspectiva de qualquer nação civilizada na face da terra.

Sim, existe uma diferença entre esses bárbaros e os antigos terroristas, da fase anarquista, quase romântica. Os antigos anarquistas, geralmente de extração operária, faziam atentados isolados, visando diretamente aos soberanos (presidentes, reis, autoridades em geral), pois queriam combater o Estado, que viam como mal absoluto. Expunham-se pessoalmente e conseguiam, em alguns casos, o seu intento. Era uma tática terrorista numa estratégia mais ampla de luta política, mas algo desorganizada, geralmente condenada pelos demais grupos de esquerda.

Os bárbaros da atualidade explodem a tudo e a todos, matando inocentes sem contar, sem qualquer objetivo militar aparente, numa estratégia de terror pelo terror. Eles também se expõem pessoalmente – e como: na promessa mirífica do paraíso dado automaticamente aos mártires – mas seus objetivos são indiscriminados, atingindo inocentes e alguns “correligionários”.

Acho que a realidade terrível está exposta, claramente. A nova barbárie bateu à nossa porta e ela promete perdurar por longos anos à frente. As pessoas que se julgam conscientes e responsáveis deveriam tomar partido. A linha divisória está posta.

Eu fico assustado de ver como a esquerda brasileira, e talvez a esquerda mundial, ainda se permite aplaudir esse tipo de gesto, apenas porque ele se dirige, supostamente, contra o inimigo imperialista ou sionista. Não gostaria de constatar que a esquerda se colocou do lado dos bárbaros, absolutos, inaceitáveis a qualquer pretexto.

Por outro lado, não creio que a resposta a esse novo fenômeno tenha de ser basicamente militar, isto é, baseada no enfrentamento de grupos terroristas com o objetivo de aniquilá-los, fisicamente. Esse tipo de tática os converte, imediatamente, em guerreiros de um novo exército, os eleva à categoria de soldados de uma causa e lhes traz, ao mesmo tempo, responsabilidade e respeitabilidade (aos olhos dos que comungam das mesmas idéias). A estratégia correta, mas muito mais difícil – reconheço – seria vencê-los no terreno das idéias, demonstrar a profunda desumanidade que encarnam, o total niilismo dos procedimentos e resultados. Obviamente, a responsabilidade maior por este tipo de mensagem “desmanteladora” da legitimidade das idéias terroristas está, antes, com os líderes religiosos e os clérigos do Islã (em suas diversas correntes) do que com os responsáveis dos países ocidentais.

O fato é que, atualmente, existe algo de profundamente errado e vicioso nas atitudes dos líderes religiosos do Islã; sua responsabilidade pelo terrorismo fundamentalista islâmico não pode, de nenhuma maneira ser afastada. O simples fato de não condenar, de forma veemente, autores e planejadores, cada vez que um ato bárbaro é perpetrado, os converte em coniventes, para dizer o mínimo, com seus autores. Existe uma guerra, mas ela se passa no interior do Islã...

Brasília, 1712: 18 janeiro 2007; revisão 23 junho 2007.
Paulo Roberto de Almeida

Publicado originalmente em Via Política
24.06.2007

domingo, 11 de janeiro de 2009

1002) Dez novas regras de diplomacia: um interesse persistente

Meu texto mais acessado na internet, que reproduzo abaixo novamente, foi escrito de maneira atabalhoada, entre uma viagem de carro nos EUA e uma ida e volta de avião ao Brasil, com base numa leitura anterior de um velho livro, como relatado abaixo. Como eu sempre carrego uma caderneta de notas comigo, apenas nos intervalos de viagem, ou durante o trajeto de avião, encontrava tempo para colocar no papel minhas reflexões sobre a atividade diplomática.
Trata-se, provavelmente, do texto que mais tocou os jovens candidatos à carreira ou mesmo os simples curiosos pelo assunto, pois que recebo continuamente comentários a respeito, alguns postados diretamente no blog.
Tendo em vista esse interesse continuado, faço nova postagem desse texto neste momento, para dizer que ele não teve, jamais, a pretensão de servir de guia para ninguém, constituindo, tão somente uma reflexão pessoal sobre o assunto, a partir de um livro mais que centenário. Mas, tendo em vista as reações despertadas, vou pensar em escrever algo mais elaborado a esse respeito.
Ele vai aqui transcrito em sua versão mais sintética, tendo uma versão maior sido publicada na revista Espaço Acadêmico (ano 1, nº 4, setembro 2001; ISSN: 1519.6186).

Dez Regras Modernas de Diplomacia
Paulo Roberto de Almeida
Quinta-feira, 22 de Dezembro de 2005

Este ensaio breve sobre as novas regras da diplomacia, me foi inspirado pela leitura de um livro de um diplomata português do século XIX: Frederico Francisco de la Figanière: Quatro regras de diplomacia (Lisboa: Livraria Ferreira, 1881, 239 p.). Ao lê-lo, passei a redigir imediatamente algumas regras mais adaptadas ao século XXI. O trabalho foi escrito originalmente entre Chicago (em 22 de julho de 2001) e depois novamente em viagem de São Paulo a Miami e daí a Washington (em 12 de agosto de 2001). Foi publicado originalmente na série “Cousas Diplomáticas” (nº 1), da revista eletrônica Espaço Acadêmico, e espero poder ampliá-lo assim que me for dada oportunidade.

Reflexões rápidas para futuro desenvolvimento...

1. Servir a pátria, mais do que aos governos, conhecer profundamente os interesses permanentes da nação e do povo aos quais serve; ter absolutamente claros quais são os grandes princípios de atuação do país a serviço do qual se encontra.
O diplomata é um agente do Estado e, ainda que ele deva obediência ao governo ao qual serve, deve ter absoluta consciência de que a nação tem interesses mais permanentes e mais fundamentais do que, por vezes, orientações momentâneas de uma determinada administração, que pode estar guiada — mesmo se em política externa isto seja mais raro — por considerações “partidárias” de reduzido escopo nacional. Em resumo, não seja subserviente ao poder político, que, como tudo mais, é passageiro, mas procure inserir uma determinada ação particular no contexto mais geral dos interesses nacionais.

2. Ter domínio total de cada assunto, dedicar-se com afinco ao estudo dos assuntos de que esteja encarregado, aprofundar os temas em pesquisas paralelas.
Esta é uma regra absoluta, que deve ser auto-assumida, obviamente. Numa secretaria de estado ou num posto no exterior, o normal é a divisão do trabalho, o que implica não apenas que você terá o controle dos temas que lhe forem atribuídos, mas que redigirá igualmente as instruções para posições negociais sobre as quais seu conhecimento é normalmente maior do que o do próprio ministro de estado ou o chefe do posto. Mergulhe, pois, nos dossiês, veja antigos maços sobre o assunto (a poeira dos arquivos é extremamente benéfica ao seu desempenho funcional), percorra as estantes da biblioteca para livros históricos e gerais sobre a questão, formule perguntas a quem já se ocupou do tema em conferências negociadoras anteriores, mantenha correspondência particular com seu contraparte no posto (ou na secretaria de estado), enfim, prepare-se como se fosse ser sabatinado no mesmo dia.

3. Adotar uma perspectiva histórica e estrutural de cada tema, situá-lo no contexto próprio, manter independência de julgamento em relação às idéias recebidas e às “verdades reveladas”.
Em diplomacia, raramente uma questão surge do nada, de maneira inopinada. Um tema negocial vem geralmente sendo “amadurecido” há algum tempo, antes de ser inserido formalmente na agenda bilateral ou multilateral. Estude, portanto, todos os antecedentes do assunto em pauta, coloque-o no contexto de sua emergência gradual e no das circunstâncias que presidiram à sua incorporação ao processo negocial, mas tente dar uma perspectiva nova ao tema em questão. Não hesite em contestar os fundamentos da antiga posição negociadora ou duvidar de velhos conceitos e julgamentos (as idées reçues), se você dispuser de novos elementos analíticos para tanto.

4. Empregar as armas da crítica ao considerar posições que devam ser adotadas por sua delegação; praticar um ceticismo sadio sobre prós e contras de determinadas posições; analisar as posições “adversárias”, procurando colocá-las igualmente no contexto de quem as defende.
Ao receber instruções, leia-as com o olho crítico de quem já se dedicou ao estudo da questão e procure colocá-las no contexto negocial efetivo, geralmente mais complexo e matizado do que a definição de posições in abstracto, feita em ambiente destacado do foro processual, sem interação com os demais participantes do jogo diplomático. Considerar os argumentos da parte adversa também contribui para avaliar os fundamentos de sua própria posição, ajudando a revisar conceitos e afinar seu próprio discurso. Uma saudável atitude cética — isto é, sem negativismos inconseqüentes — ajuda na melhoria constante da posição negociadora de sua chancelaria.

5. Dar preferência à substância sobre a forma, ao conteúdo sobre a roupagem, aos interesses econômicos concretos sobre disposições jurídico-abstratas.
Os puristas do direito e os partidários da “razão jurídica” hão de me perdoar a deformação “economicista”, mas os tratados internacionais devem muito pouco aos sacrossantos princípios do direito internacional, e muito mais a considerações econômicas concretas, por vezes de reduzido conteúdo “humanitário”, mas dotadas, ao contrário, de um impacto direto sobre os ganhos imediatos de quem as formula. Como regra geral, não importa quão tortuosa (e torturada) sua linguagem, um acordo internacional representa exatamente — às vezes de forma ambígua — aquilo que as partes lograram inserir em defesa de suas posições e interesses concretos. Portanto, não lamente o estilo “catedral gótica” de um acordo específico, mas assegure-se de que ele contém elementos que contemplem os interesses do país.

6. Afastar ideologias ou interesses político-partidários das considerações relativas à política externa do país.
A política externa tende geralmente a elevar-se acima dos partidos políticos, bem como a rejeitar considerações ideológicas, mas sempre somos afetados por nossas próprias atitudes mentais e algumas “afinidades eletivas” que podem revelar-se numa opção preferencial por um determinado tipo de discurso, “mais engajado”, em lugar de outro, supostamente mais “neutro”. Poucos acreditam no “caráter de classe” da diplomacia, mas eventualmente militantes “classistas” gostariam de ajudar na “inflexão” política ou social de determinadas posições assumidas pelo país internacionalmente, sobretudo quando os temas da agenda envolvem definição de regras que afetam agentes econômicos e expectativas de ganhos relativos para determinados setores de atividade. Deve-se buscar o equilíbrio de posições e uma definição ampla, verdadeiramente nacional, do que seja interesse público relevante.

7. Antecipar ações e reações em um processo negociador, prever caminhos de conciliação e soluções de compromisso, nunca tentar derrotar completamente ou humilhar a parte adversa.
O soldado e o diplomata, como ensinava Raymond Aron, são os dois agentes principais da política externa de um Estado — embora atualmente outras forças sociais, como as ONGs e os homens de negócio, disputem espaço nos mecanismos decisórios burocráticos — mas, à diferença do primeiro, o segundo não está interessado em ocupar território inimigo ou destruir sua capacidade de resistência. Ainda que, em determinadas situações negociais, o interesse relevante do país possa ditar alguma instrução do tipo “vá ao plenário com todas as suas armas (argumentativas) e não faça prisioneiros”, o confronto nunca é o melhor método para lograr vitória num processo negociador complexo. A situação ideal é aquela na qual você “convence” as outras partes negociadoras de que aquela solução favorecida por seu governo é a que melhor contempla os interesses de todos os participantes e na qual as partes saem efetivamente convencidas de que fizeram o melhor negócio, ou pelo menos deram a solução possível ao problema da agenda.

8. Ser eficiente na representação, ser conciso e preciso na informação, ser objetivo na negociação.
Considere-se um agente público que participa de um processo decisório relevante e convença-se de que suas ações terão um impacto decisivo para sua geração e até para a história do país: isto já é um bom começo para dar dignidade à função de representação que você exerce em nome de todos os seus concidadãos. Redija com clareza seus relatórios e seja preciso nas instruções, ainda que dando uma certa latitude ao agente negocial direto; não tente fazer literatura ao redigir um anódino memorandum, ainda que um mot d’esprit aqui e ali sempre ajuda a diminuir a secura burocrática dos expedientes oficiais. Via de regra, estes devem ter um resumo inicial sintetizando o problema e antecipando a solução proposta, um corpo analítico desenvolvendo a questão e expondo os fundamentos da posição que se pretende adotar, e uma finalização contendo os objetivos negociais ou processuais desejados. No foro negociador, não tente esconder seus objetivos sob uma linguagem empolada, mas seja claro e preciso ao expor os dados do problema e ao propor uma solução de compromisso em benefício de todas as partes.

9. Valorize a carreira diplomática sem ser carreirista, seja membro da corporação sem ser corporativista, não torne absolutas as regras hierárquicas, que não podem obstaculizar a defesa de posições bem fundamentadas.
Geralmente se entra na carreira diplomática ostentando certo temor reverencial pelos mais graduados, normalmente tidos como mais “sábios” e mais preparados do que o iniciante. Mas, se você se preparou adequada e intensamente para o exercício de uma profissão que corresponde a seus anseios intelectuais e responde a seu desejo de servir ao país mais do que aos pares, não se deixe intimidar pelas regras da hierarquia e da disciplina, mais próprias do quartel do que de uma chancelaria. Numa reunião de formulação de posições, exponha com firmeza suas opiniões, se elas refletem efetivamente um conhecimento fundamentado do problema em pauta, mesmo se uma “autoridade superior” ostenta uma opinião diversa da sua. Trabalhe com afinco e dedicação, mas não seja carreirista ou corporativista, pois o moderno serviço público não deve aproximar-se dos antigos estamentos de mandarins ou das guildas medievais, com reservas de “espaço burocrático” mais definidas em função de um sistema de “castas” do que do próprio interesse público. A competência no exercício das funções atribuídas deve ser o critério essencial do desempenho no serviço público, não o ativismo em grupos restritos de interesse puramente umbilical.

10. Não faça da diplomacia o foco exclusivo de suas atividades intelectuais e profissionais, pratique alguma outra atividade enriquecedora do espírito ou do físico, não coloque a carreira absolutamente à frente de sua família e dos amigos.
A performance profissional é importante, mas ela não pode ocupar todo o espaço mental do servidor, à exclusão de outras atividades igualmente valorizadas socialmente, seja no esporte, seja no terreno da cultura ou da arte. Uma dedicação acadêmica é a que aparentemente mais se coaduna com a profissão diplomática, mas quiçá isso represente uma deformação pessoal do autor destas linhas. Em todo caso, dedique-se potencialmente a alguma ocupação paralela, ou volte sua mente para um hobby absorvente, de maneira a não ser apenas um “burocrata alienado”, voltado exclusivamente para as lides diplomáticas. Sim, e por mais importante que seja a carreira diplomática para você, não a coloque na frente da família ou de outras pessoas próximas. Muitos se “sentem” sinceramente diplomatas, outros apenas “estão” diplomatas, mas, como no caso de qualquer outra profissão, a diplomacia não pode ser o centro exclusivo de sua vida: os seres humanos, em especial as pessoas da família, são mais importantes do que qualquer profissão ou carreira.

Postado por Paulo R. de Almeida em 22.12.05 no Blog Paulo Roberto de Almeida