O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Kossovo: Brasil, com o BRICS, não reconhece a sua independência - GZero Signal Newsletter

 GZero Signal Newsletter, Dec 27, 2022

Kosovo crisis escalates 

Serbia has placed its military on high alert amid rising tensions between ethnic Serbs and the government in neighboring Albanian-majority Kosovo. Meanwhile, ongoing protests on Wednesday prompted Kosovo to shut its main border crossing with Serbia. The center of the action is the ethnically divided town of Mitrovica, in northern Kosovo. Earlier this year, Serbs there refused to adopt Kosovo license plates and set up barricades to keep Kosovar authorities out of their areas. In recent weeks, things have gotten worse with more roadblocks and exchanges of gunfire between Mitrovica Serbs and local police. Kosovo’s government says Serbia, with backing from its friends in Moscow, is deliberately stirring up trouble in the country. Belgrade says it’s merely protecting its ethnic kin across the border. The background? Serbs consider Kosovo their historical heartland, but for centuries the region has been populated chiefly by Albanians who consider it home. In 2008, Kosovo declared independence from Serbia after surviving a brutal 1998-1999 assault by Belgrade. The US and most Western European countries recognize that independence, but a number of countries, including Brazil, China, India, and Russia, do not. The EU has, as usual, called for an elusive calm. No one in Belgrade or Mitrovica seems to be listening.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Herbert Klein: uma carreira exemplar de historiador econômico: Immigration in historical perspective - bio in Academia.edu

 Herbert Klein: uma carreira exemplar de historiador econômico

Columbia University

Emeritus

I was born in New York City in the borough of the Bronx on January 6, 1936. I attended public schools in Far Rockaway Queens. After graduating Far Rockaway High School I first attended Syracuse University from 1953 to 1955 and then transferred to the University of Chicago, where I obtained my BA in History in 1957, my MA in 1959 and my PhD in 1963 with a major in history and a minor in Anthropology. I taught Latin American History at the University of Chicago from 1962 to 1969 rising from Lecturer to the rank of Associate Professor with tenure. I then taught at Columbia University from 1969 to 2005, being named the Gouverneur Morris Professor of History in 2003. I retired from Columbia in 2005 and was named Professor of History and Director of the Center for Latin American Studies at Stanford University from 2005-2011. After my retirement as Director of the Center I was named Research Fellow and Curator of Latin American Collection, of the Hoover Institution of Stanford University in 2011. Also since 2009 I have been a Visiting Scholar at the California Center for Population Research, UCLA. My main areas of interests are in comparative social history, quantitative methods in historical research and demographic history. I have published extensively on the history of slavery, the Atlantic slave trade, colonial fiscal history, and demographic history. I have also concentrated most of my research and publications on the histories of Bolivia, Brazil and the United States. I have been a Woodrow Wilson Fellow, a Guggenheim Fellow, a Banco de España fellow, a Catedra Patrimonial" of (CONACYT) the Consejo Nacional para Ciencia y Tecnología of Mexico, , a Directeur d'études associé in 1987 and a Professeur Invité in 2002 at the École des Hautes Etudes en Sciences Sociales (Paris), and Fulbright Lecturer in numerous Latin American and European universities. I received grants from the Ford Foundation, the Social Science Research Council, the National Science Foundation, the National Endowment for the Humanities and the Tinker Foundation. My honors include the 1967 "Conference Prize" of the Conference of Latin American Historians (CLAH) for my article "Peasant Communities in Revolt, " the “Primer Premio” of the Municipality of La Paz Bolivia in 1968 for my book Orígenes de la Revolución Nacional Boliviana, the "Socio-Psychological Prize" of the AAAS (American Association for the Advancement of Science) joint with Jonathan Kelley in 1977; the 2010 “Premio em Historia e Ciencias Sociais “of the Academia Brasileira de Letras, for my book Escravismo em São Paulo e Minas Gerais (joint with Iraci Costa and Francisco Vidal Luna) , I received the Distinguished Service Award from the CLAH (Conference on Latin American History) in 2015 and in 2019 a Doctor de Honoris Causa from the University of Santiago (Usach) in Chile.. From 2003-2015, I was editor of the Cambridge University Press Series of Latin American Monographs and I am on the board of editors of several Latin American and Spanish Historical Journals.

See his most recent paper: 
Reflections on fifty years of studying international immigration in the Atlantic World. Paper prepared for the World Economic History Conference, Paris July 2022



Studying International Migrations in a Comparative Perspective 
Herbert S. Klein 
Paper Given at the World Economic History Conference, Paris July, 2022 

For almost fifty years, one of the major areas of my research has been on international migrations in the Atlantic World. As a part of my early interest in Afro-American slavery in the Americas I began to explore the Atlantic slave trade and the way Africans were moved across the Atlantic. The shipping patterns, the provisioning, the purchase and sale of the Africans and finally their mortality were among the themes I explored. As an extension of this research I also explored how the slave systems were developed in the Americas. Most of my research on African slavery has concentrated on the Brazilian experience. 
It was this research on the Afro-Brazilian experience that eventually led me to study the major European groups which replaced the Afro-Brazilians on the coffee plantations of São Paulo after emancipation. I then undertook a series of studies European migration to Brazil in the period from the 1880s to the 1930s, concentrating mostly on the three largest groups: the Portuguese, the Italians, and the Spaniards. My primary concern in these studies, and in later publications on the Mexican migration to the United States, has been on the question of the relative social mobility and social integration of immigrants over generations. After completing several of these individual studies of the origin, volume and subsequent social mobility of these immigrant groups, I turned to a relatively new question, that of the comparative difference of the history of Italian mobility in three different countries, the United States, Brazil and Argentina  –  the three most important destinations of Italian emigrants to the Americas in this period. It is this comparative social mobility question that I want to explore in my talk today.
(...)

Segurança alimentar é desafio ainda maior com mudanças climáticas

Segurança alimentar é desafio ainda maior com mudanças climáticas
Tema esteve entre as discussões na COP27. Companhias do setor alimentício apresentaram na conferência plano de ação para mitigar impactos na produção
Poder 360, 28/12/2022

A população mundial chegou a 8 bilhões de pessoas em 2022 e deve alcançar 9,7 bilhões em 2050, segundo o relatório World Population Prospects 2022, da ONU (Organização das Nações Unidas).

Com o aumento no número de habitantes, temas como insegurança alimentar e segurança energética se tornarão críticos em um cenário de alta demanda e recursos escassos. Garantir a produção de alimentos e, ao mesmo tempo, mitigar as emissões de GEE (gases de efeito estufa) é um desafio.

O impacto do aumento da população deve causar mudanças profundas em toda a escala de produção de comércio e processamento de alimento.

Diante desse cenário, 14 das maiores companhias do ramo alimentício do mundo, entre elas a JBS, prepararam um roadmap com as ações sobre as quais trabalharão para reduzir as emissões de GEE decorrentes da mudança do uso da terra em suas operações. O Roteiro do Setor Agrícola 1,5°C visa a proteger, além dos sistemas alimentares globais, os meios de subsistência dos produtores.

De acordo com o CEO global da JBS, Gilberto Tomazoni, a empresa, enquanto maior produtora de alimentos do mundo, tem o compromisso de alimentar milhões de pessoas, mas sem abrir mão do cuidado com o meio ambiente.

Leia no infográfico.



Posse de Lula: presença internacional (Estadão)

 Posse de Lula: nova presidente do Peru e primeira-dama do México confirmam presença; veja lista

Conforme dados divulgados pela equipe de Lula cerca de 120 países estarão representados na posse, com autoridades de todos os níveis. Desses, 53 terão presentes chefes de Estado, de governo ou ministros.

BRASÍLIA - A nova presidente do Peru, Dina Boluarte, que assumiu o país andino após uma tentativa de golpe de Estado do ex-presidente Pedro Castillo, é a mais recente chefe de Estado a confirmar presença na posse de Luiz Inácio Lula da Silva, no domingo, dia 1º de janeiro. Ao todo, 20 chefes de Estado e de governo assistirão à cerimônia em Brasília.

As confirmações foram enviadas por embaixadas em Brasília, por meio de notas verbais ao Itamaraty e informadas à equipe do gabinete de transição. Ambos são responsáveis pelo cerimonial da posse.

A primeira presidente peruana assumiu o país vizinho no dia 7 de dezembro, após Castillo ter sido destituído pelo Congresso. Desde então, tenta contornar a instabilidade política interna. Ela é a sexta presidente a assumir o governo peruano desde 2016. Nenhum concluiu o mandato. Para tentar evitar o processo de impeachment, ele tentou um golpe, mas não teve apoio e acabou preso. Ela era vice-presidente de Castillo, eleita pelo partido Peru Libre, mas não apoiou as medidas de radicalização num “governo de emergência”: o fechamento do Congresso, ampla reforma no Judiciário e Ministério Público, além de toque de recolher. Na ocasião, a presidência do Peru já havia recebido um convite do Itamaraty, a pedido de Lula. Originalmente, o destinatário era Pedro Castillo.

Outro governante de esquerda na América Latina, o presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, não atenderá à posse. Ele comunicou que será representado pela mulher, a primeira-dama Beatriz Gutiérrez Müller, recebida em Brasília com status de chefe de Estado. Beatriz tem algo em comum com a mulher de Lula, Janja da Silva: não gosta de ser chamada pela expressão “primeira-dama”.

Também confirmou presença na posse o presidente do Togo, Faure Gnassingbé. O gabinete de transição já havia anunciado os primeiros 17 países com líderes confirmados. Todos são presidentes, à exceção do rei da Espanha, Felipe VI – e agora da primeira-dama mexicana.

Outros países decidiram enviar representantes em lugar dos chefes de Estado e de governo. A expectativa de diplomatas envolvidos nos preparativos é de que a lista não aumente muito até 1º de janeiro. A lista de precedência na posse e de posicionamento obedece à ordem de confirmações.

Conforme dados divulgados pela equipe de Lula cerca de 120 países estarão representados na posse, com autoridades de todos os níveis. Desses, 53 terão presentes chefes de Estado, de governo ou ministros.

Veja a lista países com chefes de Estado confirmados na posse de Lula:

Portugal
Argentina
Timor Leste
Cabo Verde
Alemanha
Espanha
Guiné Bissau
Colômbia
Uruguai
Equador
Angola
Bolívia
Chile
Paraguai
Guiana
Suriname
Honduras
México
Togo
Peru


Top 10 books about the iron curtain - Timothy Phillips (The Guardian)

Livros da Guerra Fria


Top 10 books about the iron curtain

The dividing line between capitalism and communism which descended across Europe after the second world war inspired spy writers and historians, polemicists and memoirists


Timothy Phillips

The Guardian, Wed 28 Dec 2022 12.00 GMT


The iron curtain bisected Europe from north to south between 1945 and 1989. It defined the continent, and in many ways the entire world, because of the ideological battles that raged across it. The realm of capitalism and representational democracy dominated to the west; the realm of communism and one-party rule to the east.

Crossing the curtain in either direction was always an undertaking, and for millions was both illegal and impossible. The nuclear might and conventional armed forces of all major powers were focused on that dividing line, the most likely place for a third world war to start.


I was just 11 when the iron curtain collapsed. I remember watching news of the Berlin Wall falling. Ever since, the divide has been a ghost in my mind. I started learning Russian the following year and my textbooks came from the Soviet era. I visited eastern Europe from 1995 onwards and found countries reeling from the end of its version of socialism.

I also discovered early how the iron curtain had inspired writers. From tense cold war thrillers to passionately argued treatises blaming one side or the other for the stalemate, from historians trying to make sense of how Europe became so riven to memoirists committing their own, often tragic tales to print: the iron curtain has been the source of some amazing books.

Just before the pandemic, I travelled the length of the iron curtain, from the Arctic where Norway and Russia meet to the frontier of Turkey and Azerbaijan, the most southerly place where Nato touched the Warsaw Pact countries. The result was the trip of a lifetime and a book, The Curtain and the Wall: A Modern Journey along Europe’s Cold War Border. It is my attempt to capture what survives of the old divide both on the ground and in people’s heads. I read widely during the journey. It is one of the pleasures of solo travel. Here I share 10 books that reveal the essence of the most menacing border the world has yet seen.


1. Eight Days at Yalta:by Diana Preston

Even once the second world war was under way, it was by no means inevitable it would end in a divided Europe. Preston’s 2020 book is a vivacious account of how the Big Three allied leaders gathered on the Crimea to thrash out an uneasy agreement about the continent’s future and their countries’ respective spheres of influence. The Yalta Conference of February 1945 was a supremely important political event. But Preston also focuses on the personal preferences and foibles of Churchill, Roosevelt and Stalin, and how they navigated one another’s red lines.

2. The Third Man by Graham Greene

When people think of the iron curtain, they tend to think of two European cities particularly – Berlin, itself divided, and Moscow, from where the USSR government effectively ran its satellites. However, until 1955, Vienna was divided much like Berlin into American, British, French and Soviet sectors. Greene’s The Third Man (1950) and the earlier film of that name conjure the period better than anything. The investigation of Harry Lime’s death shows the City of Dreams in a seedy postwar light. Greene also foregrounds one of the greatest cold war oddities, Vienna’s Inter-Allied Military Patrol, which required one soldier from each occupying power to share a jeep and travel to crime scenes together.


3. Alex von Tunzelmann’s Blood and Sand: Suez, Hungary and the Crisis That Shook the World


This rare gem focuses on two of the biggest events of the period, the Suez crisis and the Hungarian Revolution. Both reached their culmination at the same time in 1956. More often treated separately, in Von Tunzelmann’s hands the twin crises regain their full geopolitical force. She has an eye for illuminating detail; the action often unfolds hour by hour. It reads like a thriller.


4. Berlin 1961: Kennedy, Khrushchev and the Most Dangerous Place on Earth byFrederick Kempe

The year 1961 was when the cold war had one of its “hot” moments. Kempe takes the reader on a journey into the conflict, as Soviet and East German authorities attempt to solve the problem of West Berlin. An island of western capitalism marooned inside the GDR, West Berlin was also a major escape route for unhappy East Germans. More than 2.5 million had fled by 1961. Khrushchev and the East German regime were determined to end this embarrassment. For a time, it looked as if they might seize West Berlin, but in the end the Wall was their chosen sticking plaster, a monstrous imposition on Germany’s capital, but one that largely worked to trap East Germans inside for the next 28 years.


5. The Spy Who Came in from the Cold by John le Carré

No iron curtain book list would be complete without Le Carré, and this is the book of his that sticks closest to the iron curtain. It is dark, cynical and, even after six decades, gripping. Ultimately, the hero, British agent Alec Leamas, is compelled to confront the reality of the Berlin Wall at close quarters.


6. Red Love: The Story of an East German Family by Maxim Leo

Leo explores what it was like to grow up in the GDR in one of my favourite memoirs. He writes beautifully and his words are deftly rendered in English by the much-missed translator Anthea Bell. The good, the bad and the ugly of East German life are before us. For me, the most affecting passage describes Leo’s first visit to a huge East German road checkpoint. “How barricaded our country is,” he thinks. “What became of a dream of socialism?”


7. Soviet Milk by Nora Ikstena

The USSR had iron curtain land borders with three countries – Norway, Finland and Turkey – but also a maritime border with the west on the Baltic Sea. Latvia was one Soviet republic with a long Baltic coastline. This ended up punctured with missile bases and barbed wire. Latvian writer Ikstena’s 2015 novel takes a harshly ironic look at life there, through the eyes of a doctor who is banished to a remote village only to find herself contemplating the absurdities and injustices of so-called ”mature socialism”. There is a wonderful passage where characters watch the televised state funeral of Leonid Brezhnev and see the men lowering him into the grave lose grasp of his coffin; it falls with a loud crash – I can reveal this is not fiction.


8. Along the Edge of the Forest: An Iron Curtain Journey by Anthony Bailey

Bailey’s book was one inspiration for my own iron curtain journey. He travelled the line while the divide was still in place, going from the top of the inner German border to Trieste. He is restricted in his ability to enter the east. Nonetheless, the book contains much fascinating reportage. The author really manages to get under the skin of what the frontier meant to ordinary people.


9. Enver Hoxha: The Iron Fist of Albania by Blendi Fevziu

Nowhere in Europe was more mysterious during the cold war than Albania. The country was isolated even from other communist states and the dictator Enver Hoxha effectively immured his nation on all sides. Fevziu’s biography is shocking reading. As a young man, Hoxha “slept till noon, stayed up late at night and had no particular interests”. But once he hit his stride, he imposed bizarre laws on Albanians and outlasted six ministers of the interior, the first five of whom he executed.


10. Dancing Bears: True Stories of People Nostalgic for Life Under Tyranny by Witold Szabłowski

What has the iron curtain left behind? There are physical remnants, some large and celebrated, others small and neglected. There is also a legacy in millions of minds. Many pine for their lost lives in the Eastern Bloc. My own journey found people missing not just the good parts but also sometimes the bad, including the impassable borders and the state intrusion into daily life. Szabłowski, a Polish journalist, travelled across central Europe to write this tender and opinionated book. It is a delight from beginning to end.


Demetrio Magnoli desmonta a hipocrisia dos poderosos (O Globo)

Tábuas da aliança

Demetrio Magnoli

O Globo, 26 de dezembro de 2022

 

Gilmar Mendes, operando monocrática e politicamente, torpedeou a chantagem de Arthur Lira, retirando o Bolsa Família do teto de gastos. Lula não precisava mais do Centrão para cumprir suas promessas centrais de campanha. Mas a PEC, explicaram os próceres do PT, era ''o Plano A, o B e o C''. Já não se tratava de colocar comida na mesa dos pobres. O plano obsessivo era - e é - cooptar uma ampla facção do bolsonarismo para o governo.

Foi por pouco, seis a cinco, e na última hora. A maioria do STF operou juridicamente, resistindo à tentação da politicagem, ao declarar a inconstitucionalidade do ''orçamento secreto''. Os negociadores de Lula usaram a decisão para concluir o pacto de aliança com Lira, repartindo ao meio o fruto envenenado.

''Genocida!'', ''pedófilo!'', ''canibal!'' - ninguém, exceto militantes fanáticos, tem o direito de continuar a levar a sério o rugido santo do lulismo. O agora camarada Lira funcionou como esteio indispensável de Jair Bolsonaro. As duas tábuas da aliança votadas no Congresso - a PEC da Transição e a divisão das verbas do extinto ''orçamento secreto'' - evidenciam que, se depender de Lula, o comandante parlamentar das forças bolsonaristas se tomará um baluarte do novo governo.

A imprensa afogou-se em eufemismos. Crédito extraordinário? Não: a PEC oferece segurança jurídica mais robusta. Pacto com o bolsonarismo? Sim: disso depende a sacrossanta ''governabilidade''. Tudo que era sólido desmancha-se no ar: o escandaloso converte-se em natural, necessário, quase sábio.

Só que é mentira.

A nova Câmara, embora bastante conservadora, propicia a construção de maioria sem o bolsonarismo. Uma base constituída pelos partidos que apoiaram Lula no turno final mais MDB, PSD, PSDB e Cidadania somaria 241 deputados, contra 194 dos cinco partidos bolsonaristas (PL, PP, Republicanos, PTB e PSC). Os 16 faltantes para a maioria absoluta encontram-se em facções dos demais partidos, especialmente no União Brasil. A paisagem não é diferente no Senado. Uma base constituída em linhas similares teria 41 cadeiras, contra 24 dos partidos bolsonaristas. Faltaria, para a maioria, apenas um voto entre os 16 senadores restantes.

Lula tinha, portanto, a oportunidade de governar sem Lira e sem o bolsonarismo, aprovando leis e medidas provisórias. Só faltariam votos para passar PECs - mas, num país normal, emendas constitucionais não devem ser vistas como ferramentas de governo. Dessa constatação, nasce a indagação: por que o presidente eleito escolhe, voluntariamente, a aliança com a direita bolsonarista?

Uma pista para a resposta encontra-se na aprovação da PEC do Calote, em dezembro de 2021, que adiou o pagamento de precatórios, e da PEC Kamikaze, em julho, que inventou uma ''emergência'' para ampliar o valor do Auxílio Brasil. No primeiro episódio, cinco dos seis senadores petistas votaram com o bolsonarismo. No segundo, as bancadas petistas no Congresso votaram em massa com o governo.

A aliança Lula/Lira assenta-se sobre uma plataforma comum: a captura dos recursos públicos por grupos de interesse privilegiados. Lula declarou, há pouco, que ''acabaram as privatizações''. De fato, porém, a privatização principal, a do Estado, continua a todo vapor.

É coisa antiga. O manejo das políticas fiscal e parafiscal e as concessões de subsídios abertos e ocultos para atender a interesses privados, assim como a proteção dos altos salários da elite do funcionalismo, inscrevem-se na tradição política brasileira. A novidade das últimas décadas é que os mecanismos de apropriação privada dos recursos públicos passaram a ser mascarados por programas de transferência de renda aos pobres.

O Estado-Financiador - eis o conceito central que configura o acordo entre Lula e Lira. Dele emana a necessidade de maiorias parlamentares excepcionais, capazes de promover frequentes mudanças constitucionais. Os arcabouços legais da responsabilidade fiscal, concebidos a partir do Plano Real, começaram a cair sob o fogo de Bolsonaro/Lira. A aliança Lula/Lira promete derrubar o pouco que resta.

 

 

Demétrio Magnoli

 

 

 

 

Como está e que fim levou o jornalismo de qualidade? Entrevista com Norma Couri (Observatório da Imprensa)

 

Wednesday, 28 de December de 2022 ISSN 1519-7670 - Ano 22 - nº 1219 

Norma Couri: “Não há governos eternos com alergia a jornalistas” 

(Foto: Reprodução Roda Viva)

“Fica claro que os impressos, incluindo livros, são um sustentáculo do Estado democrático pela assimilação mais profunda e por conter muito menos erros do que as matérias virtuais despejadas nas redes por motivações muitas vezes pessoais”, diz em entrevista Norma Couri. “Não é à toa que a fúria do governo autoritário se insurja contra os jornais e revistas”, argumenta.

Quanto à crítica da mídia, Norma diz que jornalistas “precisam se acostumar a ser olhados de fora, julgados enquanto julgam ou investigam. Só vejo benefícios para profissionais e leitores”.

Ela afirma que a ditadura deu à sua geração “aquela experiência que só se adquire na guerra. Não há dúvida de que somos uma geração mais culta e solidária. As novas gerações carecem de um dom que nos foi imposto: saber escrever. E para isso, ler”.

Não se trata de desencorajar os que chegam agora à profissão.

Ela recomenda aos recém-chegados “curiosidade, garra, interesse por todo e qualquer assunto, leituras que vão de Shakespeare aos almanaques, conhecer as entranhas da profissão, ter faro para notícia, e, fundamental, ter emprego para colocar tudo isso em prática. Se não tiver, trabalhar assim mesmo”.

Lamenta que tenha deixado de existir a diversidade etária nas redações, mas lança uma palavra de esperança: “não há governos eternos com alergia a jornalistas nem escuridão que dure para sempre”.

Norma Couri tem 48 anos ininterruptos de profissão. É formada em Jornalismo pela PUC-RJ, com mestrado em Jornalismo na Columbia University de Nova York e doutorado em História Social na USP. Trabalhou no Jornal do Brasil, na Veja, na Folha de S.Paulo, no Estadão, na Época e no Observatório da Imprensa até hoje. Foi correspondente do Jornal do Brasil, baseada em Lisboa, com coberturas pela Europa, África e Ásia por dez anos e correspondente, no Brasil, da revista Visão, de Portugal. Atualmente, trabalha em projeto de pós-doutorado em Jornalismo.

A seguir, a entrevista.

Que importância têm para você jornais e revistas?

Acho indispensável a leitura de jornais e revistas impressos, que trazem análises, permitem reflexões, tomadas de posição e nos dão o tempo necessário para deglutir, arquivar. Assinei algum tempo o Jornal do Brasil virtual, mas, com a rapidez e eficiência das redes, a leitura é sempre mais rápida e menos concentrada. Em contraste com as redes sociais, que inevitavelmente nos invadem e nos tomam mais tempo do que deveriam, tenho a certeza de que a assimilação é diferente; nas telinhas, as informações são multiplicadas, mais superficiais e atropeladas pela quantidade oferecida.

Fica claro que os impressos, incluindo livros, são um sustentáculo do Estado democrático pela assimilação mais profunda e por conter muito menos erros do que as matérias virtuais despejadas nas redes por motivações muitas vezes pessoais. A internet é o paraíso dos mitômanos. Os jornais e revistas impressos mantêm uma hierarquia nas redações, a matéria passa por vários crivos antes de ser publicada. Não é à toa que a fúria do governo autoritário se insurge contra os jornais e revistas. Mantenho as assinaturas que eu e [Alberto] Dines sempre tivemos, dos quatro jornais e duas revistas de informação brasileiros, além do The New York Review of Books, o Magazine Littéraire e a revista The Economist. O excelente El País, agora, só na internet.

É uma conquista ter a imprensa inteira nas mãos, numa telinha que viaja conosco e está ali para informação minuto a minuto. Um plus. Aliás, um alerta para os jornais que querem permanecer como referência investindo em boa reportagem, profissionais experientes e apuro de informação. Só assim não se deixarão engolir pela máquina virtual. O resto é escolher bem o site e ficar feliz quando abrir um blog ou site como um The Intercept, um Observatório da Imprensa, 360, alguns bons de crítica de filmes, este Olha Só, para citar alguns.

Qual é o papel da crítica da mídia?

A crítica é o espelho. Indispensável num ambiente democrático. Jornalistas precisam se acostumar a serem olhados de fora, julgados enquanto julgam ou investigam. Só vejo benefícios para profissionais e leitores.

Fale-nos do legado de Alberto Dines.

Alberto Dines foi o primeiro ombudsman brasileiro com a coluna Jornal dos Jornais, na Folha de S.Paulo, entre 1975 e 1977, não por acaso censurada na ditadura. Criou o Observatório da Imprensa online e na TV, que só alimentou o público com “o outro lado dos assuntos da semana” e tinha o objetivo de fazer pensar; o slogan é “você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito”.

Uma profissão vivida intensamente durante 65 anos não pode ir para o brejo. O Instituto Alberto Dines pretende manter seu legado, aberto a estudantes, estimulando o jornalismo investigativo com prêmios que andam escassos e promovendo uma cátedra para disseminar as áreas mais focadas por ele, jornalismo em todas as áreas, democracia, fascismo, nazismo, humor, biografias, censura, artes gráficas e plásticas, fotografia.

Que perspectiva se estende diante dos grandes jornais, hoje, a braços com um modelo de negócios que foi atropelado pelo advento da esfera digital?

The New York Times não fechou as portas, se reergueu com a versão digital mantendo na redação jornalistas premiados, alargando a cobertura, criticando especialmente o presidente Trump, que, a exemplo do Nixon durante a publicação dos papéis do Pentágono, proibiu a entrada de seus repórteres na Casa Branca.

O mesmo acontece aqui com a Folha de S.Paulo em relação ao Planalto, sinal de que os coleguinhas estão cumprindo bem o seu script. O jornal digital tem essa grande vantagem, dar sobrevida ao papel num momento de agonia. Tem investidores mundo afora, como Warren Buffet, especializado em comprar jornais falidos para relançá-los, para não deixar que morram, como aconteceu com o Jornal do Brasil. A imprensa é o pilar da democracia, não importa o suporte.

O que os novos jornalistas devem fazer para elevar os padrões de qualidade do material que produzem?

A ditadura nos deu aquela experiência que só se adquire na guerra. Não há dúvida de que somos uma geração mais culta e solidária. As novas gerações carecem de um dom que nos foi imposto: saber escrever. E para isso, ler.

Os novos jornalistas têm a ousadia necessária, mas, em geral, falta estofo. Ouço barbaridades nas rádios, leio absurdos nos textos, vejo atrocidades na TV. Eles foram pior educados nas escolas e faculdades, pegaram carona num ambiente social mais pobre, para dar certo têm de nadar de braçada nos assuntos espinhosos – são poucos os que conseguem alcançar a praia. Corro o risco de ser antiga neste quesito mas já fiz um questionário rápido e os bons leitores só param para ler com calma as matérias escritas por profissionais experientes e as que são bem arquitetadas, apuradas. No resto, sempre se dá uma passada de olhos, mas esse tipo de profissional se dá melhor nas redes com miniflashes de notícias e de ideias. Fomos a última geração sem celular ou internet. Cá pra nós, teve suas vantagens.

O que você recomenda aos recém-chegados?

Curiosidade, garra, interesse por todo e qualquer assunto, leituras que vão de Shakespeare aos almanaques, conhecer as entranhas da profissão, ter faro para notícia e, fundamental, ter emprego para colocar tudo isso em prática. Se não tiver, trabalhar assim mesmo. Uma pena que não aconteça a diversidade etária de outros tempos nas redações. Ter com quem aprender. Isso aceleraria o crescimento profissional, como acontecia com gerações anteriores. Mas não há governos eternos com alergia a jornalistas nem escuridão que dure para sempre.

Publicado originalmente no Facebook.

***

Mauro Malin é jornalista.