Continuação da resenha iniciada na postagem anterior. Ver aqui:
http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2017/07/anatomia-de-um-desastre-1-resenha-de.html
Resenha
de Carlos Yury Araújo de Morais
SAFATLE,
Claudia; BORGES, João; OLIVEIRA, Ribamar.
Anatomia
de um desastre: os bastidores da crise econômica que mergulhou o país na pior
recessão de sua história.
São Paulo: Portfolio-Penguin, 2016.
O capítulo 8 trata da “operação
quadrangular”, uma das primeiras medidas de economia criativa tomada pelo
governo para fechar as já afetadas contas públicas. O BNDES recebeu empréstimo
do Tesouro; em seguida, o BNDES comprou ações da PETROBRAS que estavam com o
Fundo Soberano do Brasil; o dinheiro da venda das ações foi para o Tesouro; O
BNDES usou parte das ações para comprar créditos junto a ITAIPU; por esses
créditos, o Tesouro recebeu do BNDES as ações da PETROBRAS, utilizadas, em
seguida, para capitalizar a CAIXA; ao mesmo tempo a CAIXA foi agraciada com
empréstimo do tesouro, o que permitiu aos bancos pagar mais dividendos ao
Tesouro. Essa foi a forma como a meta fiscal de 2012 foi atingida. Com a
operação quandrangular, a equipe econômica perdeu credibilidade, pois ficou
evidente que o superávit primário estava sendo fabricado por meio de truques e
arranjos.
O capítulo 9 narra mais uma burla ao
cumprimento da meta fiscal. As ordens bancárias feitas pelo governo para o
pagamento de servidores e fornecedores passaram a ser feitas após as 17h10. O
objetivo era simples: postergar o recebimento dos recursos, para que os mesmos
fossem contabilizados apenas no dia seguinte. A importância desse estratagema
era a redução do pagamento com as despesas correntes, inflando artificialmente
o superávit, o que ficou conhecido como “pedalada fiscal”. Esse atraso no
pagamento das despesas foi aplicado de tal forma que houve o aumento expressivo
dos restos a pagar de 2013 para 2014. Isso melhorou o resultado das contas
públicas, pois a “pedalada” não aparece nas contabilidade do mês e, para fins
de orçamento, ela é considerada paga dentro do mês, muito embora o efetivo desembolso
se dê apenas no mês seguinte. Ao atrasar o repasse de recursos aos bancos
públicos, estes foram forçados a pagar, com recursos próprios, os programas
sociais e subsídios que são atribuições do Tesouro. Eis aqui os fundamentos do
impeachment.
O capítulo 10 trata dos problemas
relacionados ao uso do BNDES como principal agente da política expansionista do
governo. A política de subsídios dos juros, o aumento desmedido da capacidade
de empréstimo através da emissão de títulos levou ao aumento do endividamento
público, o que não preocupava o então ministro Guido Mantega, pois para cada
real de dívida havia um real de crédito com o Tesouro. O problema é que a
expansão do investimento, como motor da economia, não vingou, muito em face das
constantes quebras das regras e contratos. Os bancos públicos comerciais
passaram a superar o BNDES na concessão de empréstimos com aumento de carteira
de 174,8%, enquanto o BNDES permaneceu com carteira 74% menor que a dos bancos
públicos comerciais. Todavia, o excesso de crédito foi tamanho que, mesmo
continuando a oferecer empréstimos para famílias e empresas, estes estavam
superendividados e não houve expansão do número total de empréstimos. O modelo
de crescimento baseado na expansão do crédito chegou ao fim em 2016.
O capítulo 11 narra o processo de redução
dos valores das contas de luz, anunciados em 18% para os consumidores
residenciais e 28% para os consumidores industriais. O capítulo narra o
procedimento como se chegou ao procedimento de renovação antecipada dos
contratos, saída encontrada para se chegar aos percentuais de redução
mencionados. O problema, narra o livro, é que além da redução das tarifas, as
empresas concessionárias de distribuição ainda teriam que arcar com o peso dos
investimentos para as linhas de transmissão. Como a conta não fechava, a equipe
econômica considerou que o Tesouro Nacional cobriria a diferença entre a
diminuição da tarifa e os investimentos, repassando a conta para o contribuinte
brasileiro. A conta inicial foi de 9,9 bilhões de reais, sendo que outros 19,7
bilhões vieram de um fundo chamado Conta de Desenvolvimento Energético. Além
disso, em 2013, quando a medida foi anunciada, houve risco de racionamento,
ligação das usinas termoelétricas (o que aumentou o custo de produção de
energia do sistema) e encarecia a conta do governo. As empresas distribuidoras
ficaram a descoberto e tiveram de comprar energia no mercado libre, cujo preço
não estava assegurado em contrato. Para que o sistema não entrasse em colapso,
o Tesouro passou a fazer aportes, aumentando as perdas. Especialistas
calcularam que a manobra de Dilma custou aos cofres públicos o total de 105
bilhões de reais.
O capítulo 12 narra a derrocada da
Petrobrás. Ele narra, inicialmente, como a Petrobrás era utilizada dentro das
campanhas eleitorais, como forma de criar a ilusão de prosperidade. Como
exemplo, narra a utilização da autossuficiência em petróleo anunciada da plataforma
P-50 nas vésperas da campanha eleitoral de 2006. Todavia, a autossuficiência
não se consolidou, vindo, o Brasil, a depender de importação de petróleo em
2012, em razão da frustração das metas de produção. Outra questão abordada foi o pré-sal. O capítulo
foca em como o governo, visando criar toda uma indústria nacional para
exploração do pré-sal, estabeleceu o modelo de partilha, segundo o qual a União
receberia sua parte em petróleo. Para chegar a tal ponto, deveria haver o mínimo
de participação de 30% da Petrobrás em cada campo de petróleo. Além disso, o
modelo determinava a compra de equipamentos de exploração no Brasil (o chamado
“conteúdo nacional”). Finalmente, o livro relembra os casos das refinarias
Premium I, Premium II, Abreu e Lima e a compra da refinaria de Pasadena, obras
grandiosas, porém custosas aos cofres públicos. O capítulo faz um apanhado
histórico dos prejuízos que essas obras causaram à Petrobrás, concluindo que o
uso de premissas irrealistas de custo operacional, produção, prazo e
investimento foi o responsável pelo prejuízo nas operações da empresa. Em 2008,
ela era a segunda maior empresa do mundo; em 2016, ela havia despencado para a
249ª posição no ranking das empresas mais valiosas do mundo.
O capítulo 13 narra como o governo federal virou
uma fábrica de dividendos para si próprio. Inicialmente, apenas a partir de
2000, com a estabilidade econômica, as empresas federais passaram a pagar
dividendos para a União. Em 2012 foi atingido o pico histórico de dividendos
pagos à União, no total de 28,02 bilhões de reais. Todavia, esse número recorde
em 2012 não foi fruto de atividade econômica. Na realidade, tratava-se de
manobra financeira para maquiar as contas públicas, através da alocação de
recursos no BNDES. O Tesouro colocava papeis diretamente no BNDES, repassando
os títulos para a carteira da instituição, que os foi oferecendo no mercado na
medida da necessidade de suas operações. Enquanto não colocava os papéis no
mercado, o banco computava os rendimentos dos títulos como lucro e repassava o
lucro ao Tesouro na forma de dividendos. Tratava-se, portanto, de empréstimo
disfarçado, operação que não tinha impacto no caixa do Tesouro nem era captada
pelas estatísticas do resultado primário. Esse estratagema ajudava a União a
fechar as suas contas. Esse foi o início da contabilidade criativa, o que gerou
falta de credibilidade da contabilidade fiscal brasileira.
O capítulo 14 narra os efeitos deletérios
que as sucessivas desonerações tributárias causaram no caixa da União. Após
breve histórico sobre as diversas tentativas de alteração do sistema, o
capítulo foca na MP 540/2011, a qual autorizou a desoneração da folha de
pagamentos, no contexto do Plano Brasil Maior – uma série de medidas destinadas
a estimular as exportações e o investimento da indústria. Muito embora o
objetivo fosse o de copiar o modelo europeu de “desoneração fiscal” para tornar
os produtos mais competitivos, o governo foi aumentando cada vez mais o escopo
da desoneração. Nesse sentido, editou as medidas provisórias 563, 582 e 601
aumentando cada vez mais os setores abrangidos pela desoneração. O custo da
desoneração somou, entre 2012 e 2015, mais de 54,3 bilhões de reais na
arrecadação da previdência social, o que levou à piora do déficit da
previdência. O resultado foi a queda real de 5,6% nas receitas da União; porém,
o governo continuou mantendo os gastos em crescimento acelerado, o que levou a
uma queda continuada do superávit primário da União, a qual caiu 2,14% do PIB
apenas em 2011. Em 2015, foi registrado um déficit primário de 2,01% do PIB,
demonstrando que a perda da arrecadação, combinada com aumento de despesas,
culminou em um grave problema fiscal.
(continua na terceira e última postagem).
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