Trajetórias dignas de registro num sistema político de baixo desempenho geral
Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.
Nota sobre a mediocridade geral do estamento político, com as possíveis exceções de JK e de FHC
Poucos presidentes na história do Brasil contemporâneo tiveram qualidades que os colocaram acima do marasmo geral do estamento político. O país sempre foi comandado por oligarquias civis ou militares, com poucos líderes combinando visão de estadista e conduta plenamente democrática.
JK ocupou um nicho poucas vezes conhecido em nossa história: a de um hábil condutor de um processo de desenvolvimento no quadro de uma democracia em pleno funcionamento.
A inabilidade de seus dois sucessores levou a uma crise múltipla que se desdobrou na mais profunda intervenção militar no sistema político da história militar e da história nacional.
Com exceção de Castelo Branco, os generais que se sucederam na presidência eram autocratas confirmados, cercados por oportunistas políticos, mas uma tecnocracia formada por mandarins bem-preparados conseguiu produzir algum crescimento, mas num processo de desenvolvimento deformado por uma visão autárquica da economia, predominante nas elites políticas, econômicas e militares.
Depois de políticos medíocres, FHC foi um presidente acidental, como ele mesmo se classificou: uma congregação excepcional e aleatória de fatores permitiu algo que jamais ocorreria no curso normal do estamento político. O Brasil teve uma sorte momentânea, algo fortuito e irrepetível. Mas a emenda da reeleição foi uma tragédia maldita, que deformou mais ainda os péssimos hábitos do estamento político.
Depois caímos na mediocridade habitual do estamento político, sem qualquer estadista digno desse nome, na sequência ou na prospectiva normal do sistema.
Não há perspectiva de sair do marasmo atual no futuro previsível: a mediocridade avançou no estamento político de forma disseminada e o mandarinato se concentrou na predação do Estado.
Existem ilhas de excelência no setor privado, mas isoladas dos vetores de comando, sem chances de empolgar e guiar um processo nacional de desenvolvimento econômico e social no quadro de um regime democrático plenamente funcional.
Nossa trajetória é a de um declínio relativo, embora em marcha bastante lenta e com a preservação de uma democracia de muito baixa qualidade. A desigualdade é o traço estrutural e predominante da nação.
O Brasil continuará se arrastando em direção ao futuro, embora o progresso material seja uma fatalidade determinada pela marcha geral da comunidade planetária, globalizada a despeito de tudo.
O mundo melhorou, mas pequenas e grandes “guerras de Troia” nunca estão distantes, pois que paixões e interesses ofuscam momentânea e ocasionalmente o trajeto da racionalidade governamental.
Portanto, não cabe ser pessimista, nem muito otimista: melhor preservar um ceticismo sadio, como tento fazer.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4435, 15 julho 2023, 2 p.
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