O ministro das Relações Exteriores confirmou nessa segunda-feira, 3, que o Brasil vai apresentar ao países-membros do Mercosul, “em alguns dias”, uma sugestão de contraproposta à carta da União Europeia (UE), como parte das discussões sobre o acordo entre os dois blocos. A previsão foi feita em meio à pressão da chancelaria do Uruguai, que criticou a demora nas negociações e cobrou uma resposta do bloco sobre o caso da China, com quem os uruguaios estão discutindo fechar um acordo bilateral separadamente, ou seja, à revelia do Mercosul.
“Pretendemos trabalhar intensamente com aqueles parceiros cujas negociações se encontram em etapa avançada, como com a União Europeia. Em alguns dias, pretendemos apresentar para exame de todos uma contraproposta de reação à carta adicional da União Europeia, com o intuito de destravar a negociação birregional”, explicou Vieira, na abertura 62ª cúpula de chefes dos Estados do bloco, que acontece na cidade de Puerto Iguazú, na Argentina, região da tríplice fronteira.
As discussões continuam nesta terça-feira, quando acontecerá uma reunião dos próprios chefes de Estado do Mercosul sobre o mesmo tema. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem presença confirmada no encontro porque irá receber, das mãos da Argentina, a presidência temporária do bloco. O governo brasileiro quer aproveitar essa liderança justamente para tentar viabilizar o acordo com os europeus.
Apesar dessa intenção, Mauro Vieira criticou indiretamente a UE por, na visão dele, ter usado a questão ambiental como “pretexto” para praticar adotar “medidas de caráter protecionista”. “As preocupações internacionais com o meio ambiente, que compartilhamos, não podem servir de pretexto para adoção de medidas comerciais de caráter protecionista”, disse.
A afirmação do chanceler brasileiro tem relação com a decisão dos países europeus de apresentar, no último mês de maio, um documento adicional à mesa de negociação que contém, por exemplo, exigências de maior rigor no combate à derrubada de florestas. Essas colocações não agradaram, porém, os países sul-americanos.
Alinhado com o Brasil, o ministro das Ministro de Relações Exteriores, Comércio Internacional e Culto da Argentina, Santiago Cafiero, foi mais enfático e disse que a carta europeia é “parcial” e coloca um enfoque “excessivo” na questão ambiental.
A ‘Side Letter’ apresenta uma visão parcial do desenvolvimento sustentável”
“A ‘Side Letter’ [documento adicional] apresenta uma visão parcial do desenvolvimento sustentável, excessivamente focada na questão ambiental, com escassa consideração sobre o desenvolvimento econômico”, criticou. De acordo com o chanceler argentino, nesta área, a União Europeia teria, inclusive, feito exigências que estão acima do patamar estabelecido em organismos multilaterais.
“O texto sobre o meio ambiente nos coloca novas obrigações sobre mudança climática, desmatamento ou biodiversidade que vão, inclusive, além do acordado em fóruns multilaterais, mas se omite sobre os meios de implementação. Como vamos implementar isso? Isso é indispensável para saber como vamos cumprir com compromissos ambientais”, enfatizou.
Por conta desse impasse, Cafiero também criticou o “esforço desigual” que estaria sendo feito por Mercosul e União Europeia para a conclusão do acordo comercial entre os dois continentes. Neste sentido, ele salientou a importância de que se façam ajustes no texto negociado até 2019, que já este estaria desatualizado agora.
Como exemplo, o ministro argentino afirmou que, se o acordo estivesse em vigor hoje, os países sul-americanos teriam que reduzir o volume de exportações para a Europa, o que não seria necessário no sentido contrário.
“Enquanto o Mercosul libera tarifas para 95% das exportações europeias de bens agrícolas, a União Europeia libera somente para 82% das suas importações agrícolas. Para o restante, oferece cotas e preferências fixas. Algumas dessas cotas ficaram desatualizadas e hoje comercializamos acima do que foi acordado até 2019.”
Ainda assim, integrantes do Ministério de Relações Exteriores argentino deixaram claro que o país não deseja reabrir as negociações com a União Europeia de maneira oficial, pois isso poderia atrasar ainda mais o acordo, já que as diplomacias teriam que revisar cada ponto do acordo.
A voz dissonante do encontro foi o Uruguai. O ministro das Relações Exteriores do país, Francisco Bustillo, criticou duramente o “imobilismo” do Mercosul em relação a acordos com as principais potências econômicas. Neste sentido, o chanceler vizinho voltou a pressionar os outros países-membros do bloco e disse que o Uruguai está “esperando” uma resposta sobre um possível acordo com a China, país com o qual o presidente do Uruguai, Lacalle Pou, está negociando um tratado bilateral.
Além disso, Bustillo ironizou a chamada Tarifa Externa Comum (TEC), taxa comercial padronizada para os países da região e usada como união aduaneira. Segundo o ministro, as taxas nacionais continuam prevalecendo no comércio entre os países.
“O Uruguai avançou e finalizou um estudo de viabilidade conjunto com a República Popular da China. Informamos isso no âmbito da presidência temporária do Paraguai. Na ocasião, os demais membros manifestaram sua preocupação de que também gostariam de realizar um estudo no mesmo sentido. Bem, a China está esperando, o Uruguai está esperando”, enfatizou.
De acordo com ele, o Uruguai prefere estar acompanhado de outros países sul-americanos na negociação com a China, mas não irá aceitar uma posição de “imobilidade”. “É sempre melhor estar acompanhado de Argentina, Brasil e Paraguai em qualquer mesa de negociação. No entanto, a única coisa que não nos vamos permitir é a imobilidade”, defendeu.
https://valor.globo.com/google/amp/brasil/noticia/2023/07/04/brasil-vai-sugerir-ao-mercosul-resposta-a-ue-diz-chanceler.ghtml
Nenhum comentário:
Postar um comentário