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quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Politica Externa e Estudos de RI: III CORE (Funag-MRE) e os 40 anos da graducao na UNB - discurso do chanceler Figueiredo

Palestra Magna do Ministro de Estado das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo Machado, na III Conferência sobre Relações Internacionais – iREL-UnB


Mundorama, 10/12/2014

PROFESSOR IVAN MARQUES DE TOLEDO CAMARGO, MAGNÍFICO REITOR DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
SENHOR EMBAIXADOR SÉRGIO MOREIRA LIMA, PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO ALEXANDRE DE GUSMÃPROFESSOR MARCO AURÉLIO GARCIA, ASSESSOR ESPECIAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
EMBAIXADORES RONALDO MOTA SARDENBERG E SAMUEL PINHEIRO GUIMARÃES
PROFESSOR PAULO ESTEVES, PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS
PROFESSOR JOSÉ FLÁVIO SOMBRA SARAIVA, DIRETOR DO INSTITUTO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA UNB
SENHORAS E SENHORES PROFESSORES E PESQUISADORES
CARAS E CAROS ALUNOS
SENHORAS E SENHORES

É com grande satisfação que venho à Universidade de Brasília para participar da abertura da III Conferência sobre Relações Internacionais, organizada em parceria entre a Fundação Alexandre de Gusmão e a Universidade de Brasília.

A realização da III CORE, aqui nesta Universidade, é uma justa homenagem aos 40 anos da criação do primeiro curso de Relações Internacionais do Brasil. O desenvolvimento impressionante e o aumento da qualidade da área de Relações Internacionais no País muito se devem a este pioneirismo da Universidade de Brasília, que desde os anos 1970 forma gerações de especialistas.

O Itamaraty sempre teve uma relação muito próxima com a UnB e beneficia-se dos talentos aqui formados, muitos dos quais passaram a integrar nossos quadros. Por isso, proferir esta palestra expressa, ao mesmo tempo, uma satisfação e um agradecimento.

O tema desta III CORE – "O Brasil e as Tendências do Cenário Internacional" – não poderia ser mais apropriado. A definição do lugar do Brasil no mundo de hoje se dá em um ambiente internacional em profunda transformação. Não é só o Brasil que tem se transformado. Também o mundo não é mais o mesmo. E o alcance dessas mudanças internacionais parece de muito mais difícil apreensão do que as transformações ocorridas em cada país em particular, como no caso do Brasil, onde há um claro sentido de fortalecimento da cidadania e da inclusão social.

Não é à toa que, passado um quarto de século desde a queda do muro de Berlim, continuemos a recorrer a expressões vagas, como o "sistema internacional pós-Guerra Fria", para caracterizar o mundo em que vivemos.

A indefinição, porém, não nos exime da obrigação de agir. Muito pelo contrário. A diplomacia exige uma capacidade permanente de reflexão e ação, especialmente nos momentos em que a ordem internacional se redefine, como agora. Este é um importante desafio para a atual diplomacia brasileira. Mais do que se preparar para uma nova realidade do século XXI, a política externa precisa engajar-se de modo ativo e construtivo para ajudar a moldá-la de acordo com os interesses do País.

Daí a importância renovada de pensar e agir estrategicamente, e não como mera reação aos eventos internacionais. Daí a importância também de discutir com a academia, em eventos como este, e com todos os setores da sociedade, sobre o mundo que teremos pela frente e como podemos ajudar a construí-lo com base em nossos valores e interesses.

Há pouco mais de um ano, assumi a chefia do Itamaraty com uma clara diretriz da Presidenta Dilma Rousseff: imprimir sentido estratégico e também instrumental à política externa, para concebê-la e executá-la como componente essencial do nosso projeto nacional de desenvolvimento.

A política externa deve estar a serviço do conjunto do Governo e da sociedade brasileira, em seus esforços de realizar as potencialidades do Brasil.

É preciso reforçar o papel da diplomacia como instrumento do projeto de desenvolvimento nacional em suas múltiplas vertentes. Sem prejuízo da contribuição que damos e continuaremos a dar à comunidade internacional, a ação do Itamaraty teve e tem compromisso fundamental com o atendimento das múltiplas necessidades do País. Assim, seu sentido e utilidade fundamentais consistem em contribuir para que o conjunto do Governo e a sociedade identifiquem, num mundo em transformação e, portanto pleno de oportunidades, novas possibilidades externas que possam trazer benefício interno.

Nesse sentido, a promoção e a defesa dos nossos interesses nacionais de desenvolvimento requer uma estratégia de política externa que defina nossos objetivos a partir de uma visão do sistema internacional e da realidade nacional; que se prepare materialmente para buscar tais objetivos; e que seja capaz de construir consensos domésticos para que possamos melhor implementar e defender aquela estratégia.

O Sistema Internacional em Transformação
Nos últimos vinte e cinco anos, o mundo vem transitando da clara supremacia de uma superpotência a uma paulatina redistribuição de poder que nos permite hoje, cada vez mais, caracterizar o sistema internacional como multipolar.

No imediato pós-Guerra Fria, certo clima de triunfo propiciava o surgimento de teses como a do fim da história. Anunciava-se a vitória final do liberalismo político e econômico como valores definidores da ordem internacional. A Organização das Nações Unidas (ONU), fortalecida com o fim do conflito Leste-Oeste, deveria resguardar consensos legítimos e universais da sociedade internacional. O processo de globalização econômica levaria ao desenvolvimento inevitável pela integração de todos os países à economia mundial. A unipolaridade e a promoção de projetos políticos e econômicos algo uniformes marcaram esse momento.

No Brasil, nos primeiros anos do imediato pós-Guerra Fria, buscavam-se superar fragilidades econômicas e políticas, tanto internas quanto externas. O País se recuperava de anos de instabilidade econômica e dava os primeiros passos para consolidar a redemocratização. Num quadro de considerável vulnerabilidade, a política externa brasileira buscava o caminho possível, que à época ganhou tantos nomes, da "diversificação da dependência" à “autonomia pela participação”. A uma autoimagem de fragilidade doméstica correspondia uma autoimagem de vulnerabilidade externa.

O triunfalismo do imediato pós-Guerra Fria não durou mais que uma década. A expectativa de formação dos consensos e de universalização de valores logo frustrou-se, com o acirramento dos conflitos e o recurso a intervenções militares.

A unipolaridade traduziu-se, por vezes, em unilateralismos. A força militar se reapresentava como meio e método de transformação e reforma em regiões do globo, como o Oriente Médio. É incalculável o preço que cada geração parece fadada a pagar pelo aprendizado, sempre provisório, sobre os limites da força nas relações internacionais. Nos vácuos de poder, que a força é incapaz de preencher, surgiram novas ameaças à paz e à segurança internacional.

Assim, a década de 2000 nas relações internacionais caracterizou-se por uma dinâmica perversa, em que os excessos de confiança em soluções unilaterais e consensos ideológicos herdados da década anterior redundaram em crises de alcance global. O uso da força militar no Iraque em 2003 deixou consequências, ainda hoje sentidas, para a estabilidade regional e global.

Já os excessos financeiros e econômicos da globalização encontraram seu limite na crise de 2008. A governança da paz e da economia, tal como comandadas pelas potências estabelecidas, passou a enfrentar uma crise de credibilidade e de eficácia.

Ao mesmo tempo, a década de 2000 testemunhou a ascensão de novos polos de poder. Países como a China, a Índia e o Brasil, por exemplo, ampliaram sua voz e seu peso internacionais. Ganhou impulso um processo de redistribuição do poder mundial. A participação dos países do G-7 no produto mundial caiu de 46% em 1992 para 33% em 2011. Em contrapartida, a participação dos BRICS subiu, no mesmo período, de 17% para 28%. Tendência semelhante ocorreu nas exportações mundiais de bens, em que a participação dos BRICS e do mundo em desenvolvimento em geral saltou de 34% para 47%.

Cresceu também o "potencial diplomático" dos países emergentes, justamente pela maior capacidade de articulação de seus interesses e visões por meio da criação de grupos e coalizões. Essa redistribuição do poder mundial tem sido paulatina e nem todos os polos emergem ou se consolidam com o mesmo vigor, mas o conjunto dessas mudanças aponta para um cenário mais propenso a soluções coletivas do que ao exercício de hegemonias.

Essas mudanças têm um impacto direto sobre a governança do sistema internacional. O arcabouço político, institucional e jurídico internacional montado a partir de 1945 reflete, especialmente em alguns de seus arranjos principais, níveis de concentração de poder em descompasso com a realidade atual. Isso cria barreiras à plena participação de novos atores. Os "donos do poder" resistem à eliminação ou mesmo à redução de tais barreiras.

Os casos mais evidentes, mas não únicos, são o da composição do Conselho de Segurança da ONU e a distribuição de quotas e cargos de direção nas instituições financeiras internacionais.

A atual crise de representatividade das estruturas de governança leva a uma crise também de eficácia das instituições globais. E justamente delas mais se necessita para gerir a maior integração de sociedades e economias nacionais.

Assim, por princípio e por legítimo interesse nacional e sistêmico, desejamos favorecer a desconcentração do poder e uma reforma da governança de modo a torná-la mais inclusiva e participativa, mas também mais funcional e legítima.

Isso exige o reforço do multilateralismo. A desconcentração de poder em curso só poderá produzir graus mais elevados de legitimidade e funcionalidade por meio do diálogo multilateral, ao qual não há alternativa.
Ao mesmo tempo, é indispensável assegurar que as organizações internacionais, em especial a ONU e seu sistema, sirvam – eficazmente - às necessidades de todos os Estados e de suas sociedades. Devem ser capazes de mostrar quotidianamente e na prática sua relevância para o conjunto da comunidade internacional.

A ordem internacional em formação tem também um forte elemento valorativo. A opinião pública internacional e nacional exigem crescentemente que os Estados e as organizações internacionais pautem sua ação pela proteção e promoção dos direitos humanos, inclusive os direitos políticos, sociais e culturais; pelo combate a toda forma de discriminação; pelo imperativo da solidariedade humanitária. Para além da discussão sobre se tais valores são ou não universais, é fato que, no plano internacional, há hoje e deverá haver no futuro, cada vez menos espaço para o puro exercício do poder, ou para a observância pura e simples de conveniências ou necessidades políticas ao arrepio de valores tidos como fundamentais.
É indispensável, no entanto, assegurar que os valores e as ações internacionais neles fundadas sejam genuínos, livres de politização indevida ou de uma seletividade interessada em objetivos alheios à sua defesa. Os valores não são propriedade de nenhuma potência, nem seu respeito o apanágio de um grupo determinado de nações, ricas ou pobres, grandes ou pequenas.

Toda ordem internacional depende de certo equilíbrio de poder, mas sobretudo de valores compartilhados que criam um senso de finalidade e propósito. Como sociedade que é e se deseja crescentemente democrática e plural, o Brasil estimula e apoia uma ordem internacional que reflita os valores que fundam nossa sociedade. Isso significa uma ordem mais aberta e participativa, que reforce a capacidade do País e da comunidade internacional de promover a paz e o desenvolvimento. Significa também uma ordem comprometida com a prosperidade compartilhada, com o desenvolvimento associado à inclusão social e ao respeito aos direitos humanos.

É de se prever também que, em um cenário de crescente multipolaridade, o regionalismo será mais – e não menos – importante nas relações internacionais. O Brasil é favorável a uma ordem em que as regiões sejam cada vez mais estáveis, harmônicas e integradas. É um desenvolvimento que guarda sintonia com os esforços que estamos empreendendo, junto com nossos vizinhos, para a integração da América do Sul.

A Política Externa Brasileira – Um Duplo Diálogo: Internacional e Nacional
Em um mundo interdependente, marcado por fluxos crescentes de pessoas, bens, serviços, conhecimento e informações, a ação externa é parte fundamental da agenda do desenvolvimento nacional, mais ainda para um país com as dimensões, as características e os interesses do Brasil.

Como diz a Presidenta Dilma Rousseff, "as dimensões interna e externa da política de um país são inseparáveis".

A complexidade dos desafios inerentes ao processo de desenvolvimento de um país como o Brasil requer uma estratégia de inserção externa diversificada e em sintonia com os anseios nacionais. Essa estratégia dever ser capaz de garantir uma presença no mundo ao mesmo tempo competitiva e sensível aos desafios da redução das desigualdades sociais.

Isso é talvez mais evidente quando pensamos na agenda de nossa política externa econômica, que inclui:
- a participação ativa nas discussões sobre governança econômica e financeira mundial, em particular no G-20;
- a conclusão de negociações comerciais externas que garantam acesso a mercados ampliados, na região e no mundo;
- o apoio constante ao empresário brasileiro que exporta e cada vez mais se internacionaliza;
- a atração e a promoção de investimentos que auxiliem nosso esforço de desenvolvimento;
- a consolidação de parcerias em setores estratégicos;
- a cooperação em ciência, tecnologia e inovação, fundamentais para alçar a indústria brasileira a um novo patamar de competitividade;
- ou ainda a formação de recursos humanos de qualidade e a participação ativa das cadeias internacionais de conhecimento.

Mas a preocupação com o desenvolvimento perpassa outras agendas da nossa política externa.
- A consolidação de um entorno regional estável e próspero;
- a ampliação e a diversificação das nossas parcerias, sem descuidar dos nossos parceiros tradicionais;
- a atualização das instâncias de governança internacional, em particular as Nações Unidas;
- a geração de novos espaços de concertação, como o BRICS e o IBAS;
- as negociações de parâmetros e metas para um desenvolvimento sustentável, tanto do ponto de vista econômico, ambiental e social;
- ou ainda nossa constante atuação em prol da superação dos conflitos e da promoção de um ambiente de paz e cooperação internacional.

Todas essas iniciativas e vertentes são parte da construção do pano de fundo necessário para a plena consecução do desenvolvimento nacional.

Nossa política externa tem aproveitado condições propícias à projeção dos interesses do Brasil. No plano interno, avanços econômicos e sociais têm proporcionado bases sólidas para nossa inserção internacional. No plano externo, o sistema internacional em transformação tem criado mais espaços de atuação para as potências emergentes.

Temos adotado um padrão amplo e diversificado de atuação, em termos tanto geográficos como temáticos. Ao mesmo tempo em que atuamos para fortalecer relações novas e tradicionais com parceiros em todos os continentes – naturalmente com foco imediato na América do Sul –, mantemos participação ativa nos debates e negociações sobre amplo espectro de temas da agenda internacional.

A política externa brasileira procurou aprofundar o perfil diversificado da inserção internacional do Brasil. Conciliamos a universalidade das relações diplomáticas com um compromisso renovado com o multilateralismo e com o engajamento em instâncias de formato mais reduzido, como BRICS e IBAS. Com os esforços dos últimos anos de aprofundar as relações com países de todos os continentes, o Brasil passou a exercer uma política externa de alcance efetivamente global. Essa é uma resposta estratégica ao atual contexto de transformações internacionais.

A diversificação cada vez maior da atuação do Brasil é condizente com um cenário em que as potências tradicionais coexistem com potências emergentes. Condizente também com um mundo cada vez mais interdependente no plano econômico. Trata-se, portanto, de um contexto que desaconselha opções excludentes: nem alinhamentos automáticos, nem a alienação de parcerias.

Ao contrário, sem descuidar das relações tradicionais que continuam a merecer um lugar privilegiado em nossa política externa, passamos a buscar também novos parceiros e novas coalizões, que complementam ou suprem lacunas das estruturas tradicionais de poder.

A última década foi um período de grande atividade e criatividade da política externa brasileira. Formamos o G-20 nas negociações agrícolas da OMC, que mudou a dinâmica das negociações comerciais da Rodada Doha. Criamos o IBAS e, mais tarde, o BRICS, coalizões comprometidas com a reforma da ordem internacional. Articulamos o BASIC nas negociações de clima. A dimensão Sul-Sul de nossa diplomacia não foi uma opção ideológica ou uma tentativa de restaurar um terceiro-mundismo do passado, como alguns críticos insistem em caracterizar. Partiu, ao contrário, de um claro diagnóstico de que o Sul era parte ativa na geopolítica e na geoeconomia global.

A rigor, já não faz sentido falar em busca de autonomia em nossa política externa. Já logramos alcançá-la, graças às conquistas internas de nossa sociedade e ao trabalho de nossa diplomacia. Tornamo-nos a sétima economia mundial em um contexto de estabilidade macroeconômica; de devedores passamos a credores líquidos internacionais; realizamos progressos expressivos em matéria de inclusão social, de fortalecimento da consciência ambiental e de promoção e proteção dos direitos humanos. Desenvolvemos uma política externa que buscou, com determinação, ocupar e criar espaços. O Brasil transformou-se em um país com influência na formação da nova ordem internacional, do desenvolvimento sustentável ao comércio, da paz e segurança aos caminhos da integração regional.

Em uma política externa marcada pela universalidade, interessa ao Brasil um entorno regional estável e próspero. A América do Sul permanece como área prioritária da política externa. A fim de consolidar a região como espaço de paz, estabilidade e cooperação, o Brasil continua empenhado em uma estratégia de convergência e integração regional. Este é o "cimento" da paz e da estabilidade em nossa região.

Além da manutenção da paz e da estabilidade, a integração regional é importante em nossa estratégia de desenvolvimento econômico e social. O nosso entorno é um espaço para a expansão econômico-comercial do Brasil. É na América do Sul que muitas empresas brasileiras iniciam seu processo de internacionalização e encontram mercados atraentes para seus produtos e serviços. O superávit comercial do Brasil com a região em 2013 foi de US$ 9,1 bilhões, montante muito mais elevado do que o saldo com o resto do mundo, que foi de US$ 2,4 bilhões.

A integração regional está na pauta da política externa há três décadas, independentemente das ênfases de cada Governo, tendo-se firmado como uma política de Estado e consagrado no texto constitucional. Interessa ao Brasil trabalhar ativamente pela consolidação de um espaço sul-americano próspero, democrático e crescentemente integrado. Essa não é uma "opção ideológica", como muitas vezes se tem dito. Só há uma ideologia da nossa política externa, na região como no mundo: a promoção do interesse nacional.

A evolução que tivemos no MERCOSUL estimulou o impulso integracionista no Brasil e na região. A UNASUL consolidou-se como principal organismo de concertação sul-americana e tem conseguido dar soluções próprias para os problemas e desafios da região, inclusive para o fortalecimento da democracia e da estabilidade política. Uma prova recente disso é o diálogo trilateral de chanceleres com a Venezuela, de que tenho participado.

Dentro da série de iniciativas e coalizões diplomáticas que surgiram nos últimos anos, o BRICS ganhou uma grande importância nos seus poucos anos de existência e se tornou uma força incontornável nas relações internacionais. Os resultados da VI Cúpula dos líderes, realizada em Fortaleza, foram históricos. O grupo afirmou sua vocação global e sua força política em prol do aprimoramento das instituições de governança internacional. Entre as vertentes de cooperação mais promissoras, destaca-se a área econômico-financeira. Os acordos sobre o Novo Banco de Desenvolvimento do BRICS e o Arranjo Contingente de Reservas (CRA) demonstram a disposição do grupo de aprofundar a parceria na área econômico-financeira e representam um estímulo às necessárias reformas das estruturas financeiras internacionais.

Também as relações do Brasil com os países africanos têm sido aprofundadas. Isso ocorre em um momento de crescente conscientização da sociedade brasileira sobre suas raízes africanas. Além dos laços históricos, econômicos e culturais, a África tem para nós uma importância de natureza estratégica. Compartilhamos com o continente africano uma longa "fronteira" marítima, o Atlântico Sul, crucial para nosso desenvolvimento e nossa defesa.

Nossa política externa tem dado atenção especial à diplomacia econômica como instrumento para o desenvolvimento e, em particular, para o aumento da produtividade e competitividade da economia. Nesse contexto, procuramos fazer avançar a Rodada Doha da OMC e as tratativas para o Acordo de Associação MERCOSUL-UE.

Também nos empenhamos para criar e fortalecer parcerias em educação e ciência, tecnologia e inovação, tendo-nos mobilizado para prestar apoio ao Programa Ciência sem Fronteiras.

A diplomacia econômica e da inovação assume, portanto, uma importância fundamental no atual ciclo de desenvolvimento brasileiro. Precisamos intensificar ainda mais os esforços no sentido de contribuir para o aumento do volume e valor das exportações, estimular e amparar a internacionalização de empresas, atrair investimentos para o País e assegurar um espaço normativo para a promoção das políticas nacionais de desenvolvimento.

Nos temas de paz e segurança internacional, é permanente a defesa pelo Brasil da via diplomática, da não-intervenção e da solução pacífica de controvérsias como princípios centrais do relacionamento entre as Nações.
Permanece vital o respeito à Carta da ONU, em particular a proibição do uso da força sem a autorização do Conselho de Segurança ou em contexto que não seja o de autodefesa. O Brasil considera que a interdição às intervenções militares em situações que não as previstas na Carta é o fundamento de uma ordem internacional estável, e deve ser observada por todos os países, em todas as regiões do mundo.

A observância seletiva da Carta e sua interpretação enviesada minam parte dos fundamentos daquela ordem, sem substituí-la por outra mais afim com as aspirações por paz fundada na justiça e por prosperidade compartilhada. Ao contrário, ameaça debilitar aspecto civilizacional e político do mundo pós-Guerra que cabe sustentar continuamente e, onde couber, reforçar.

Há hoje um quadro preocupante no campo da paz e segurança internacional. Como assinalou a Presidenta Dilma Rousseff na Assembleia-Geral da ONU, não se resolvem muitos dos conflitos antigos, e surgem novos, cuja solução tampouco se alcança. Muitos deles são acompanhados de graves crises humanitárias e violações de direitos humanos.

Entre as diversas razões para explicar essa situação, está a inclinação de responder a conflitos ou crises com o uso da força. Usa-se a força antes mesmo de se buscar exaurir os meios de solução política. O foco na solução pacífica, na negociação e no diálogo diplomático não é expressão de idealismo de um país que vive em paz com seus vizinhos há mais de 140 anos.

É fruto de valores enraizados na sociedade brasileira, mas também da constatação empírica do fracasso do uso da força como "solução padrão" de problemas cuja efetiva resolução exige não só a diplomacia, mas a transformação de práticas e estruturas de poder político e econômico à qual muitos resistem. Líbia, Iraque, Síria e Palestina são apenas alguns exemplos dos limites da força como instrumento para a superação de crises ou conflitos.

Além desta agenda, a qual chamo de agenda clássica, há conjunto amplo de novos temas tem demandado maior atenção do Brasil, relacionados à crescente importância da agenda do desenvolvimento social, aos compromissos internacionais em matéria de direitos humanos, à definição de novos paradigmas de desenvolvimento sustentável e às questões relativas à privacidade no espaço cibernético e à governança da internet.

Temos de ter consciência de que, na esteira do reconhecimento internacional do Brasil como exemplo de país que deu um salto de crescimento com distribuição de renda em contexto democrático, o Itamaraty passa a atuar cada vez mais na vertente da diplomacia social. A cooperação Sul-Sul prestada pelo Brasil tem-se firmado progressivamente, em apoio a programas de inclusão social e erradicação da pobreza em outros países em desenvolvimento. Vem contribuindo para projetar uma imagem positiva do Brasil, com efeitos benéficos para todas as dimensões do relacionamento com os países receptores. Nesse ponto, tivemos um notável acréscimo de capital diplomático.

No plano do desenvolvimento sustentável, o País sediou em 2012, no Rio de Janeiro, a maior conferência da história das Nações Unidas. Com a liderança brasileira, a Rio+20 teve o papel de consolidar o conceito de desenvolvimento sustentável e consagrar o consenso de que “a erradicação da pobreza extrema representa o maior desafio global da atualidade e constitui requisito indispensável para a sustentabilidade”. Nas negociações internacionais sobre mudança do clima, o Brasil também teve posição de destaque, lastreado por suas credenciais internas de sustentabilidade.

Na questão da privacidade no espaço cibernético e da governança da internet, o Brasil assumiu uma posição de liderança. Esses temas ganharam maior relevo na sequência das denúncias sobre as atividades de espionagem de serviços de inteligência estrangeiros. O Brasil, junto com a Alemanha, conseguiu aprovar, por consenso, na Assembleia Geral da ONU, duas resoluções sobre o direito à privacidade na era digital.
O Governo brasileiro também realizou este ano, em São Paulo, a Reunião Multissetorial Global sobre o Futuro da Governança da Internet. A "NETmundial" foi um desdobramento da proposta de debate sobre um "Marco Civil Internacional" para a Internet, apresentada pela Presidenta Dilma Rousseff na abertura da 68ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em 2013.

Como disse no início da minha exposição, o diálogo diplomático tem hoje importante dimensão interna. Como reflexo do amadurecimento de nossa democracia e do crescente interesse em assuntos internacionais no Brasil, o Itamaraty tem buscado aprofundar seus canais de interação com os demais órgãos públicos e a sociedade. De fevereiro a abril deste ano realizamos, no Itamaraty, um amplo debate com a sociedade, os “Diálogos sobre Política Externa”.

O Itamaraty também está elaborando um Livro Branco da Política Externa brasileira, que deverá ser ultimado até o final do ano. O propósito é oferecer um retrato das atividades do Ministério e das linhas de atuação externa do Brasil. Queremos, com isso, aprofundar o debate público sobre a política externa brasileira.

Quero concluir observando que a política externa brasileira reflete, a um só tempo, uma avaliação das tendências em curso e uma aposta no futuro a que aspiramos. Há um componente analítico e um componente que poderíamos chamar de "idealista". Essa combinação é essencial para toda política que se quer transformadora. É o desafio da fusão entre o conhecimento e a ação. Por isso que eventos como este são tão importantes para o Itamaraty e para o debate de política externa.

Palestra proferida no Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília em 27/11/2014.

sábado, 4 de outubro de 2014

Luta de classes no Itamaraty? Nao! Apenas TPE: tensao pre-eleitoral...

Coluna Diário do Poder, jornalista Claudio Humberto, 4/10/2014:

CHANCELER AMEAÇA RETALIAR DIPLOMATAS ANTIDILMA

MINISTRO LUIZ FIGUEIREDO VOLTA A AMEAÇAR RETALIAR DIPLOMATAS “ANTIDILMA”

Diário do Poder: 4 de outubro de 2014 às 0:49
Por: 
Antonio Cruz ABr - Luiz Alberto Figueiredo

Ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo. Foto: Antonio Cruz/ABr

O ministro Luiz Figueiredo (Relações Exteriores) adora alimentar sua birra contra diplomatas, na maioria jovens, que se expressam em suas páginas pessoais no Facebook criticando o atual governo ou apoiando a oposição. Em jantar recente com diplomatas na embaixada do Brasil em Washington, ele se queixou de novo desses colegas e disse textualmente: se Dilma ganhar, não poderia “aproveitar esse pessoal”.

A perspectiva de reeleição de Dilma provoca nervosismo no Itamaraty, ante os indícios de que o País caminha para um certo “chavismo light”.

O tal “chavismo light”, advertem experientes diplomatas, comprometeria a capacidade do Itamaraty de implementar políticas de Estado.

A guinada de Dilma se une à “regulação da mídia” – fantasia petista de inspiração fascista – que ela prometeu a blogueiros que a bajulam. Leia na Coluna Cláudio Humberto.


Perguntar não ofende: 
Mas, e se ela perder, como é que fica?
Vão ter de aproveitar, e premiar, toda essa meninada rebelde?
Os jovens costumam antecipar as grandes transformações, sobretudo quando usam guarda-chuvas...
Aliás ando sentindo falta daquelas notas sempre bem argumentadas...
Paulo Roberto de Almeida 

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Itamaraty promove debates sobre política externa: Dialogos sobre a diplomacia brasileira

Agencia de Noticias Brasil-Árabe, 26/02/2014

Itamaraty promove debates sobre política externa

Série 'Diálogos sobre Política Externa' começou nesta quarta-feira e segue até 02 de abril. Objetivo é discutir prioridades da diplomacia brasileira. Oriente Médio será um dos temas.


São Paulo – O Ministério das Relações Exteriores do Brasil deu início nesta quarta-feira (26) à série de debates Diálogos sobre Política Externa. O objetivo, segundo o Itamaraty, é contribuir na elaboração de um “livro branco” dos princípios, prioridades e linhas de ação da política externa brasileira, além de estimular o debate público sobre o trabalho da pasta.

O ministro Luiz Alberto Figueiredo Machado participou esta manhã da sessão de abertura dos encontros no Palácio Itamaraty, em Brasília.

Os debates serão abertos somente a convidados e entre os participantes estão acadêmicos, sindicalistas, representantes de movimentos sociais, jornalistas e parlamentares. De acordo com o ministério, cada sessão terá um tema diferente sobre o qual os representantes da sociedade civil darão o seu posicionamento.

O Itamaraty informa que a iniciativa surgiu como resultado da percepção do chanceler Machado de um aumento crescente do interesse da sociedade por assuntos de política externa. Entre os temas em pauta está o Oriente Médio, cuja sessão deve acontecer em meados de março, mas ainda sem data estipulada.

Outros assuntos que farão parte dos diálogos são o comércio, comunidades brasileiras no exterior, ciência, tecnologia, as relações do Brasil com países desenvolvidos, energia, África, América do Sul e a integração regional, governança internacional, mudança do clima, desenvolvimento sustentável, Ásia, Brics (bloco formado por Brasil, Rússia, China e África do Sul) e Ibas (bloco que inclui Brasil, Índia e África do Sul).
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Ministério das Relações Exteriores
Assessoria de Imprensa do Gabinete


Nota nº 53
26 de fevereiro de 2014


Discurso proferido pelo Ministro de Estado das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo Machado, na sessão de abertura dos "Diálogos sobre Política Externa"
Palácio Itamaraty, 26 de fevereiro de 2014


Tenho o prazer de dirigir-me a Vossas Excelências nesta sessão de abertura dos "Diálogos sobre Política Externa". Esta série de encontros que o Itamaraty inaugura hoje tem o objetivo de promover o debate entre o Governo, o Congresso, o Judiciário e a sociedade civil sobre as linhas gerais e os principais temas da política externa brasileira.

Ao longo do próximo mês, os Diálogos sobre Política Externa reunirão, além de entidades públicas, representantes da academia, da imprensa, dos movimentos sociais, de organizações não governamentais, dos sindicatos e do empresariado.

Nesta sessão governamental de abertura, quero agradecer a presença de representantes do Parlamento, da Presidência e Vice-Presidência da República, dos diversos Ministérios e das chefias do Itamaraty. 

O diálogo é instrumento próprio da diplomacia, que já foi definida como "o diálogo entre países". Nas democracias modernas, como a brasileira, este diálogo diplomático não se restringe ao plano internacional. Os temas de política externa têm mobilizado, cada vez mais, o interesse e a atenção dentro do País, à medida que se amplia a projeção externa do Brasil e cresce a percepção no plano interno sobre a relevância dos assuntos internacionais, sua complexidade e seu impacto sobre a realidade e os destinos nacionais. O diálogo diplomático é hoje, também, um diálogo dentro do país.

O mundo tem passado por transformações significativas, e o lugar do Brasil no mundo mudou. Essas transformações incidem sobre a própria distribuição do poder mundial. Desenham-se os contornos de uma configuração multipolar da geopolítica e da geoeconomia mundial. A desconcentração do poder econômico e político no espaço internacional vem conferindo mais voz e peso aos países emergentes. E a estruturação do comércio global em cadeias globais de valor, entrelaçando produção, investimentos e comércio, assim como as grandes negociações regionais, impõem desafios à inserção econômica externa do Brasil. Acabo de retornar de Bruxelas, onde o Brasil reafirmou junto com seus parceiros europeus seu empenho na conclusão de um acordo entre o MERCOSUL e a União Europeia.

Aprofundam-se, ao mesmo tempo, as relações do Brasil com seus vizinhos na América do Sul e o interesse comum em fortalecer a estabilidade política e a prosperidade econômica regional. Consolidamos diversas iniciativas de integração entre os países latino-americanos, de que são exemplos o MERCOSUL, a UNASUL e a CELAC. Ganham relevo novas relações bilaterais entre países em desenvolvimento, às quais se somam relações bilaterais tradicionais. Criamos novas instâncias de concertação plurilateral, como o IBAS, o BRICS e o BASIC.

Na agenda internacional, ampliou-se a diversidade de temas e hoje coexistem uma agenda clássica de política externa, com questões ligadas à paz e à segurança internacionais, à integração regional, aos relacionamentos políticos bilaterais e à diplomacia econômica; e uma nova agenda de política externa, associada aos temas do combate à fome e à pobreza, aos programas sociais, ao desenvolvimento sustentável, à mudança do clima, à promoção da privacidade e dos direitos humanos em geral e, ainda mais recentemente, à governança na internet.
                      
Intensificam-se também os desafios de aperfeiçoamento das regras e instituições de governança que fundamentam a ordem internacional, como a reforma do Conselho de Segurança da ONU, que ainda reflete a configuração geopolítica de 1945; a conclusão da Rodada Doha iniciada em 2001 e o fortalecimento das regras multilaterais de comércio incorporadas na OMC; a reforma do sistema de quotas do FMI; o fortalecimento do papel do G20, em substituição ao G8, como principal instância internacional de coordenação econômico-financeira.

Crescem, ademais, as demandas internacionais de cooperação com o Brasil nas mais diversas áreas, especialmente na área social. O Brasil tornou-se uma referência mundial em programas de inclusão social e erradicação da pobreza e é visto como exemplo a seguir de país que deu o salto de crescimento com distribuição de renda em contexto democrático. Isso se reflete nos encontros que mantenho com meus homólogos, sempre interessados em conhecer os programas sociais brasileiros.

Expande-se igualmente a tarefa de prestar assistência cada vez mais ampla e eficiente aos brasileiros no exterior.

A confluência dessas grandes transformações no Brasil e no mundo tem efeitos significativos sobre a formulação e a execução da política externa brasileira.

Tenho enfatizado que a política externa é parte integral do projeto nacional de desenvolvimento do Brasil – econômico, político, social, cultural. Neste papel de instrumento do desenvolvimento, uma política externa sem perspectiva estratégica de longo prazo torna-se reativa, sem direção. Já uma política externa alheia às aspirações da sociedade torna-se carente de sustentação e respaldo.

O Itamaraty exerce, de maneira ativa e inclusiva, as funções que lhe cabem de coordenação da ação internacional do Governo brasileiro, de acordo com as diretrizes estabelecidas pela Presidenta Dilma Rousseff. No exercício dessas funções, o Itamaraty tem que estar sempre aberto ao diálogo com todos os setores da sociedade; tem que estar muito próximo do Parlamento, do Judiciário e de outras instâncias do Governo federal, estadual e municipal; e tem que saber ouvir os conselhos, as recomendações e as críticas construtivas, sempre em nome do aprimoramento do serviço exterior e da política externa brasileira.

Desde o início da minha gestão, tenho procurado reforçar a área de planejamento estratégico de política externa do Itamaraty, com o objetivo de pensar a visão de conjunto da política externa brasileira e seus interesses, objetivos, prioridades e desafios no longo prazo. Tenho também conferido fundamental importância ao propósito de engajar os mais diversos setores do País no debate sobre a política externa.

Não tenho dúvida de que a política externa brasileira precisa ser, cada vez mais, debatida e compreendida.

O Itamaraty deseja fortalecer as bases de um processo permanente e continuado de diálogo com a sociedade brasileira.

Os Diálogos sobre Política Externa são parte desse processo. Mas o diálogo obviamente não se esgotará com esses eventos. Estou seguro de que esse exercício abrirá portas e canais para a continuação do debate. Desejo que as diversas unidades do Itamaraty estejam, de modo permanente, abertas ao diálogo com a sociedade, com todos os atores governamentais e não governamentais que precisam ser ouvidos e consultados.

Os aportes e contribuições que recolheremos ao longo dos Diálogos sobre Política Externa servirão como subsídios para a elaboração pelo Itamaraty de um Livro Branco da Política Externa Brasileira. O Livro Branco terá como objetivo registrar e divulgar os princípios, prioridades e linhas de ação da política externa, bem como estimular o conhecimento e o escrutínio público do trabalho realizado pelo Ministério das Relações Exteriores.

O Itamaraty procura, portanto, fortalecer a reflexão estratégia de longo prazo e aprofundar o diálogo com a Esplanada, o Parlamento, o Judiciário e a sociedade civil, nos processos de formulação e execução da política externa.

Quero crer que, com iniciativas como os Diálogos sobre Política Externa, o Itamaraty poderá dar sua modesta contribuição para o aprimoramento permanente do debate democrático sobre as políticas públicas implementadas no País.

O Senhor Secretário-Geral das Relações Exteriores apresentará mais adiante a estrutura e o cronograma dos Diálogos sobre Política Externa, mas eu já antecipo a Vossas Excelências o convite para participarem do evento de encerramento dos Diálogos no próximo dia 2 de abril, quando será apresentado pelo governo e pela sociedade civil um balanço das discussões havidas ao longo do mês de março.


Muito obrigado.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Itamaraty em transicao, para...? - Lisandra Paraguassu (OESP)

Itamaraty recupera status com o Planalto
Lisandra Paraguassu / BRASÍLIA
O Estado de S.Paulo, 02 de janeiro de 2014 | 2h 05

Figueiredo ainda tem problemas a resolver na diplomacia, mas ganha espaço com Dilma

Em agosto, quando assumiu o Ministério das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo encontrou a pasta em meio a uma de suas piores crises na última década e uma presidente da República cuja má vontade com a diplomacia era notória. De lá para cá, o embaixador conseguiu resolver parte dos impasses e um feito: hoje é um dos poucos ministros ouvidos com atenção por Dilma Rousseff. Se os rumos da diplomacia brasileira não tiveram mudanças perceptíveis, a relação entre os Palácios do Planalto e do Itamaraty foi radicalmente alterada.
Objetivo e pragmático, Figueiredo conseguiu conquistar o ouvido da presidente. Assessores do Planalto confirmam que a mudança é notória. Hoje, Dilma delega ao ministro manifestações sobre política externa sem exigir analisar tudo antes. E, ao que se sabe, Figueiredo ainda não teria levado uma das famosas broncas da presidente.
Figueiredo foi chamado da embaixada nas Nações Unidas para tocar um Itamaraty dividido após a atuação do diplomata Eduardo Saboia, que decidira por conta própria tirar da embaixada em La Paz o senador boliviano Roger Pinto Molina. Desde o convite para assumir a pasta, o ministro se deu como prazo no cargo o fim de 2014. Nesse período, suas principais missões seriam encerrar algumas questões pendentes da diplomacia brasileira e fazer mudanças internas no Itamaraty.
Na conta positiva, o chanceler coloca pelo menos três questões: a volta do Paraguai ao Mercosul, que deve ser formalizada neste mês, com o país assumindo a presidência, em reunião de cúpula em Caracas (Venezuela), pondo fim à maior crise política do bloco. A segunda, a solução, em parceria com o Uruguai, das eleições parlamentares haitianas, até então sem prazo para ocorrer e com um Congresso à beira da paralisia.
A última, ainda em aberto, é o início das negociações para o acordo comercial entre Mercosul e União Europeia. Os países do bloco sul-americano conseguiram fechar a proposta que vai abrir as conversas com os europeus. Será a primeira vez, desde o enterro da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), em 2005, que o Brasil volta a tratar seriamente, com um parceiro de peso, de um acordo comercial.
Impasses. Figueiredo, porém, não conseguiu solucionar as duas maiores crises diplomáticas de 2013. A primeira é interna. A atuação de Saboia no caso Pinto Molina dividiu o ministério entre os que o criticavam pela quebra de hierarquia,tão cara aos diplomatas - e que levou à demissão de Antonio Patriota - e os que o tratavam como herói.
Saboia voltou ao Brasil, trabalha normalmente em um dos departamentos do Itamaraty, mas enfrenta um processo administrativo interno. A embaixada brasileira na Bolívia continua vaga, já que a Comissão de Relações Exteriores do Senado, que precisa aprovar a indicação de Raymundo Magno, recusa-se a fazê-lo enquanto não souber o destino de Saboia e de Pinto Molina.
O ministro tampouco obteve sucesso no encerramento da crise com os Estados Unidos, após a revelação das espionagens feitas pela Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês). Apesar do anúncio de que procedimentos do órgão serão revistos, o Brasil espera as explicações detalhadas prometidas a Dilma por Barack Obama.
Prazo. A boa relação com Dilma possivelmente estenderá o prazo de Figueiredo à frente do Itamaraty, em caso de reeleição. Assim, o ministro teria mais tempo para levar adiante as mudanças internas que começou. Entre elas, a decisão de eliminar da diplomacia brasileira os últimos resquícios de um discurso mais ideológico, à esquerda, do que estratégico - crítica constante desde a passagem de Celso Amorim, no governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Em uma de suas primeiras ações, Figueiredo abriu conversas com a Alemanha sobre tecnologias de segurança na internet para combater possíveis novas espionagens. Encontrou narizes torcidos para o contato com um membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), vista como inimiga pelos governos mais à esquerda na América Latina. A ordem, no entanto, é prosseguir.
Também fez uma análise de gestão e não gostou do que viu: áreas sobrepostas, departamentos mais prestigiados com excesso de gente e outros, teoricamente menos interessantes, esvaziados. Na área de Direitos Humanos, já pediu quesejam preenchidas vagas vazias há bastante tempo.
Uma das mudanças determinadas por Patriota foi eliminada. A criação de uma secretaria de relação com a sociedade civil foi trocada por um trabalho integrado de todas as áreas. O Itamaraty prepara um "livro branco da diplomacia", com itens como modelos de cooperação, plano de carreira e estrutura, com debates sobre o assunto previstos para meados deste ano. 

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Politica Externa Brasileira - Entrevista com o novo Chanceler (Valor)

Um encontro com o novo chanceler
Rosângela Bittar *
Valor Econômico, 20/11/2013

A política externa com iniciativa e não reativa, como parece. Com definição de rumos para atualizar as relações do Brasil com o mundo - com a China, com a União Europeia, com os Estados Unidos, com os andinos, com os países da África. Que agregue os temas novos da sociedade brasileira e não se limite aos clássicos e permanentes. Há o mundo novo do século 21 a explorar: os direitos humanos, as questões sociais, o racismo, o grupo LGBT, a inclusão, a internet, atualidades que precisam ser contempladas na política externa, sem abandonar a tradicional agenda da paz e da segurança, da cooperação regional, de integração, do comércio exterior. E a criação de instâncias de pensamento e debate na estrutura do Itamaraty, abrindo a casa para que perca a má fama de caixa preta do governo e se apresente à sociedade civil, aos empresários, às organizações sociais, à academia.
São princípios percebidos com clareza em uma conversa, na véspera do último feriado, com o novo chanceler do Brasil que assumiu o cargo no fim de agosto, Luiz Alberto Figueiredo. O ministro não concorda com decepções do respeitável público, ou de sua interlocutora, que veem o governo brasileiro se arrastar em uma política externa ditada pelos presidentes populistas da sudamérica, pelos africanos, pelos ditadores árabes, por quem der mais, seja em comércio, seja em afinidade ideológica. Luiz Alberto Figueiredo recusa a ideia de que o Brasil está fazendo a política externa exclusivamente na reação aos acidentes diplomáticos.
O Mais Médicos é uma medida de política externa pela via da política interna, uma iniciativa para disfarçar ajuda a fundo perdido a Cuba? "Não, é um programa fundamental interno, uma necessidade da população brasileira", responde a isso como responde a tudo com naturalidade.
"Espionagem à parte, precisamos nos debruçar no estudo e no debate sobre a questão da Internet", afirma, citando de passagem e indiretamente o grande contencioso mais recente com os Estados Unidos para introduzir os novos temas que pretende abrigar na política externa.
Sobre o que se fez com o embaixador americano Thomas Shannon que, segundo relato da "Folha de S. Paulo", saiu do Brasil escorraçado, hostilizado pelo governo, Figueiredo deixa passar o comentário sem comentários, meio a outros acidentes citados à sua consideração sobre a política reativa do Brasil. De que é exemplo, também, o episódio que o levou ao governo Dilma com a demissão do antecessor: o translado do senador boliviano asilado na embaixada brasileira em La Paz. "O caso do senador boliviano está sendo examinado pelo Conare, o conselho de refugiados, e o do diplomata Eduardo Saboia, que respondia pela embaixada à época da concessão do asilo, por uma comissão do Itamaraty", relata. Sem entrar em méritos, completa: "Isso está tendo seu curso normal, vai durar o tempo que a defesa quiser que dure".
Os laços que unem o Brasil de maneira preponderante aos interesses de Evo Morales, Nicolás Maduro, Raul Castro, Rafael Correia, Cristina Kirchner, não se confundem com uma inédita e intensa partidarização da política externa? "Eu não tenho partido", diz o ministro, que informa já ter servido como diplomata a vários governos, de diferentes orientações. "Mas é natural que a política externa reflita as orientações do governo", completa, com outra de suas assertivas.
Luiz Alberto Figueiredo seguiu esta semana para uma série de viagens para reuniões bilaterais com Moscou, Haiti, Noruega, passará na Polônia, onde transcorre a Conferência do Clima, para marcar posição política do governo brasileiro de apoio às negociações,. De lá, Figueiredo tem uma pausa de um dia e segue para Bali, rumo às negociações, que se esperam duríssimas, da conferência ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC).
No início de dezembro, participa dos entendimentos Mercosul-União Europeia. "Como isto está num processo bastante adiantado, nossa perspectiva é, até o fim do ano, por volta do dia 15, nós e os europeus trocarmos as ofertas para começar uma negociação", informou.
Uma política em curso, uma nova em formulação por duas instâncias criadas pelo novo ministro para debater a política externa. Luiz Alberto Figueiredo determinou a elaboração do livro branco da política externa em que, por escrito, se vai afirmar qual é a política que se quer ver debatida pela sociedade.
Um dos grupos estará na Secretaria de Planejamento Diplomático, que mudará seu nome para Planejamento de Política Externa. O outro é um Conselho com integrantes do governo e da sociedade.
O ministro está levando à chancelaria um especialista, profundo conhecedor de China, que estava na Embaixada do Brasil naquele país, além de experts nos novos temas que pretende incluir nos papers e manuais, como as questões sociais.
Figueiredo quer chegar a uma política externa que olhe para a frente e, sobre ela, quer conversar com todos, que enumera: academia, sociedade civil, empresariado, movimentos sociais. "Queremos ouvir e explicar o que estamos fazendo e porque estamos fazendo. A prestação de contas faz parte da minha função", afirma.
O Brasil está sendo empurrado às transformações até pelo interesse dos outros países pela forma como algumas questões avançaram por aqui. "Os presidentes que vêm se interessam pelas tecnologias sociais do Brasil. Como o Brasil conseguiu superar o dogma econômico da década de 80, o de crescer e tirar gente da pobreza ao mesmo tempo. Isso tem que entrar na política externa".
Foi para isto que reestruturou suas unidades de pensamento político, mudanças que atingirão, também, o Instituto Rio Branco, a escola de formação de diplomatas, com a criação de novas disciplinas e muita conferência sobre as questões de hoje que interessam a todos. O chanceler não se furta a dirimir um falso antagonismo que tem sido colocado como exigência da presidente da República. Dilma gostaria de ter "mais política externa e menos diplomacia", é o que se diz. A diplomacia, explica Figueiredo, é o instrumento, os diplomatas aprendem a manejá-lo. O que é necessário é ter uma política externa para a diplomacia trabalhar.

* Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

A frase da semana: hierarquia e debate de ideias - Luiz Alberto Figueiredo Machado

A hierarquia não exclui o debate de ideias. Queremos um Itamaraty arejado e aberto a novos conceitos, mas o debate de ideias não substitui a obediência à institucionalidade.

Luiz Alberto Figueiredo Machado
Chanceler brasileiro, 29/08/2013

PS: Eu também gosto do debate de ideias, e ideias não se submetem a qualquer hierarquia...
Paulo Roberto de Almeida