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quinta-feira, 29 de junho de 2023

Derrota de Putin na Ucrânia pode ter consequências inimagináveis - Thomas Friedman (NYT, OESP)

 Derrota de Putin na Ucrânia pode ter consequências inimagináveis 

Thomas Friedman, THE NEW YORK TIMES
O Estado de S. Paulo, 29/06/2023

Os acontecimentos recentes na Rússia se parecem com o trailer do próximo filme de James Bond: o ex-chefe, hacker e mercenário de Vladimir Putin, Ievgeni Prigozhin se rebela. Prigozhin, parecendo com um personagem saído diretamente de ‘Doctor No’, lidera um comboio de ex-detentos e mercenários em uma corrida excêntrica para tomar a capital russa, derrubando alguns helicópteros no caminho. Eles encontram tão pouca resistência que a internet está cheia de imagens de seus mercenários esperando pacientemente para comprar café pelo caminho, como se dissessem: ‘Ei, podem colocar uma tampa no café? Não quero sujar meu blindado.”

Ainda não está claro se o frio e calculista Putin dirigiu qualquer ameaça direta a seu velho amigo Prigozhin, mas o líder mercenário, sendo um velho laranja de Putin, claramente não estava assumindo riscos. E com razão. O sempre útil presidente de Belarus, Alexander Lukashenko, que abrigou Prigozhin, relatou que Putin compartilhou consigo o desejo de matar o mercenário e “esmagá-lo como um inseto.”

Como o sinistro Ernst Stavro Blofeld, o vilão dos filmes de James Bond que lidera o sindicato internacional do crime Spectre e sempre era visto acaraciando seu gatinho branco enquanto tramava algum ardil, Putin é quase sempre visto em sua longa mesa branca, com as visitas geralmente sentadas no lado oposto da peça, onde, é possível suspeitar, uma armadilha espera pronta para engolir qualquer um que saia da linha.

A minha reação inicial ao ver o drama se desenrolar na CNN foi questionar se tudo aquilo era real. Não sou fã de teorias da conspiração, mas 007 — Viva e Deixe Morrer não tem nada a ver com esse motim com um roteiro escrito em Moscou — um roteiro ainda em produção, enquanto um Putin analógico tenta alcançar com a TV estatal russa um Prighozin digital que o cerca com sua comunicação via Telegram.

Responder a pergunta que muitos me fazem — O que Putin fará agora — é impossível. Eu seria cauteloso, no entanto, em tirá-lo de cena tão rápido. Lembrem-se: Blofeld apareceu em seis filmes do James Bond até que o 007 finalmente o derrotasse.

Tudo que se pode fazer por enquanto, creio, é tentar calcular os diferentes equilíbrios de poder envolvidos nessa história e analisar quem, nos próximos meses, pode fazer o quê.

As fraquezas de Vladimir Putin
Permitam-me começar com o maior equilíbrio de poder em questão, que nunca pode ser deixado de lado. E o presidente Biden merece os aplausos por ele. Foi graças à ampla coalizão reunida pelo presidente dos Estados Unidos para enfrentar Putin na Ucrânia que expôs a face do vilarejo Potemkin do líder russo.

Gosto da argumentação de Alon Pinkas, ex-diplomata israelense sediado nos EUA, em um artigo publicado no Haaretz nesta semana. Segundo ele, Biden entendeu desde o começo que Putin é o epicentro de uma constelação antiamericana, antidemocrática e fascista que precisa ser derrotada. E com ela, não há negociação possível. O motim de Prigozhin fez na prática o que Biden tem feito desde a invasão da Ucrânia: expôs as fraquezas de Putin, ferundo sua já abalada aparência de invencibilidade e sua suposta condição de gênio estrategista.

Putin, há muito, governa com dois instrumentos: medo e dinheiro, cobertos com uma capa de nacionalismo. Ele comprou quem poderia comprar e prendeu ou matou quem não podia. Mas agora alguns observadores do que acontece na Rússia argumentam que o medo está se dissipando em Moscou. Com a aura de invencibilidade de Putin abalada, outros poderiam desafiá-lo. Veremos.

Se eu fosse Prigozhin ou um de seus aliados, ficaria longe de qualquer um que passasse na calçada em Belarus com um guarda-chuva em um dia de sol. Putin tem feito um trabalho bastante efetivo eliminando seus críticos e ninguém pode subestimar o temor profundo dos russos sobre qualquer retorno ao caos do período pós-soviético, no início dos anos 90. Muitos deles ainda são gratos a Putin pela ordem que ele restaurou no país.

Um plano que pode dar certo
Quando analisamos o equilíbrio de poder de Putin com o resto do mundo as coisas ficam complicadas. No Ocidente, temos de temer as fraquezas de Putin tanto quanto tememos suas forças.

Ainda não há um sinal de que o motim de Prigozhin ou a contraofensiva ucraniana tenham levado a qualquer colapso significativo das forças Rússias na Ucrânia. Apesar disso, ainda é cedo para qualquer conclusão.

Fontes do governo americano dizem que a estratégia de Putin é exaurir o Exército ucraniano até o ponto em que ele não tenha mais suas peças de artilharia howitzer de 155 milímetros nem seus sistemas antiaéreos cedidos por Washington. Essas peças são a principal arma das forças terrestres ucranianas. Sem elas, a Força Aérea Russa teria alguma supremacia até que os aliados ocidentais tenham seus recursos exauridos, ou até Donald Trump voltar à Casa Branca e Putin conseguir algum acordo sujo com ele que salve sua pele.

A estratégia não é maluca. A Ucrânia gasta tanto esse tipo de munição — cerca de 8 mil por dia — que o governo americano está tentando encontrar reposição para elas antes que novas entregas industriais dessas peças cheguem no ano que vem.

Além disso, a logística é importante numa guerra. Também é importante se você está no ataque ou na defesa. Atacar é mais difícil e os russos estão entrincheirados e com toda sua linha defensiva minada. É por isso que a contraofensiva ucraniana tem sido tão lenta.

Como me disse Ivan Krastev, especialista em Rússia e diretor do Centro de Estatégias Liberais na Bulgária: “No primeiro ano da guerra, quando a Rússia estava no ataque, todo dia sem uma vitória era uma derrota. No segundo ano, todo dia em que a Ucrânia não está vencendo é uma vitória para os russos.”

Nós não devemos subestimar a coragem dos ucranianos. Mas também não podemos superestimar a exaustão do país como uma sociedade.

E como a história ensina, o Exército da Rússia tem aprendido com seus erros. John Arquilla, professor da Escola Naval de Pós-Graduação na Califórnia e autor de Blitzkrieg: os novos desafios da guerra cibernética, “os russos sofrem, mas aprendem.”

Segundo o professor, o Exército de Putin ficou melhor em manter a hierarquia da tropa no front. Além disso, segundo Arquilla, eles aperfeiçoaram o uso de drones em combate. Ao mesmo tempo, os ucranianos mudaram sua estratégia inicial, de usar unidades móveis menores, armadas com armas inteligentes, para atacar um imóvel Exército russo, para um perfil mais pesado e maior, com tanques e blindados.

“Os ucranianos agora estão cada vez mais parecidos com o Exército russo que estavam derrotando no ano passado”, disse Arquilla. “O campo de batalha nos dirá se essa é a melhor estratégia.”

Os riscos de uma Rússia sem Putin
Isto posto, devemos nos preocupar tanto com a perspectiva de uma derrota de Putin quanto de qualquer vitória. E se ele for derrubado? Não estamos mais na época do fim da União Soviética. Não há ninguém bonzinho ou decente ali. Nenhum personagem inspirado em Yeltsin ou Gorbachev está à espreita para assumir o poder.

“A velha União Soviética tinha algumas instituições estatais que eram responsável por manter o funcionamento da burocracia, bem como alguma ordem de sucessão. Quando Putin entrou em cena, ele destruiu ou subverteu todas as estruturas sociais e políticas além do Kremlin”, me explicou Leon Aron, especialista em Rússia do American Enterprise Institute, cujo livro sobre a Rússia de Putin sai em outubro.

No entanto, a História da Rússia traz algumas reviravoltas surpreendentes, ele diz. “Apesar disso, numa perspectiva histórica, os sucessores de líderes reacionários no país costumam ser mais liberais: o czar Alexander II depois de Nicolas I, e na URSS, Kruschev depois de Stalin, e Gorbachev depois de Andropov. Então, se houver uma transição pós-Putin, há esperança.

Apesar disso, no curto prazo, Se Putin for derrubado, podemos acabar com alguém pior. Como você, leitor, se sentiria, se Prigozhin estivesse no Kremlin desde hoje cedo comandando o arsenal nuclear da Rússia?

Um outro cenário possível é a desordem ou uma guerra civil e a consequente implosão da Rússia nas mãos de diversos oligarcas e grupos armados. Por mais que eu deteste Putin, eu odeio o caos ainda mais, porque quando um Estado do tamanho da Rússia colapsa é muito difícil reconstruí-lo As armas nucleares e a criminalidade derivadas dessa catástrofe mudariam o mundo.

E isso não é uma defesa de Putin. É uma expressão de raiva pelo que ele fez a seu país, tornando-o uma bomba-relógio continental. Ele fez o mundo inteiro refém.

Se Putin vencer, o povo russo perderá. Mas se ele perder e for substituído pelo caos, o mundo inteiro sairá derrotado.


terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Putin faz nova chantagem nuclear: guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia

 Mais um blefe, e uma chantagem, de quem sabe que já perdeu:

“President Vladimir Putin said Russia would suspend participation in New START, its last major nuclear arms control treaty with the U.S.” (NYT)

Não vai conseguir outra coisa senão nova corrida armamentista. Numa anterior, a de mísseis balisticos iniciada prla URSS, os EUA responderam com outro programa de keynesianismo militar, um pouco lunático, a famosa Star Wars Initiative, que serviu para aprofundar o déficit fiscal americano. 

Mas teve pelo menos  um efeito positivo: afundou de vez, junto com a coragem do Papa Wojtilla (João Paulo II), a esclerosada União Soviética. 

Fez um bem à humanidade, ainda que temporário. Sempre aparecem tiranos desvairados, pequenos e grandes ditadores, em países grandes e pequenos.

No mais, a humanidade progrediu muito pouco: paixões e interesses dominam as relações de poder, dentro dos, e entre os Estados.

Tem sido assim desde a guerra de Troia (mas a Helena não teve nada a ver com o conflito entre a Grécia e uma de suas colônias). Mas Putin não tem nada de Menelau: está mais para uma combinação de Hitler com Mussolini: os dois tiveram triste fim, depois de arrasarem seus respectivos países e vários em volta.

Assim caminha a humanidade, como um desengonçado carro de bois, avançando lentamente por uma estrada lamacenta e esburacada, sem muita visão do que vem pela frente.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 21/02/2023

terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

Israel e a democracia - Tom Friedman (NYT, Estadão)

 Thomas Friedman: Biden envia uma mensagem clara a Israel, em 46 palavras

Por Thomas L. Friedman
NYTimes, Estadão, 14/02/2023

Acordei na manhã de sábado, li as notícias dizendo que em Israel, pelo menos 50 mil pessoas tinham acabado de participar de mais uma manifestação contra os planos do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que busca limitar a independência da suprema corte israelense e subjugá-la a si próprio, em um momento em que o próprio Netanyahu é investigado por corrupção, e fiz a mim mesmo uma pergunta simples: “O que o presidente Joe Biden acha disso?”

Instintivamente, Biden é um dos presidentes que mais defendem Israel dentre os que já acompanhei. Ele também tem uma longa relação de respeito mútuo com Netanyahu. Então, posso dizer que qualquer comentário de Biden a respeito de Israel é fruto de uma preocupação sincera.

Uma preocupação com a transformação radical do sistema judiciário de Israel que a coalizão ultranacionalista e ultrarreligiosa de Netanyahu busca aprovar à força na Knesset e a possibilidade de ela danificar seriamente a democracia do país, e consequentemente, seus laços com os Estados Unidos e as democracias de todo o mundo.

Eis a declaração que Biden me enviou na tarde de sábado quando pedi a ele que comentasse a situação: “O que a democracia americana e a democracia israelense têm de genial é o fato de serem ambas alicerçadas em instituições robustas, em sistemas de freios e contrapesos, em um judiciário independente. A formação de consensos para mudanças fundamentais é muito importante para garantir a adesão das pessoas, de modo que tais mudanças sejam sustentadas”.

‘Orbanização’
É a primeira vez que me lembro de ver um presidente americano opinar a respeito de um debate interno israelense envolvendo o próprio caráter da democracia do país. E ainda que sejam poucas palavras, a declaração de Biden é feita em um momento crucial desta importantíssima discussão interna em Israel, podendo energizar e expandir a já significativa oposição àquilo que os adversários de Netanyahu estão chamando de golpe dentro da lei, podendo situar Israel entre os países que vêm se afastando da democracia, como Turquia, Hungria e Polônia.

Eis o motivo de as palavras de Biden serem tão importantes: primeiro, ele se coloca claramente em defesa da abordagem conciliadora pedida pelo presidente israelense Isaac Herzog, e defende claramente a independência do judiciário de Israel, amplamente respeitado.

Ainda que a presidência de Israel seja um cargo principalmente simbólico, atribui-se a ela peso moral. Herzog é um bom homem que tenta afastar o que teme ser o caos civil mais grave já visto na sociedade israelense caso seja aprovada tamanha mudança no judiciário do país, parcialmente inspirada por um centro de estudos estratégicos de extrema-direita.

Herzog pediu a Netanyahu e sua coalizão que recuem e organizem algum tipo de diálogo nacional e bipartidário que possa estudar pacientemente o tipo de mudanças judiciais que poderiam ser saudáveis para Israel, fazendo isso com especialistas em direito e de maneira não partidária, preservando a integridade do sistema judicial que existe desde a fundação de Israel.

Infelizmente, Netanyahu rechaçou o presidente israelense, levando Herzog a dizer no dia 24 de janeiro, a respeito da dita reforma do judiciário: “Os alicerces democráticos de Israel, incluindo o sistema de justiça, os direitos humanos e as liberdades, são sagrados, e devemos protegê-los e os valores expressos na declaração de independência. A reforma dramática, se implementada rapidamente sem negociação, inflama a oposição e as preocupações do público”. Ele acrescentou, “A ausência de diálogo está nos dilacerando internamente, e digo claramente: este barril de pólvora está prestes a explodir. Isso é uma emergência”.

Adversários de Netanyahu estão chamando plano de golpe dentro da lei, podendo situar Israel entre os países que vêm se afastando da democracia, como Turquia, Hungria e Polônia.

Pressão sobre Bibi
Com as palavras de Biden, Netanyahu se vê agora em uma situação na qual, se insistir em seguir no rumo apesar de tudo, estará contrariando não apenas o presidente de Israel, mas também o presidente americano. Não é pouca coisa. Também suspeito que o posicionamento de Biden nessa questão, comedido e claro, incentivará outras lideranças democráticas, lideranças empresariais, senadores americanos e demais representantes a fazer o mesmo, o que vai energizar a oposição.

A segunda razão da importância das palavras de Biden é o momento em que ele se manifesta, que não poderia ser mais importante. Na segunda-feira, 13, a primeira leitura no Parlamento de alguns dos aspectos mais controvertidos da reforma judicial de Netanyahu foi feita. Uma proposta de lei deve passar por três leituras antes de se tornar lei, e a coalizão indicou que busca uma aprovação relâmpago do texto no Knesset até abril.

Biden está indicando que, faça o que fizer, Israel não deve se afastar fundamentalmente desses valores compartilhados com os EUA

Um golpe contra o Judiciário
Em terceiro, Biden situou a si mesmo e aos EUA claramente do lado da maioria israelense que se opõe à aprovação apressada das “reformas” de Netanyahu em um episódio que cada vez mais parece um putsch jurídico.

Uma pesquisa de opinião publicada na sexta feira “indica que mais de 60% do público querem que o governo suspenda ou atrase seus esforços legislativos para enfraquecer dramaticamente a Suprema Corte de Justiça e garantir o controle político das nomeações para o judiciário”, informou o Times israelense.

Isso também coloca os EUA claramente ao lado do procurador-geral do próprio Netanyahu quando este ocupou o cargo pela última vez, Avichai Mandelblit — que indiciou Netanyahu em 2020 por acusações de fraude, suborno e quebra de confiança, e que denunciou as alterações judiciais de Netanyahu como tentativa disfarçada de acabar com o próprio julgamento e evitar a prisão.

Falando ao programa “Uvda”, da TV israelense, Mandelblit disse que as amplas reformas propostas por Netanyahu para o judiciário “não são uma reforma”, e sim uma “mudança de governo”.

Como Israel não possui uma constituição e o executivo sempre controla o Knesset, Mandelblit explicou que a única separação entre os poderes — o único contrapeso para o executivo — é o judiciário israelense e a Suprema Corte. E o que Netanyahu está propondo é que uma maioria simples no Knesset — 61 dos 120 assentos — tenha poder para rejeitar qualquer decisão da Suprema Corte. Com a menor das maiorias, o governo seria capaz de aprovar qualquer lei que desejasse.

O plano de Netanyahu também daria ao governo o controle da escolha dos juízes, há muito responsabilidade de uma comissão independente, e removeria também os conselheiros jurídicos independentes (supervisores internos) de cada ministério. Atualmente, estes são nomeados pela comissão de serviços civis e só podem ser afastados pelo procurador-geral. Em vez disso, Netanyahu quer que sejam nomeados por cada ministro, a quem seriam leais.

Somando-se tudo, o resultado seria um governo eleito por 30 mil votos dentre um eleitorado de 4,7 milhões assumindo controle total da Suprema Corte, da escolha dos juízes e dos conselheiros jurídicos de cada ministério.

“Não posso me calar”, concluiu Mandelblit. “Se não houver judiciário independente, será o fim. Teremos um sistema de governo diferente.” O governante “vai decidir”, acrescentou ele. “Terá seus próprios procuradores, seus próprios conselheiros jurídicos, seus próprios juízes. E se as pessoas nesses cargos forem pessoalmente leais a ele, não haverá primazia da lei. É um buraco sem fundo que vai nos engolir a todos.”

Finalmente, o que Biden fez dará credibilidade à voz dos EUA em apoio à democracia global. Vê-se que os EUA não se manifestam somente quando a China esmaga a democracia em Hong Kong. Os americanos se manifestam ao ver a democracia ameaçada em qualquer lugar. Com frequência, os EUA criticaram abusos dos direitos humanos cometidos por Israel no tratamento dos palestinos na Cisjordânia ocupada. Mas não me lembro de um presidente americano ter criticado mudanças propostas na natureza democrática do estado israelense, pois nenhum presidente teve que fazer isso até semanas atrás.

Uma aliança em risco
Se a mensagem de Biden não for clara o suficiente para a coalizão de Netanyahu, vou tentar traduzi-la nos termos mais simples possíveis: os EUA apoiaram Israel militarmente e diplomaticamente, com bilhões de dólares oferecidos como auxílio desde a fundação do país, mas não por partilhar dos seus interesses. Nem sempre seus interesses coincidem. Israel manteve-se neutro no conflito entre Ucrânia e Rússia, mostra-se indiferente aos abusos dos direitos humanos no Egito e na Arábia Saudita, e empresas israelenses às vezes vendem à China tecnologias de defesa que preocupam muito o Pentágono. Oferecemos muito apoio a Israel desde a sua fundação porque acreditamos que o país partilha dos nossos valores.

E mesmo quando, em Gaza ou na Cisjordânia, Israel se comporta de maneiras que não condizem com nossos valores, os israelenses frequentemente os retomam como referência. Eles nos dizem: “Ei, americanos, sejam menos rigorosos. Vivemos em constante conflito violento com os palestinos. Habitamos uma região louca. E ainda assim conseguimos manter a supervisão judiciária de nossas forças armadas, instituições democráticas sólidas, um judiciário independente e uma imprensa livre”.

Essa linha de raciocínio é seriamente ameaçada pelo que Netanyahu está tentando fazer. E, na ausência dessa coincidência de valores, o que resta? Interesses partilhados não serão suficientes, pois estes são transitórios.

É por isso que as palavras de Biden são tão importantes. Com essas palavras, Biden está dizendo a Israel que nossa relação nunca se baseou de fato em interesses compartilhados. Sempre teve como base os valores que partilhamos. É por isso que durou tanto tempo, mesmo quando nossos interesses divergem. Com essa simples declaração, Biden está indicando que, faça o que fizer, Israel não deve se afastar fundamentalmente desses valores compartilhados. Caso contrário, estaremos em um mundo inteiramente novo. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

terça-feira, 7 de fevereiro de 2023

O segundo ano da guerra na Ucrânia será assustador - Thomas Friedman (NYT, Estadão)

O segundo ano da guerra na Ucrânia será assustador; leia o artigo de Thomas Friedman


Para o autor, uma geração sem uma guerra entre Grandes Potências fez muita gente esquecer o que tornou essa longa era de paz possível

Por Thomas Friedman
O Estado de S. Paulo, 06/02/2023

Conforme nos aproximamos do primeiro aniversário da invasão russa em escala total à Ucrânia — e da feroz resposta ucraniana apoiada pela coalizão ocidental liderada pelos Estados Unidos — a seguinte pergunta precisa ser respondida com urgência: Como foi possível que, em 23 de fevereiro de 2022, virtualmente ninguém nos EUA argumentava que estava no centro do nosso interesse nacional entrar em uma guerra indireta com a Rússia para impedi-la de subjugar a Ucrânia, um país que a maioria dos americanos não conseguia encontrar no mapa em dez tentativas?

E ainda assim, agora, quase um ano depois, pesquisas mostram sólidas maiorias americanas (apesar de diminuindo levemente) a favor do apoio aos ucranianos com armas e ajudas, mesmo que isso arrisque um conflito direto com a Rússia de Vladimir Putin.

Tratou-se de uma mudança diametral na opinião pública americana. Certamente isso se explica em parte pelo fato de que nenhuma força de combate dos EUA está na Ucrânia, então a sensação é como se estivéssemos arriscando, por agora, armas e dinheiro — enquanto o impacto total da guerra é absorvido pelos ucranianos.

Mas há outra explicação, apesar de a maioria dos americanos provavelmente não ser capaz de articulá-la e muitos poderem concordar com ela apenas relutantemente.

Eles sabem em algum nível profundo que o mundo em que vivemos hoje é enviesado da maneira que é por causa do poder americano. Isso não significa que sempre os EUA usam seu poder sabiamente, nem que teriam alcançado sucesso sem aliados. Mas na medida que usa seu poder sabiamente e em concerto com aliados, o país constrói e protege uma ordem mundial liberal desde 1945, o que atendeu enormemente a seus interesses — economicamente e geopoliticamente.

Esta é uma ordem na qual grandes potência autocráticas, como a Alemanha nazista, o Império do Japão ou a Rússia moderna não são livres para simplesmente devorar seus vizinhos. E trata-se de uma ordem em que mais democracias do que nunca foram capazes de florescer — e na qual mercados livres e comércio aberto tiraram mais gente da pobreza do que em qualquer outro período na história da humanidade. Ela nem sempre é perfeita — mas em um mundo em que a perfeição jamais está no cardápio, esta ordem produziu quase 80 anos sem uma guerra entre Grande Potências, do tipo capaz de desestabilizar todo o planeta.

Defender esta ordem liberal é a lógica subjacente que fez os EUA e seus aliados na Otan ajudar Kiev a reverter a invasão “casa comigo ou te mato” de Putin à Ucrânia — a primeira investida de um país da Europa contra outra nação europeia desde o fim da 2.ª Guerra.

Agora vem a má notícia: Durante o primeiro ano desta guerra, a coisa foi relativamente fácil para os EUA e seus aliados. Os americanos foram capazes de fornecer armas, ajudas e inteligência — assim como impor sanções sobre Moscou — e os ucranianos fizeram o resto, arruinando o Exército de Putin e empurrando suas forças de volta para o leste da Ucrânia. Não acho que o segundo ano será assim tão fácil.

Putin, está claro agora, decidiu dobrar a aposta, mobilizando nos meses recentes possivelmente até 500 mil novos soldados para um novo esforço no primeiro aniversário do conflito. Volume é importante na guerra — mesmo que essa massa contenha grandes números de mercenários, ex-presidiários condenados pela Justiça e conscritos sem treinamento.

Putin está basicamente dizendo o seguinte a Biden: Não posso me permitir perder esta guerra e pagarei qualquer preço e suportarei qualquer sacrifício para garantir que ficarei com um pedaço da Ucrânia que possa justificar minhas baixas. E você, Joe? E seus amigos europeus? Vocês estão dispostos a pagar qualquer preço e suportar qualquer sacrifício para manter a “ordem liberal”?

A coisa vai ficar assustadora. E porque ficamos quase uma geração sem uma guerra entre Grandes Potências, muita gente esqueceu o que tornou essa longa era de paz entre Grandes Potências possível.

‘Punho invisível’
Ainda que eu tenha argumentado no meu livro de 1999, O Lexus e a oliveira, que a explosão massiva de comércio global, negócios e conectividade desempenhava um papel importantíssimo nesta era de paz incomum, eu também argumentei que “a mão invisível do mercado jamais funcionará sem um punho invisível — o McDonald’s não pode sobreviver sem McDonnell Douglas, a fabricante do F-15″. Alguém tem de manter a ordem e fazer valer as regras.

Esse alguém tem sido os Estados Unidos, e acredito que esse papel será testado mais agora do que em qualquer outro momento desde a Crise dos Mísseis em Cuba, de 1962. Os americanos ainda estão dispostos a isso?

Há um novo livro importante que coloca esse desafio em um contexto histórico maior. Em The Ghost at the Feast: America and the Collapse of World Order, 1900-1941 (O fantasma no banquete: Os EUA e o colapso da ordem mundial, 1900-1941), o historiador Robert Kagan, da Brookings Institution, argumenta que, por mais espasmos isolacionistas que os americanos possam ter, a verdade é que, pelo menos ao longo do século recente ou pouco mais, a maioria deles apoiou a aplicação do poder dos EUA para forjar uma ordem mundial liberal que mantinha o mundo inclinado para sistemas políticos e mercados abertos em cada vez mais lugares, de cada vez mais maneiras e cada vez mais frequentemente — o suficiente para impedir que o mundo se tornasse uma selva hobbesiana.

Eu liguei para Kagan e lhe perguntei por que ele percebe a guerra na Ucrânia não como algo em que tropeçamos, mas, em vez disso, como o desdobramento natural de um arco de um século de política externa americana sobre o qual ele está escrevendo. As respostas de Kagan confortarão alguns e inquietarão outros, mas essa discussão é necessária conforme entramos no segundo ano da guerra.

“No meu livro”, afirmou Kagan, “eu cito o discurso sobre o Estado da União de Franklin Roosevelt de 1939. Em um momento em que a segurança dos EUA não estava de nenhuma maneira ameaçada — Hitler ainda não tinha invadido a Polônia, e a queda da França era quase impossível de imaginar — Roosevelt insistiu que havia, contudo, momentos ‘nos assuntos dos homens em que eles devem se preparar para defender não apenas seus lares, mas os princípios de fé e humanidade sobre os quais são fundados suas igrejas, seus governos e sua civilização’. Em ambas as guerras mundiais, e ao longo de toda a Guerra Fria, os americanos agiram não em autodefesa imediata, mas para defender o mundo liberal contra desafios de governos militaristas e autoritários, assim como estão fazendo hoje na Ucrânia”.

Mas por que apoiar a Ucrânia nesta guerra não atende apenas o interesse estratégico americano, mas também está em linha com os valores americanos?

“Os americanos têm dificuldades contínuas para conciliar interpretações contraditórias de seus interesses — um com foco em segurança dentro do país e outro com foco na defesa do mundo liberal para além das fronteiras americanas. O primeiro dialoga com a preferência dos americanos em ser deixados em paz e evitar os custos, responsabilidades e fardos morais de exercitar poder no exterior. O segundo reflete suas ansiedades enquanto um povo favorável à liberdade, sobre se tornar o que Franklin Delano Roosevelt qualificou como uma ‘ilha solitária’ em um mar de ditaduras militaristas. A oscilação entre essas duas perspectivas produziu tropeços recorrentes na política externa americana do século passado.”

Teóricos de relações internacionais, acrescentou Kagan, “nos ensinam a considerar ‘interesses’ e ‘valores’ como elementos distintos, com a ideia de que, para todos os países, os ‘interesses’ — preocupações materiais, como segurança e bem-estar econômico — necessariamente assumem primazia sobre os valores. Mas não é assim, na realidade, como as nações se comportam. A Rússia após a Guerra Fria desfrutou de mais segurança em sua fronteira ocidental do que em qualquer outro momento na história, mesmo com a expansão da Otan. Mas Putin tem se mostrado disposto a tornar a Rússia menos segura para cumprir as ambições tradicionais da grande potência russa, ambições que têm mais a ver com honra e identidade do que com segurança”. O mesmo parece verdadeiro para o presidente Xi Jinping em relação a recuperar Taiwan.

É interessante notar, porém, que um número crescente de republicanos, pelo menos na Câmara e na Fox News, não compra esse argumento, enquanto o presidente democrata e seu Senado o fazem. E no que dá?

“Debates de política externa americana nunca são apenas sobre política externa”, respondeu Kagan. “Os ‘isolacionistas’ nos anos 30 eram majoritariamente republicanos. Seu maior medo, conforme afirmavam, era que Franklin Delano Roosevelt estivesse liderando o país na direção do comunismo. Em assuntos internacionais, portanto, eles tendiam a ser mais simpáticos com potências fascistas do que os democratas progressistas. Eles gostavam de Mussolini, se opunham à ajuda aos republicanos espanhóis contra o fascista Franco, que era apoiado pelos nazistas, e consideravam Hitler uma fortaleza útil contra a União Soviética.

‘Cruzada global antiliberal’
“Então não surpreende hoje que tantos republicanos conservadores tenham uma queda por Putin, que eles consideram um líder da cruzada global antiliberal. Talvez valha a pena recordar Kevin McCarthy de que os republicanos foram destruídos politicamente por sua oposição à intervenção americana na 2.ª Guerra e só conseguiram ressurgir elegendo um internacionalista, Dwight Eisenhower, em 1952.”

Mas também há muitas vozes da esquerda perguntando legitimamente: Vale mesmo a pena arriscar a 3.ª Guerra Mundial para retirar a Rússia completamente do leste da Ucrânia? Nós já não machucamos Putin tanto, ao ponto dele não tentar mais nada na Ucrânia novamente no futuro próximo? Chegou a hora de um acordo sujo?

Já que, suspeito, essa questão estará no centro do nosso debate de política externa em 2023, pedi que Kagan começasse a respondê-la. “Qualquer negociação que permita às forças russas permanecer em território ucraniano será somente uma trégua temporária antes da nova tentativa de Putin”, afirmou ele. “Putin está no processo de militarizar completamente a sociedade russa, muito parecido com o que Stálin fez durante a 2.ª Guerra. Ele joga a longo prazo e conta com que os EUA e o Ocidente fiquem cansados diante da perspectiva de um conflito prolongado — como isolacionistas tanto de esquerda quanto de direita do Instituto Quincy e no Congresso já indicaram estar.

“Não há dúvida de que os EUA são falíveis e certas vezes usam seu poder de maneira insensata. Mas se você não é capaz de encarar francamente a questão do que aconteceria no mundo se os EUA não agissem no exterior, você não está levando essas questões difíceis a sério.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO


terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia: os novos mercenários, saídos das prisões (NYT)

 

Graves of Wagner group fighters, most of them prison conscripts, in a cemetery near the village of Bakinskaya, Russia, this month.Reuters

Russia’s convict fighters

In July, Yevgeny Prigozhin, the founder of Russia’s largest private military group, Wagner, started arriving via helicopter at prisons around the country with an offer to the inmates: Pay your debt to society by joining a private army in Ukraine.

Prigozhin promised the prisoners they would receive 100,000 rubles a month — the equivalent of $1,700 at the time, and nearly double Russia’s average monthly wage. He also offered bravery bonuses, $80,000 death payouts and, should they fulfill the six-month contract, freedom in the form of a presidential pardon.

Those who ran away, used drugs or alcohol or had sexual relations, he warned, would be killed.

My colleagues Anatoly Kurmanaev, Alina Lobzina and Ekaterina Bodyagina reported on the recruitment drive and the return to Russia of some convict fighters after they fulfilled the contract. 

“These are psychologically broken people who are returning with a sense of righteousness, a belief that they have killed to defend the Motherland,” said Yana Gelmel, a Russian prisoner rights lawyer who works with enlisted inmates. “These can be very dangerous people.”

Since July, around 40,000 inmates have joined the Russian forces, according to Western intelligence agencies, the Ukrainian government and a prisoners’ rights association. Ukraine claims that nearly 30,000 have deserted or been killed or wounded, mostly in the fighting around the eastern city of Bakhmut, though that figure is difficult to confirm.

former inmate himself, Prigozhin showed that he understood prison culture, skillfully combining a threat of punishment with a promise of a new, dignified life, according to rights activists and families.

“I needed your criminal talents to kill the enemy in the war,” Prigozhin said in one video. “Those who want to return, we are waiting for you to come back. Those who want to get married, get baptized, study — go ahead with a blessing.”

Most of the enlisted men were serving time for petty crimes like robbery and theft, but records from one penal colony seen by The New York Times show that the recruits also included men convicted of aggravated rape and multiple murders.

“There are no more crimes and no more punishments,” Olga Romanova, the head of Russia Behind Bars, said. “Anything is permissible now, and this brings very far-reaching consequences for any country.”

NYT Ukraine War Briefing, Jan 30, 2023

segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

Russia-Ukraine War Briefing, January 2, 2023 - Carole Landry (NYT)

 

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An image from video footage showed the aftermath of a Ukrainian missile attack at a vocational school in the Donetsk region on New Year’s Day.Reuters

A lethal start to 2023

Ukrainian forces used U.S.-supplied guided rockets to hit a building housing dozens of Russian soldiers in the eastern Donetsk region on New Year’s Day, Russian and Ukrainian officials said today. It was one of the deadliest strikes on Russian forces since the beginning of the war 10 months ago.

The Russian Defense Ministry said that 63 service members had been killed in the strike in the city of Makiivka while Ukrainian officials said about 400 Russians had died. A spokesman for the Russian-installed government in the Donetsk region, Daniil Bezsonov, called the strike “a massive blow” and suggested that Russian forces were partly at fault.

“The enemy inflicted the most serious defeats in this war on us not because of their coolness and talent, but because of our mistakes,” he wrote in a post on Telegram.

A former Russian paramilitary commander, Igor Girkin, also known as Igor Strelkov, wrote on Telegram that “many hundreds” were dead and wounded and that many “remained under the rubble.”

The barracks set up in a vocational school were “almost completely destroyed” because “ammunition stored in the same building” detonated in the strike, Girkin said.

A report in Russian state media said that “active use of cellular phones by the newly arrived servicemen” in that unit had helped Ukrainian forces pinpoint their location and launch the assault using HIMARS rocket launchers.

The attack came as the war appeared set to grind on, with leaders of Ukraine and Russia vowing in their New Year’s messages to press on with their military campaigns and prevail. There appears to be little hope for peace negotiations in the near future.

President Vladimir Putin broke from practice and delivered his New Year’s address not from the Kremlin, but from an unspecified military base, flanked by soldiers. The Russian leader struck a defiant tone, asserting that “moral and historical righteousness is on our side.”

Russian soldiers, Putin said, were fighting to secure “peace and security guarantees for Russia,” while the West was using Ukraine “to weaken and split up Russia.”

In his own New Year’s address, President Volodymyr Zelensky recalled that 2022 had begun with fear over Russia’s invasion but ended with hopes for victory. “We have overcome doubts, despair and fear, ” he said.

“Let this year be the year of return,” Zelensky said of 2023. “The return of our people. Soldiers — to their families. Prisoners — to their homes. Immigrants — to their Ukraine. Return of our lands.”

Kyiv and other Ukrainian cities greeted the New Year with air-raid sirens and explosive thuds from Russian missile attacks.

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Russian paratroopers in Bucha on March 3, 2022.

A Times investigation into Bucha

An eight-month visual investigation by The Times has documented the killing of 36 Ukrainian civilians in Bucha during the Russian occupation, and identified the Russian unit behind one of the worst atrocities of the war.

The victims were killed along Yablunska Street in Bucha as Moscow’s forces sought to secure a route to Kyiv.

A team of Times reporters spent months in Bucha after Russian forces withdrew in late March, interviewing residents, collecting security-camera footage and obtaining records from government sources.

The Times concluded that the perpetrators of the killings along Yablunska Street were Russian paratroopers from the 234th Air Assault Regiment, based in the city of Pskov in western Russia and led by Lt. Col. Artyom Gorodilov.

One of the most chilling findings from the investigation came from a cellphone database that showed that several Russian soldiers killed Ukrainian civilians and then used their phones to call home to Russia.

Hours before Russian troops began withdrawing from Bucha, a lone Russian soldier, either drunk or high, went on a rampage, looking for wine. Through interviews with local officials, neighbors and family members, my colleagues Carlotta Gall and Oleksandr Chubko reconstructed a night of horror.

The soldier took Oleksandr Kryvenko, 75, at gunpoint and made him bang on the doors of private homes. They ended up at the large property of Oleksandr Rzhavsky, 63, a retired politician who apparently let the Russian and his hostage into his house. They sat at the dining table, and Rzhavsky gave them wine, according to neighbors.

Something snapped that evening, and the soldier, named Aleksei, opened fire on the two men at the table, killing Kryvenko in his chair with three bullets to the chest. Rzhavsky was shot in the head. The soldier then threw a grenade and injured his leg in the explosion.

The soldier’s unit fetched him in the morning and disposed of the bodies. But the grief of family members remains raw. Two women in the house at the time, Rzhavsky’s wife and his sister, hid and managed to escape injury.

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