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domingo, 8 de dezembro de 2024

Brasileiro reuniu maior arquivo sobre crimes cometidos por Assad e alertou para risco de novas ‘atrocidades’ - Jamil Chade (UOL)

Todos sabemos que o Assad merece um capítulo especial no TPI, graças ao trabalho de Paulo Sérgio Pinheiro. Vamos aguardar os novos crimes dos fundamentalistas islâmicos que podem converter o país num novo regime do tipo talebã ou teocrático iraniano, ou pior... (PRA)

Brasileiro reuniu maior arquivo sobre crimes cometidos por Assad e alertou para risco de novas ‘atrocidades’

Por Jamil Chade 

Uma equipe liderada pelo brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro guarda um verdadeiro tesouro: o arquivo de mais de uma década de provas, testemunhos e relatos dos crimes cometidos pelo regime de Bashar Al Assad.

Pinheiro, que foi chefe da pasta de Direitos Humanos no governo de Fernando Henrique Cardoso, foi escolhido em 2011 para comandar a comissão de inquérito da ONU sobre os crimes cometidos na Síria, depois da eclosão do conflito no país. Sua nomeação era considerada como estratégica.

Meses depois, ele chegou à conclusão que Bashar Al Assad havia cometido "crimes contra a humanidade" ao reprimir manifestantes desarmados, implementando uma máquina de tortura e assassinatos em estádios, escolas e hospitais.

Ao longo de anos, a comissão presidida pelo brasileiro reuniu centenas de relatos e documentos que, eventualmente, podem ser usados para uma denúncia ao Tribunal Penal Internacional. Entre os trabalhos de Pinheiro está a construção de uma cadeia de comando na execução de crimes.

Naquele momento, Pinheiro indicou que não restava dúvida que torturas, violações sexuais, mortes e desaparecimentos de milhares de pessoas, inclusive de crianças, foram ordenados pelo alto escalão do governo sírio.

Pinheiro liderou os trabalhos à pedido do Conselho de Direitos Humanos da ONU e foi escolhido por sua experiência e por ser brasileiro, já que o Itamaraty ainda mantinha canais abertos com Damasco.

Os sírios impediram a entrada oficial da comissão ao país. Mas chegaram a receber o brasileiro de forma isolada. Ainda assim, a enquete é considerada dentro da ONU como a coleta mais completa de evidências da repressão de Assad.

Leia matéria completa: 

https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2024/12/08/brasileiro-foi-chave-em-denuncia-contra-assad-por-crimes-contra-humanidade.htm

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segunda-feira, 18 de maio de 2020

O presidente perdeu a condição de governar - ex-ministros

O presidente perdeu a condição de governar

Não há como aceitar governante que viola até o sentido básico da decência   

José Carlos Dias
Claudia Costin
José Gregori
Luiz Carlos Bresser-Pereira
Paulo Sérgio Pinheiro
Paulo Vannuchi
O momento é grave. É hora de dar um basta ao desgoverno. Hoje é preciso falar ao conjunto dos brasileiros, nossa população multiétnica, multirracial, com diversidade cultural e distintas visões políticas, 210 milhões de cidadãs e cidadãos. Hora de falar ao povo, detentor e destinatário dos rumos do país.
Assistimos em 2019 ao desmanche de instituições e estruturas de Estado, em nome de alinhamentos ideológicos e guerras culturais. A partir de fevereiro último, com a chegada da pandemia em nosso território, ao grande desmanche somaram-se ataques à ordem constitucional, à democracia, ao Estado de Direito. Não podem ser banalizados, muito menos naturalizados.

O presidente Jair Bolsonaro retira máscara para falar com jornalistas em frente ao Palácio da Alvorada, em Brasília - Lúcio Tavora - 13.mai.20/Xinhua
Como alertaram os cientistas, a Covid-19 encontraria no Brasil campo fértil para o seu alastramento: um país-continente com enorme desigualdade social e concentração de renda, sistema de saúde fragilizado por cortes e tetos orçamentários, saneamento básico precário, milhões de brasileiros vivendo em bairros, comunidades e distritos sem infraestrutura, sucateamento da educação pública, desemprego na casa das 13 milhões de pessoas e uma economia estagnada. Acrescente-se a esse quadro as características próprias da atual pandemia —um vírus com alta velocidade de transmissão e sintomatologia grave, para o qual ainda não há remédio ou vacina eficazes. ​
Talvez não imune ao vírus, mas com toda certeza imune ao sofrimento humano, o presidente da República, Jair Bolsonaro, tem manifestado notória falta de preocupação com os brasileiros, com o risco das aglomerações que estimula, com a volta prematura ao trabalho, com um sistema de saúde que colapsa aos olhos de todos e até com o número de óbitos pela Covid-19, que totalizam, hoje, muitos milhares de casos —sobre os quais, aliás, já se permitiu fazer ironias grosseiras e cruéis.
Mas a sanha do presidente não para por aí. Enquanto o país vive um calvário, Jair Bolsonaro insufla crises entre os Poderes. Baixa atos administrativos para inibir investigações envolvendo a sua família. Participa de manifestações pelo fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal. Manipula a opinião pública, e até as Forças Armadas, propagando a ideia de um apoio incondicional dos militares como blindagem para os seus desatinos. Enfim, o presidente deixa de governar para se dedicar à exibição diária de sua triste figura, em pantomimas familiares e ensaios golpistas.
Preocupado com o amanhã e sob o peso do luto, o Brasil precisa contar com um governo que coordene esforços para a superação da crise, começando por ouvir a voz que vem das casas, das pessoas que sofrem, em todas as partes. Não há como aceitar um governante que ouve apenas radicais fanáticos, ressentidos e manipuladores, obcecado que está em exercer o poder de forma ilimitada, em regime miliciano-militar que viola as regras democráticas e até mesmo o sentido básico da decência.
Só resta sublinhar o que já ficou evidente: Jair Bolsonaro perdeu todas as condições para o exercício legítimo da Presidência da República, por sua incapacidade, vocação autoritária e pela ameaça que representa à democracia. Ao semear a intranquilidade, a insegurança, a desinformação e, sobretudo, ao colocar em risco a vida dos brasileiros, seu afastamento do cargo se impõe.
A Comissão Arns de Defesa dos Direitos Humanos entende que as forças democráticas devem buscar, com urgência, caminhos para que isso se faça dentro do Estado de Direito e em obediência à Constituição.
José Carlos Dias
Presidente da Comissão Arns de Defesa dos Direitos Humanos e ex-ministro da Justiça (governo FHC)
Claudia Costin
Ex-ministra de Administração e Reforma (governo FHC)
José Gregori
Ex-ministro da Justiça (governo FHC)
Luiz Carlos Bresser-Pereira
Ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), ministro da Administração e Reforma do Estado e ministro da Ciência e Tecnologia (governos FHC)
Paulo Sérgio Pinheiro
Ex-ministro da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos (governo FHC)
Paulo Vannuchi
Ex-ministro de Direitos Humanos (governo Lula). Todos são fundadores e representantes da Comissão Arns

segunda-feira, 30 de junho de 2014

A desintegracao da Siria - Paulo Sergio Pinheiro (FSP)

De fato, como a diplomacia brasileira vem dizendo desde o início, não existe solução militar ao problema da Síria, e que a solução teria de ser política, ou diplomática. O problema é que nenhum dos lados pretende sentar-se à mesa para debater politicamente, nem os próprios contendores pretendem, podem, ou querem realmente uma resposta e uma solução política. De diplomacia, então, nem falar. A única "solução" em vista, portanto, é o esgotamento dos dois lados numa insana guerra, que não se sabe se é civil, étnica, tribal, religiosa, partidária, ou qualquer outra coisa. O país está destruído e a população destroçada sobretudo em suas esperanças de ter uma vida normal.
E tudo começou porque um ditador pretendeu manter-se no poder ante os protestos pacíficos de cidadãos por uma abertura política e por mais democracia. Massacrados estes, o caminho estava aberto para os fundamentalistas.
Ditadores, por mais que pretendam "unir" o país, sempre colocam seus interesses pessoais acima dos da nação, e por isso devem ser afastados pela pressão da comunidade internacional. Como isso não foi possível na Síria, temos essa situação de caos absoluto.
Paulo Roberto de Almeida

A DESINTEGRAÇÃO DA SÍRIA
Estratégias da ilusão
Paulo Sérgio Pinheiro
Presidente da comissão independente internacional de investigação da ONU sobre a República Árabe da Síria
Folha de SP, 29/06/2014

A ameaça de guerra no Oriente Médio está cada vez mais próxima. O conflito no Iraque terá repercussão devastadora na Síria e nos países vizinhos
No quarto ano do conflito armado, milhões de sírios ainda sofrem com a perda de familiares em bombardeios aéreos, com a violência em centros de detenção, com desaparecimentos e fome. Mais de 150 mil pessoas perderam a vida.
A incapacidade de proteger os civis dos bombardeios das forças governamentais sírias e dos ataques dos grupos não estatais armados levou a um sofrimento indizível.
Estima-se que 9,3 milhões de sírios têm necessidade de assistência humanitária urgente, com 4,25 milhões de deslocados internamente e 2,8 milhões de refugiados em países vizinhos. A expressiva maioria são mulheres e crianças.
A infraestrutura básica do país foi destroçada. Escolas foram reduzidas a escombros ou ocupadas pelas forças armadas. Hospitais foram invadidos. Bairros residenciais estão destruídos. Alimentos, água e eletricidade foram cortados para infligir sofrimento a populações civis. A guerra teve um impacto devastador sobre a economia do país.
Como meu colega Lakhdar Brahimi afirmou antes de renunciar a suas funções de enviado conjunto da ONU e da Liga Árabe, a Síria está a ponto de se tornar um "Estado falido, com senhores da guerra por toda parte", e o conflito não ficará restrito às fronteiras do país.
A guerra na Síria atingiu um ponto de inflexão que ameaça toda a região. O governo sírio e os grupos armados na oposição têm levado a violência ao paroxismo. Todos desrespeitam flagrantemente as regras dos direitos humanos. Uma impunidade generalizada campeia.
Combatentes e cidadãos são torturados até a morte dentro de centros de detenção, homens são decapitados e alguns crucificados em praça pública, mulheres vivem com o estigma do abuso sexual e as crianças são recrutadas pelas forças de combate.
Escolhas cotidianas como ir ou não à mesquita para as orações, ir ou não ao mercado para fazer compras de comida ou levar ou não as crianças à escola para que deem continuidade a seus estudos se tornaram decisões de vida ou morte.
Como as partes em conflito chafurdam na ilusão de que a vitória militar está a seu alcance, Estados com influência no conflito renunciaram a trilhar a via para uma solução política. Alguns continuam a fornecer armas, artilharia e aviação para o governo ou contribuem com assistência logística e estratégica. Outros países e indivíduos apoiam os grupos armados não estatais com doações financeiras, armas e treinamento. Alimentam, assim, uma guerra por delegação, uma "proxy war" de potências dentro da Síria.
A ameaça de uma guerra regional no Oriente Médio está cada vez mais próxima. O conflito armado que se alastra no Iraque terá repercussão devastadora na Síria e em outros países limítrofes.
O aspecto mais alarmante tem sido o aumento da ameaça sectária, consequência direta da dominação de grupos extremistas como o Estado Islâmico no Iraque e no Levante, o EIIL. Seus combatentes radicais atacam não somente as comunidades sunitas que não se submetem a seu controle, mas também minorias como os xiitas, alauítas, cristãos, armênios, drusos e curdos, todos considerados apóstatas ou infiéis que devem ser abatidos.
Diante das ilusões desse triunfalismo belicoso generalizado por todas as partes, deve-se continuar a insistir que não há solução militar para o conflito. Desde o início, a única via sempre foi e continua sendo uma negociação diplomática, política, que inclua todos os países com influência na região, desde o Irã até a Arábia Saudita.
Os povos da Síria têm o direito de exigir da comunidade internacional, pelas oportunidades perdidas de terminar o conflito e pelo sofrimento a eles imposto, que a paz não continue a lhes ser negada.

PAULO SÉRGIO PINHEIRO, 70, é presidente da comissão independente internacional de investigação da ONU sobre a República Árabe da Síria. Foi secretário de Estado de Direitos Humanos no governo Fernando Henrique Cardoso.