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domingo, 8 de dezembro de 2024

Brasileiro reuniu maior arquivo sobre crimes cometidos por Assad e alertou para risco de novas ‘atrocidades’ - Jamil Chade (UOL)

Todos sabemos que o Assad merece um capítulo especial no TPI, graças ao trabalho de Paulo Sérgio Pinheiro. Vamos aguardar os novos crimes dos fundamentalistas islâmicos que podem converter o país num novo regime do tipo talebã ou teocrático iraniano, ou pior... (PRA)

Brasileiro reuniu maior arquivo sobre crimes cometidos por Assad e alertou para risco de novas ‘atrocidades’

Por Jamil Chade 

Uma equipe liderada pelo brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro guarda um verdadeiro tesouro: o arquivo de mais de uma década de provas, testemunhos e relatos dos crimes cometidos pelo regime de Bashar Al Assad.

Pinheiro, que foi chefe da pasta de Direitos Humanos no governo de Fernando Henrique Cardoso, foi escolhido em 2011 para comandar a comissão de inquérito da ONU sobre os crimes cometidos na Síria, depois da eclosão do conflito no país. Sua nomeação era considerada como estratégica.

Meses depois, ele chegou à conclusão que Bashar Al Assad havia cometido "crimes contra a humanidade" ao reprimir manifestantes desarmados, implementando uma máquina de tortura e assassinatos em estádios, escolas e hospitais.

Ao longo de anos, a comissão presidida pelo brasileiro reuniu centenas de relatos e documentos que, eventualmente, podem ser usados para uma denúncia ao Tribunal Penal Internacional. Entre os trabalhos de Pinheiro está a construção de uma cadeia de comando na execução de crimes.

Naquele momento, Pinheiro indicou que não restava dúvida que torturas, violações sexuais, mortes e desaparecimentos de milhares de pessoas, inclusive de crianças, foram ordenados pelo alto escalão do governo sírio.

Pinheiro liderou os trabalhos à pedido do Conselho de Direitos Humanos da ONU e foi escolhido por sua experiência e por ser brasileiro, já que o Itamaraty ainda mantinha canais abertos com Damasco.

Os sírios impediram a entrada oficial da comissão ao país. Mas chegaram a receber o brasileiro de forma isolada. Ainda assim, a enquete é considerada dentro da ONU como a coleta mais completa de evidências da repressão de Assad.

Leia matéria completa: 

https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2024/12/08/brasileiro-foi-chave-em-denuncia-contra-assad-por-crimes-contra-humanidade.htm

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segunda-feira, 1 de abril de 2024

Os perigos da diplomacia personalista: Putin, TPI e G20 - Ricardo Della Coletta, José Marques (FSP), Paulo Roberto de Almeida

 Primeiro a noticia (ver a íntegra abaixo):

“ PUTIN

Governo produz parecer que embasa possível vinda de Putin para o G20. Texto oferece defesa para descumprir eventuais ordens de prisão do TPI contra chefes de Estado. A Folha de S. Paulo questionou o Itamaraty sobre o parecer apresentado na ONU e sua relação com a possível vinda de Putin ao Brasil. O ministério respondeu que não comentaria, uma vez que o documento faz observações iniciais de um tema que ainda será negociado.”

Agora o comentário:

O Estatuto de Roma está incorporado à Constituição do Brasil. Mas Lula nunca ligou para isso, assim como nunca ligou para as cláusulas de relações internacionsis contidas no art. 4. da mesma Carta, sobretudo o item da não interferência nos assuntos internos de outros Estados. Ele o fez sistematicamente a favor de seus amigos esquerdistas, com destaque para os comunistas cubanos, os chavistas (Chávez, Morales e outros), e todos os demais que estivessem na lista de alianças do PT. Mais ainda: isso ultrapassa o terreno da esquerda, como visto no caso de Putin, que é simplesmente o fato da aliança com tudo e todos que se contrapõem aos Estados Unidos.

Disso já sabemos. O que não sabíamos é que o Itamaraty confirma sua submissão caolha, míope, ao que deseja o chefe de Estado. Já o fez sob Bolsonaro, está fazendo novamente sob Lula.

Diplomacia presidencial pode ser um problema, dependendo da qualidade do chefe do Executivo. Vargas, Geisel e FHC conduziram pessoalmente a diplomacia do Brasil em seus respectivos mandatos. Com os demais presidentes, o Itamaraty teve certa latitude de ação, de aconselhamento e até de condução de determinados assuntos.

Diplomacia personalista sempre é um problema, pois que o chefe de Estado conduz as relações exteriores segundo critérios que podem não ser os mais adequados do ponto de vista dos interesses do Brasil, tal como refletidos na agenda do Itamaraty.

Lamento pelos meus colegas diplomatas, lamento pelo Brasil.

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 1/04/2024

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Governo Lula produz parecer que embasa possível vinda de Putin ao Brasil no G20

Texto oferece defesa para descumprir eventuais ordens de prisão do TPI contra chefes de Estado


BRASÍLIA

O governo Lula (PT) produziu um parecer com argumentação jurídica que embasa eventual vinda ao Brasil do presidente da Rússia, Vladimir Putin, mesmo ele sendo alvo de um mandado internacional de prisão.

O documento foi submetido em novembro do ano passado à Comissão de Direito Internacional da ONU. O órgão atualmente trabalha na elaboração de uma normativa sobre imunidade de jurisdição a chefes de Estado. O status, que também pode ser conferido a outras altas autoridades, garante que esses líderes não sejam processados ou atingidos por ações judiciais vigentes nos países que os recebem em visitas internacionais.

O governo brasileiro não cita diretamente Putin no texto, mas faz referência a um cenário que se encaixa na situação atual do líder russo: ele é alvo de um mandado de prisão expedido pelo TPI (Tribunal Penal Internacional), acusado de ter permitido que ocorressem crimes de guerra no conflito com a Ucrânia.

Como o Brasil é signatário do Estatuto de Roma, que criou o TPI, o país em tese está obrigado a prender Putin caso ele desembarque em território nacional. Encarcerá-lo em solo brasileiro é, no entanto, um cenário considerado inimaginável devido às consequências geopolíticas e de segurança que a detenção do líder da segunda maior potência militar do planeta representaria.

Ainda assim, a hipótese de uma ordem de prisão tem potencial de criar, no mínimo, constrangimento diplomático para Brasil e Rússia em plena cúpula do G20 caso Putin venha para o encontro no Rio de Janeiro em novembro.

O texto submetido à Comissão de Direito Internacional não tem efeito prático e tampouco é garantia de que o Brasil estaria livre de censura do TPI caso ignore uma ordem do tribunal durante possível passagem de Putin pelo país, segundo especialistas ouvidos pela Folha.

Ele indica, porém, uma opinião oficial do governo Lula no sentido de que a imunidade de jurisdição de Putin deveria protegê-lo do alcance do TPI na hipótese de que essa viagem se concretize.

O principal argumento do documento é que acordos que criam tribunais internacionais (como é o caso do Estatuto de Roma) devem ter efeito apenas entre as partes que assinaram o tratado.

Por essa tese, um chefe de Estado de um país não signatário não poderia ter sua imunidade ignorada mesmo ao estar em um território que reconhece a autoridade dessa corte internacional. A Rússia retirou sua assinatura do Estatuto de Roma em 2016.

Em um dos parágrafos do parecer, o Brasil concorda que a imunidade de jurisdição para altas autoridades "não deve afetar os direitos e as obrigações dos Estados partes diante de acordos que estabeleceram cortes e tribunais penais internacionais". Mas em seguida destaca que isso deve ocorrer no âmbito das "relações entre as partes desses acordos".

"É norma básica da lei internacional geral, codificada no artigo 34 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, que 'um tratado não cria obrigações ou direitos para um terceiro Estado sem o seu consentimento'", diz o texto.

"Dessa forma, enquanto os artigos [sobre imunidade] não afetam obrigações de tratados referentes a tribunais internacionais, esses acordos internacionais não afetam a imunidade de agentes de Estados não partes".

O Brasil afirma ainda que a imunidade de jurisdição para dirigentes é essencial "para promover entendimentos pacíficos de disputas internacionais e relações amigáveis entre os Estados, inclusive na medida em que permite que funcionários de Estados participem em conferências internacionais e missões em países estrangeiros".

E faz eco a uma crítica que já circulou entre representantes de países em desenvolvimento sobre o mandado do TPI contra Putin: a de que a corte está sendo usada politicamente. "[A imunidade de jurisdição] contribui para a estabilidade das relações internacionais, por prevenir o exercício abusivo, arbitrário e politicamente motivado da jurisdição criminal que pode ser usado contra agentes dos Estados".

Folha questionou o Itamaraty sobre o parecer apresentado na ONU e sua relação com a possível vinda de Putin ao Brasil. O ministério respondeu que não comentaria, uma vez que o documento faz observações iniciais de um tema que ainda será negociado longamente no âmbito da Comissão de Direito Internacional.

A reportagem também encaminhou o parecer a quatro especialistas em direito internacional. Três viram na argumentação uma tentativa de flexibilizar as obrigações do Brasil junto ao TPI e disseram que a hipótese descrita na redação se aplica à situação de Putin.

André de Carvalho Ramos, professor de Direito Internacional da USP (Universidade de São Paulo), diz que a argumentação feita pelo Brasil tem como base um dispositivo específico previsto no próprio Estatuto de Roma: o de que um pedido do TPI pode não ter efeito caso o Estado requerido seja obrigado a atuar de forma incompatível com o direito internacional "em matéria de imunidade dos Estados".

O problema, prossegue o professor, é que já existe precedente sobre esse tema.

"O TPI decidiu que a Jordânia violou o Estatuto de Roma ao não prender em 2017 o então presidente do Sudão Omar al-Bashir durante visita dele ao país. Pois bem, a Jordânia apelou e, em 2019, o TPI decidiu que a norma consuetudinária [invocada pelo Brasil] só se aplica a tribunais nacionais, inexistindo norma consuetudinária imunizante em face de tribunais internacionais, como o TPI", diz ele.

"No plano do TPI, mesmo que o Judiciário brasileiro dê razão ao governo federal, há fortíssima probabilidade do Brasil ter o mesmo destino que a Jordânia."

Wagner Menezes, presidente da Academia Brasileira de Direito Internacional, opina que a argumentação apresentada pelo Brasil "relativiza" o alcance do Estatuto de Roma e vai na contramão de um dos principais objetivos do TPI: o de constranger a movimentação internacional de pessoas acusadas de crimes de guerra e contra a humanidade.

"Não é relevante se a Rússia ratificou ou não o Estatuto. O Brasil não tem qualquer tipo de relação, nesse caso, com a Rússia. Trata-se de um tema da relação do Brasil com o tribunal", afirma.

Professor titular de Teoria e História do Direito Internacional, Arno Dal Ri Jr. vê na redação submetida pelo governo à ONU uma "cortina de fumaça". Ele também classifica a argumentação de "frágil".

"Os termos do documento são hipotéticos, em que se levanta vários quadros e hipóteses, dentre essas aquela de legitimação da vinda do Putin através da imunidade típica de chefes de Estado", diz.

"É um jogo muito dúbio que está sendo feito, no qual se sabe a realidade de que, em caso de pedido de entrega pelo TPI não cumprido pelo Brasil, existiria uma colisão [com o Estatuto de Roma] e o Brasil que seria responsabilizado por isso. Mas usa-se uma interpretação ampliada para retirar o foco do real problema jurídico que poderia advir."

Já o advogado e doutor em Direito Marcelo Peregrino Ferreira tem opinião diferente e não enxerga na hipótese tratada pelo parecer algo que beneficie o caso russo. "Acho que a investida do Brasil não é contra o Estatuto de Roma ou outra corte internacional, mas contra a suspensão da imunidade pela jurisdição criminal comum de países que não tem um tratado entre si. E a proposta brasileira não me parece beneficiar o caso russo", diz ele.

A possível vinda de Putin ao Brasil para a cúpula do G20 é um tema altamente sensível. Se confirmada, ela deve virar o fato político mais impactante da reunião.

Desde que ordenou a invasão da Ucrânia, em fevereiro de 2022, o líder russo virou alvo de uma operação que, orquestrada por Estados Unidos e Europa, busca isolá-lo nos diferentes fóruns internacionais. Ele não compareceu às duas últimas edições do G20, na Índia e na Indonésia —nenhum dos países é signatário do Estatuto de Roma.

A eventual vinda de Putin à cúpula no Rio de Janeiro motivou polêmica antes mesmo de o Brasil iniciar seu mandato na presidência do G20.

Em setembro de 2023, quando participava da cúpula do fórum em Nova Déli, Lula afirmou que seu homólogo russo não corria o risco de ser preso caso decidisse vir à edição seguinte do evento. "Se eu for presidente do Brasil, e se ele [Putin] vier para o Brasil, não tem como ele ser preso. Não, ele não será preso. Ninguém vai desrespeitar o Brasil", disse o petista na ocasião.

Dias depois, Lula voltou atrás e afirmou que a decisão sobre uma eventual prisão caberia ao Poder Judiciário. "Se o Putin decidir ir ao Brasil, quem toma a decisão de prendê-lo ou não é a Justiça, não o governo nem o Congresso Nacional."


terça-feira, 19 de dezembro de 2023

TPI: importante testemunho de ex-oficial da invasão russa na Ucrânia - Ariana Gic (via X)

 Tudo o que vai relatado abaixo era perfeitamente conhecido dos meios bem informados, ou seja, a mídia de qualidade, independente, e das autoridades nacionais, sobretudo na Europa. No Brasil, o governo Dilma preferiu ignorar as invasões do Donbas e da peninsula da Crimeia, sendo deliberadamente indiferente ao sofrimento do povo ucraniano e às violações da Carta da ONU e das normas mais elementares do Direito Internacional. A origem dessa indiferença e dessa aliança objetiva com o tirano rusdo desde o inicio do governo Lula.


‼️Former senior Russian GRU officer, & ex Officer in Russian mercenary groups has fled to the Netherlands with the intention of testifying about Russian war crimes in Ukraine before the ICC. Salikov is not seeking immunity & is prepared to accept responsibility for his role.

1/8

Some of the crimes Salikov has testified to:

-Russia invaded Ukraine in 2014

-Orders came directly from the President's Office & Ministry of Defence

-Russia staged FAKE "referendum" in Donbas by force and falsified the "results" for the Kremlin

2/8

-Russia shelled & mined occupied Donbas in order to kill civilians, and then blamed Ukrainian forces for the killing of the Ukrainian civilians 

-Salikov was chief of the Special Ops forces in Russia's occupation administration & totally FAKE "Donetsk People's Republic"

3/8

-Russian forces execute Ukrainian civilians en masse

-Russian forces torture and kill Ukrainian POW's

-Russian forces systemically and in large numbers kidnap Ukrainian children and forcibly move them across the border to Belarus

4/8

Note that this is the account of just ONE person which speaks to the truth of the general picture of Russia's brutal and illegal genocidal war against Ukraine - a war based on total lies, fabrications, and extreme barbarity.

5/8

Testimony from this Russian war criminal put to absolute shame most of the reporting on Russia's war against Ukraine.

Ukraine has been telling the world these FACTS since 2014. But truth from Ukraine was ignored, dismissed, mocked and replaced with Russian lies.

6/8

Many western journalists and experts have a DIRECT role in the sidelining of truth about Russia's genocidal war against Ukraine. They attacked Ukraine when it spoke the truth, and platformed the lies that Moscow told to cover up its crimes.

7/8

Don't be mistaken - Western political leadership was WELL aware of these FACTS as well. They turned a blind eye to the truth, to the suffering of Ukraine and Ukrainians, to Russia's illegal and evil ambitions, and threw Ukrainians to the Russian wolves.

8/8


sábado, 16 de setembro de 2023

Negacionista Silencioso, o ministro dos Direitos Humanos seletivos - Demétrio Magnoli (FSP)

 NEGACIONISTA SILENCIOSO

Lula e Silvio Almeida negam direitos humanos por motivos geopolíticos e ideológicos

Demétrio Magnoli

Folha de São Paulo (15/09/2023)

No 16 de novembro de 1998, o então ex-ditador Pinochet foi preso em Londres por solicitação do juiz Baltasar Garzón. A prisão no Reino Unido de um chileno indiciado por um espanhol representou uma aplicação inédita do princípio da universalidade dos direitos humanos. Meses antes, o Estatuto de Roma estabelecera o Tribunal Penal Internacional (TPI), que entrou em vigor em 2002. Nos 50 anos do golpe de Pinochet, quando Lula investiu contra o TPI, o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, alinhou-se ao presidente por meio de um silêncio cúmplice.

Lula e Almeida são negacionistas dos direitos humanos, mas o primeiro os despreza por motivos geopolíticos enquanto o segundo os renega por motivos ideológicos. As razões do presidente, embora abjetas, inscrevem-se na esfera superficial do oportunismo. Já as razões do ministro têm raízes profundas e, por isso, ferem o núcleo da cultura dos direitos humanos.

Meses antes de assumir o ministério, Almeida publicou um artigo esclarecedor. Consagrado à invasão da Ucrânia, o texto conseguiu a proeza de, ao longo de 613 palavras, evitar a responsabilização de Putin. Nele, invoca-se a "complexidade do evento" para, afastando "reflexões maniqueístas", atribuir o "conflito" ao "expansionismo capitalista" e à "lógica destrutiva da mercadoria" (leia-se: EUA). Culpa coletiva, difusa, espalhada: "todos os governos estão cientes do horror que estão promovendo".

O substrato ideológico do artigo encontra-se, contudo, em outro lugar: uma citação de 1950 do martinicano Aimé Cesaire, que ainda militava no Partido Comunista Francês e admirava Stalin. Segundo Cesaire, a indignação diante do nazismo, fonte da Declaração Universal de 1948, não decorria do "crime contra o homem, mas contra o homem branco" pois inexistiria diferença fundamental entre a máquina de extermínio hitlerista e os "processos colonialistas" europeus.

Cesaire escreveu durante 66 anos. Almeida escolheu o voo mais baixo do martinicano. A passagem pertence à extensa tradição do antissemitismo soft contemporâneo que, no lugar da negação factual do Holocausto, opera pela sua relativização. Mas a cuidadosa seleção faz sentido: o objetivo do ministro é exibir a cultura dos direitos humanos como pura hipocrisia de brancos ocidentais.

A narrativa identitária de Cesaire e Almeida tem mil e uma utilidades, inclusive a proteção de Stalin, no caso do primeiro, e a de Putin, no do segundo. Sobretudo, porém, trata-se de contestar a natureza universal dos direitos humanos para sustentar uma doutrina assentada na cisão "brancos/não-brancos". Daí, a hostilidade tanto à Declaração Universal quanto ao TPI, seu principal fruto.

"Todos os seres humanos podem invocar os direitos e liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião...". O artigo 2º da Declaração Universal, aprovada antes da queda dos impérios coloniais, indica o alcance da reação civilizatória ao Holocausto.

O Estatuto de Roma nasceu do repúdio ao genocídio de Ruanda (1994) e ao massacre de Srebrenica (1995), eventos incompreensíveis nos termos da doutrina identitária. A "purificação racial" foi a mola propulsora de ambos. Na antiga Iugoslávia, militares sérvios eliminaram milhares de civis muçulmanos bósnios. No país africano, a ditadura hutu comandou o extermínio de mais de meio milhão de tutsis. "Brancos contra brancos" e "negros contra negros"? O exterminismo racista não precisa de diferenças de cor de pele.

O crime de Putin que provocou a ordem de prisão do TPI é do mesmo tipo. A deportação de dezenas de milhares de crianças ucranianas para a Rússia destina-se a russificá-las, um passo no projeto de eliminar a Ucrânia como nação. O negacionista Almeida não vê escândalo nisso: "brancos contra brancos", tudo bem.

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Esse tal de TPI! Tem conserto? Acho difícil! - Lula e Paulo Roberto de Almeida

Esse tal de TPI! Tem conserto? Acho difícil!

  

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Nota sobre declarações de Lula sobre o TPI e a prisão de Putin

  

Seriam precisos vários anos de escola (não precisaria ser graduação, poderia ser um bom curso médio), e muita leitura de alguns bons livros sobre Direito Internacional, História do Mundo, História Diplomática do Brasil, ou então bons assessores internacionais (podem ser até diplomatas), para tentar minimizar ou corrigir o descalabro que representa cada uma das frases tortas de quem insiste em ser ignorante, em não se informar e ainda assim dizer o que lhe vem à cabeça, coisas pronunciadas com aquele tom veemente de quem acha que tem sempre razão, mas que causam um enorme prejuízo à imagem internacional do Brasil e à de sua diplomacia, já tão machucada: 

Quero estudar muito essa questão desse Tribunal Penal Internacional (TPI). Até porque os Estados Unidos não é signatário, Rússia não é signatária. Quero saber por que o Brasil é signatário de uma coisa que os Estados Unidos não aceita. (sic)

É um absurdo. São países emergentes signatários de umas coisas que prejudicam eles mesmo. Vou dar uma pensada nisso direitinho. De qualquer forma quem toma a decisão é a Justiça. Se o Putin decidir ir ao Brasil, quem toma a decisão é a Justiça, não é nem o governo, nem o Congresso Nacional. Espero que (até lá) já tenha acabado a guerra e o tribunal tenha refeito a sua posição para que possamos voltar à normalidade.

(Lula, em coletiva de imprensa, após participar de um encontro de líderes do G20, 11/09/2023)

O TPI “precisa refazer a sua posição”, este é o recado final. 

Algum porta-voz do TPI poderia explicar ao preclaro presidente do Brasil o que é, para que serve o TPI e o que representa na escala civilizatória dos direitos humanos?

Algum assessor brasileiro, entendido em Direito Internacional e Constitucional (pode até ser um diplomata recém saído do IRBr, ou o próprio ministro dos Direitos Humanos), poderia explicar ao presidente o que são tratados internacionais de Direitos Humanos, qual o seu papel no sistema constitucional brasileiro (teve até uma PEC exclusivamente para isso, incorporada à Carta) e quais são as obrigações internacionais do Brasil, sob os tratados aos quais aderiu soberanamente, com a aprovação do Congresso e a anuência do STF?

Pode ser um crash course.

Não fica bem um presidente sair pelo mundo espalhando a sua ignorância. 

Fica mal para o Brasil, fica mal para a diplomacia do país e fica mal para a sua presidência do G20. 

Pode até pegar bem no BRICS+, ou no tal de Sul Global e seu projeto de uma “nova ordem mundial pós ocidental”, mas isso é uma outra história.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4474, 11 setembro 2023, 2 p.

Postado no blog Diplomatizzando (link: ).

 

 

domingo, 10 de setembro de 2023

Fim de uma era, a do Barão do Rio Branco - Paulo Roberto de Almeida

Fim de uma era, a do Barão do Rio Branco

Paulo Roberto de Almeida 

A intenção de Lula de convidar ao G20 de 2024 o presidente Putin, buscado pelo Tribunal Penal Internacional por crimes de guerra na sua guerra de agressão contra a Ucrânia, enterra definitivamente a postura formalizada 120 anos atrás pelo Barão do Rio Branco quanto ao absoluto respeito ao Direito Internacional pela diplomacia brasileira. 

Acabou assim um padrão estabelecido pelo grande patrono do Itamaraty para a política externa brasileira. Sem dúvida alguma, uma tomada histórica de posição, embora indigna de figurar nos livros de história diplomática do Brasil. 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 10/09/2023

sexta-feira, 24 de março de 2023

Wanted, dead or alive: Mr. Putin; Address: Kremlin (that's the easy part) - Washington Post

 The big idea

The Washington Post, March 24. 2023

Actually, 'wanted’ world leaders often face justice, new study finds
Russian President Vladimir Putin has been accused of committing war crimes in Ukraine.
It’s been a historic week for world leaders accused of atrocities:
On March 17, judges for the International Criminal Court (ICC) in The Hague issued an arrest warrant for Russian President Vladimir Putin on war crimes charges.
And on March 20, the world marked 20 years since the U.S.-led war in Iraq to topple dictator Saddam Hussein, who was deposed, arrested, tried and ultimately executed in 2006.
The ICC news about Putin drew understandable skepticism.
After all, he’s the leader of a nuclear-armed country that is a veto-wielding permanent member of the U.N. Security Council. The ICC doesn’t do trials in absentia, so he’d have to be handed over. And, as Bloomberg reported, “of the two dozen people against whom the ICC has pursued war crimes cases, about a third remain at large.”
JUSTICE OFTEN SERVED?
But now comes a new study from Tom Warrick, who served as deputy assistant secretary for counterterrorism policy at the Department of Homeland Security and is now a senior fellow at the Atlantic Council think tank. It publishes this week, but The Daily 202 got an early look. You should be able to read the whole thing here.
Warrick’s conclusion? It’ll surprise skeptics (including, in all honesty, The Daily 202), but in recent times, high-profile targets of war-crimes prosecution mostly do not evade justice and certainly don’t die peacefully in their sleep. With some exceptions, of course.
“Heads of state and major political or military leaders wanted by international courts have faced justice far more often than not,” he found. “If modern history is a guide, the ICC arrest warrant has dramatically changed Putin’s fate.”
The Daily 202 readers are surely familiar with the Nuremberg trials of Nazi military and political leaders. But the modern era of war-crimes accountability began in 1992 with the U.N. Security Council’s establishment of mechanisms for punishing atrocities in the former Yugoslavia.
That was followed by a wave of other actions, some of them country-specific, like an international tribunal for Rwanda or domestic courts in places like Cambodia or Iraq, as well of course as the creation of the ICC. (The China, India, Russia and the United States, notably, don’t recognize ICC jurisdiction.)
Warrick looked at 18 heads of state or leaders or major military forces sought by international justice for genocide, crimes against humanity and serious war crimes. (They’re all men.)
Of the 18, he wrote:
15 (83 percent) have faced justice of some kind before a tribunal.
Two were acquitted “for lack of evidence under less-than-ideal circumstances” but still appeared before ICC judges.
Two others were killed before they could face trial (meaning 94 percent have either faced a tribunal or were killed before that could happen).
Just one of the 18 is still at large.
And here’s the mic-drop: “Of the seven who have died, 0 percent died in their beds at home as free men.”
THE ADMINISTRATION’S HAND
President Biden’s administration this week looked to leverage the ICC warrant for Putin, with Secretary of State Antony Blinken saying Wednesday European countries should detain him and hand him over to the ICC if he visits their countries.
“Anyone who is a party to the court and has obligations should fulfill their obligations,” Blinken said, my colleagues John Hudson and Missy Ryan reported.
The ICC warrant “is not just a symbolic action, it has consequences that are going to change the trajectory of Putin’s life, said Warrick, who has decades of experience as an international lawyer, including years of work in the State Department on war-crimes issues.
It could restrict his travel options, it could restrict what world leaders choose to meet with him or associate with him — though obviously his recent summit with Chinese President Xi Jinping shows some of the limits to the limits, so to speak. And many ICC signatories have declined to sign on to condemnations of Russia’s war in Ukraine.
The warrant could also “fundamentally alter the way other Russians deal with him,” Warrick said.
How?
In Russia, “there will eventually come to power a group of people who want to break with the crimes of the current leadership [and the international price to pay] and so putting someone like Putin on an airplane to The Hague becomes an option that solves several problems,” he said in an interview with The Daily 202.
Warrick pointed to Putin’s widely reported revulsion at images of ousted Libyan strongman Muammar al-Qaddafi being killed in a ditch, seeing his brutal and bloody end as a lesson in what happens to leaders who play by the West’s rules.
“If there’s not a measure of accountability for mass murder, there will be vengeance,” he told The Daily 202. Qaddafi’s fate was evidence of that. So was Italian dictator Benito Mussolini’s. Or that of Nicolae Ceaușescu, the Romanian dictator.
“The world has changed since 1992,” said Warrick, “and it’s time everyone catch up.”