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domingo, 4 de maio de 2014

Economia mundial: acabou-se o que era doce (para o Brasil) - Pedro da Motta Veiga, Sandra P. Rios

O avestruz num mundo em transformação
Pedro da Motta Veiga e Sandra Polónia Rios*
O Estado de S.Paulo, 02 de maio de 2014

As tendências que ganham força no quadro econômico e político internacional apontam para um cenário muito diverso da bonança que tanto beneficiou o Brasil na primeira década do século. Independentemente dos contornos precisos que o cenário global adquirirá nos próximos anos, as margens de manobra de um país com as características do Brasil serão, daqui até pelo menos o fim dos anos 10, muito mais estreitas do que as vigentes no período anterior à eclosão da crise.
Já há a percepção difusa da emergência de um mundo marcado por mais riscos do que oportunidades para o Brasil. As preocupações com o "isolamento" internacional da economia brasileira e as críticas ao atrelamento das posições brasileiras em negociações comerciais às preferências argentinas são expressões dessa percepção. Mas, em geral, a percepção de riscos e ameaças é genérica e com frequência "transborda" para visões quase apocalípticas do futuro que nos espera num mundo mais hostil.
Não é para tanto, mas o que vem por aí é, de fato, preocupante. Senão vejamos. Não se esperem mais da China os bônus gerados por espantosas taxas de crescimento e pela disparada dos preços de commodities. A China em transição para um modelo de crescimento baseado mais no consumo doméstico do que em investimentos e exportações continuará a demandar as commodities exportadas pelo Brasil - provavelmente mais as agropecuárias que as minerais -, mas crescerá menos e não produzirá o choque externo positivo que nos proporcionou na primeira década do século.
Mesmo com taxas anuais que serão uma fração (minoritária) daquelas observadas há menos de dez anos, o crescimento da China continuará a ser uma estrela de primeira grandeza num mundo marcado pelo baixo crescimento. Este já está contratado para os próximos anos na União Europeia e seria irrealista esperar uma vigorosa recuperação dos EUA no curto prazo.
De seu lado, o vigoroso crescimento dos emergentes esbarrou em limites estruturais e em obstáculos políticos. Nesse processo, percebeu-se que o tal crescimento vigoroso dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) foi um fenômeno principalmente chinês. À exceção da China, o principal desafio dos Brics é a volta ao crescimento sustentado nos próximos anos, o que supõe o enfrentamento de uma agenda de reformas domésticas econômica e politicamente complicada. Difícil imaginar que esses países (exceção feita à China, mais uma vez) venham a dar, nos próximos anos, contribuição muito relevante para o crescimento global.
Não bastassem essas evoluções, as negociações comerciais preferenciais - quase um anátema para a política externa brasileira, quando não se trata de Mercosul e congêneres - voltaram à agenda dos principais atores da economia internacional. A China tece gradualmente sua rede de acordos, principalmente na Ásia e na América do Sul, mas a
principal novidade, aqui, é a negociação dos acordos ditos megarregionais - o TPP, envolvendo os EUA e diversos países da Ásia-Pacífico; e o TTIP, envolvendo EUA e União Europeia.
Como o foco principal dessas negociações são regras e disciplinas aplicáveis a um grande número de temas, há a preocupação - não de todo injustificada, mas certamente exagerada - de que países que não participam das negociações estarão virtualmente excluídos dos grandes mercados do mundo.
Ainda que a conclusão desses acordos possa ser mais difícil do que fazem crer seus patrocinadores, há um forte movimento na direção da convergência de regras comerciais, que moldará crescentemente os fluxos de comércio de bens e serviços. Essa convergência tem motivações econômicas, mas também segue lógica geopolítica, que vem ganhando peso depois da intervenção russa na Ucrânia.
Diante dessas evoluções, o governo brasileiro tem adotado a postura do avestruz e torce para que alguma "força maior" detenha as mudanças em curso no mundo. O Brasil não aproveitou o período de bonança para se preparar para tempos mais difíceis. Ante o novo cenário, o País estará diante da alternativa de (mais uma vez) se proteger de um mundo pouco amigável com políticas de isolamento ou de adotar políticas ativas de revisão e modernização de suas relações econômicas internacionais.

*Pedro da Motta Veiga e Sandra Polónia Rios são diretores do Centro de Estudos de Integração Econômica (CINDES).

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Politica comercial hiperativa - Pedro Motta Veiga, Sandra Rios

Síndrome de hiperatividade infantil?
Hardly...
Parece mais um surto de passadismo incontido, de volta aos anos 1970 de grata memória para os companheiros.
A despeito da ditadura no plano político, eles adoravam aquele estatismo vicejante, rastejante, grimpante, todo aquele stalinismo industrial, todo aquele frenesi de medidas estatais, aparentemente benéficas para o país.
Outros tempos, outros costumes. Parece que já não se fazem mais protecionistas como antigamente.
Paulo Roberto de Almeida
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A política comercial hiperativa de Dilma

PEDRO DA MOTTA VEIGA E SANDRA POLÓNIA RIOS
O Estado de S.Paulo, 09 de fevereiro de 2013
 
O governo Dilma Rousseff chega à metade do seu mandato dando mostras de permanente ativismo na área de política comercial e de política de investimentos e produção. Nosso balanço "de meio de caminho" dessas políticas do governo ressalta cinco características.
A prioridade permanente. A preocupação central dessas políticas foi, em todo o período, o desempenho da indústria. Essa prioridade já havia emergido ao final do governo Lula, mas foi reforçada com Dilma. A estratégia defensiva explicitada pela política de proteção tarifária e não tarifária, o uso das compras do governo como instrumento de política e o ativismo do BNDES no apoio aos investimentos e à produção são manifestações desta clara prioridade.
O diagnóstico mutante. O diagnóstico governamental dos fatores responsáveis pelo fraco desempenho da indústria brasileira evoluiu significativamente. No início, o governo Dilma atribuía ao câmbio a origem dos problemas de competitividade do setor. Desvalorizado o câmbio e não tendo a indústria reagido no plano doméstico, ou nas exportações, o diagnóstico voltou-se para fatores relacionados aos custos de produção da indústria, às deficiências e aos custos de utilização da infraestrutura de transportes e energia, enfim, ao que em outra época se denominava "custo Brasil". A evolução no diagnóstico é muito positiva, mas seus resultados estão muito aquém do desejável, em razão de uma terceira característica da gestão Dilma nesta área de política.
A discriminação como método. Essa terceira característica diz respeito ao fato de que os problemas de competitividade da indústria têm sido atacados por meio de mecanismos e instrumentos cujos traços mais nítidos são o foco setorial e o decorrente caráter discriminatório dos incentivos e da proteção que materializam as políticas. Os exemplos mais notáveis são os incentivos ao setor automotivo e a proteção adicional que beneficiou produtos e setores intermediários, partes e peças e bens de capital, pela elevação da tarifa de importação.
A despreocupação com os custos. A aparente desatenção em relação aos custos das políticas adotadas é a quarta característica do governo Dilma nesta área. As seguidas injeções de recursos do Tesouro no BNDES para que este reduza taxas de juros - em muitos casos já hoje negativas, em termos reais - parecem ser uma sequência de decisões cujos custos para a sociedade seriam irrelevantes. Além disso, políticas de proteção a setores específicos geram custos elevados para setores usuários dos produtos protegidos e comprometem sua competitividade. Tais custos são ignorados pelo governo.
A desimportância do mundo. A quinta característica do governo Dilma nesta área é a irrelevância da dimensão externa das políticas. Aqui, a novidade é o crescente distanciamento do País das regras comerciais da OMC, cujo melhor exemplo é o novo regime automotivo. Menos nova é a irrelevância atribuída às negociações comerciais no menu de políticas do Brasil. Trata-se aí de herança dos governos Lula: esvaziamento das agendas de negociação comercial, como resultado da submissão destas a objetivos e visões políticas que valorizam as relações Sul-Sul (sem por isso gerar nenhum resultado na esfera das negociações comerciais) e evitam tratativas com os países desenvolvidos.
O que veremos nos dois anos restantes do mandato de Dilma, nesta área de política? Provavelmente, mais do mesmo, se tomarmos como base o quadro atual e a ele agregarmos o fato de que o calendário eleitoral atiçará a criatividade dos formuladores de política.
No atacado, assistiremos muito provavelmente ao encurtamento do horizonte temporal que serve de referência à formulação de políticas: a busca de resultados imediatos se sobreporá mais e mais a preocupações com os efeitos e impactos não imediatos - entre os quais os custos - das políticas adotadas. No varejo, esforços adicionais focados em setores específicos e pautados pelo diagnóstico de que a competitividade da indústria depende de avanços na agenda do custo Brasil, mas dificuldades de implementação desta agenda em função dos compromissos e da visão de política do PT e seus aliados.

* DIRETORES DO CENTRO DE ESTUDOS DE INTEGRAÇÃO, DESENVOLVIMENTO (CINDES), PEDRO DA MOTTA VEIGA, SANDRA POLÓNIA RIOS, DIRETORES DO CENTRO DE ESTUDOS DE INTEGRAÇÃO, DESENVOLVIMENTO (CINDES)

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

De volta ao custo Brasil - Sandra Rios, Pedro M Veiga


De volta à agenda do custo Brasil 
Pedro da Motta Veiga e Sandra Polonio Rios *
O Estado de S.Paulo, 25 de agosto de 2012

A estratégia de enfrentamento da crise internacional e da perda de dinamismo da indústria com a mobilização de vasto arsenal de medidas de política industrial e comercial parece ter atingido seus limites. O próprio governo vem sinalizando, nos últimos tempos, para alterações no mix de instrumentos de políticas para lidar com esses desafios.
Com o modelo de crescimento apoiado na expansão - principalmente por meio do crédito - do consumo doméstico, à política industrial e comercial se atribuiu o papel de garantir que os benefícios daquela expansão não fossem capturados pelas importações, mas, sim, pela produção doméstica. Incentivos diversos e subsídios foram concedidos à indústria, ao tempo em que se aumentava, por meio de elevações tarifárias e crescente ativismo na área do antidumping, a proteção à produção doméstica.
A percepção dos limites da estratégia de crescimento baseada na ampliação do consumo ocorreu em paralelo à constatação das fragilidades da visão de política que orientou a ação do governo na esfera industrial e comercial, no período em que a apreciação do real levou a culpa pelas dificuldades da indústria.
De um lado, parece claro que a panóplia de medidas e instrumentos mobilizados pelo governo não fará mais do que eventualmente aliviar a situação de curto prazo de algumas empresas e setores específicos. A regra é um conjunto de medidas adotadas para tentar resolver problemas específicos de diferentes setores, por meio da desoneração de folha de pagamento, estabelecimento de margens de preferências nas compras governamentais, etc.
De outro lado, o espaço fiscal para políticas industriais intensivas em subsídios governamentais é hoje nitidamente mais reduzido do que no passado recente. O baixo nível de crescimento tem afetado negativamente a arrecadação federal nos últimos meses e, além disso, há pressões sobre as contas públicas vindas de outras áreas e setores que concorrem com a demanda por incentivos de política industrial.
Neste cenário, o próprio governo parece estar promovendo um deslocamento da ênfase da agenda industrial. Ao que tudo indica, esta se distanciará dos instrumentos voltados para enfrentar situações consideradas emergenciais ou conjunturais - sem que tais instrumentos sejam desmobilizados, no entanto - e focalizará em temas predominantemente "horizontais", que afetam todos os setores da indústria.
Esse ressurgimento da agenda do "custo Brasil" - atribuído pela imprensa à decisão pessoal da presidente da República - deverá se materializar numa série de medidas relacionadas à redução do custo da energia elétrica, à simplificação da carga tributária e à abertura de novas oportunidades de investimento privado em setores de infraestrutura e logística, por meio de concessões, parcerias público-privadas, etc.
O reconhecimento de que o custo Brasil é um dos principais fatores que afetam a competitividade da indústria brasileira é em si positivo, pois evita o diagnóstico fácil que atribui esse problema a situações conjunturais ou à taxa de câmbio. O problema de competitividade da indústria brasileira é estrutural e é para esta realidade que o resgate da agenda do custo Brasil aponta. 
Porém, o otimismo em relação ao novo foco da política não deve ser exagerado. O tema da carga tributária, presente em diversas declarações da presidente, parece ter sido deixado de lado, pelo menos por enquanto. A redução do custo de energia também não faz parte do primeiro "pacote" de medidas, que está focado em infraestrutura de transportes. Mesmo nessa área, a agenda está sendo "fatiada", começando-se pelo anúncio de medidas em áreas consideradas mais "fáceis", como rodovias e ferrovias.
Não se deve minimizar as dificuldades de toda ordem para abordar a agenda do custo Brasil: há, em todos os temas, resistências fortes dos interesses públicos e privados estabelecidos e não é por acaso que esta agenda - identificada há quase 20 anos - pouco avançou. Ainda assim, o retorno dessa agenda ao centro do debate de políticas públicas é motivo para comemoração.

* DIRETORES DO CENTRO DE ESTUDOS DE INTEGRAÇÃO E DESENVOLVIMENTO (CINDES)