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segunda-feira, 14 de agosto de 2023

Bibliografia seletiva sobre política externa e diplomacia do Brasil - Paulo Roberto de Almeida

Bibliografia seletiva sobre política externa e diplomacia do Brasil

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata e professor

 

Almeida, Paulo Roberto de (2021a). Apogeu e demolição da política externa: itinerários da diplomacia brasileira. Curitiba: Appris.

 ______ (2021b). O Itamaraty Sequestrado: a destruição da diplomacia pelo bolsolavismo, 2018-2021. Brasília: Diplomatizzando; edição Kindle.

______ (2020a). Uma certa ideia do Itamaraty: a reconstrução da política externa e a restauração da diplomacia brasileira. Brasília: Diplomatizzando; disponível em: https://www.academia.edu/44037693/Uma_certa_ideia_do_Itamaraty_A_reconstrucao_da_politica_externa_e_a_restauracao_da_diplomacia_brasileira_2020_; acesso em 16/01/2022.

______ (2020b). O Itamaraty num labirinto de sombras: ensaios de política externa e de diplomacia brasileira. Brasília: Diplomatizzando; edição Kindle. 

______ (2019). Miséria da diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty. Boa Vista: Editora da UFRR; disponível em: https://docs.wixstatic.com/ugd/6e2800_3e88aadf851b4b2ba4b54c6707fd9086.pdf; acesso em 16/01/2022.

______ (2017). Formação da Diplomacia Econômica no Brasil: as relações econômicas internacionais no Império. 3ª ed.; Brasília: Funag, 2 vols.; disponível: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/13-252-formacao_da_diplomacia_economica_do_brasil_volume_i.

______ (2016). “A construção do direito internacional do Brasil a partir dos pareceres dos consultores jurídicos do Itamaraty: do Império à República”, Cadernos de Política Exterior, ano II, n. 4, p. 241-298; disponível:http://funag.gov.br/loja/download/1186-cadernos-de-politica-exterior-ano-2-volume-4.pdf

Amaral, Luis Gurgel do (2008). O Meu Velho Itamarati (De Amanuense a Secretário de Legação) 1905-19132a. ed. revista; Brasília: Funag; 1ª ed.: 1947l disponível: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/1-144-meu_velho_itamarati_de_amanuense_a_secretario_de_legacao_1905_1913_o.

Araújo, Ernesto H. F. (2020). Política externa: soberania, democracia e liberdade: coletânea de discursos, artigos e entrevistas do Ministro das Relações Exteriores. Brasília: Funag; disponível na Biblioteca Digital da Funag.

_______ (2019). A nova política externa brasileira: seleção de discursos, artigos e entrevistas do Ministro das Relações Exteriores. Brasília: Funag; disponível na Biblioteca Digital da Funag.

_______ (2017). Trump e o Ocidente, Cadernos de Política Exterior, Brasília: IPRI, ano III, n. 6, p. 323-353; disponível em: https://funag.gov.br/loja/download/CADERNOS-DO-IPRI-N-6.pdf; acesso: 16/01/2022.

_______ (2008). O Mercosul: negociações extrarregionais. Brasília: Funag.

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_______ (2021b). “O Itamaraty da Rua Larga”, in: Camargo, Leda Lúcia (org.). Os Diplomatas e suas histórias. Rio de Janeiro: Francisco Alves, p. 28-41.

Barreto, Fernando de Mello (2001). Os Sucessores do Barão, 1912-1964; relações exteriores do Brasil. São Paulo: Paz e Terra.

_______ (2012). A política externa após a redemocratização, 2 vols.; tomo I, 1985-2002; tomo II, 2003-2010. Brasília: Funag.

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Caldeira, Jorge (org.) (2002). José Bonifácio de Andrada e Silva. São Paulo: Editora 34.

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Carvalho, José Murilo de (1996). A Construção da Ordem: a elite política imperialTeatro de Sombras: a política imperial. Rio de Janeiro: Rio de Janeiro: Editora da UFRAJ; Relume Dumará.

Castro, Flavio Mendes de Oliveira (2009). Itamaraty: dois séculos de história 1808-2008. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2009, 2 vols.; disponível: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/1-38-itamaraty_dois_seculos_de_historia_da_organizacao_do_itamaraty_1808_2008_volume_1

Cervo, Amado Luiz (2013). Joaquim Tomás do Amaral (Visconde do Cabo Frio): o pensamento gestor. In: Pimentel, J. V. (org.) (2013), Pensamento Diplomático Brasileiro: Formuladores e agentes da política externa (1750-1964).Brasília: Funag, vol. 1, p. 303-329; disponível: http://funag.gov.br/loja/download/pensamento_diplomatico_brasileiro.zip.

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______ (2002). “Apresentação”, O Barão do Rio Branco visto por seus contemporâneos: série de artigos publicados pela Revista Americana, em abril de 1913; Brasília: Funag, Centro de História e Documentação Diplomática, p. 11-13; disponível: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/1-676-barao_do_rio_branco_visto_por_seus_contemporaneos_serie_de_artigos_publicados_pela_revista_americana_em_abril_de_1913.

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Flaubert, Flaubert (1913). Dictionnaire des Idées ReçuesParis : Éditions Conard.

Forster, Maria Theresa Diniz (2011). Oliveira Lima e as Relações Exteriores do Brasil: o legado de um pioneiro e sua relevância atual para a diplomacia brasileira. Brasília: Funag; disponível: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/1-43-oliveira_lima_e_as_relacoes_exteriores_do_brasil_o_legado_de_um_pioneiro_e_sua_relevancia_atual_para_a_diplomacia_brasileira

Friaça, Guilherme José Roeder (2018). Mulheres diplomatas no Itamaraty (1918-2011): uma análise de trajetórias, vitórias e desafios. Brasília: Funag; disponível: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/1-265-mulheres_diplomatas_no_itamaraty_1918_2011_uma_analise_de_trajetorias_vitorias_e_desafios

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Mercadante, Paulo (1965). A Consciência Conservadora no Brasil. Rio de Janeiro: Saga.

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Oliveira Lima, M. (2021). O Descobrimento do Brasil e outros ensaios. São Paulo: Publicações BBM; organização, introdução e notas: André Heráclio do Rêgo.

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Paim, Antonio (2018). História do Liberalismo Brasileiro. 2ª. ed.; São Paulo: LVM. 

Paiva Torres, Miguel Gustavo (2011). O Visconde do Uruguai e sua atuação diplomática para a consolidação da política externa do Império. Brasília: Funag.

Pinheiro, Letícia. (2004). Política externa, 1889-2002. Rio de Janeiro: Zahar.

Pinheiro Machado, Paulo Fernando (2022). Ideias e diplomacia: O Visconde do Uruguai e o nascimento da política externa brasileira– 1849-1853. Lisboa: Lisbon International.

Ricupero, Rubens (2017). A diplomacia na construção do Brasil, 1750-2016. Rio de Janeiro: Versal.

Rio Branco, Barão (2012). Obras. Brasília: Funag, 12 vols.; disponível: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/6-123-obras_do_barao_do_rio_branco_introducao_as_obras_do_barao_do_rio_branco

Romero, Marcos (2019). História da organização administrativa da Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e das Relações Exteriores (1808-1951). Brasília: Funag; disponível: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/1-848-historia_da_organizacao_administrativa_da_secretaria_de_estado_dos_negocios_estrangeiros_e_das_relacoes_exteriores_1808_1951_.

Soares de Souza, José Antonio (2021a). Um diplomata do Império: o Barão da Ponte Ribeiro. Brasília: Funag; disponível: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/1-1160.

_____ (2021b). A vida do Visconde do Uruguai: Paulino José Soares de Souza (1807-1866). Brasília: Funag; disponível: https://funag.gov.br/biblioteca-nova/produto/1-1167.

Temer, M (2018). O Brasil no mundo: abertura e responsabilidade – Escritos de diplomacia presidencial (2016-2018). Brasília: Funag; na Biblioteca Digital da Funag.

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Viana Filho, Luís (1988). A vida do Barão do Rio Branco. 6ª ed.; Rio de Janeiro: José Olympio.

 

Brasília, 6 maio 2022


sábado, 5 de agosto de 2023

O Brasil aos olhos do mundo: como era antes, como ficou agora? - Paulo Roberto de Almeida (revista Crusoé)

Meu artigo mais recente publicado:  

4415. “O Brasil aos olhos do mundo: como era antes, como ficou agora?”, Brasília, 13 junho 2023, 3 p. Artigo sobre a diminuição da credibilidade diplomática do Brasil de Lula 3, para a revista Crusoé. (4/08/2023; link: https://crusoe.uol.com.br/edicoes/275/o-brasil-aos-olhos-do-mundo-como-era-antes-como-ficou-agora/). Relação de Publicados n. 1518. 

O Brasil aos olhos do mundo: como era antes, como ficou agora?

 

 

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Artigo para a revista Crusoé. 

 

Todo país, toda nação, exibe uma imagem aos olhos do mundo, por vezes com base em estereótipos simplistas, mas ainda assim identificados com alguma característica da nação em questão. Marco Polo deixou um testemunho direto da China sob a dominação mongol, com alguns exageros involuntários, o que alimentou a curiosidade dos europeus pelo fabuloso Celeste Império. A riqueza em ouro e prata dos impérios pré-colombianos no México e no Peru atuais atiçou a cobiça dos conquistadores ibéricos, prontamente seguidos por piratas e corsários de outros reinos europeus, saqueando galeões carregados dos preciosos metais. 

O Brasil da era do café e seus barões apreciadores dos cabarés de Paris suscitaram a criação de uma figura cenográfica, o “Brésilien d’operette”, o pródigo ricaço do interior, que acendia charutos com notas de 100 francos e bebia champagne nos sapatos das dançarinas de can-can. A prática era tão comum que deu origem ao termo, momentaneamente inscrito nos dicionários franceses, de paulistade, significando gastar à tripa forra nos cabarés. Mais tarde, na fase da aliança com os Estados Unidos da era Vargas, o típico carioca de Carnaval se transmutou no Zé Carioca do Walt Disney, junto com a cantora Carmen Miranda, acolhida por Hollywood, encantando a todos com seus balangandãs e a coroa de frutas na cabeça.

A imagem do Brasil esteve associada, durante muitas décadas, ao Carnaval e às selvas luxuriantes, mais adiante a Pelé, seguramente o brasileiro mais famoso do mundo, no tempo em que a Bossa Nova se juntou ao jazz para brindar ao mundo inteiro os encantos da praia de Ipanema ao ritmo das músicas de Tom Jobim e na voz suave de Astrud Gilberto. A ditadura militar ofuscou muito desse brilho, com a repressão truculenta na política e na cultura, mais as notícias pouco edificantes de extermínio dos indígenas, de destruição ambiental, de pobres dormindo nas ruas. A inflação astronômica, as crises financeiras e da dívida externa também grudaram na imagem do país durante as décadas seguintes, até praticamente o período recente, quando a corrupção política colocou o país, junto a várias ditaduras, nos primeiros lugares do ranking da Transparência Internacional. 

(...)

Um editorial do Globo, do dia 23 de maio de 2023, resumiu o revés que representou a reunião do G7 para os planos de Lula: “As potências ocidentais que saudaram sua chegada ao poder como um vento benfazejo depois do furacão Jair Bolsonaro já não parecem encará-lo com a mesma deferência. (...) Lula volta de Hiroshima menor do que chegou.” Esta parece ser a imagem que agora passa a marcar o Brasil de Lula no contexto mundial: uma promessa de inclusão no campo das democracias que ficou perdido no pequeno clube dos revisionistas da ordem global liberal. O Brasil já não é o que poderia ter sido...

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4415, 13 junho 2023, 3 p.

segunda-feira, 24 de julho de 2023

“NÃO SOMOS CANDIDATOS À MEDIAÇÃO”, DIZ CHANCELER MAURO VIEIRA SOBRE GUERRA NA UCRÂNIA - CARLOS LINS e EDSON SARDINHA (Congresso em Foco)

 


ENTREVISTA

“NÃO SOMOS CANDIDATOS À MEDIAÇÃO”, DIZ CHANCELER MAURO VIEIRA SOBRE GUERRA NA UCRÂNIA

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, diz que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não se propõe a assumir o papel de mediador na guerra entre Rússia e Ucrânia. Em entrevista ao Congresso em Foco, o chanceler diz que o presidente vem apenas postulando a “necessidade urgente de se falar na paz, e não só na guerra” – e que, segundo ele, esse objetivo vem sendo alcançado.

“NÃO SOMOS CANDIDATOS À MEDIAÇÃO. O QUE TEMOS DITO É QUE ESTAMOS DISPOSTOS A APOIAR QUALQUER ESFORÇO DE PAZ, E QUE A GUERRA NA UCRÂNIA REQUER UM ESFORÇO COLETIVO, DE VÁRIOS PAÍSES. NÃO É TAREFA PARA UM PAÍS SÓ”

O presidente vem recebendo críticas nos últimos meses por não se posicionar de forma mais contundente contra a Rússia e a invasão comandada por Vladimir Putin, que já dura um ano e meio. Em 25 de abril, quando estava em Portugal, Lula já disse que o conflito é uma “violação da integridade territorial” da Ucrânia. Mas também já chegou a falar que, para que a guerra acabe, “cada um vai ter que ceder um pouco”. Em 19 de julho, Lula disse ainda que o presidente do Chile, Gabriel Boric, estaria sendo “sequioso” e “apressado” por cobrar uma postura anti-Rússia dos países da América Latina.

De acordo com o chanceler Mauro Vieira, no entanto, há progresso: “Nosso objetivo, que é esse, de que se fale também de paz, está sendo atingido. Basta ver o recente engajamento dos países africanos, que enviaram delegação de alto nível a Kiev e Moscou para dialogar com as partes. E também outras lideranças globais têm atuado nesse mesmo sentido. […] Eventuais críticas na mídia fazem parte do processo, mas o importante é que já contribuímos para que o debate sobre a paz ocupe também o primeiro plano”.

Vieira ainda não descarta um encontro presencial entre Lula e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. Os dois líderes estiveram na Cúpula do G-7 em Hiroshima, no Japão, mas não chegaram a se reunir. “Não há qualquer ansiedade a respeito”, diz Mauro Vieira. “Os canais estão abertos e estão funcionando, e o encontro pessoal entre os presidentes ocorrerá quando houver uma próxima oportunidade”.

Na entrevista ao Congresso em Foco, Mauro Vieira definiu o atual momento da política externa como uma “volta do Brasil ao mundo”. Segundo ele, a prioridade do Itamaraty no primeiro semestre do governo Lula 3 foi “reconstruir pontes com o mundo”, buscando compensar os danos produzidos pelo isolamento diplomático nos quatro anos de Jair Bolsonaro.

Nessa toada, o presidente Lula vem adotando agenda intensa de viagens. No Brasil, nenhum presidente pós-ditadura militar viajou tanto nos 6 primeiros meses de mandato quanto Lula em seu terceiro mandato. “A demanda desses primeiros meses foi muito grande, porque todos querem conversar com o Brasil e com o presidente Lula”, diz Mauro Vieira. Segundo ele, o presidente realizou reuniões bilaterais com chefes de Estado e de Governo de mais de 40 países nesse período.

Leia abaixo o que o chanceler falou ao Congresso em Foco a respeito de outros assuntos:

  • política externa na gestão Bolsonaro – “Estamos trabalhando para repará-los [os danos], já a partir do processo eleitoral, quando as instituições democráticas brasileiras foram ameaçadas por discursos e orquestrações autoritárias e souberam dar a resposta adequada. O Brasil mostrou que é uma democracia madura e sólida, em um momento turbulento no mundo”;
  • agenda para o segundo semestre de 2023 – “É natural que a confirmação de algumas viagens ocorra mais perto das datas de cada compromisso”. Citou a cúpula dos BRICS em Joanesburgo, na África do Sul (agosto), a cúpula do G20 em Nova Délhi, na Índia (setembro), e a Assembleia-Geral da ONU, em Nova York (setembro), ambas em setembro, além da COP 28 do clima, nos Emirados Árabes Unidos (novembro);
  • Congresso – “Boa parte da sociedade brasileira, e também do Congresso, já está convencida dos prejuízos do isolamento diplomático dos últimos anos […] Desde o início da legislatura, temos contado com o apoio e com a compreensão de ambas as Casas do Congresso Nacional em relação ao nosso esforço de reconstruir pontes”;
  • Venezuela – “Para mim o mais importante foi a retomada das relações diplomáticas entre dois países vizinhos, após um afastamento que durou três anos, determinado pela decisão equivocada do governo anterior de fechar a embaixada e os consulados brasileiros naquele país. […] Isso é a antidiplomacia, com prejuízos evidentes para o Brasil”;
  • governo Maduro e violações à democracia – “Faremos chegar ao governo venezuelano nossas preocupações e críticas por meio de um diálogo diplomático franco, mas que será mantido pelos canais diplomáticos adequados, e não pela mídia ou pelas redes sociais”.

ÍNTEGRA

Leia abaixo a íntegra da entrevista concedida por Mauro Vieira ao Congresso em Foco. As perguntas e as respostas foram enviadas por e-mail.

Congresso em Foco: O presidente Lula tem priorizado a agenda internacional desde a sua posse, depois de quatro longos anos de isolamento internacional do Brasil. Nenhum outro presidente viajou tanto quanto ele nos seis primeiros meses do mandato. O que o governo espera conseguir ainda neste ano com esta agenda de viagens? O que já conseguimos até agora?
Mauro Vieira: Para um país da importância que o Brasil tem na sua região e no mundo, a agenda internacional se impõe entre as prioridades, até porque a política externa e a diplomacia presidencial são ferramentas indispensáveis para a promoção do País e dos seus produtos, para a atração de investimentos e para a defesa de regras internacionais que levem em conta os interesses da sociedade brasileira. Nestes seis primeiros meses, o que o Presidente Lula tem feito é reconhecer essa necessidade, atender a inúmeros convites e atuar para que o Brasil supere o isolamento que marcou o período anterior. Posso sintetizar esse momento novo, de volta do Brasil ao mundo, com uma frase do chanceler de um de nossos principais parceiros na Europa: “Como é bom poder voltar a conversar com o Brasil”, me disse ele, e outros parceiros disseram frases parecidas, na mesma linha, de que o mundo esperava pela volta do Brasil com saudades, para usarmos uma expressão bem nossa.

Com isso, a demanda desses primeiros meses foi muito grande, porque todos querem conversar com o Brasil e com o Presidente Lula. Ao final desse período inicial, o Presidente Lula tem um balanço de reuniões bilaterais com Chefes de Estado e de Governo de mais de 40 países, e em todas elas são discutidos assuntos de interesse do Brasil, seja na atração de investimentos, seja no fortalecimento de laços econômico-comerciais com nossos vizinhos, ou, para ser mais específico, na venda de aviões brasileiros para a China ou na atração de novos parceiros para o Fundo Amazônia, como ocorreu com os Estados Unidos e o Reino Unido, entre outros países. É uma política externa pragmática e que prioriza as necessidades de geração de oportunidades no nosso país, por meio dos laços econômicos e políticos com o mundo.

Já conseguimos sair do isolamento, logramos recuperar o lugar do Brasil como um país que é respeitado e lidera discussões relevantes no mundo, e que defende suas posições a partir do diálogo com a sociedade brasileira e de uma clara noção do interesse nacional em cada questão. O desenvolvimento sustentável e o combate à desigualdade, por meio da geração de oportunidades para todos, estão sempre entre essas questões. 

Há algum dano irreparável que o Brasil tenha sofrido com esse isolamento internacional ao longo dos últimos quatro anos?

Os danos, tanto de imagem quanto na defesa de interesses concretos, foram muito grandes. Estamos trabalhando para repará-los, já a partir do processo eleitoral, quando as instituições democráticas brasileiras foram ameaçadas por discursos e orquestrações autoritárias e souberam dar a resposta adequada. O Brasil mostrou que é uma democracia madura e sólida, em um momento turbulento no mundo, e mais uma vez se credenciou como um ator responsável para a comunidade internacional. A partir da posse do Presidente Lula, a tarefa que ele me delegou foi a de reconstruir pontes com o mundo. A expressão “reconstruir pontes” dá a exata noção dos muitos danos a reparar, e temos trabalhado nesse sentido desde o primeiro dia de gestão.

Quais países o presidente pretende visitar ainda em 2023?

O Presidente tem uma série de convites para visitas bilaterais e para eventos multilaterais no segundo semestre, e temos definido a agenda de viagens em diálogo com o Planalto, e em sintonia com as demandas da agenda doméstica, que são prioritárias para o governo. Com isso, é natural que a confirmação de algumas viagens ocorra mais perto das datas de cada compromisso. Mas, no segundo semestre, entre outros compromissos, o Presidente já participou da cúpula do Mercosul, em Puerto Iguazú, na Argentina, no começo de julho, está participando da cúpula CELAC-União Europeia em Bruxelas, e ainda terá a cúpula dos BRICS em Joanesburgo, na África do Sul, em agosto, a cúpula do G20 em Nova Délhi, na Índia, e a Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, ambas em setembro, além da COP 28 do clima, nos Emirados Árabes Unidos, entre o final de novembro e o início de dezembro.

Na cúpula do Mercosul o Brasil assumiu a Presidência pro tempore do bloco, e o Brasil também assumirá a Presidência do G20 no ano que vem, o que torna indispensável a presença no encontro em Nova Délhi. Além disso, na COP 28 do Clima será oficializada a escolha de Belém (PA) para sediar a COP 30, em 2025. Belém também sediará outro importante evento de política externa do segundo semestre, a cúpula da Amazônia, que reunirá os presidentes dos oito países membros da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) e mais alguns convidados, em agosto, com o objetivo de debater soluções e articular políticas para enfrentar os desafios do desenvolvimento sustentável na região.

Uma das questões colocadas como prioridade pelo presidente da República na política externa é o meio ambiente. O Brasil não envia sinais contraditórios ao mundo quando uma das Casas do Congresso aprova medidas como o marco temporal para as terras indígenas ou diminui as atribuições do Ministério do Meio Ambiente, como já foi feito?

Não vejo contradição aí, vejo apenas os Três Poderes da República desempenhando suas funções, e o Executivo também já reagiu a algumas dessas decisões, no âmbito das suas competências constitucionais. É assim que uma democracia funciona. O compromisso do governo do Presidente Lula com o desenvolvimento sustentável, já demonstrado plenamente nas duas gestões anteriores dele, voltou a ser demonstrado a partir do primeiro dia de gestão. Foram tomadas medidas duras de combate à criminalidade ambiental, como foi o caso do garimpo ilegal no território ianomâmi, por exemplo, entre tantas outras políticas em favor da sustentabilidade. Como consequência imediata, dados do INPE mostram que houve uma redução de 33,6% no desmatamento na Amazônia no primeiro semestre, na comparação com o mesmo período de 2022.

Nesse contexto, quais são as ambições do Brasil com a realização da COP 30, em 2025, em Belém?

Não se trata de ambição, e sim de reassumir um papel de liderança que o Brasil tradicionalmente ocupou no debate global sobre o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável, agora somado ao desafio da mudança climática, que ameaça a todos. E esse papel significa dar voz às preocupações dos países em desenvolvimento e às populações de regiões como a Amazônia. O Presidente Lula tem sido muito claro no sentido de cobrar dos países desenvolvidos o cumprimento de reiteradas promessas de apoio financeiro a projetos de desenvolvimento sustentável, promessas que não têm se materializado. E é preciso que elas se materializem, com urgência. O Brasil tem credenciais, tem credibilidade para fazer essas cobranças, e por isso é importante que reassuma seu papel no debate global sobre grandes desafios como o da mudança climática, e não só na COP. Já a partir da Presidência brasileira do G20, no ano que vem, esse assunto será uma das prioridades do período em que estaremos à frente do grupo. Muito tempo já foi perdido com promessas não cumpridas e, mais recentemente, com um negacionismo em relação à ameaça da mudança climática que é típico da era da desinformação em que vivemos.

Realisticamente, que tipo de suporte se pode esperar da atual composição do Congresso Nacional à política externa do governo Lula? O número alto de parlamentares mais à direita representa um obstáculo?

Pessoalmente, creio que boa parte da sociedade brasileira, e também do Congresso, já está convencida dos prejuízos do isolamento diplomático dos últimos anos, quando em muitos momentos se abdicou de fazer diplomacia por simples sectarismo ideológico. Diplomacia se faz por meio do diálogo com todos, e em especial com aqueles com os quais não concordamos, dessa forma se superam as dificuldades.

Essa tem sido a linha condutora da política externa brasileira ao longo de décadas, em governos de diferentes orientações ideológicas, e é essa a linha que estamos retomando, a da diplomacia, do diálogo, da busca do entendimento. E, desde o início da legislatura, temos contado com o apoio e com a compreensão de ambas as Casas do Congresso Nacional em relação ao nosso esforço de reconstruir pontes com o mundo e de retomar os princípios e linhas de ação tradicionais do País na política externa, com o pragmatismo e a responsabilidade que sempre nos caracterizaram no cenário mundial.

Eu mesmo já participei de audiências públicas tanto na Câmara como no Senado, e em ambas contei com uma ampla compreensão dos parlamentares a respeito da necessidade de retomada das linhas tradicionais de política externa brasileira.

Em relação aos Estados Unidos: é comum que se faça uma analogia entre o ataque ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021, de inclinação pró-Trump, com os atos golpistas de caráter bolsonarista na Esplanada dos Ministérios em 8 de janeiro de 2023. O Itamaraty considera que a pré-candidatura de Donald Trump a presidente representa algum risco à democracia, seja nos Estados Unidos ou em uma escala maior?

Tanto as instituições democráticas norte-americanas quanto as brasileiras, que enfrentaram desafios muito semelhantes, demonstraram estar à altura desses desafios. Somos duas democracias sólidas, devemos estar atentos a eventuais ameaças, mas não vejo razão para temores quanto ao futuro.

Em relação à guerra entre Rússia e Ucrânia, o presidente Lula tem postulado o papel de mediador no conflito. Ele sofreu algumas críticas por declarações a respeito da posição da Ucrânia no conflito. Que grau de protagonismo o presidente brasileiro pode ter nessa negociação? 

O que o Presidente Lula tem postulado é a necessidade urgente de se falar na paz, e não só na guerra. Não somos candidatos à mediação, o que temos dito é que estamos dispostos a apoiar qualquer esforço de paz, e que a guerra na Ucrânia requer um esforço coletivo, de vários países. Não é tarefa para um país só.

Nosso objetivo, que é esse, de que se fale também de paz, está sendo atingido, basta ver o recente engajamento dos países africanos, que enviaram delegação de alto nível a Kiev e Moscou para dialogar com as partes. E também outras lideranças globais têm atuado nesse mesmo sentido, recentemente no Vaticano o Papa Francisco e o Presidente Lula também falaram sobre os esforços de paz. Desde a posse, já mantive reuniões de trabalho com quase 60 chanceleres, e em todas as conversas nas quais a guerra na Ucrânia foi mencionada, o papel do Brasil e do Presidente Lula foi bem recebido, mesmo pelos países em conflito e pelos seus principais aliados. Eventuais críticas na mídia fazem parte do processo, mas o importante é que já contribuímos para que o debate sobre a paz ocupe também o primeiro plano.

A evolução desse processo depende fundamentalmente dos países envolvidos, e da sua disposição em negociar, mas o avanço recente fez com que o debate global não esteja mais exclusivamente focado no conflito. Ele já contempla posições como a do Brasil, e agora também dos países africanos, e isso é um avanço.

Encontrar-se com Volodymyr Zelensky é uma prioridade para o presidente Lula?

Como sabemos, não foi possível o encontro entre os dois líderes à margem da cúpula do G7, em Hiroshima, no Japão, mas não há qualquer ansiedade a respeito. O Presidente Lula já manteve contatos telefônicos tanto com o Presidente Zelensky como com o Presidente Putin, o Embaixador Celso Amorim esteve em Moscou e em Kiev, como enviado especial, e avistou-se também com ambos os líderes, e eu também já me encontrei com o chanceler ucraniano Kuleba e com o chanceler russo Lavrov. Os canais estão abertos e estão funcionando, e o encontro pessoal entre os Presidentes ocorrerá quando houver uma próxima oportunidade.

A indústria brasileira tem perdido terreno na América do Sul para a China. Que medidas comerciais concretas o governo Lula pretende adotar para recuperar esse espaço no subcontinente?

Um dos grandes avanços em matéria de política externa nesse início de gestão foi a reunião de Presidentes da América do Sul. Um encontro presidencial na América do Sul não ocorria havia nove anos, e ocorreu no final de maio, em Brasília, por iniciativa do Presidente Lula, com a presença de 11 Chefes de Estado e um Chefe de Governo, ou seja, todos os países sul-americanos estiveram representados no mais alto nível. Depois de nove anos de canais bloqueados para o diálogo. Esse é um dado significativo dos prejuízos do isolamento, que começamos a reverter. Os chanceleres da reunião reuniram-se em Bruxelas à margem da reunião CELAC-UE, desta semana, para dar seguimento à retomada do diálogo, e voltarão a reunir-se em setembro em Nova York, à margem da Assembleia Geral da ONU. A integração latino-americana é um mandamento constitucional, em democracia nossos países protagonizaram uma aproximação inédita, e construíram um patrimônio de laços econômicos que precisa ser aprofundado. A reunião presidencial é o primeiro passo nessa retomada, que tem impacto direto e positivo em matéria de integração e das oportunidades econômicas que ela é capaz de gerar. 

Presidentes de esquerda de países da América do Sul criticaram o presidente Lula pelas declarações dele, no encontro em Brasília, de que há uma narrativa contra o governo de Nicolás Maduro na Venezuela. O governo brasileiro reafirma que a miséria e as violações de direitos humanos, apesar de reconhecidas por organismos internacionais, são uma narrativa?

Meu papel é o de Ministro das Relações Exteriores do Brasil, e não de comentarista das notícias da atualidade, por isso procuro ser bastante claro em questões complexas do contexto regional. E insisto no fato de que o grande avanço do semestre na região foi a realização da reunião dos presidentes sul-americanos, após nove anos de silêncio e de falta de diálogo. Para mim, é natural que divergências surjam, e é saudável que seja assim, não se convocou o encontro para que houvesse uma troca de elogios. No que diz respeito à situação na Venezuela e à relação bilateral, para mim o mais importante foi a retomada das relações diplomáticas entre dois países vizinhos, após um afastamento que durou três anos, determinado pela decisão equivocada do governo anterior de fechar a embaixada e os consulados brasileiros naquele país. O primeiro resultado foi o de que cerca de 20 mil brasileiros que vivem na Venezuela não tiveram, durante três anos, qualquer assistência do governo brasileiro. Se algum deles precisasse de algum documento oficial, só o obteria viajando à Colômbia ou voltando ao Brasil. Um governo não pode deixar seus nacionais sem qualquer apoio do Estado durante três anos. Mas foi justamente isso o que ocorreu na Venezuela. Além disso, o fechamento dos canais de diálogo afetou duramente o comércio, com impacto negativo para a região Norte do Brasil, e privou a população de Roraima do acesso à energia mais barata da usina hidrelétrica venezuelana de Guri. 

Isso é a antidiplomacia, com prejuízos evidentes para o Brasil. O Itamaraty sempre soube fazer diplomacia, e voltou a praticá-la. É bom lembrar também que, mesmo com as relações virtualmente rompidas, durante a pandemia foi o oxigênio doado pela Venezuela que salvou centenas de vidas em Manaus, em um momento no qual a escassez de oxigênio gerou uma séria crise na capital amazonense.

O governo brasileiro, que já condenou publicamente o embargo econômico à Venezuela, pretende repudiar as violações à democracia atribuídas ao governo Maduro?

O Brasil tem como tradição, sempre que chamado, atuar na construção de consensos em momentos de dificuldades em países amigos. Também com a Venezuela tem sido assim, em especial desde 2013. O Brasil tem estado à disposição para apoiar e, quando convidado, mediar o diálogo entre os atores políticos venezuelanos. Naquele momento isso ocorreu com o engajamento também da UNASUL. Vários dos esforços diplomáticos desde então produziram resultados positivos, enquanto o rompimento do diálogo não trouxe qualquer benefício ao longo dos últimos anos. Em 2019, ao decidir reconhecer como presidente “autoproclamado” o deputado Juan Guaidó, eleito em 2015 com pouco menos de 100 mil votos, na prática o governo anterior inviabilizou qualquer possibilidade de atuação efetiva da diplomacia brasileira para a superação da crise política na Venezuela.

A história recente demonstra claramente que o Brasil cometeu um grande equívoco.

Não repetiremos esse equívoco, e faremos chegar ao governo venezuelano nossas preocupações e críticas por meio de um diálogo diplomático franco, mas que será mantido pelos canais diplomáticos adequados, e não pela mídia ou pelas redes sociais. Os interesses do Brasil e da integração regional exigem de nós profissionalismo em uma relação que é estratégica para nós e também para a colaboração fronteiriça na Amazônia.

As previsões para a economia mundial são de baixo crescimento para 2023, mas vêm melhorando em comparação ao início do ano. De um modo geral, que oportunidades isso representa para o Brasil?

Economia não é minha especialidade, mas nos contatos que venho mantendo desde janeiro, percebo que o cenário global oferece boas perspectivas para a economia brasileira, tanto para o nosso setor exportador quanto para aqueles que investem em novas fronteiras tecnológicas, como a da transição energética. Há uma profunda transformação em curso no mundo, e é preciso que estejamos prontos para aproveitar as oportunidades que ela já está oferecendo. Em matéria de transição energética, por exemplo, nossas possibilidades são muito promissoras, desde que consigamos gerar, na política e na sociedade, os consensos necessários quanto aos rumos a seguir. Tenho a confiança de que não deixaremos passar essa oportunidade.



segunda-feira, 12 de junho de 2023

POLÍTICA EXTERNA: A diplomacia ‘repentista’ de Lula - José Eduardo Faria (Jota)

POLÍTICA EXTERNA

A diplomacia ‘repentista’ de Lula

Com a cabeça nos tempos da Guerra Fria, presidente tornou assertiva sua posição à esquerda na economia e na geopolítica

José Eduardo Faria
Jota, 11/06/2023

 

diplomacia de Lula
Lula recebe presidentes sul-americanos em Brasília. Crédito: Ricardo Stuckert/PR

Para um presidente da República inteligente mas pouco instruído que optou por priorizar a política externa, deixando a política interna para seus ministros, os primeiros cinco meses de mandato estão corroendo rapidamente sua autoridade e credibilidade. Com a cabeça nos tempos da polarização da Guerra Fria, Lula tornou assertiva sua posição à esquerda quer na economia quer na geopolítica.  

Na economia, por exemplo, criticou a hegemonia do dólar no comércio mundial, na viagem à China. Também defendeu a criação de uma moeda alternativa ao fim de seu encontro em Brasília com 11 presidentes de países sul-americanos em maio. “Por que hoje um país precisa correr atrás de dólar para exportar, quando ele poderia exportar em sua própria moeda, e os bancos centrais certamente poderiam cuidar disso”, indagou Lula na ocasião, não escondendo a pretensão de ser porta-voz dos interesses da região. 

No plano político, surpreendeu ao afirmar nos Emirados Árabes Unidos que o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, é tão culpado quanto o presidente russo, Vladimir Putin, pela invasão da Ucrânia pela Rússia. E, depois de dizer que “a construção da guerra foi mais fácil do que será a saída da guerra, porque a decisão da guerra foi tomada por dois países”, defendeu a criação de uma espécie de G20 político com o objetivo de restabelecer a paz naquela região. 

Além disso, durante o encontro com os líderes sul-americanos, também surpreendeu ao conceder ao presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, uma reunião fora da agenda oficial. Na ocasião, afirmou que esse país – classificado pelos relatórios da OEA como “um regime autocrático e sem garantias de liberdades fundamentais” – estaria sendo alvo de “narrativas, em referência às afirmações de que é uma ditadura”. E criticou Washington por desclassificar a legitimidade de Maduro e impor sanções contra seu regime. No dia seguinte, o presidente do Uruguai, um conservador, e do Chile, um esquerdista, protestaram. Não se pode tapar o sol com a peneira, violação de direitos humanos não é narrativa, alegaram. 

Muitas foram as críticas sobre os equívocos e bobagens que Lula vem cometendo e falando em matéria de política externa. Uma das mais felizes foi a do diplomata brasileiro Marcos Azambuja, ex-embaixador na França e na Argentina e ex-secretário-geral do Itamaraty. Em entrevista ao jornal Valor Econômico, ele lembrou, no plano formal, que diplomacia é feita com “palavras medidas milimetricamente, com precisão conceitual e rigor semântico”. E também disse que Lula vem primando pela desatenção à linguagem e pela imprecisão conceitual. “Não pode improvisar linguagem em temas de terreno minado”, como os de política externa. No plano substantivo, Azambuja enfatizou que a falta de “disciplina das ideias” do presidente está levando o Brasil a ter uma política externa “espontânea e improvisada”, o que tende a reduzir a estatura internacional do país. 

Como as críticas foram respeitosas e procedentes, e Lula ainda tem três anos e meio de mandato, o mais sensato é que ele as ouça enquanto é tempo. Sem ser pretensioso nem professoral, eu sugeriria a ele que aproveitasse uma manhã de sábado e se concentrasse por pelo menos meia hora na leitura de um discurso pronunciado na tribuna da Câmara em 26 de agosto de 1959 por um deputado que mais tarde seria ministro das Relações Exteriores e da Fazenda. Trata-se de San Tiago Dantas, e sua fala disse respeito a uma reunião de chanceleres sul-americanos da qual participou. Ocorrida no Chile, ela foi convocada para discutir uma política externa dos países da América do Sul capaz de defender a democracia em plena Guerra Fria.

A base do documento aprovado foi a proposta brasileira, apresentada pelo então titular do Itamaraty, ministro Horácio Lafer. A proposta enfatizava a importância do império da lei, da independência dos Poderes e do controle da legalidade dos atos de governo. Defendia eleições livres e classificava como antidemocrática a perpetuação dos governantes no poder. Enfatizava a importância dos direitos individuais, do direito de manifestação do pensamento e da liberdade de imprensa.

O argumento básico do documento era que apenas com base nesses princípios os governos sul-americanos conseguiriam adotar políticas capazes de promover o desenvolvimento econômico, reduzir desigualdades sociais e assegurar a independência dos povos. “Se o florescimento da democracia na comunidade regional depende do desenvolvimento econômico e se este por sua vez depende da cooperação internacional, é claro que entre esta e o fortalecimento da democracia há uma relação de causalidade indisfarçável, à qual cumpre dar adequada expressão jurídica”, concluiu San Tiago, um nome até hoje respeitado por suas posições avançadas em seu tempo, ao justificar e defender a posição  brasileira. 

Publicado em 1983 pela Câmara na série Perfis Parlamentares, um livro com 695 páginas, esse discurso tem 16 páginas. Mas, se concentrar atenção somente nas páginas 281, 282 e 283, Lula poderá seguir, para seu próprio sucesso político e em benefício do país, o conselho de Azambuja: “Na defesa de valores e de interesses os países precisam usar da sobriedade nas palavras e na moderação no tom; com valores, interesses, sobriedade e moderação costuma-se errar menos”, disse ele, após propor ao presidente que não se comporte mais como um repentista – o cantor nordestino que responde com naturalidade o verso que virá enquanto ainda está cantando o verso anterior. “Na diplomacia, esse é um exercício perigoso”, concluiu.