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sexta-feira, 12 de julho de 2019

Acordo Mercosul-EU: derrota para os antiglobalistas - Eliane Oliveira

Antiglobalistas do governo Bolsonaro sofreram derrota no acordo UE-Mercosul, apontam diplomatas


Ao assinar tratado, negociadores foram obrigados a aceitar cláusulas sobre direitos humanos, meio ambiente e leis trabalhistas que já haviam sido incluídas no tratado durante governo Temer.

Eliane Oliveira
O Globo, 11/07/2019

BRASÍLIA - O acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia, anunciado há quase duas semanas, em Bruxelas, na Bélgica, trouxe a seguinte lição para a ala mais conservadora do governo: os tratados comerciais do século XXI incluem questões que vão além do comércio, como meio ambiente, direitos humanos e leis trabalhistas. Na avaliação de fontes da área diplomática, ao aceitar essas precondições para que o documento fosse finalmente assinado após duas décadas de negociações, o Brasil se rendeu ao globalismo tão combatido pela equipe do presidente Jair Bolsonaro . Esses temas já haviam sido negociados na gestão do ex-presidente Michel Temer e tiveram de ser mantidos.

A expressão globalismo é usada pelos movimentos de direita para se referir a instituições internacionais, como a própria ONU, que acusam de interferir na soberania dos países e tentar apagar as tradições nacionais. O governo atual mantém uma faceta " antiglobalista " ao rejeitar conceitos já consolidados em fóruns multilaterais em temas como aborto, mudança climática e gênero. Não há, contudo, resistência à globalização , que eles próprios enxergam apenas em seus aspectos econômico-comerciais.

Na avaliação de uma importante fonte do governo, a ala antiglobalista sofreu uma derrota, "por ter de concordar com tudo o que diz que é contra". Essa contradição, destacou essa fonte, vai ocorrer também na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o chamado "clube dos países ricos", no qual o Brasil é candidato a uma vaga. Tanto União Europeia quanto a OCDE e outros organismos adotam padrões e valores universais que não são "genuinamente nacionais".

Para o cientista político e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV)  Guilherme Casarões, há uma tentativa sistemática da "ala olavista" do governo —  os adeptos do ideólogo de direita Olavo de Carvalho —  em distinguir globalização de globalismo. Globalização teria a ver com os fluxos econômicos, geralmente pouco ou não regulados, enquanto o globalismo diria respeito à tentativa, eminentemente política, de se criar uma burocracia global que opere nos países como uma espécie de governo mundial, impondo padrões culturais e regulatórios que supostamente atentam contra a soberania nacional.

 —  Ao assinar o acordo Mercosul-UE , dirão os antiglobalistas que o que o Brasil fez foi ampliar nossa inserção dentro dos fluxos de globalização e nada mais. A contradição na fala deles é que a UE é frequentemente usada como exemplo dos malefícios do globalismo político. O próprio chanceler Ernesto Araújo, no famigerado texto "Trump e o Ocidente", publicado em 2017, refere-se à Europa como um "espaço culturalmente vazio regido por valores abstratos"  —  disse Casarões.

Na versão divulgada pelo Itamaraty, o acordo reforça o compromisso brasileiro em áreas como meio ambiente e desenvolvimento sustentável, "inclusive o Acordo de Paris e a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, com previsão de aportes dos países desenvolvidos para mitigação e adaptação, tendo em conta as necessidades dos países em desenvolvimento". Já o texto divulgado pelos europeus destaca a premissa de que o aumento do comércio não deve ocorrer às custas do meio ambiente ou das condições de trabalho. A UE cita explicitamente o trabalho infantil.

 —  O Brasil cedeu, ao assinar um acordo dentro das regras do sistema multilateral de comércio, com cláusulas ambientais e sociais. Se o país quer entrar para o Primeiro Mundo, precisa seguir as normas dos países desenvolvidos  —  afirmou Nelson Franco Jobim, professor da pós-graduação em relações internacionais das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha).

Franco Jobim acredita que este é "um dos aspectos positivos" do acordo, mas ressalta:

 — Vai contra o antiglobalismo do núcleo mais ideológico do governo. É uma vitória da globalização, do sistema multilateral de comércio e da ala mais pragmática do governo, que está empenhada numa abertura comercial para aumentar a competitividade da economia brasileira  —  completou.

Políticas não mudam, diz especialista
Carolina Pavese, especialista em União Europeia da PUC de Poços de Caldas (MG), não acredita que ter endossado um acordo com cláusulas sociais e ambientais vá levar o governo Bolsonaro a necessariamente mudar de posição nessas áreas. Segundo ela, esse tipo de exigência faz parte dos acordos assinados pela UE com outros parceiros internacionais, e é encarado como uma formalidade.

 —  Claro, com o atual governo certas agendas devem perder um pouco de fôlego, refletindo a orientação de política externa que se faz presente, mas a cooperação e a menção a certos temas é uma característica já presente na estrutura das relações Brasil-UE desde muito tempo. Seria difícil encrencar agora e arriscar perder tudo, insistindo em retirar essas cláusulas. Elas não têm poder vinculante no direito internacional. São apenas uma declaração de intenções, se assim o Brasil quiser  — disse ela.

Mercosul-UE: tratado nao vigora antes de dois anos - Ferran Bono (El Pais)

El tratado de la UE con Mercosur no entrará en vigor antes de dos años
El presidente valenciano, Ximo Puig, se reúne en Bruselas con la comisaria de Comercio, Cecilia Malmström, por el temor del sector citrícola a los productos argentinos y brasileños
Ferran Bono
El País, Madri – 12.7.2019

Bruselas - El tratado entre la Unión Europea (UE) y los países de Mercosur (Argentina, Brasil, Uruguay y Paraguay), anunciado el pasado 29 de junio, no entrará en vigor antes de dos años, según los cálculos que ha transmitido jueves la comisaria de Comercio, la sueca Cecilia Malmström, a la delegación valenciana, encabezada por el presidente de la Generalitat, Ximo Puig. "El tratado se aprobará dentro de un año por la comisión y posteriormente por el parlamento europeo. De modo que la aprobación definitiva no será antes de dos años como mínimo", ha manifestado Puig tras la reunión mantenida en la sede de la Comisión Europea en Bruselas. El presidente valenciano había solicitado la reunión para transmitir a la comisaria el temor del sector citrícola por los perjuicios para el mercado español que pueda ocasionar la llegada sin aranceles a Europa de los productos de Brasil y Argentina. 
El mayor acuerdo comercial logrado jamás por los Veintiocho, que dará acceso a un mercado de 260 millones de consumidores, entrará en vigor una vez lo apruebe tanto el parlamento europeo, previsiblemente en 2021, como el parlamento de Mercosur. Pero solo la parte comercial, la principal del acuerdo, porque la asociación política y la cooperación, que integran también el tratado, también debe ser refrendada por los parlamentos nacionales, por lo que su puesta en marcha aún se postergará más. El tratado llevaba 20 años negociándose entre las partes.
El proceso es lento y garantista, como en todos los acuerdos de este tipo. La próxima semana se dará a conocer el contenido del tratado de 1.500 páginas en su versión en inglés. Entonces verán la luz las medidas concretas, se bajará a los detalles como la reducción de los aranceles, a qué productos afectan o el calendario. Luego, el acuerdo debe pasar una revisión jurídica del texto. Después debe ser traducido a las 24 lenguas de la Unión Europea y la comisión debe aprobarlo y autorizar su remisión al parlamento. Una vez en al cámara, debe ser estudiada en la Comisión de Comercio Internacional y también en la de Asuntos Exteriores. También debe emitir un informe la Comisión de Medio Ambiente y finalmente, el texto llegará al pleno del parlamento para su aprobación y entrará en vigor. Posteriormente, se remitirá a los parlamentos nacionales para que den el visto bueno al acuerdo de asociación política y de cooperación.    
En este intervalo de dos años, el presidente valenciano ha solicitado organizar una conferencia sectorial en el seno de la Comisión Europea, con todos los departamentos afectados, para tratar el problema de los cítricos y de la agricultura en Europa. "Es un problema que no afecta solo a la Comunidad Valenciana y hay que encontrar soluciones integrales. Porque no solo está Mercosur, también el veto ruso, la naranja sudafricana y sobre todo Egipto. Pedimos una acción directa porque puede hacer mucha competencia desleal. Hemos mostrado nuestra preocupación porque en el puerto de Rotterdam no hay suficiente vigilancia. Y debemos asegurar para el ciudadano europeo las mismas garantías fitosanitarias". Ahora bien, Puig ha pedido también al sector que sea proactivo y promueva campañas, entre otras medidas modernizadoras. 

La industria, beneficiada

El sector de la naranja valenciana, que mueve en torno a 2.200 millones de euros al año, ha sido el más crítico, junto al ganadero francés, con las posibles repercusiones negativas del acuerdo con Mercosur. El sector industrial, por el contrario, es el que sale más beneficiado con la reducción de los aranceles, especialmente, el automóvil, el textil, el cerámico o el calzado. Por ejemplo, en la actualidad, los aranceles para el calzado español en los países de Mercosur se elevan al 43%, los de la industria cerámica al 35% y los del textil, al 37%. Con la entrada en funcionamiento del acuerdo, la tasa se reducirá hasta su desmentelamiento en algún caso, y en otros se reducirán notablemente, tras un periodo transitorio. Faltan por concretar los plazos y los detalles negociados para cada sector y para cada producto.     
Puig ha descatado el carácter dialogante de la comisaria, que ha sido pieza clave en la negociación de un acuerdo que llevaba buscándose desde 1995. Su mandado concluye el próximo mes de noviembre. 
Una de las posibles medidas para controlar y compensar la entrada de las mercancías de dos de los principales productores de naranjas del mundo, Argentina (en fruta fresca) y Brasil (en zumo) es articular una cláusula de salvaguarda que entré en funcionamiento ante la amenaza y no posteriormente, cuando el producto ya ha invadido los mercados. Además, hay previsto un fondo de compensación de unos 1.000 millones de euros.

quinta-feira, 11 de julho de 2019

Acordo Mercosul-União Europeia: sintese e documento integral

Acuerdo de Asociación MERCOSUR-UNIÓN EUROPEA: Síntesis del Acuerdo - Textos del Acuerdo

Informes - MERCOSUR – Unión Europea
2 de Julio, 2019
Finalizadas las negociaciones entre el MERCOSUR y la Unión Europea, el Ministerio de Relaciones Exteriores adjunta:
-Síntesis del Acuerdo de Asociación MERCOSUR–Unión Europea, y
-Textos del Acuerdo “en principio” MERCOSUR-Unión Europea.

Síntesis del Acuerdo
Continuando con la política de transparencia y difusión de los resultados de las recientemente finalizadas negociaciones entre el MERCOSUR y la Unión Europea, el Ministerio de Relaciones Exteriores adjunta la Síntesis del Acuerdo de Asociación MERCOSUR – Unión Europea.
El documento sintetiza los resultados del capítulo comercial del Acuerdo de Asociación entre el MERCOSUR y la Unión Europea, al momento de la conclusión de las negociaciones el pasado 28 de junio de 2019. El presente resumen no constituye un documento legal.


Logos de Mercosur y Uniòn Europea
.Textos del Acuerdo MERCOSUR – UNIÓN EUROPEA
Disclaimer
En atención al creciente interés público en las negociaciones recientemente concluidas entre el MERCOSUR y la Unión Europea, el Ministerio de Relaciones Exteriores, a fin de garantizar el efectivo ejercicio del derecho de acceso a la información pública y la transparencia de la gestión pública, da a conocer  los textos del Acuerdo “en principio” MERCOSUR- UE  anunciado en Bruselas el pasado 28 de junio de 2019.
No obstante se deja constancia que estos textos se publican sólo con fines informativos y pueden sufrir modificaciones adicionales como resultado del proceso de revisión legal de los mismos, sin perjuicio de no alterar los compromisos en las concesiones alcanzados en el acuerdo anunciado entre el MERCOSUR y la UE.
Los textos solo serán definitivos una vez firmado el Acuerdo. El acuerdo será obligatorio para las Partes en virtud del derecho internacional solo después de que cada una de ellas complete los procedimientos legales internos necesarios para la entrada en vigor del Acuerdo (o su aplicación provisional).
Textos del acuerdo: el orden final de los Capítulos y textos podrá ser alterada como producto de la revisión legal e institucional del Acuerdo citado. 
             01 - Comercio de Bienes 
  • Cronograma de eliminación de aranceles
                 -  Cronograma de eliminación de aranceles de la Unión Europea
                 -  Cronograma de eliminación de aranceles del MERCOSUR 
  • Derechos de Exportación del MERCOSUR
  • Empresas Comercializadoras del Estado
02 - Reglas de Origen
03 - Defensa Comercial 
04 - Medidas Sanitarias y Fitosanitarias 
05 - Obstáculos Técnicos al Comercio 
06 - Facilitación del Comercio 
07 - Servicios y Establecimiento 
08 - Compras Gubernamentales 
09 - Propiedad Intelectual 
  • Propiedad Intelectual
  • Lista de Indicaciones Geográficas del MERCOSUR
  • Lista de Indicaciones Geográficas de la Unión Europea 
11 - Subsidios
  • Side letter 
17 - Solución de Diferencias 
Ambas Partes han acordado la publicidad simultánea de los textos acordados. Los textos faltantes serán publicados en la medida en que sean confirmados por las Partes. 

domingo, 7 de julho de 2019

Acordo MSul-UE: a visao do negociador principal - Caio Junqueira (Crusoe)

Hora do dever de casa

Marcos Troyjo, o secretário do Ministério da Economia encarregado de negociar o acordo comercial com a União Europeia, diz que o Brasil precisa aprovar as reformas para tirar o melhor proveito possível da parceria

Adriano Machado/Crusoe"O primeiro grande acordo comercial que o Brasil tem de fazer depois desse com a União Europeia é com ele mesmo"05.07.19
Quando o secretário especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia, Marco Troyjo, embarcou na semana passada para Bruxelas, na Bélgica, mesmo quem acompanha de perto o dia a dia da pasta não acreditava que ele poderia voltar de lá com um troféu importante. Com a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, o chanceler Ernesto Araújo e representantes de países que integram o Mercosul, Troyjo sentou-se à mesa com comissários da União Europeia para tentar arrematar uma conversa iniciada havia duas décadas. Deu certo. O acordo comercial entre o Mercosul e o bloco de países europeus foi anunciado na tarde da última sexta-feira, 28, ao cabo de três dias de reuniões.
Basicamente, o acerto zera tarifas e prevê a liberalização do comércio de serviços dos dois lados. A expectativa é de que, a partir do que ficou definido no texto, que ainda precisará ser aprovado pelo Parlamento Europeu, pelos parlamentos de cada país da UE e pelos congressos dos quatro países do Mercosul, só o PIB brasileiro tenha um aumento de 500 bilhões de reais em dez anos. Economista, cientista político e diplomata, Troyjo observa que, para que os resultados apareçam, e os reflexos na economia brasileira sejam os melhores possíveis, é preciso que o país faça o seu dever de casa, a começar pela aprovação da reforma da Previdência e da reforma tributária. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Por que o Mercosul demorou tanto tempo para fechar um acordo comercial com a União Europeia?
Apesar da negociação ter começado 20 anos atrás, é um erro dizer que ela durou 20 anos. Houve vários períodos em que nada avançou. E agora avançou.
Por quê?
Primeiro, vamos ao ambiente externo. O que estávamos fazendo no Brasil em termos de comércio exterior? Vendendo mais para a China. Só que vieram as crises de 2008 e 2011 e houve uma desaceleração do crescimento chinês. Além disso, outros fornecedores começaram a entrar pesado no mercado mundial. Começou, então, a haver mais competição e voltou a conversa aqui de que precisávamos diversificar nosso mercado. Ocorreu, então, mais um fenômeno: o Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia). Muitos avaliaram que geraria um efeito dominó por toda a Europa. Outros, o contrário: que haveria mais coesão no bloco europeu, o que, aparentemente, aconteceu. A União Europeia, para mostrar que estava viva após o Brexit, voltou à mesa de negociação de uma forma diferente. Foi importante também o próprio ciclo de governança da União Europeia. Em breve haverá uma sucessão no comissariado europeu (os representantes do bloco em Bruxelas) e isso levou a que houvesse mais boa vontade dos comissários que ainda estão lá para fechar esse capítulo com o Mercosul.
E a situação interna, favoreceu de que maneira?
O fator (Jair) Bolsonaro e (Paulo) Guedes foi determinante. Quais são as cinco prioridades econômicas para o Brasil neste governo? Reforma da Previdência, reforma tributária, reforma administrativa, privatizações e concessões, além de abertura comercial. E como se faz abertura comercial? Por meio de tratados internacionais, da facilitação do ambiente de negócios e de modernização tarifária. Ficou muito claro em determinado momento para nós que as razões pelas quais a gente não conseguia avançar do nosso lado nos últimos anos faziam parte do acervo do nacional-desenvolvimentismo. Estávamos negociando com a cabeça dos anos 1960. Nesse sentido, o fim do ciclo do lulopetismo no Brasil foi determinante. O término dessa coisa do Norte contra o Sul, de terceiromundismo. Aquela ideia de que o Mercosul serve para dar palpite sobre a Crimeia, sobre o Oriente Médio, sobre os fundos abutres (empresas que compram títulos de países quebrados). Deixamos isso para trás e dissemos: vamos ver se a gente consegue fechar algum acordo.
Adriano Machado/CrusoeAdriano Machado/Crusoe“Estávamos negociando com a cabeça dos anos 1960”
O acordo começou a ser negociado ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, no final dos anos 1990. Não é resultado desse processo mais longo?
Olha, claro que herdamos muita coisa, principalmente do governo passado (Michel Temer). Mas ainda havia muito por fazer. Praticamente todos os capítulos da negociação estavam abertos quando assumimos. O mérito pelo acordo é deste governo. Criamos um Ministério da Economia em que muitas das áreas mais protecionistas que encontraram no passado espaço na governança ficaram sem abrigo na atual configuração. Isso nos permitiu avançar. É como se a política comercial, ao contrário de todas as outras experiências que o Brasil teve, tivesse migrado para o coração da política econômica. E com outro viés. No lugar do protecionismo, a abertura. Antes, não podia fazer acordo internacional porque impactaria a política dos campeões nacionais (idealizada pelo ex-presidente Lula para incentivar financiamentos públicos a um grupo restrito de empresas). Mas é justamente uma política dessas que a gente não quer fazer. Há também um alinhamento de toda a equipe econômica e com outros ministérios, como o Itamaraty e a Agricultura.
Por que as negociações foram feitas sem grande alarde?
Negociações são assim. Não se dão à luz do dia. Mas se você olhar nos últimos seis meses, verá declarações de um lado e de outro de que estávamos mais perto do acordo. Uma das negociadoras europeias chegou a dizer que avançamos nesses quatro meses mais do que nos últimos 20 anos.
Qual foi o papel da Argentina nesse processo?
Essencial. A Argentina teve uma ascensão brutal no final do século 19. De 1875 até 1910, a Argentina cresceu mais do que a Califórnia. Mas, de 1875 até 2015, não teve nenhum governo liberal. Cresceu pouco. Foram 140 anos de protecionismo, peronismo, patrimonialismo. E, de repente, tem um governo liberal (o do presidente Maurício Macri). E ela teve de correr atrás também um pouco do prejuízo reputacional. É um país que deu calote, nacionalizou empresas.
Quando, na prática, os efeitos do acordo chegam para a população?
Muito rápido. A economia é fundamento, situação concreta, mas também é criação de expectativa, aquilo que está por acontecer. Quanto mais sustentável é essa expectativa, mais ela impacta a decisão dos atores que atuam na economia. O país passa a representar um elo naquilo que é um dos motores de tração do sucesso econômico dos últimos 30 anos: as cadeias globais de produção. Mais investimentos significam mais emprego e renda. Mas, veja, acordos internacionais não são uma panaceia. Se você não melhora as condições de competividade internas, pode ocorrer um fenômeno que alguns especialistas chamam de paradoxo mexicano.
Adriano Machado/CrusoeAdriano Machado/Crusoe“No caso da relação com os Estados Unidos, a relação comercial dos dois países está muito abaixo de onde deveria estar”
O que seria esse paradoxo?
O México fez o Nafta (acordo bilateral com os Estados Unidos) no começo dos anos 1990 e, depois, fez quase 50 acordos com outros países. Mas não fez as reformas internas. Por isso, acho que o primeiro grande acordo comercial que o Brasil tem de fazer depois desse com a União Europeia é com ele mesmo. Por meio de reformas institucionais. Se fizer a reforma da Previdência, a economia aos cofres públicos será equivalente a anos e anos de superávit comercial. Se simplificar a estrutura tributária, a sua capacidade de competir internacionalmente vai melhorar a vida do cara aqui.
Quais os próximos acordos em vista?
O próximo é com o grupo de países formado por Noruega, Suíça, Islândia e Liechtenstein. Depois deles, estão em negociação acordos com Canadá, Coreia do Sul e Japão.
Não é uma contradição não ter nada em vista com os Estados Unidos, o declarado grande parceiro geopolítico do presidente?
Se você pegar o discurso do presidente Bolsonaro no Congresso Nacional e no parlatório no dia da posse e algumas declarações dele desde então, verá que ele repete à exaustão: “Vamos fazer negócios com qualquer parte do mundo, sem viés ideológico”. No caso da relação com os Estados Unidos, além da conexão e empatia entre os presidentes, a relação comercial dos dois países está muito abaixo de onde deveria estar. O teto é muito mais alto, ainda mais se considerar que são as duas maiores democracias do Ocidente e as duas maiores economias do continente. Então, o que está ocorrendo é uma espécie de busca do tempo perdido em relação aos americanos, que é muito importante para os dois lados. Aliás, ao aprimorar a relação com os Estados Unidos, você dá mais incentivos que se afine ainda mais a relação com os europeus, e vice-versa.

Não é no mínimo curioso que o acordo tenha sido fechado por um chanceler que é crítico do globalismo?
Sinceramente, não tenho acompanhado muito a teoria de relações internacionais. O que posso dizer é que todos que participaram dessas negociações têm uma bússola muito importante que é a busca do interesse nacional. O que não significa nacionalismo. É interesse nacional.