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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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quarta-feira, 25 de março de 2020

Globalizando: ensaios sobre a globalização e a antiglobalização - livro de Paulo Roberto de Almeida (2011)

Dando continuidade à libre disponibilidade de livros fora do mercado, venho, agora, a um dos que me deu maior prazer na construção, um processo que durou praticamente dez anos, ao meu estilo contrarianista, contestando cada uma das afirmações dos altermundialistas, ou antiglobalistas.


Globalizando: ensaios sobre a globalização e a antiglobalização 
(Rio de Janeiro: Lumen Juris Editora, 2011, xx+272 p.; Inclui bibliografia; ISBN: 978-85-375-0875-6)

Frontspício
Ridendo castigat mores.
Jean-Baptiste Poquelin, aliás Molière (1622-1673)


“O Brasil converter-se-á num dos mais formosos estabelecimentos do globo (nada para isso lhe falta) quando o tiverem libertado dessa multidão de impostos, desse cardume de recebedores que o humilham e oprimem; quando inúmeros monopólios não mais encadearem sua atividade; quando o preço das mercadorias que lhe trazem não mais for duplicado pelas taxas que andam sobrecarregadas; quando os seus produtos não pagarem mais direitos ou não os pagarem mais avultados que os dos seus concorrentes; quando as suas comunicações com as outras possessões nacionais se virem desembaraçadas dos entraves que as restringem...”.

Guillaume-Thomas Raynal, conhecido como Abade Raynal,
Histoire philosophique et politique des établissements et du commerce des européens dans les deux Indes (Amsterdam, 1770);
Apud Manuel de Oliveira Lima, D. João VI no Brasil
 (3a. ed.; Rio de Janeiro: Topbooks, 1996), p. 58-59.

Sumário

À maneira de prefácio:
O altermundialismo, uma enfermidade infantil da globalização

Parte I
Globalização
1. O Brasil e os primeiros 500 anos de globalização capitalista
2. Contra a corrente: treze ideias fora do lugar sobre as relações internacionais
3. A globalização e as desigualdades: quais as evidências?
4.  Três vivas ao processo de globalização: crescimento, pobreza e desigualdade
5. Distribuição mundial da renda: evidências desmentem concentração e divergência
6. O Brasil e os impactos econômicos e sociais da globalização
7. Globalização perversa e políticas econômicas nacionais: um contraponto

Parte II
Antiglobalização
8. Contra a antiglobalização: Contradições, insuficiências e impasses do movimento
9. A globalização e seus descontentes: um roteiro sintético dos equívocos
10. A globalização e seus benefícios: um contraponto ao pessimismo
11. Fórum Social Mundial: nove objetivos gerais e alguns grandes equívocos
12. Um outro Fórum Social Mundial é possível… (aliás, é até mesmo necessário)
13. Fórum Social Mundial 2008: menos transpiração, mais inspiração, por favor...
14. Fórum Surreal Mundial: pequena visita aos desvarios dos antiglobalizadores
15. Uma previsão marxista...
16. Perguntas impertinentes a um amigo antiglobalizador
17. Fórum Social Mundial 2010, uma década de embromação

À guisa de conclusão:
Se, nouvelle manière (ou as qualidades do homem na globalização)
Obras de Paulo Roberto de Almeida

Índice
  
À maneira de prefácio:
O altermundialismo, uma enfermidade infantil da globalização  

Parte I
Globalização
1. O Brasil e os primeiros 500 anos de globalização capitalista
1.1. Introdução: meio milênio de inserção internacional do Brasil    
1.2. A globalização mercantilista: as grandes descobertas e a expansão dos séculos 16-18 
1.3. A globalização da Revolução Industrial: manufaturas e novos impérios coloniais 
1.4. A globalização em compasso de espera: crises e recessão mundial no século 20 
1.5. A nova globalização capitalista: sob a sombra da Pax Americana  
1.6. Conclusão: um Brasil ainda pouco globalizado 

2. Contra a corrente: treze ideias fora do lugar sobre as relações internacionais
2.1. O mundo é injusto e desigual, está baseado nas relações de força e na prepotência dos poderosos  
2.2. O Brasil está situado na periferia, por razões históricas e estruturais, e portanto forçado a uma situação de dependência em relação às poderosas nações centrais 
2.3. A dominação econômica de empresas multinacionais atua como obstáculo para nossa independência tecnológica e se reflete em relações desiguais na balança tecnológica
2.4. O Brasil não consegue exportar devido ao protecionismo dos países ricos que protegem seus setores estratégicos ou sensíveis. O Brasil deveria fazer o mesmo 
2.5. O multilateralismo e os agrupamentos regionais representam nossa melhor defesa no plano mundial, por isso precisamos atuar mediante grupos de países (G-77, Mercosul etc.)
2.6. Devemos reforçar os laços com os grandes países em desenvolvimento (China, Índia, Rússia) e com os da América do Sul, onde podemos dispor de vantagens comparativas 
2.7. Só podemos abrir nossa economia e liberalizar o comércio na base da estrita barganha recíproca e com o oferecimento de concessões equivalentes e substantivas  
2.8. Os capitais voláteis são responsáveis pela desestabilização de nossas contas externas e devem ser estritamente controlados 
2.9. Os tratados devem ser sempre recíprocos e respeitadores de nossa soberania e autonomia nacional
2.10. A globalização acentua as desigualdades dentro e entre as nações. Por isso o Brasil deve evitar uma abertura excessiva à economia mundial 
2.11. Processos de liberalização entre parceiros muito desiguais beneficiam principalmente os mais poderosos, por isso devemos primeiro corrigir assimetrias estruturais  80
2.12. Nossa diplomacia é altamente capacitada e profissional, reconhecida pelos seus dotes de excelência                                                                                                        84
2.13. A ação diplomática brasileira deve servir ao processo de desenvolvimento nacional      86

3. A globalização e as desigualdades: quais as evidências?                                   91
3.1. Tendências à divergência e à concentração na economia mundial                 92
3.2. Tendências demográficas: a globalização promove a transição                      93
3.3. Mudanças tecnológicas: os fatores determinantes são domésticos
3.4. O mito do “intercâmbio desigual” 
3.5. Globalização financeira: para o bem e para o mal  
3.6. A globalização como bode expiatório de políticas nacionais  

4. Três vivas ao processo de globalização: crescimento, pobreza e desigualdade
4.1. Mea culpa: miserere nobis illusionis est   
4.2. A antiglobalização e os seus descontentes: em busca de coerência  
4.3. O que era preciso demonstrar: o economista como profeta  
4.4. Vinde a mim os pobres deste mundo?: os milagres da globalização 
4.5. Uma proposta modesta: o neomarxismo da globalização 

5. Distribuição mundial da renda: evidências desmentem concentração e divergência 
5.1. De volta ao problema (equivocado) do crescimento da pobreza mundial  
5.2. A diminuição da pobreza mundial: velhas e novas evidências     
5.3. Os dados do problema: questões metodológicas e descobertas empíricas  
5.4. A pobreza no mundo: diminuindo, a despeito de tudo   
5.5. O mundo é menos desigual: como isso ocorre, e por quais razões? 
5.6. Uma palavra final: os antiglobalizadores precisam mudar o discurso...

6. O Brasil e os impactos econômicos e sociais da globalização 
6.1. Um debate marcado por posições maniqueístas  
6.2. A globalização, o “fim da geografia” e a inserção desigual 
6.3. O Brasil na economia mundial   
6.4. Impactos e desafios do processo de globalização  
6.4.1. A abertura externa leva ao debilitamento das políticas nacionais?   
6.4.2. A globalização aumenta ou diminui as desigualdades intra- e entre-Estados? 
6.4.3. A globalização se traduz num padrão uniforme de políticas públicas? 
6.4.4. Crises financeiras são o resultado da globalização?; a integração regional é o remédio?  
6.4.5. A globalização significa menos democracia e maior dominação de cartéis e monopólios?  
6.4.6. Impactos econômicos e sociais da globalização ou do sistema de mercado?

7. Globalização perversa e políticas econômicas nacionais: um contraponto 
7.1. Abertura econômica e liberalização comercial   
7.2. Ausência de projeto estratégico   
7.3. Políticas não-ortodoxas de desenvolvimento   
7.4. As supostas políticas não-liberais da China   
7.5. A Índia como promotora do mercado interno    
7.6. O papel do cobre nacionalizado no sucesso do Chile   
7.7. O Brasil penalizado pelos seus juros excessivamente altos   
7.8. Políticas monetária e cambial do Brasil nocivas ao crescimento  

Parte II
Antiglobalização
8. Contra a antiglobalização: Contradições, insuficiências e impasses do movimento
8.1. Uma longa (mas necessária) introdução metodológica e de princípios  
8.2. Contradições da antiglobalização: carência de fatos, de método, de análises 
8.3. Pensando o impensado: existem ideias concretas sobre temas concretos? 
8.3.1. Protecionismo agrícola e vantagens comparativas dos mais pobres 
8.3.2. Dívida externa, movimentos de capitais e globalização financeira  
8.3.3. Competição aberta contra mercados regulados e fechados  
8.3.4. Instituições de solução de controvérsias em face do arbítrio comercial 
8.3.5. Crescimento e pobreza, ou o que a globalização pode fazer por eles 
8.3.6. Concentração da renda e desigualdades  
8.3.7. Tecnologia proprietária e dependência tecnológica  
8.3.8. Meio ambiente e mercado: um instável equilíbrio 
8.4. Diagnóstico de duas enfermidades precoces: autismo e esquizofrenia  

9. A globalização e seus descontentes: um roteiro sintético dos equívocos  
9.1. A globalização e o desenvolvimento: convergências ou divergências? 
9.2. A globalização e as políticas neoliberais: elas produzem recessão e desemprego? 
9.3. O “consenso de Washington” fracassou na América Latina? E o caso do Chile? 
9.4. Liberalização comercial e produtividade: quais as evidências nesse campo?
9.5. Liberalização financeira e capitais voláteis: e o problema da estabilidade?
9.6. Relações de trabalho e desemprego: quais as lições dos países mais flexíveis?
9.7. Inserção internacional e interdependência econômica: quais são os problemas? 
9.8. Patentes e países pobres: como avançar em ciência e tecnologia? 
9.9. Investimentos externos e autonomia tecnológica: eles são opostos? 
9.10. Segurança alimentar e protecionismo agrícola: e a situação dos países mais pobres?
9.11. Taxas sobre fluxos de capitais: elas são positivas ou mesmo necessárias? 
9.12. Livre-comércio ou mercantilismo: o que é bom para o crescimento?   
9.13. Conclusões: os mitos e equívocos sobre a globalização  

10. A globalização e seus benefícios: um contraponto ao pessimismo   
10.1. Uma controvérsia politicamente enviesada   
10.2. A globalização provoca miséria e desigualdade?  
10.3. As desigualdades estruturais da globalização capitalista agravaram-se? 
10.4. Os benefícios da globalização: redução da miséria e das desigualdades 

11. Fórum Social Mundial: nove objetivos gerais e alguns grandes equívocos
11.1. Pela construção de um mundo de paz, justiça, ética e respeito pelas espiritualidades diversas  
11.2. Pela libertação do mundo do domínio das multinacionais e do capital financeiro 11.3. Pelo acesso universal e sustentável aos bens comuns da humanidade e da natureza 
11.4. Pela democratização do conhecimento e da informação  
11.5. Pela dignidade, diversidade, garantia da igualdade de gênero e eliminação de todas as formas de discriminação 
11.6. Pela garantia dos direitos econômicos, sociais, humanos e culturais, especialmente os direitos à alimentação, saúde, educação, habitação, emprego e trabalho digno
11.7. Pela construção de uma ordem mundial baseada na soberania, na autodeterminação e nos direitos dos povos  
11.8. Pela construção de uma economia centrada nos povos e na sustentabilidade 
11.9. Pela construção de estruturas políticas realmente democráticas e instituições com a participação da população nas decisões e controle dos negócios e recursos públicos  

12. Um outro Fórum Social Mundial é possível… (aliás, é até mesmo necessário) 
12.1. Onde se encontra o outro mundo possível?  
12.2. Quem sabe um outro Fórum seja possível?  

13. Fórum Social Mundial 2008: menos transpiração, mais inspiração, por favor...
13.1. Déjà vu, all over again   
13.2. Repetindo velhos argumentos (equivocados)   
13.3. A mobilização pela mobilização (isso deve cansar)  
13.4. Os jornalistas estão fazendo o seu trabalho corretamente?   

14. Fórum Surreal Mundial: pequena visita aos desvarios dos antiglobalizadores   
14.1. Globalizados contra a globalização: reação freudiana?    
14.2. Objetivos reciclados nos últimos três anos: falta de ideias?   
14.3. Pelo menos um objetivo novo: alguma grande contribuição intelectual? 
14.4. Os “sábios” da antiglobalização: mais bem dotados que os jovens? 
14.5. Mais uma dúzia de propostas para um outro mundo possível: será possível? 
14.5.1. Cancelamento da dívida externa dos países do Sul  
14.5.2. Introdução da Taxa Tobin sobre transações financeiras   
14.5.3. Desmantelamento dos paraísos fiscais   
14.5.4. Benefícios sociais sem discriminação de gêneros 
14.5.5. Comércio justo com exclusão da liberalização de serviços
14.5.6. Soberania alimentar e barreiras a OGMs       
14.5.7. Contra patentes de conhecimento e a privatização de bens comuns 
14.5.8. Contra todas as discriminações, pelos direitos de povos indígenas 
14.5.9. Defesa dos recursos naturais, sobriedade energética  
14.5.10. Contra bases estrangeiras, salvo a serviço da ONU  
14.5.11. Direito à informação, contra os grandes grupos de comunicação 
14.5.12. Democratização ampla das organizações internacionais 
14.6. A caminho de Belém 2009: alguma esperança de ideias novas?  

15. Uma previsão marxista sobre o “fim da história” e os equívocos atuais dos antiglobalizadores             
15.1. Da profecia, enquanto engenharia social       
15.2. O fim da história, enquanto profecia otimista   
15.3. O capitalismo não tem manual de instruções (aliás, nem o socialismo) 
15.4. O socialismo tropeça no cálculo econômico     
15.5. Marx: habitual de Davos e articulista da Economist 

16. Perguntas impertinentes a um amigo antiglobalizador     
16.1. Sem querer ofender ninguém...            
16.2. Quem afirma tem o dever de provar...     
16.3. Doze perguntas em busca do outro mundo possível...   

17. Fórum Social Mundial 2010, uma década de embromação
17.1. A novela está de volta (com o mesmo enredo...)   
17.2. O diagnóstico do nosso mundo impossível      
17.3. Construindo um outro mundo possível    
17.4. O mundo possível dos antiglobalizadores     
17.5. A grande síntese antiglobalizadora         


À guisa de conclusão:
Se, nouvelle manière (ou as qualidades do homem na globalização)       


Obras de Paulo Roberto de Almeida                 



À maneira de prefácio:
O altermundialismo, uma enfermidade infantil da globalização

Incrível atualidade a da frase transcrita no frontspício deste livro, de uma das cabeças mais lúcidas do século 18 francês. Anti-escravagista em plena era do tráfico africano, pensador iluminista, conhecedor das coisas do mundo, mesmo sem ter viajado fora da Europa ocidental, o abade Raynal (Guillaume-Thomas) poderia ser descrito, em linguagem moderna, como um “globalizador esclarecido”, categoria à qual eu mesmo me orgulharia de pertencer, se existisse entre nós tal clube filosófico. Com efeito, a sua provocadora Histoire philosophique et politique des établissemens & du commerce des européens dans les deux Indes pode ser chamada de primeiro tratado da globalização dos tempos modernos, ou le premier traité de la mondialisation, como prefeririam os franceses, sempre suscetíveis nessas coisas de anglofonia.
Raynal começa o primeiro livro de sua enorme obra (6 volumes) proclamando a revolução que tinha sido a passagem do cabo da Boa-Esperança: “uma revolução então começou no comércio, na potência das nações, nos costumes, na indústria e no governo dos povos. Foi nesse momento que os homens dos lugares mais distantes se fizeram necessários: os produtos dos climas equatoriais são consumidos nos climas vizinhos do pólo; a indústria do norte é transportada ao sul; os tecidos do Oriente vestem o Ocidente, e em todas as partes os homens trocam suas opiniões, suas leis, seus hábitos, seus remédios, suas enfermidades, suas virtudes e seus vícios”. Além de lúcido, nosso abade era um visionário: “Tudo mudou e tudo deve mudar ainda. Mas, as revoluções passadas e aquelas que ainda vão vir, podem ser úteis à natureza humana? O homem, por causa delas, gozará um dia de mais tranquilidade, de mais virtudes ou de mais prazeres? Poderão elas torná-lo melhor, ou elas apenas o mudarão um pouco?” [1]
Estas perguntas, filosóficas, de fato, são examinadas à luz da obra colonizadora dos europeus: “Depois que se conheceu a América e a rota do Cabo, nações que não eram nada se tornaram poderosas; outras, que faziam estremecer a Europa, se enfraqueceram. Como essas descobertas influenciaram o estados dos povos? Por que, enfim, as nações mais florescentes não são exatamente aquelas com as quais a natureza foi mais pródiga?” Ele começa a explorar essas questões, partindo do pressuposto da unificação comercial do mundo sob a hegemonia do se poderia chamar, hoje em dia, de capitalismo ocidental. A análise de Raynal é absolutamente atual, podendo-se dizer que seus argumentos parecem referir-se à globalização contemporânea.

Esta coleção de ensaios pessoais também é colocada sob o signo controverso da globalização, aliás, bem mais do lado do abade Raynal do que dos modernos êmulos daqueles representantes das correntes anti-iluministas que colocaram sua obra no index dos livros proibidos e tentaram calar sua voz incômoda e libertária. Após a publicação da terceira edição da sua História filosófica das duas Índias, seus inimigos a fazem condenar pelo Parlamento de Paris, queimando-a em praça pública, enquanto ele se refugiava na Suíça (onde ele faz construir um monumento em honra à liberdade). Ele freqüenta em seguida as cortes de Frederico II, da Prússia, e a de Catarina II, da Rússia.
Às vésperas da Revolução, ele encarna os ideais do Iluminismo e dos direitos humanos e protesta contra a autocracia e a escravidão nos territórios coloniais, cujos horrores ele conhecia por ser descendente de uma família de grandes comerciantes (e de traficantes). Perseguido pelo ancien Régime, ele logo se coloca também contra os exageros do novo regime, como declarado em sua carta à Assembléia Nacional em 31 de maio de 1791: “eu alertei os reis quanto aos seus deveres; inquietai-vos que hoje eu fale ao povo dos seus erros”.
Com efeito, mesmo os bem intencionados cometem erros, como por exemplo, hoje, os chamados altermondialistes franceses – e seus seguidores miméticos no Terceiro-Mundo, conhecidos como antiglobalizadores –, ao pretender substituir as iniquidades da globalização capitalista por sistemas econômicos que fariam os povos das antigas colônias ainda mais pobres do que eles já são.
De fato, ao examinar os escritos, declarações, manifestos, slogans e consignas dos antiglobalizadores, e ao confrontá-los com os dados da realidade, tanto no plano da história, como da atualidade, ou ainda no âmbito da simples lógica formal, impossível não chegar à conclusão de que eles se equivocam redondamente sobre o mundo, seus problemas e respectivas soluções. Pode-se, inclusive, parafrasear a velha frase: nunca, tantos se enganaram tanto, sobre tantos assuntos.

Há muitos anos venho observado o curioso fenômeno da antiglobalização: não posso me impedir de admirar e também de sorrir face à ingenuidade de tantos jovens, sinceramente armados de idealismo, desejosos de corrigir os defeitos deste mundo. Mas tampouco posso evitar uma sensação de cansaço ante tantos slogans repetidos, retomando aborrecidamente chavões de décadas atrás, quando eu também marchava contra o imperialismo e a dominação do capital financeiro internacional. Creio, sim, que o movimento altermundialista é uma enfermidade infantil da globalização. Como não existe uma vacina contra ele, é preciso esperar que os sinais da enfermidade se tornem cada vez mais tênues, até desaparecer por completo, quando todos os jovens estiverem devidamente  globalizados, como aliás já estão os da antiglobalização (mas no seu caso, eles pegam continuamente o virus com professores alienados da academia).
Tenho menos complacência, justamente, em face desses velhos representantes da academia, que parecem não ter aprendido absolutamente a partir do itinerário de desastres do socialismo real, no século 20. Velhos sindicalistas podem ser perdoados por marcharem contra a “deslocalização”, já que, afinal de contas, eles não estão fazendo mais do que o seu dever, ao defender a manutenção dos empregos de seus associados em seus respectivos países. Mas, intelectuais de gabinete, que repetem slogans monotemáticos, simplificando uma realidade complexa e induzindo jovens a se engajarem em causas perdidas, não são apenas equivocados; eles também podem ser considerados intelectualmente desonestos, já que dispondo de todos os instrumentos para se informar (e se formar). 
A acusação é grave, e ela se refere não apenas a equívocos materiais, digamos de avaliação econômica da realidade. Ela tem a ver com um slogan absolutamente vazio, o tal de “outro mundo possível”: jamais fomos contemplados com a arquitetura desse outro mundo prometido, nunca apresentado em seus contornos materiais ou sequer “filosóficos”. Esses acadêmicos vivem do movimento pelo movimento, numa espécie de moto perpétuo mental, aliás, girando em circuito fechado, pois que imune e isolado de todo e qualquer debate que não seja no interior do próprio movimento.
Ao condenar o tal de “pensamento único” – que seria, supostamente, o do neoliberalismo – esses acadêmicos alienados conseguem ostentar o mais rígido pensamento único conhecido na atualidade. De resto, o conjunto do movimento antiglobalizador pode ser acusado de sectarismo e tribalismo: só podem participar dos seus encontros, aqueles que aderem ao credo filosófico que constitui a “bíblia” do movimento antiglobalizador. Os que não estão habituados aos rituais da tribo encontrarão nesta coleção de ensaios farto material probatório.

Os trabalhos aqui compilados falam por si mesmos. Eles tanto dão a palavra ao movimento antiglobalizador – pois que reproduzindo fielmente suas teses e argumentos mais repetidos – quanto se dedicam à anatomia desse pensamento redutor e simplista. Cada um dos ensaios está datado cronologicamente, o que explica pequenas repetições nos argumentos aqui e ali. De resto, eles devem se sustentar por si mesmos, e submeter-se à crítica dos leitores, entre os quais espero encontrar muitos jovens idealistas e alguns irredutíveis antiglobalizadores. Não tenho o hábito de ser politicamente correto, nem o de dobrar-me a conveniências do momento. Alguns dos trabalhos aqui compilados, já publicados anteriormente, podem explicar minha posição singular tanto na academia, quanto em outros ambientes. Não sou de esconder minhas posições. A todos de julgar.

Paulo Roberto de Almeida


[1] As obras de Raynal estão disponíveis em formato digital no site da Bibliothèque Nationale de France, também através do portal da coleção Europeana: http://www.europeana.eu/portal/brief-doc.html?start=1&view=table&query=Abb%C3%A9+Raynal.


A obra está disponível na plataforma Academia.edu, neste link: 

https://www.academia.edu/42313006/Globalizando_ensaios_sobre_a_globalizacao_e_a_antiglobalizacao_2011_

domingo, 4 de agosto de 2019

Onde estão os antiglobalizadores? Perderam para os antiglobalistas?

Até a chegada de alguns malucos ao poder, um dos meus textos mais acessados, livremente disponíveis na Internet – plataforma Academia.edu – era este aqui, já bem antigo, mas de "sucesso" mais recente: 

1297) Contra a antiglobalização: Contradições, insuficiências e impasses do movimento antiglobalizador (2004)
https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida/Analytics/activity/documents/5873102 

Em Academia.edu, ele totalizou 5.890 visualizações, o primeiro de todos, campeão absoluto, pois o segundo, meu livro de 2014, Prata da Casa, só tem 4.896 visualizações, e alcançou 1.198 downloads, também campeão absoluto nesse quesito (o segundo vem numa distante posição, com 540 downloads, o livro Prata da Casa, justamente.

O texto é antigo, do tempo em que existiam antiglobalizadores, quando a tribo ainda organizava ruidosos convescotes anuais sob o signo do "Foro Social Mundial" – estou falando dos primeiros quinze anos do século atual, portanto –,  mas algum professor do Instituto Legislativo Brasileiro parece ter gostado dele e proposto a leitura para seus alunos de curso não presencial sobre relações internacionais. Foi portanto um dos mais acessados em toda a minha longa história de interações desse tipo. Mas de sucesso efêmero, pois quase já não existem mais representantes da tribo.

Hoje, fui verificar uma a uma as dezenas, centenas de mensagens que os garimpeiros desse curso deixavam para mim, ao descarregar o arquivo. A maioria simpaticamente, falando dos estudos ou apenas agradecendo. 
Mas também tive um aluno que foi absolutamente sincero ao dizer que não gostou do meu texto.
Reproduzo aqui o que ele escreveu: 

"Bom dia P. de Almeida. Gostaria de falar um pouco do artigo Contra a antiglobalização. Primeiro queria deixar claro que o artigo não é tão interessante como o título e mais decepcionante ainda quando o lê, e vê que você não é neutro na contradição dos anti, o artigo se tornou chato antes mesmo de começar, por que sua opinião a respeito ficou se repetindo continuamente a cada parágrafo. Não terminei de ler por que é chato de lê alguém que não argumenta apenas expõe a opinião repetidamente de forma que você engula e aceite. 
Ass: Rxxxxx Cxxxx
Dispenso os [sic] de certas expressões, e ainda corrigi alguns acentos, mas gostaria de agradecer a esse leitor a sinceridade da crítica, ainda que ele não tenha me corrigido em nada, apenas disse que não gostou da minha abordagem contra os antiglobalizadores.
É direito dele. Mas eu também acho que essa fauna curiosa já nem existe mais, eles devem ter se cansado de protestar contra a globalização usando os mais modernos materiais, ferramentas, técnicas e métodos de comunicação e publicação fornecidos quase a preço de custo, ou gratuitamente, pelo objeto mesmo do seu protesto: a globalização.
Acho que eles se aborreceram com os velhacos que queriam fazê-los acreditar que a globalização produzia pobreza e miséria no mundo, quando o contrário é o que acontece.

Acho que agora estamos sendo assediados por uma outra tribo, os antiglobalistas, ainda não muito ruidosa, talvez porque ele são basicamente ridículos, ao lutar contra um tal de globalismo que parece estar ameaçando a soberania dos povos. 
São os ludditas da globalização.
Olá, antiglobalistas, vocês são absolutamente entediantes, com essa conversa mole, paranóica, do globalismo.
Estou aguardando mais sérias evidências das ameaças globalistas para poder me pronunciar, mas já escrevi alguns textos a respeito. Um dos mais recentes é este aqui: 

O globalismo e seus descontentes: notas de um contrarianista
https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida/Analytics/activity/documents/39206570

Tem também um dossiê, feito de forma absolutamente involuntária, ao deparar-me com um maluco que fica pregando essa paranoia: 
Dossiê Globalismo: Brasil Paralelo e seu seguimento

Enfim, não se pode contentar todo mundo, e a internet é livre: abriga pesquisadores sérios, aprendizes, simples estudantes e um bando de malucos...

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4 de agosto de 2019

quarta-feira, 16 de maio de 2018

A globalizacao e seus descontentes: um roteiro dos equívocos - Paulo Roberto de Almeida (2006)

A globalização e seus descontentes:
um roteiro sintético dos equívocos

Paulo Roberto de Almeida

I. Une petite maladie française...
Mesmo sabendo que é particularmente difícil dialogar com os antiglobalizadores (sejam eles profissionais ou amadores), venho, desde muitos anos, tentando manter aberto um canal de debate sobre algumas das questões mais relevantes da agenda internacional. 
De fato, no que se refere aos problemas de desenvolvimento e de distribuição mundial de riqueza, que estão no centro de grande parte dos conflitos remanescentes no cenário internacional, parece ser virtualmente impossível chegar a um terreno comum de entendimento com os antiglobalizadores, em geral em função de uma tendência latente, chez eux, àquela virtude que os franceses chamariam de repli-sur-soi(e que nós chamaríamos, simplesmente, de “política do avestruz”). 
Sei que eles, adotando um vocábulo de origem francesa, preferem chamar a si mesmos de “altermundialistas”, mas como eles nunca apresentaram a arquitetura exata desse “alter” mundo, vou continuar chamando-os de “antiglobalizadores”, até que eles apareçam com a receita do novo mundo.
Os franceses, justamente, que detêem o “copyright” mundial do altermundialismo, são especialistas no esforço, geralmente inútil, de lutar contra “moinhos de vento”, a começar pelo exercício intelectualmente patético de recusar o conceito anglo-saxão de globalization, preferindo em seu lugar o equivalente doméstico mondialisation.
Eles também vêem se especializando, nos últimos tempos, em lutar contra eles mesmos, ao mesmo tempo que contra o seu próprio país, como revelado nas maciças manifestações contra a flexibilização tentativa das relações contratuais de trabalho, empreendida pela gestão Dominique de Villepin (até quando ele vai resistir?). A maior parte dos franceses parece preferir uma taxa maior de desemprego e uma menor de crescimento econômico, numa demonstração canhestra, ou tosca, de que não existem piores males sociais do que aqueles auto-infligidos, conscientemente ou não. Assistiremos, provavelmente, a maiores e mais pesados embates políticos, até que o cansaço social e o aprofundamento inelutável da decadência nacional consigam realizar uma convergência dos franceses em direção da lógica cartesiana e da razão econômica. 
Ou será que não? Ah, mais ça importe à qui, finalement?

II. Et le Brésil, comment va-t-il?
O Brasil não está imune ao mesmo tipo de reação “ludita” contra as tendências atuais e futuras da globalização, uma vez que, aqui também, ostentamos as rigidezes sociais da França no que se refere à legislação laboral e um mesmo espírito “gaulês” de “solução de controvérsias”, que faz do “enfrentamento de classes” não apenas um método de luta mas, sobretudo, uma ação finalística que sempre visa algum grande projeto de “reordenamento social” no sentido da redenção dos males do passado e da construção utópica de um futuro imaginado.
Tampouco escapamos dessa espécie bizarra de “pacto social perverso”, que faz com que a sociedade prefira sempre exigir “direitos máximos”, em lugar de pensar em primeiro lugar em “obrigações mínimas”, ou daquela outra inclinação surrealista que consiste em pedir sempre maiores serviços ao “Estado”, olvidando que a fonte de todos os recursos do Estado nada mais é do que a riqueza gerada na própria sociedade, que aliás deixa, no meio do caminho, uma parte dessa renda aos burocratas e outros intermediadores estatais.
Mas, estes são os nossos “males de origem”, difíceis a extirpar, sobretudo quando tantos intelectuais de gabinete e muitos dos seus companheiros acadêmicos, em lugar de se dedicarem a uma análise objetiva da realidade contemporânea, tal como “realmente existente”, se comprazem mutuamente nesses encontros de protesto contra a globalização “assimétrica”, contra o capitalismo “selvagem” e a arrogância “unilateral” do império. 
A auto-ilusão é uma virtude muito bem compartilhada por todos esses representantes típicos do niilismo contemporâneo, em especial quando o que menos importa nessas ruidosas reuniões é a lógica do pensamento e sua conexão com os fatos objetivos. Daí a minha sensação de mais perfeita inutilidade ao rabiscunhar tantos e tão variados textos sobre a globalização, já que o que faz sucesso, retumbante, é a antiglobalização militante, a luta contra o “pensamento único” das regras do consenso de Washington e contra a ditadura do neoliberalismo. 
Sim, cabe a pergunta: alguém já assistiu, em qualquer lugar da terra e, sobretudo, no Brasil, a alguma manifestação “em favor” da globalização? (r.s.v.p: meu e-mail).

III. A água é mole, mas a pedra é duríssima (e as cabeças ainda mais...)
Como eu sou um pouco persistente nesse emprendimento inglório, continuo a tecer meus comentários iconoclastas, mas confesso que o exercício me parece bem mais próximo daquilo que se chama de “tarefa de Sísifo”. Vou persistir, assim, nesse encargo, ainda que eu seja o primeiro a reconhecer que a minha vontade de debater é, no mais das vezes, absolutamente unilateral, já que nunca vejo vir alguma coisa, qualquer coisa, do “outro lado”. Deve ser por autismo e introversão, certamente. 
Ainda assim, pretendo continuar na arena das idéias, armado, como sempre estou, unicamente de meus instrumentos habituais de “combate”, que são a lógica como método irrecusável de argumentação, a sustentação empírica e a exibição de evidências históricas e fáticas em apoio a minhas afirmações e propostas. 

IV. O meu roteiro dos equívos dos antiglobalizadores...
Dito isto, passemos aos argumentos de trabalho. Quais seriam, numa visão sintética, os elementos essenciais de qualquer discurso empiricamente embasado sobre a agenda internacional da globalização e seus principais problemas? 
Eles parecem se resumir a estas questões maiores:  
A globalização e seus possíveis pontos de contestação:
1. A globalização e o desenvolvimento: convergências ou divergências? 
2. A globalização e as políticas neoliberais: elas produzem recessão e desemprego?
3. O “consenso de Washington” fracassou na América Latina? E o caso do Chile? 
4. Liberalização comercial e produtividade: quais as evidências nesse campo? 
5. Liberalização financeira e capitais voláteis: e o problema da estabilidade? 
6. Relações de trabalho e desemprego: quais as lições dos países mais flexíveis? 
7. Inserção internacional e interdependência econômica: quais são os problemas?
8. Patentes e países pobres: como avançar em ciência e tecnologia? 
9. Investimentos externos e autonomia tecnológica: eles são opostos? 
10. Segurança alimentar e protecionismo agrícola: e a situação dos países mais pobres? 
11. Taxas sobre fluxos de capitais: elas são positivas ou mesmo necessárias? 
12. Livre-comércio ou mercantilismo: o que é bom para o crescimento? 

Vejamos agora, ainda que resumidamente, cada um desses pontos de controvérsia. Eu o farei sob a forma de quadros sintéticos, sem me preocupar, no momento, em desenvolver cada um dos pontos. Disponho, em todo caso, para ajudar os curiosos e insaciáveis de conhecimento empírico, de tabelas, relatórios, estatísticas, estudos setoriais e globais, publicações especializadas dos organismos internacionais, enfim, tudo o que possa servir para embasar, quantitativa e qualitativamente, cada uma das minhas afirmações nas celulas “orientais” de cada uma das tabelas (eu poderia dizer “células da direita”, reservando o privilégio da “esquerda” para os antiglobalizadores, como de fato ocorre, mas esse tipo de derivação ideológica-terminológica me parece por demais infantil).
Aceito contestações e polêmicas, mas os candidatos ao debate deverão comparecer, por favor, armados dos dados estatísticos, relatórios e outros informes que permitam comprovar as acusações também genéricas que aparecem nas “células da esquerda”.
Voilà, allons-nous...

1. A globalização e o processo de desenvolvimento: convergência ou divergência?

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
Globalização aprofunda a miséria, cria mais desemprego e acarreta mais desigualdades no mundo, tanto dentro dos países, como entre os países
Dados estatísticos não corroboram essas afirmações; ela diminuiu a pobreza e a miséria (China e Índia); evidências são ainda insuficientes no que toca a desigualdade interna


2.A globalização e as políticas econômicas neoliberais: recessão e desemprego?

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
As políticas liberais produzem recessão e desemprego, privilegiando unicamente os setores financeiros e as elites
Os países que mais crescem e que ostentam as menores taxas de desemprego são, justamente, os chamados “neoliberais”


3. O “consenso de Washington” fracassou na América Latina? E o caso do Chile?

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
O “consenso de Washington” fracassou na América Latina e  os países deveriam se opor às suas regras para retomar o crescimento, o dinamismo e se inserirem de forma soberana na economia internacional
Os países que mais se identificaram com as políticas “neoliberais”, como o Chile, ostentam taxas sustentadas de crescimento e progressos na redução das desigualdades distributivas e na qualificação competitiva de suas economias


4. Liberalização comercial e ganhos de produtividade: quais as evidências?

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
Processos de abertura econômica e de liberalização comercial representam o sucateamento da indústria e desmantelamento de setores inteiros da economia nacional
Países que adotaram essas medidas, como o Brasil do início dos anos 1990, registraram, as maiores taxas de crescimento da produtividade e ganhos significativos  de competitividade internacional


5. Liberalização financeira e capitais voláteis: quais requisitos para a estabilidade?

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
As regras liberais impõem total liberdade aos movimentos de capitais e a plena abertura cambial, o que facilita as atividades especulativas nos mercados de divisas e eventual instabilidade financeira
Maior competição nos mercados de capitais e liberalização cambial reduzem o custo do dinheiro e estimulam o investimento produtivo, mas regras ditas de Basiléia devem existir para prevenir crises financeiras


6. Relações de trabalho e desemprego: quais são as lições dos países mais flexíveis?

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
A flexibilização neoliberal do mercado de trabalho produz desemprego e perda de direitos consagrados, resultando em precarização das relações de trabalho e terceirização das atividades
Países que mais adotaram essa postura são os que exibem as menores taxas de desemprego e o maior crescimento da produtividade do trabalho; taxas de desemprego dos EUA e da Grã-Bretanha são a metade das prevalecentes na França


7. Inserção comercial internacional e interdependência econômica: problemas?

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
Livre-comércio internacional acarreta desigualdades e dependência dos países das empresas multinacionais, o que compromete possíveis políticas públicas
Economias que se inserem nos fluxos internacionais de intercâmbio comercial melhoram o padrão produtivo e tecnológico, criam suas multinacionais e diminuem a dependência das matérias-primas


8. Patentes e países em desenvolvimento: como avançar em ciência e tecnologia?

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
Os direitos de propriedade intelectual, sobretudo na área farmacêutica, são inerentemente injustos, transferindo renda dos países pobres para os mais ricos, condenando os primeiros a uma “eterna dependência tecnológica” dos segundos
É preciso uma compensação pela inovação tecnológica; países como China e Índia, que são ainda relativamente pobres segundo os padrões internacionais, estão aderindo de forma crescente a normas mais elevadas de proteção patentária


9. Investimentos diretos estrangeiros e autonomia tecnológica: incompatibilidades?

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
Investimentos diretos estrangeiros criam maior dependência econômica e oneram o balanço de pagamentos pela remessa ampliada de divisas e de royalties para o exterior
Países pobres vêm aumentando o volume e a qualidade da proteção dada ao IDE (acordos de garantia de investimentos) e assegurando livre transferência dos resultados produzidos


10. Segurança alimentar e protecionismo agrícola: isso é bom para os países pobres?

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
É preciso garantir a segurança alimentar e reduzir a dependência externa, daí a legitimidade de políticas subvencionistas e protecionistas, como aquelas em vigor nos países desenvolvidos, como os EUA, a União Européia e o Japão
Políticas subvencionistas não são apenas irracionais do ponto de vista econômico, elas também trazem enorme prejuízo aos países mais pobres, inviabilizam sua participação no comércio internacional e os condena a uma eterna dependência econômica


11. Taxas sobre movimentos de capitais: são positivas ou até mesmo necessárias? 

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
“Colocar areia nas engrengagens do capital”; (a adoção de uma taxa internacional sobre movimentos de capitais foi, depois, condenada pelo próprio criador da medida, James Tobin)
Os países em desenvolvimento são importadores necessários de capitais e o novo imposto irá aumentar o custo dos empréstimos e de captação de recursos financeiros nos mercados


12. Livre-comércio e mercantilismo: o que é melhor para o crescimento econômico?

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
O livre-comércio sempre beneficia os mais poderosos, daí a necessidade de administrar politicamente os mercados e estabelecer políticas industriais
Mercados livres são funcionais para a modernização tecnológica, ganhos de oportunidade e distribuição de renda (via especialização produtiva), permitindo a livre circulação de fatores


Conclusões: os mitos e equívocos sobre a globalização

Antiglobalizadores:
Realidades da globalização
Um “outro mundo é possível”, não mais baseado no lucro e nos ganhos materiais, mas na solidariedade e na partilha; as empresas multinacionais impõem sua ditadura econômica aos povos do mundo, esgotam os recursos naturais e comprometem o meio ambiente
O “outro mundo possível” nunca foi formalizado no papel ou  apresentado em detalhes, na prática; os agentes econômicos diretos e os consumidores sabem melhor do que quaisquer governos como alocar recursos, poupança e investimentos produtivos


Nota final: espero não cansar muito meus opositores, que poderão responder aos poucos, se desejarem. (Duvido, porém, que apareçam candidatos; vale um livro, gratuíto, como oferta da casa...)

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de abril de 2006

1573. “A globalização e seus descontentes: um roteiro sintético dos equívocos”, Brasília, 7 abril, 2006, 6 p. Texto suporte para palestra no Uniceub, em ciclo de integração entre graduação e pós-graduação, que seria proferida no dia 19 de abril de 2006, com versão em PowerPoint. Palestra suspensa, alguns dias antes. Transformado em artigo, sob versão revista, e publicado no Espaço Acadêmico(ano VI, nº 61, junho 2006). Relação de Publicados n. 655.