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sábado, 11 de setembro de 2021

A diáspora brasileira - Taísa Szabatura e Vinícius Mendes (IstoÉ)

 A diáspora brasileira

Nunca tantos brasileiros foram morar no exterior: são 4,2 milhões só na última década. E como expressão do desalento com o Brasil, a maioria deles não têm planos de voltar
Taísa Szabatura e Vinícius Mendes 
IstoÉ, 10/09/21 - 09h30 - Atualizado em 10/09/21 - 12h09

“Dificilmente voltaremos”, é a frase mais comum de se ouvir de famílias brasileiras morando fora do País. Ela tem sido dita também porque muitas delas engrossam um dado histórico: o número de brasileiros morando no exterior nunca foi tão alto como agora, segundo levantamento feito pelo Itamaraty. Até o fim de 2020, 4,21 milhões de pessoas haviam deixado o Brasil — um aumento de 35% em relação a 2010, quando este número era de 3,12 milhões. Foi o caso de Adriana Tanzi, de 49 anos: ela não pensava em morar fora até meados de 2019, mesmo possuindo cidadania europeia. No entanto, quando o orçamento doméstico caiu, em meio à crise econômica, ela e o marido, o soldador Edson Monteiro, de 54, resolveram partir junto com a filha, Vitória, de nove anos, para a Itália. “No começo foi difícil.Nós não falamos o idioma e ainda veio a pandemia”, relata. Hoje, um ano e meio depois, a situação é mais tranquila: vivendo em Mântua, na Lombardia, Edson voltou a trabalhar e Adriana já está no processo de validação de seu diploma.

A psicóloga Monise Valzacchi, de 32 anos, por sua vez, foi ao lado do namorado, o nutricionista Felipe Jorge Melo, de 31, para a Austrália em setembro de 2014, quando o Brasil já estava em crise. O objetivo inicial era estudar inglês, mas eles acabaram ficando em busca de uma residência permanente na cidade de Perth, uma das maiores do país. O processo demorou, mas saiu no começo desse ano, quando eles, enfim, compraram uma casa. Agora estão esperando a primeira filha, que vai nascer em novembro. “Nunca imaginamos que teríamos condições de comprar um imóvel como o nosso por aqui, mas deu certo”, diz Monise. Já o futuro pai, engenheiro, não quer deixar mais a vida australiana. “Mesmo na hipótese de que tudo desse errado, faríamos o possível para não voltar. Desde que nós chegamos, temos o mesmo pensamento: não estamos aqui para passear”.

Destinos brasileiros
Para o antropólogo Igor Renó Machado, professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), o crescimento da presença brasileira no exterior se explica, principalmente, pela falta de perspectivas no País. Esse fenômeno tem se acentuado nos últimos anos. Pelo levantamento do Itamaraty, por exemplo, apenas entre 2018 e 2020, cerca de 625 mil pessoas deixaram o Brasil em direção a outros países — o que representa 14% do total de saídas nacionais em toda a década passada. “No início de 2010 havia até gente voltando. Mas, depois de 2016, quando as condições por aqui se deterioraram, começou uma saída violenta em busca de uma nova vida lá fora”, diz. Os Estados Unidos abrigam quase metade (42%) da população. Em números absolutos, trata-se de 1,77 milhão de pessoas.

No Canadá, a ida de brasileiros capacitados, em grande parte no setor de tecnologia, é até incentivada pelo governo. Foi esse chamado que atraiu o casal de desenvolvedores Bárbara Lourenço, de 28 anos, e Thiago de Lima Pacheco, de 27, por exemplo. Quando ele conseguiu um emprego na área em Montreal, no fim de 2019, os dois se casaram correndo para terem acesso ao visto canadense. Hoje, não querem voltar. “Aqui há segurança até para esperar um ônibus à noite”, justifica Bárbara. “Apesar disso, a saúde pública é mais burocrática. Eu prefiro o SUS”, confessa Thiago.

Mas o fenômeno ganhou mesmo força em Portugal. O país concedeu residência a 42,2 mil cidadãos do Brasil somente em 2020, segundo números oficiais. Hoje, 183,9 mil brasileiros — quase um terço do total de estrangeiros — vivem no país europeu. “O boom dessas chegadas aconteceu entre 2014 e 2018, quando elas triplicaram”, diz o advogado Felipe Tramujas, que, de Lisboa, ajuda brasileiros que buscam estabilidade em solo português. Neste período, porém, ele viu o perfil dos migrantes se transformar. “São pessoas já formadas e com filhos, sem contar o alto número de aposentados”, conta.

Um desses brasileiros é o executivo William Silva, de 33 anos. Ele mandou mais de 500 currículos até conseguir ser contratado por uma empresa em Lisboa, em 2019. “Eu vivia bem no Rio de Janeiro, mas a corrupção e a violência eram intransponíveis”, explica. A esposa, Bianca Costa, busca agora a revalidação do diploma, enquanto a filha, Júlia, de cinco anos, já está matriculada em uma escola pública. Nessa toada, o prefeito de Braga tem incentivado a migração brasileira como forma de lidar com o envelhecimento da população local. Logo após a eleição de Jair Bolsonaro, em 2018, ele escreveu um artigo que resumia esse acolhimento com um trocadilho: “Bem-vindos ao Braguil”.

https://istoe.com.br/a-diaspora-brasileira/