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sexta-feira, 20 de novembro de 2020

Eliana Cantanhede: “Não levamos nada“ na subordinação aos EUA : embaixador Mario Vilalva

 'Não levamos nada'

Elina Cantanhede

O Estado de S. Paulo, 20/11/2020

Mário Villalva: 'A diplomacia brasileira foi ingênua, amadora ou imprudente?'


Depois de ser alvo de todas as críticas e de o Brasil sofrer todo o desgaste, o presidente Jair Bolsonaro está prestes a reconhecer finalmente, talvez ainda hoje, a vitória de Joe Biden nos Estados Unidos. Desta vez, porém, os últimos não serão os primeiros, serão os últimos mesmo, para desconforto de diplomatas, militares, empresários, exportadores e analistas. Mas o "capitão" é o "capitão", o que fazer?

É agora que vai ficar mais evidente ainda a tragédia da política externa brasileira que, segundo o embaixador Mário Villalva, "jogou todas as fichas numa só cesta, transformou os EUA na única referência". Isso, destaca, "não combina com o nosso DNA, a nossa índole, a nossa tradição de política externa, que sempre foi ecumênica e universal".

Diplomata de carreira, ex-embaixador no Chile, Portugal e Alemanha, Villalva presidiu a Apex no início do governo Bolsonaro, mas saiu três meses depois, botando aboca no trombone contra o aparelhamento político. Ainda "na ativa", está licenciado e se soma a ex-chanceleres e a mentes brilhantes da história do Itamaraty na crítica à atual política externa.

Na sua opinião, Biden tem habilidade política, com 36 anos de Legislativo, e vai restabelecer a liderança dos EUA no mundo, não mudando tudo mecanicamente, nem na base do confronto e da agressão, mas sim conversando, articulando, negociando. E, claro, como qualquer líder que se preze, priorizando o interesse do seu País.

Ele, Biden, em algum momento vai olhar para o Brasil, "não com antagonismo, mas com pressões políticas legítimas para que o País mostre resultados no meio ambiente e volte a valorizar o multilateralismo". Não será fácil, porque Bolsonaro replica Donald Trump até contra OMS (Saúde), OMC (Comércio) e a própria ONU, mas o Brasil não tem o que perder, já que não ganhou nada com Trump: "o governo brasileiro foi extremamente solícito em tudo, o tempo todo, mas os americanos não cederam nada e extraíram o máximo que puderam".

Resumindo a longa lista de Villalva: suspensão de visto para americanos (sem reciprocidade), cessão de dados de brasileiros para o "Global Entry", desistir de um brasileiro para os EUA quebrarem a tradição e presidirem o BID, cota livre de tarifa para o trigo, acesso de carne de porco americano sem contrapartida para a carne bovina brasileira, desequilíbrio em etanol, aço e alumínio, abrir mão do tratamento diferenciado na OMC sem entrar na OCDE. E o Brasil nem mesmo saiu da lista negra dos EUA para propriedade intelectual...

"Não levamos nada", diz o embaixador, apontando o acordo de facilitação de comércio como repetição "bilaterizada" do que foi feito em bloco pela OMC em 2017. Além disso, "só serve para diminuir a burocracia, a papelada, e não representa redução de barreiras tarifárias e não-tarifárias, que é o que a gente precisa". Logo, "é uma política de enxuga-gelo", diz ele, que é diplomata. E de "engana trouxa", acrescento eu, que não sou.

Se houve avanço, foi em defesa, mas sem chegar aonde realmente interessa: acesso a financiamento, ou seja, a um naco dos US$ 140 bilhões dos EUA para o setor. E, diante da lista de concessões para lá e nenhum retorno para cá, Mário Villalva pergunta: "A diplomacia brasileira foi ingênua, amadora ou imprudente?" Vale acrescentar: E vai mudar?

Para Villalva, 44 anos de carreira, o Itamaraty "tem uma das melhores burocracias da República, com pessoas bem selecionadas, bem treinadas, que pensam o Brasil 24 horas por dia, mas não é suficiente ter um Boeing, é preciso um bom piloto". Que tal o atual piloto? Resposta: "Os resultados estão aí..." Não custa lembrar que "o piloto é o executor da política externa, mas o formulador é o presidente".

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COMENTARISTA DA RÁDIO ELDORADO, DA RÁDIO JORNAL E DO TELEJORNAL GLOBONEWS EM PAUTA

segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Consequências involuntárias da tragédia bolsonarista no Brasil, 2 - Paulo Roberto de Almeida

 Postagem do mês de junho. O que mudou de lá para cá?

Bem, na frente interna, a situação mudou bastante, no sentido da domesticação do autoritário presidente pelo Centrão, o que lhe garante não ser impichado, como mereceria, pelo menos por enquanto. 

Mas, como se disse várias vezes: "Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará" .

Na área da política externa, conhecemos a verdade, e ela é muito feia: submissão total a Trump, e aos EUA de modo geral.

Vou escrever uma nova obra sobre os últimos meses do Brasil bolsonarista. Continua a tragédia.

Paulo Roberto de Almeida


quarta-feira, 10 de junho de 2020

Consequências involuntárias da tragédia bolsonarista no Brasil - Paulo Roberto de Almeida

Consequências involuntárias da tragédia bolsonarista no Brasil

Diz a sabedoria popular que não há bem que sempre dure, nem há mal que nunca acabe. 
Toda e qualquer experiência humana, ou social, mesmo uma das mais horríveis e degradantes, como pode ser a delinquência política e a deterioração intelectual em nosso país, atualmente em curso, sempre pode, aliás deve, nos trazer modestos ensinamentos, e algumas infelizes lições, sobre o que deveríamos ter feito de acertado, e não fizemos, assim como sobre o que poderemos, ou que pelo menos deveríamos fazer de melhor da próxima vez.
Aprendemos uma variação do velho adágio segundo o qual o preço da liberdade é a eterna vigilância. Corrigindo: o preço da democracia é o constante esforço em não nos deixarmos arrastar em divisões sectárias em torno dessas querelas menores sustentadas em meras conquistas táticas, ao preço de uma perda de objetivos estratégicos, que significam, simplesmente, a derrocada do edifício democrático tão duramente construído contra ventos e marés ao longo das últimas três décadas.
Aprendemos a valorizar a unidade — pelo menos espero — das forças democráticas em torno de um patrimônio civilizatório que vem sendo atacado pelos novos bárbaros, que já conquistaram a praça forte, a despeito da indigência de suas propostas e das mentiras tão amplamente disseminadas (ou, mais provavelmente, por isso mesmo, a julgar pela mentalidade obtusa daqueles que os seguem de forma tão entusiasta).
Os bárbaros nos fizeram um favor — pelo menos espero — que é o de valorizar algumas pequenas coisas, que acabam sendo grandes em retrospecto: a importância da convergência de metas mais elementares que vantagens políticas secundárias, que vêm a ser a preservação do diálogo democrático entre nossas tribos até aqui desunidas e a união do conjunto de nossas forças dispersas em nome da simples sobrevivência de valores e princípios que estão na base de uma sociedade civilizada, oposta à peste negra do fascismo e do autoritarismo.
A vitória circunstancial e temporária — pelo menos espero — das forças bárbaras nos demonstra quão vã era a nossa ingênua crença na racionalidade das massas depois que o virus da divisão da nação já nos tinha sido inoculado pelos aderentes a crenças aparentemente opostas, mas inacreditavelmente similares em propósitos — a tal “revolução cultural” da reforma completa daqueles princípios e valores — e mecanismos: a promessa de um futuro melhor nas mãos de algum líder salvador que dá início a um novo ciclo de bajulação e servilismo. 
Uma das consequências involuntárias da presente tragédia  — pelo menos espero — pode ser um esforço de reflexão em torno dos nossos erros acumulados e da dolorosa busca de uma plataforma mínima de sobrevivência, até que uma nova acumulação de forças convergentes nos permita expulsar os novos bárbaros da cidadela, o que não poderá ser feito sem o convencimento de uma maioria de cidadãos complacentes com o regime danoso dos novos bárbaros.
Temos a nosso favor a bestialidade, a ignorância, a estupidez desses bárbaros, assim como a sua completa falta de visão sobre o futuro da nação. Temos de poder oferecer à cidadania — pelo menos espero — alguma razão para acreditar que um projeto iluminista e humanista passa antes, é melhor, do que o empreendimento de destruição prometido e implementado pelos novos bárbaros, ainda que estes possam contar, momentaneamente, com a ajuda da força e do dinheiro. 
Nem sempre a autoridade do argumento prevalece sobre o argumento da autoridade, mas, em princípio, ideias são mais poderosas que as armas, e em muitos casos a pluma pode vencer o poder da espada.
Pelo menos espero...
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 10 de junho de 2020