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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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quinta-feira, 23 de abril de 2020

O Brasil de volta ao passado petista - Ricardo Bergamini; Robson Bonin

Aparentemente, como argumenta Ricardo Bergamini, o governo Bolsonaro está de volta aos governos petistas, mas não só no que toca às políticas econômicas, mas igualmente no campo das trapaças políticas e possivelmente na corrupção também.
Paulo Roberto de Almeida 

O Brasil de volta ao passado petista
Prezados Senhores.
Vitória das teses da esquerda, qual seja: responsabilidade e austeridade fiscal é bobagem. Pela milésima vez, fim do sonho liberal no Brasil.
É triste ver um profissional de renome internacional ser tão humilhado e desprezado como foi o Paulo Guedes, nesse plano maluco. Espero que não se humilhe mais e retorne o caminho da roça.
A parte saudável será a volta de nossos velhos amigos liberais ao debate adulto e maduro do pensamento liberal, isento de masturbação mental ideológica.
Vitória ao pensamento liberal: liberdade, igualdade, fraternidade e soberania dos povos.
Ricardo Bergamini 


Bolsonaro abandona Guedes para evitar terminar como Temer
Depois de o coronavírus implodir a pauta do Posto Ipiranga, presidente se move para dar sobrevida à agenda de governo na crise do coronavírus 
Revista Veja, 23 abril 2020

Depois de ouvir o plano do chefe da Casa Civil para colocar o governo no comando de uma espécie de novo PAC, com o orçamento estatal motorizando a economia a partir de grandes obras, Bolsonaro determinou: “Vamos em frente!” Adriano Machado/Reuters
A história do governo de Jair Bolsonaro começou a mudar a partir desta semana. Na crônica política, a quarta-feira será lembrada, no capítulo econômico, como o dia em que o presidente perdeu a fé no Posto Ipiranga.
Paulo Guedes foi atropelado por Walter Braga Netto. Depois de ouvir o plano do chefe da Casa Civil para colocar o governo no comando de uma espécie de novo PAC, com o orçamento estatal motorizando a economia a partir de grandes obras, Bolsonaro determinou: “Vamos em frente!” Antes de mais nada, fica aqui o registro de que Guedes considera a ideia uma maluquice. Espera mostrar isso ao presidente nos próximos dias, convencendo-o a abandonar a tal solução mágica. É a porta estreita de São Lucas. Não há caminho fácil.
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Guedes, que defendia a retomada econômica a partir da força privada, viu o furacão passar sem conseguir se mover. A reunião ocorrida nesta quarta, no Planalto, mudou a agenda do governo e deu novo sentido à pauta econômica. É como se derrubassem as bombas de combustível do posto para instalar no lugar uma loja de material de construção.
“Neste momento de crise, tocar a agenda de retomada do país com o mercado, apostando na iniciativa privada, seria caminhar lento demais para a normalidade. Por isso, o Estado deve ser o tomador de risco nos momentos de grave crise”, explica um auxiliar do presidente.
Da agenda liberal, o país migrará a partir de agora para o que há de mais martelado – e mais perigoso — na tecnologia desenvolvimentista — isso mesmo, caro leitor bolsonarista, aquele bicho feio dos governos do PT.
Com a emergência global do coronavírus justificando medidas drásticas, o governo abrirá, se tudo correr como o plano atual, um período de gastos bilionários e de discursos por menos controles, menos regulação, menos licenciamentos…
“O presidente precisava comunicar ao país que isso estava sendo preparado pelo governo. Daqui para frente, vamos discutir tudo dentro dos ministérios”, disse ao Radar um auxiliar de Bolsonaro. “Será um momento de mexer em marcos regulatórios, um momento de simplificar contratações, licenças, tudo para acelerar a retomada”, complementou.
Bolsonaro topou a empreitada na hora, porque esse discurso fala diretamente ao seu coração político. Bateu na alma. Com a agenda desenganada pela pandemia, acharam uma saída, um discurso diferente para o bolsonarismo tentar variar um pouco a fórmula já cansada do golpe, golpe, golpe…
Cada ministério foi acionado a apresentar uma lista de obras paradas e projetos que poderão fazer parte do plano. A ideia de retomar a construção de eixos de infraestrutura em todas as frentes – rodoviário, ferroviário, aquaviário – voltará com força.
Obras que proporcionem impacto imediato no emprego e renda serão prioridade, mas outros empreendimentos complexos, hoje travados por legislações ou em estudo serão previstos.
O governo diz que fará tudo com mais eficiência, responsabilidade e controle que as gestões petistas. Precisará convencer a audiência de que tocar grandes obras com menos regulação, menos controle e menos licenças resultará em algo melhor que o estrago petista.
Idealizado pela ala política da Esplanada, o plano oferece a Bolsonaro um recomeço no governo que ele mesmo admitiu outro dia parecer terminar antes da hora. Em uma entrevista, ele citou Michel Temer, que liderava uma agenda reformista até o escândalo da delação da J&F explodir, transformando os dias seguintes numa luta pela sobrevivência. Bolsonaro, como Temer, também teria dias para lutar pela sobrevivência do governo até 2022, se continuasse na pauta de Guedes. Preferiu virar a mesa e apostar num plano de gastos públicos formatado em 24 horas para reverter os estragos econômicos da pandemia. Se vai funcionar, é outra história. Guedes, como dito no início do texto, não acredita que vá. A conferir.

[Agora a visão da esquerda:]

Plano Marshall' de Braga Netto enterra a era Paulo Guedes na economia

General determina investimentos de R$ 300 bilhões em infraestrutura. Derrotado, Guedes fala que é a volta do 'modelo Dilma Rousseff'. Chamado de pró-Brasil, o programa, que chegou a ser apelidado inicialmente de Plano Marshall brasileiro, prevê um incremento de R$ 300 bilhões – R$ 250 bilhões em concessões e parceria público privada e outros R$ 50 bilhões de investimento públicos. A coordenação será do ministro Braga Netto.

247 - 23 de abril de 2020


 O governo federal decidiu retomar o Programa de Aceleração do Crescimento, que marcou a gestão da ex-presidente Dilma Rousseff, renomeando o mesmo de 'Pró-Brasil'. Este novo 'Plano Marshall' representa uma derrota decisiva para o modelo neoliberal de Paulo Guedes, que é incapaz de oferecer saídas para a crise econômica. O novo PAC será conduzido pelo general Braga Netto, que assume o papel de homem forte da economia. O programa Pró-Brasil, que o governo anuncia como a panaceia para a recuperação econômica do país após a pandemia do coronavírus, foi lançado nesta quarta-feira (22) pelo ministro da Casa Civil, general Braga Netto. O ministro da Economia, Paulo Guedes não participou do anúncio.  Ele e sua equipe divergem do plano por implicar o aumento do gasto público.

Reportagem de O Estado de São Paulo informa que Braga Netto falou sobre a aceitação unânime do programa em todos os ministérios, mas a ausência de Paulo Guedes é um sinal das divergências. Além disso, não houve anúncio do volume de recursos públicos que pode ser desembolsado.

A primeira reunião de trabalho será na próxima sexta-feira, 24, quando cada ministro vai levar as suas propostas. A fase de estruturação será feita entre maio a julho. Os detalhes dos projetos serão feitos em setembro para a implantação a partir de outubro.

sábado, 4 de janeiro de 2020

Revisando a Carta ao Povo Brasileiro de Lula (2002): novas revelações

Então a "Carta ao Povo Brasileiro", que Lula divulgou em meados de 2002 era, na verdade, dirigida a um "povo especial"? 
Quero dizer, ela se dirigia mais aos grandes capitalistas que iriam sustentar o "governo popular" do carismático líder sindicalista do que propriamente ao povinho miúdo das políticas assistencialistas?
É o que transparece desta matéria, que promete revisar algumas das suposições que tínhamos, em 2002, a respeito desse importante documento que praticamente carimbou a vitória de Lula nas eleições de outubro de 2002.
Lembro-me perfeitamente de grandes banqueiros e capitalistas brasileiros, reunidos para um daqueles grandes encontros de plutocratas nos EUA – eu estava então servindo na embaixada em Washington –, e que praticamente selaram a vitória de Lula: eles passaram o tempo todo, numa reunião em New York em agosto de 2002, fazendo elogios a Lula, ignorando totalmente o candidato Serra, do PSDB, e convencendo seus interlocutores americanos, preocupados com a vitória de um "esquerdista socialista" nas eleições de outubro, que Lula não era nada daquilo que diziam, e que ele seria um bom candidato e um presidente perfeitamente aceitável para a plutocracia americana.
Esta matéria deixa a entender porque.
Eu sempre fiquei intrigado pela súbita, total e completa conversão da plutocracia brasileira – grandes capitalistas e banqueiros conhecidos – ao candidato "socialista" e procurei explicar essa conversão num texto que escrevi praticamente no imediato seguimento da divulgação dessa Carta, e muito antes da vitória de Lula, mas que só desvendei muito anos depois: 
“Lula e as relações internacionais do Brasil”, Washington, 24 junho 2002, 6 pp. Comentários aos aspectos de relações internacionais da “Carta ao Povo Brasileiro”, apresentada como resultado da conferência nacional sobre programa do PT, pelo candidato Luis Inácio Lula da Silva. Divulgado no blog Diplomatizzando (22/10/2017; link: https://diplomatizzando.blogspot.com.br/2017/10/carta-ao-povo-brasileiro-lula-2002.html).
Num texto de abril de 2004, e jamais divulgado, eu fazia um comentário à Carta e às novas posições econômicas de Lula, que divulgo agora, ao final desta postagem.
Pouco depois, ao se completarem dois anos desde a divulgação da Carta ao Povo Brasileiro, eu fazia uma análise daquele "documento de ruptura" num artigo que foi, sim, publicado em meu nome, e novamente divulgado em 2016, como registro abaixo: 


1294. “Dois anos de ‘Carta ao Povo Brasileiro’: De volta a um documento de ruptura”, Brasília, 27 junho 2004, 16 p. Análise do discurso argumentativo desse documento de campanha do candidato Lula (06/2002), com base em sua lógica intrínseca, sem tentativa de balanço em relação ao conteúdo efetivo. Publicado no Espaço Acadêmico (n. 38, jul. 2004). Relação de Publicados n. 474. Postado novamente no blog Diplomatizzando, em 4/04/2016 (link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/04/a-carta-ao-povo-brasileiro-de-2002.html); disseminado no Facebook (https://www.facebook.com/paulobooks/posts/1126550154075100).

Creio que a história revisitada sempre nos traz algumas precisões sobre o passado.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4 de janeiro de 2020

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LAVA-JATO

O dedo de Emilio Odebrecht na carta mais importante de Lula

Por Lauro Jardim
02/01/2020 • 08:03

Lula e Emílio Odebrecht
A reportagem de capa da revista piauí que chega amanhã às bancas, "História de uma amizade — como Emílio Odebrecht se aproximou de Lula e o que aconteceu depois", escrita por Malu Gaspar, traz uma revelação sobre a célebre "Carta ao povo brasileiro": o texto com o qual Lula pretendeu acalmar o establishment econômico na eleição de 2002 teve o dedo do pai de Marcelo Odebrecht. Escreve Malu:
— Em meio a intenções genéricas, um item em particular indicava a digital da Odebrecht: a criação de uma secretaria de Comércio Exterior, ligada diretamente à Presidência da República, com a intenção de facilitar o financiamento a obras de infraestrutura e exportação de serviços. 
A capa de piauí é um trecho inédito do livro que a autora do excepcional "Tudo ou Nada — a verdadeira história do grupo X" está escrevendo sobre a Odebrecht e que será lançado em meados do ano pela Companhia das Letras.


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Comentário PRA, de abril de 2004, inédito até o momento: 

Puxando pela memória

Paulo Roberto de Almeida
7 de abril de 2004

Nosso povo constata com pesar e indignação que a economia não cresceu e está muito mais vulnerável, a soberania do país ficou em grande parte comprometida, a corrupção continua alta e, principalmente, a crise social e a insegurança tornaram-se assustadoras.” Triste quadro, não é? Mas a frase não tem, ou não tinha, a intenção de descrever a atual situação de incertezas e de baixo crescimento.
Ela data de 22 de junho de 2002 e visava o governo de FHC. Seu autor?: Luiz Inácio Lula da Silva, na “Carta ao Povo Brasileiro”. Que voltas que o mundo dá, não é?
O povo brasileiro quer mudar para valer. Quer trilhar o caminho da redução de nossa vulnerabilidade externa pelo esforço conjugado de exportar mais e de criar um amplo mercado interno de consumo de massas.” Mudou para valer? Estamos menos vulveráveis? Sim, aumentamos nossas exportações, mas nisso o governo atual leva pouco crédito: depois da desvalorização provocada pelo pânico eleitoral, o câmbio valorizou-se em 2003, sendo a boa situação da economia mundial e a crescente demanda chinesa por importações os reais responsáveis pelo bom desempenho exportador. A dívida externa aumentou e a interna seguiu atrás. Quanto ao amplo mercado interno, só se for para calmantes e anti-depressivos, pois a massa real de rendimentos caiu 7,3% em 2003.
O nervosismo dos mercados e a especulação não nascem das eleições. Nascem, sim, da graves vulnerabilidades estruturais da economia apresentadas pelo governo, de modo totalitário, como o único caminho possível para o Brasil. Na verdade, há diversos países estáveis e competitivos no mundo que adotaram outras alternativas.” Parece que foi hoje, não é mesmo? Pois o governo do PT se eximiu, em 2002 ou atualmente, de dizer, concretamente, quais eram esses caminhos alternativos, sob risco de pensarmos que a carta-compromisso era mera demagogia. Quais seriam esses países? Índia, China, Rússia? Eles estão mesmo melhor do que o Brasil? Ou será que Lula queria se referir aos Estados Unidos, à Inglaterra, à França, democracias avançadas, com bem estar pleno para suas populações? Mas esses países são neoliberais, para dizer o minimo.
Será que é a esse modelo a que Lula se referia? Eu, por mim, penso que sim, e a política do Dr. Palocci é totalmente consistente com as receitas do G7 em matéria de responsabilidade econômica. Então, a alternativa do “new” PT é o neoliberalismo? Essa orientação não casa muito bem com a política externa terceiro-mundista que ele vem conduzindo, para alegria e satisfação do “old” PT, que ainda não se converteu ao sensato realismo da equipe econômica. Falando de política externa, eis o que Lula dizia em 2002:
“Nossa política externa deve ser reorientada para esse imenso desafio de promover nossos interesses comerciais e remover graves obstáculos impostos pelos países mais ricos às nações em desenvolvimento.” Não parece, pois que ela desdenha os mercados e os investimentos americanos, parecendo preferir os dos ultra-protecionistas europeus, que só nos compram produtos primários.
E o que Lula propunha na frente interna? “Superando a nossa vulnerabilidade externa, poderemos reduzir de forma sustentada a taxa de juros. Poderemos recuperar a capacidade de investimento público tão importante para alavancar o crescimento econômico.” Não ocorreu a redução e os investimentos, portanto, não foram sustentados, o que deixou o crescimento irrealizado. Mas aqui ocorreu um erro de avaliação. A taxa de juros depende das necessidades de financiamento do setor público, que se abastece no mercado interno. Se Lula quisesse mesmo reduzir a vulnerabilidade externa, deveria começar propondo um superávit primário de 5 ou 6% do PIB, isto é, o governo não precisaria ficar tomando dinheiro no mercado e faria com que os banqueiros deixassem de ser “gigolôs” do Estado. Os juros baixariam rapidamente. Ele pode fazer isso?
Lula tinha consciência, em 2002, de que pelo menos deveria manter a política de responsabilidade fiscal de FHC, mas à sua maneira: “Queremos equilíbrio fiscal para crescer e não apenas para prestar contas aos nossos credores.” Excelente: é o que todo mundo quer. Mas o PT tem a receita mágica do equilíbrio fiscal com crescimento? Se tem, já estava na hora de dizer, pois estamos há anos atolados no desequilíbrio e no baixo crescimento e, até aqui, prestando contas aos credores externos. Onde estão os gênios econômicos do PT? Escondidos de vergonha? Assim fica dificil ganhar as próximas eleições e as de 2006: se eles guardam suas receitas geniais para depois, correm o risco de serem acusados de demagogia eleitoreira e de inconsistência governamental.
Precisamos de uma nova “Carta ao Povo Brasileiro”, que reafirme as bases do crescimento responsável e que diga que a política econômica é essa mesma que está aí. O Dr. Palocci agradece. Nós também, pois saberemos que o PT adotou um novo manual de economia política, que nos livrará, finalmente, de novas promessas de rupturas…

1229. “Puxando pela memória”, Brasília, 20 março 2004, 3 p. Comentário sobre a Carta ao Povo Brasileiro, emitida por Lula em junho de 2002. Inédito.