Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
segunda-feira, 24 de março de 2014
Industria e politicas industriais: algum cuidado especial? - SamuelPessoa (FSP)
terça-feira, 9 de agosto de 2011
Tudo o que voce sempre quis saber sobre o Brasil Menor, e nao tinha a quem perguntar...
Ops, acho que teve um erro no título, mas não sei bem qual seja. Depois vemos isso.
Paulo Roberto de Almeida
BRASIL MAIOR - PERGUNTAS FREQUENTES
http://www.brasilmaior.mdic.gov.br/oplano/perguntas-frequentes/
1. O Plano Brasil Maior é uma continuidade da PDP (Política de Desenvolvimento Produtivo), lançada em 2008?
Sim, é a continuidade da política governamental de incentivo e fortalecimento à indústria nacional. A novidade é que Plano Brasil Maior é mais abrangente e, além da indústria, engloba ações e medidas para o incentivo ao comércio exterior e ao setor de comércio e serviços.
2. Por que a desoneração da folha de pagamento não atingiu todos os setores produtivos?
Nesse primeiro momento, os segmentos de confecções, calçados, móveis e software serão os beneficiados por serem setores intensivos em mão de obra e estarem sofrendo com a concorrência de importações desleais.
3. O Plano Brasil Maior pretende utilizar as compras governamentais como incentivo à empresa nacional. O que isso significa?
A Lei nº 12.349/2010 institui margem de preferência de até 25% nos processos de licitação para produtos manufaturados e serviços nacionais que atendam às normas técnicas brasileiras conforme critérios de geração de emprego e renda e de desenvolvimento e inovação tecnológica. É uma maneira de incentivarmos a produção nacional, garantindo que o produto a ser adquirido pelo governo seja de uma empresa genuinamente brasileira. Vários países possuem mecanismo semelhante, como os Estados Unidos, que utilizam o Buy American Act.
4. Quais incentivos o governo pretende oferecer para convencer as empresas a investirem em inovação?
Uma série de medidas está sendo anunciada e outras serão definidas nos próximos meses para incentivo à inovação. Além da desoneração da folha de pagamento para quatro segmentos, o BNDES irá oferecer R$ 7 bilhões em crédito para empresas que queiram investir em inovação. Outros benefícios, como desoneração tributária para empresas que investirem em processos de inovação, também estarão disponíveis para as empresas brasileiras.
5. Quais medidas do plano poderão compensar as perdas dos exportadores com apreciação cambial do real e a elevada taxa de juros do país?
O Brasil Maior irá oferecer medidas para redução do custo das exportações, como a instituição do Reintegro, a partir do qual será possível a devolução de até 4% do valor exportado em manufaturados. Outra medida será a ampliação do ressarcimento de créditos aos exportadores, que permitirá às empresas com escrituração fiscal fazerem o processamento automático e receberem em ate 60 dias. Também estamos criando linhas de financiamento específicas para o incentivo às exportações, inclusive para micro, pequenas e médias empresas, além de definir ações para a simplificação do processo exportador que facilitam e diminuem os custos para o exportador.
6. Por que a criação do Exim Brasil não consta do Plano Brasil Maior?
A criação da Agência de Crédito à Exportação do Brasil S.A (EXIM Brasil), uma agência de crédito à exportação que vai centralizar e ampliar os esforços do governo no apoio ao setor exportador, foi anunciada pelo governo em 2010 e continua em discussão porque envolve muitas definições e será lançado no momento oportuno. Ainda não temos uma data prevista.
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BRASIL MAIOR - RESUMO DE MEDIDAS
http://www.brasilmaior.mdic.gov.br/oplano/medidas/comercio-exterior/
Comércio Exterior
Desoneração das exportações
• Instituição do Reintegra:
- Devolução ao exportador de bens industrializados de 3% sobre valor exportado.
• Ampliar o ressarcimento de créditos aos exportadores:
- Mais agilidade aos pedidos de ressarcimento no valor de R$ 19 bilhões
- Processamento automático dos pedidos de ressarcimento e pagamento em 60 dias a empresas com escrituração fiscal digital, a partir de outubro de 2011.
- Escrituração fiscal digital obrigatória, a partir de março de 2012.
Defesa comercial
• Intensificação da defesa comercial: antidumping, salvaguardas e medidas compensatórias:
- Redução de prazos: de 15 para 10 meses (investigação) e de 240 para 120 dias (aplicação de direito provisório).
• Combate à circunvenção:
- Extensão de direitos antidumping ou de medidas compensatórias a importações cujo objetivo seja reduzir a eficácia de medidas de defesa comercial em vigor.
• Combate à falsa declaração de origem:
- Indeferimento da licença de importação no caso de falsa declaração de origem, após investigação.
• Combate a preços subfaturados:
- Fortalecimento da fiscalização administrativa dos preços das importações, para identificação de casos de subfaturamento.
• Aperfeiçoamento da estrutura tarifária do Imposto de Importação com foco na Política:
- Apoiar, no âmbito do Mercosul, a proposta de criação de mecanismo para permitir aumento do imposto de importação.
• Aumento da exigência de certificação compulsória:
- Instituição (ou ampliação) de tratamento administrativo para importações de produtos sujeitos à certificação compulsória e fortalecimento do controle aduaneiro desses produtos, mediante cooperação entre Inmetro, Secex e Receita Federal.
- 150 novos servidores (Inmetro)
• Fortalecimento do combate a importações ilegais:
- Acordo de cooperação MJ-MDIC para combater a violação de propriedade industrial e de certificação compulsória
• Suspensão de ex-tarifário para máquinas e equipamentos usados:
- Revisão da Resolução CAMEX suspendendo a concessão de ex-tarifário para bens usados.
• Quadruplicar o número de investigadores de defesa comercial:
- Ampliar de 30 para 120 o número de investigadores de defesa comercial.
Financiamento e garantia para exportações
• Criação de Fundo de Financiamento à Exportação de MPME – Proex Financiamento:
- Fundo de natureza privada criado no BB para empresas com faturamento de até R$ 60 milhões.
- A União é o principal cotista (aporte inicial), mas outras instituições poderão fazer parte do fundo.
- Alimentado com os retornos futuros do Proex Financiamento.
- Aprovação na alçada do BB.
- Seguro de crédito à exportação/FGE: sistema informatizado para emissão de apólice on line BB ou BNDES.
• Enquadramento automático Proex Equalização:
- Definição de spreads de referência que terão aprovação automática nas exportações de bens e serviços.
- Empresas com faturamento de R$ 60 a R$ 600 milhões continuarão com condições de financiamento equiparadas ao Proex Financiamento.
• FGE limite rotativo instituições financeiras – países de maior risco:
- Fundo de Garantia à Exportação com limite de US$ 50 milhões ao ano para exportação de bens manufaturados.
- Pagamento do financiamento abre saldo para novas operações
Promoção comercial
• Entrada em vigor do Ata-Carnet:
- Facilitação da circulação dos bens em regime de admissão temporária (sem a incidência de tributos).
• Estratégia Nacional de Exportações:
- Adoção de estratégia de promoção comercial por produtos/serviços prioritários em mercados selecionados e adoção dos Mapas de Comex por Estado.
sexta-feira, 5 de agosto de 2011
Brasil Maior? Inteligencia Menor? - vamos fazer as contas...
Empresas do setor de confecções de SC dizem que a desoneração tributária proposta pelo governo -- de zerar os recolhimentos para o INSS, atualmente de 20% da folha salarial -- que será compensada por uma nova contribuição de 1,5% sobre o faturamento, redundará, ao fim e ao cabo, em uma redução de menos de 1 (UM!)% da carga tributária total suportada pelas empresas. Ou seja, pouco mais do que nada.
Os empresários ainda não se convenceram de que o governo é seu inimigo...
Paulo Roberto de Almeida
Gastança e competitividade
Rolf Kuntz
O Estado de S.Paulo, 3 de agosto de 2011
O governo confirmou mais uma vez sua opção pela gastança improdutiva, em prejuízo da competitividade, do crescimento industrial e de um desempenho econômico semelhante ao dos emergentes mais dinâmicos. A política industrial anunciada pela presidente Dilma Rousseff nem chega a ser um blefe. A medida aparentemente mais audaciosa, a desoneração da folha de salários, será apenas um teste aplicado a quatro setores – confecções, calçados, móveis e software – até dezembro do próximo ano. Dirigentes dessas indústrias podem até aplaudir o governo, porque devem receber uma ajuda para sair do sufoco. Os da indústria automobilística também deverão ficar satisfeitos, se o prometido regime automotivo reeditar os velhos acordos setoriais, financiados por muitos para vantagem de algumas empresas e algumas categorias profissionais. Mas os novos benefícios ainda estão em estudo, segundo informação divulgada no site da Presidência da República. Também esse detalhe mostra como foi preparado o pacotinho.
Prometida há meses, a política industrial só foi lançada nesta terça-feira porque a presidente Dilma Rousseff insistiu em evitar um novo adiamento. Inventou-se um nome, “Plano Brasil Maior”, e improvisaram-se algumas medidas mal ajambradas.
Ainda faltava acordo, obviamente, sobre a desoneração da folha de pagamento. O ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, falou muitas vezes sobre o assunto, desde os primeiros meses do governo, mas os ministros envolvidos no debate nunca formularam completamente a mudança. Há poucos dias o ministro da Previdência, Garibaldi Alves Filho, ainda se mostrou preocupado com a perspectiva de perder arrecadação. Nesta terça, no entanto, ele se declarou tranquilo, diante da promessa do ministro da Fazenda de cobrir qualquer diferença. Qual a perda prevista? Não está calculada, segundo Garibaldi Alves Filho. De qualquer forma, ele cochilou na cerimônia.
A desoneração tributária custará R$ 25 bilhões em dois anos, informou o Ministério do Desenvolvimento. É um cálculo estranho, tanto pelo prazo quanto pelo valor, porque parte das medidas ainda nem foi definida. Até a palavra “desoneração” é obscura, porque parte dos benefícios prometidos vai depender simplesmente do cumprimento de obrigações já assumidas pelo governo – como o pagamento de créditos fiscais acumulados em vários anos pelas empresas. Os créditos em atraso são estimados em cerca de R$ 25 bilhões, mas falta saber se esse dinheiro será restituído nos próximos dois anos. A isso será preciso somar o corte das contribuições previdenciárias dos setores selecionados e outras vantagens menores incluídas no pacote. O Tesouro terá de passar US$ 1,3 bilhão por ano à Previdência, segundo o ministro Pimentel.
Se o governo cumprir todas as promessas, terá alguma dificuldade para alcançar a meta fiscal do próximo ano – especialmente se a economia brasileira perder impulso por causa do quadro internacional. As limitações fiscais obviamente explicam a timidez da impropriamente chamada nova política industrial. Mas essas limitações decorrem da vocação do governo para a gastança e da rigidez do Orçamento federal, um problema cada vez mais grave. A arrecadação continua crescendo em ritmo acelerado. De janeiro a junho foi 20,3% maior do que um ano antes, em termos nominais. Mas a despesa continua a elevar-se muito mais que a quantidade e a qualidade dos serviços.
A rigidez do Orçamento e a incompetência na gestão federal – mais uma vez comprovada pela execução deficiente das obras da Copa – são os principais obstáculos a uma política efetiva de competitividade. Empresários voltam da China encantados com os investimentos em infraestrutura, mas são incapazes de pressionar o governo para ser mais eficiente no gasto, na mobilização de capitais privados e no combate à corrupção (a bandalheira nos Transportes, por exemplo, atrapalha a competitividade).
A política monetária, alvo preferencial dos empresários, foi insuficiente, até agora, para esfriar a demanda. Não basta olhar só para a desaceleração da indústria. A produção nacional perdeu impulso, mas a importação continuou crescendo. De janeiro a junho (último dado), a indústria de bens intermediários produziu 1,2% mais que no primeiro semestre de 2010. A de bens de consumo, 0,6% mais. De janeiro a julho, o País gastou 24,9% mais que um ano antes com a importação de matérias-primas e bens intermediários e 31,9% mais com as compras de bens de consumo. Câmbio é importante, mas é só uma parte do problema. Quanto aos juros, estão vinculados à questão fiscal. Além disso, o desajuste cambial aumentará, se o combate à inflação for relaxado e se ampliar o descompasso entre preços internos e externos.
Não se faz política de competitividade com meia dúzia de remendos e um pouco mais de proteção. O assunto é mais sério e uma resposta eficiente depende, em primeiro lugar, de um compromisso mais firme do governo com a seriedade.
quinta-feira, 4 de agosto de 2011
Pacote industrial decepciona - editorial Estadao
Editorial - O Estado de S.Paulo
03 de agosto de 2011
Corajoso, ousado e audaz foram os adjetivos impropriamente escolhidos pelo ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, para qualificar a política industrial lançada nessa terça-feira pela presidente Dilma Rousseff. Bem ao contrário, a política industrial anunciada pela presidente Dilma Rousseff é caracterizada principalmente pela timidez das medidas fiscais, algumas provisórias e até em regime de teste.
O pacote inclui políticas de apoio setorial já testadas e já reprovadas em outras circunstâncias, como a concessão de benefícios ao setor automobilístico em troca de investimentos, inovação tecnológica e geração de empregos. Além de tudo, o chamado Plano Brasil Maior tem um forte viés defensivo, embora o real desafio para o produtor nacional seja competir em todos os mercados. Enfrentar o concorrente estrangeiro no mercado interno é apenas uma parte do problema - agravada pela forte perda de competitividade num cenário global especialmente desfavorável.
A desoneração da folha de pagamentos foi apresentada como experiência piloto por tempo limitado - até dezembro de 2012 - e beneficiará poucos setores. O material divulgado pelo Palácio do Planalto e pelo Ministério do Desenvolvimento menciona somente as indústrias de confecções, calçados, móveis e software. Os quatro segmentos foram escolhidos como representativos dos setores com uso intensivo de mão de obra. Como contrapartida, será cobrada uma contribuição sobre o faturamento, com alíquota "a partir de 1,5% de acordo com o setor". O governo se absteve de maiores esclarecimentos. Se houver perdas para a Previdência, o Tesouro cuidará da compensação.
A timidez é ostensiva em todo o pacote. A redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) cobrado nas compras de máquinas e equipamentos, materiais de construção, caminhões e veículos comerciais leves será estendida por 12 meses. Ou seja, um incentivo já em vigor será simplesmente prorrogado, sem se tornar um componente de uma política industrial de longo prazo. Mas também isso é facilmente explicável: política industrial ou de competitividade, no Brasil, é força de expressão.
A desoneração de exportações, tal como apresentada, é quase uma brincadeira. O governo promete apressar o pagamento de créditos devidos a exportadores e acumulados há vários anos. Essa dívida equivale a uns R$ 24 bilhões e as empresas têm levado até cinco anos para receber o dinheiro - quando conseguem vencer os obstáculos burocráticos. Em outras palavras, cumprir a obrigação de pagar dívidas virou item de política industrial. As novas bondades incluirão "maior agilidade" no atendimento aos 116 maiores exportadores.
Mas o pacote inclui um mimo adicional - a restituição de 0,5% do valor da exportação de manufaturados a empresas até agora sem direito à recuperação de impostos pagos em etapas anteriores da produção. A presidente da República poderá elevar a alíquota a até 4%. O benefício, avisa o governo, é compatível com as normas internacionais. O aviso é feito, obviamente, porque o governo se julga exposto à contestação.
As medidas para o setor automobilístico "ainda estão em estudo", segundo a informação oficial, mas a indústria deverá atender a certas condições para merecer o benefício. Políticas desse tipo já foram tentadas e resultaram mais em privilégios do que em benefícios para o País.
O resto é pr0messa de crédito por meio de bancos oficiais. Nos últimos anos, os bancos oficiais foram usados amplamente para beneficiar empresas estatais e grandes companhias privadas escolhidas arbitrariamente.
A política defensiva inclui medidas normais de política comercial, até agora mal aplicadas por incompetência administrativa. Trata-se, mais uma vez, de cumprir a obrigação. Além disso, será concedida preferência de preço de até 25% a empresas brasileiras, em certas concorrências. Muito melhor e mais seguro para todos seria adotar uma efetiva política de competitividade - algo mais sério que o Plano Brasil Maior.
Mas isso envolveria mudanças fiscais para valer - com redução da gastança - e melhor aplicação do dinheiro público. Tudo isso está fora de cogitação.
sábado, 4 de junho de 2011
Deterioracao tecnologica da industria brasileira
Roberto Nicolsky
O Globo, 4/06/2011
A competência tecnológica relativa de uma economia é avaliada principalmente pela qualidade do seu comércio exterior, ou seja, pelo seu desempenho nas relações com outras economias mais ou menos competitivas segundo a intensidade de tecnologia contida nos produtos. Esse critério foi estabelecido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico com base na distinção de níveis de intensidade tecnológica. Alta intensidade tecnológica corresponde ao segmento de produtos com elevada agregação de valor pela incorporação de inovações tecnológicas; média-alta intensidade tecnológica refere-se ao segmento dos produtos que, embora tenham valor agregado expressivo, alcançam índices inferiores; média-baixa reúne produtos bem mais simples, com pouca elaboração; baixa intensidade tecnológica designa produtos em que a inovação tecnológica incorporada tem pouca relevância; e os não industriais referem-se a produtos in natura. Assim, o perfil do comércio exterior torna-se um indicador expressivo da competência tecnológica relativa de uma economia em incorporar valor a seus produtos e processos através da geração de inovações.
Com base nesses conceitos, vê-se que o desempenho da economia não tem sido positivo. Temos tido um crescimento da produção industrial acompanhando parcialmente a expansão quase explosiva do mercado interno. Por outro lado, vemos que nossa competitividade em relação a países emergentes tem enfraquecido, resultando que esses países, especialmente a China, aproveitam muito mais a expansão do nosso PIB e mercado interno.
Considerando o primeiro trimestre de cada ano entre 2006 e 2011, observamos que, no segmento de média-alta intensidade tecnológica, que abrange as indústrias química, de equipamentos mecânicos e elétricos e de veículos rodoviários e ferroviários, fornecedoras de outras indústrias e, portanto, estratégicas para o desenvolvimento, a exportação brasileira cresceu 25%, alcançando US$9,1 bilhões, o que poderia indicar um bom desempenho. Entretanto, a importação explodiu, apresentando crescimento de 173%. O resultado do balanço tornou-se altamente deficitário, com saldo negativo de US$9,9 bilhões no último trimestre. Nos produtos de alta intensidade tecnológica — aviões, medicamentos, informática, telecomunicação e equipamentos médicos — as exportações do primeiro trimestre de 2011 totalizaram US$1,9 bilhão, com uma queda de 11%, enquanto as importações cresceram 86%, gerando um déficit de US$6,9 bilhões.
De que maneira o comércio exterior brasileiro compensou esses déficits? Exportando produtos industrializados de baixo conteúdo tecnológico e, principalmente, colocando no mercado internacional um volume maciço de produtos não industriais, as commodities. O perigo para nossa economia é que essas commodities têm preços formados no mercado internacional. Espera-se que haja uma ação governamental para mudar a tendência em curso e que a indústria manifeste sua insatisfação, apontando possíveis caminhos.
ROBERTO NICOLSKY é diretor da Sociedade Brasileira Pró-Inovação Tecnológica (Protec).
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
Capitalismo de compadres (onde mais poderia ser?)
Mansueto de Almeida, do IPEA
25 de novembro de 2010
Hoje, o presidente do grupo JBS deu entrevista ao Estado de São Paulo e reclama do tratamento que a empresa vem recebendo do mercado e da imprensa que, entre outras coisas, faz matérias negativas sobre o grupo. O título da matéria (será que joguei pedra na cruz?) mostra a indignação do executivo com as matérias da imprensa e com o comportamento dos investidores privados que penalizam o valor de mercado do JBS (valor de mercado despencou em mais de 30% este ano e está abaixo do valor patrimonial), que seria uma das companhias brasileiras mais bem sucedida aqui e lá fora.
Já falei sobre esse assunto várias vezes, mas como já está em gestação no BNDES a mais nova versão da política industrial, a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) na sua segunda versão, que agora vai focar em sub-setores ou “elos das cadeias produtivas”, acho que vale a pena voltar ao assunto e, claro, o JBS sempre entra na discussão porque essa empresa em 2008, 2009 e 2010 esteva na lista dos maiores empréstimos diretos do BNDES ao setor industrial.
Em 2008, o JBS pegou R$1,1 bilhão de empréstimos com o BNDES, em 2009, mais R$ 3,5 bilhões, e mais R$ 200 milhões em 2010. Como JBS comprou o grupo Bertin, que tinha recebido R$ 2,5 bilhões de empréstimos diretos do BNDES, em 2008, e mais R$ 200 milhões em 2009, todos esses empréstimos totalizam R$ 7,5 bilhões em um prazo de três anos.
Além desses empréstimos diretos, O BNDESpar comprou participação no JBS e no grupo Bertin que hoje são a mesma empresa. De acordo com o balanço patrimonial do BNDES de junho de 2010, o BNDES possuía 17,32% do JBS; algo como R$ 3,9 bilhões (participação societária do custo de dezembro de 2009). Essa participação coloca o JBS entre aquelas empresas nas quais o BNDESpar aposta muito dinheiro, grupo formado pela Eletrobrás (R$ 4,3 bilhões), Vale S/A (R$ 3,7 bilhões), Valepar (R$ 2,6 bilhões) e FIBRIA (R$ 2,3 bilhões) entre outras.
Assim, a relação BNDES-JBS é mais do que um simples empréstimo para o BNDES. É uma aposta de política industrial que o banco fez no grupo para que este pudesse se consolidar como um grande player no mercado de carnes global. O BNDES fez a mesma aposta com a Fibria (30,4% do capital) para o setor de celulose e com o frigorífico Marfrig, no qual o banco detém 13,9% (R$ 987 milhões) do capital.
Dito isso, seguem alguns esclarecimentos.
(1) Ganho Privado versus Ganho Social: o grupo JBS adotou a estratégia correta de crescimento do ponto de vista privado. Eu como empresário teria buscado o BNDES como parceiro e fonte de recursos. O que se questiona não é o JBS, mas sim o BNDES que nunca explicou claramente os critérios para apostar tanto em um setor no qual o Brasil já tinha uma clara vantagem comparativa. Qual o ganho social dessa aposta? O crescimento da empresa decorreu mais do acesso ao BNDES ou do mérito dos seus administradores?
O JBS fez o jogo correto, quem teria que se explicar deveria ser o BNDES que se restringiu a falar que precisamos criar empresas globais. OK, mas por que o setor público tem que estar por trás dessa estratégia em companhias que já são competitivas? por sinal, há algumas semanas o economista Josér Roberto Mendonça Barros publicou na sua coluna no Estado de São Paulo (clique aqui)uma avaliação dos impactos do crescimento do JBS na economia brasileira.
(2) Banco de Fomento versus Operações de Socorro: Na entrevista de hoje ao jornal estado de São Paulo, o presidente do JBS deixa escapar que:
“….Sabe o que ninguém lembra? É que o Bertin tinha R$ 4 bilhões de dívida com Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil. Por que ninguém pergunta: o Bradesco te pediu para comprar? O BNDES tinha R$ 2 bilhões. O fato é que naquele momento ninguém tinha balanço para comprar o Bertin. Eu acho que ajudei o Bradesco, ajudei o Santander. Quando eu converso com o Fábio (Barbosa, do Santander), eu digo: olha, você lembra, né? Eu poderia até levar vantagem em cima disso. Mas eu nunca faria isso.”
O curioso é que este não foi o único caso. Como já cometei neste blog sobre matéria de outubro na revista Piauí no caso da venda da Sadia para Perdigão:
“Nildemar Secches, antigo presidente da Perdigão e atual presidente do conselho da Brasil Foods, acha que, sem a intervenção do BNDES, teria comprado a Sadia por um preço muito mais baixo. “A Sadia não ia quebrar, quem ia quebrar eram os acionistas”, disse ele a um amigo. “Nós ficaríamos com a empresa por um preço muito menor.”
E exatamente as mesmas observações valem para o caso da venda da Aracruz celulose, que tinha como acionistas os mesmos controladores do Banco Safra, para a Votorantim Celulose para formar a Fibria. Os empréstimos do BNDES, além de facilitar as vendas, “salvou” os empréstimos dos bancos privados (ou de seus acionistas).
Essas operações nunca foram devidamente explicadas. De qualquer forma, aqui e acolá acaba-se descobrindo que os bancos privados também foram favorecidos pela posição mais ativa que o BNDES adotou desde a crise do final de 2008.
As dúvidas do mercado não são se este ou aquele empresário “atirou pedra na cruz”, mas sim do que estar por trás do crescimento de várias empresas brasileiras, se uma maior facilidade de acesso a recursos públicos ou a competência excepcional dos seus administradores. Como ninguém se dá o trabalho de explicar a “real política industrial”, fica-se com a impressão que nossas grandes empresas crescem rápido devido a condições excepcionais de acesso a recursos do BNDES