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sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Capitalismo de compadres (onde mais poderia ser?)

Política Industrial II : JBS/Friboi, etc. e as condições privilegiadas de acesso ao  BNDES  das tais "empresas campeãs"
Mansueto de Almeida, do IPEA
25 de novembro de 2010

Hoje, o presidente do grupo JBS deu entrevista ao Estado de São Paulo e reclama do tratamento que a empresa vem recebendo do mercado e da imprensa que, entre outras coisas, faz matérias negativas sobre o grupo. O título da matéria (será que joguei pedra na cruz?) mostra a indignação do executivo com as matérias da imprensa e com o comportamento dos investidores privados que penalizam o valor de mercado do  JBS (valor de mercado despencou em mais de 30% este ano e está abaixo do valor patrimonial), que seria uma das companhias brasileiras mais bem sucedida aqui e lá fora.

Já falei sobre esse assunto várias vezes, mas como já está em gestação no BNDES a mais nova versão da política industrial, a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) na sua segunda versão, que agora vai focar em sub-setores ou “elos das cadeias produtivas”, acho que vale a pena voltar ao assunto e, claro, o JBS sempre entra na discussão porque essa empresa em 2008, 2009 e 2010 esteva na lista dos maiores empréstimos diretos do BNDES ao setor industrial.

Em 2008, o JBS pegou R$1,1 bilhão de empréstimos com o BNDES, em 2009, mais R$ 3,5 bilhões, e mais R$ 200 milhões em 2010. Como JBS comprou o grupo Bertin, que tinha recebido R$ 2,5 bilhões de empréstimos diretos do BNDES, em 2008, e mais R$ 200 milhões em 2009, todos esses empréstimos totalizam R$ 7,5 bilhões em um prazo de três anos.

Além desses empréstimos diretos, O BNDESpar comprou participação no JBS e no grupo Bertin que hoje são a mesma empresa. De acordo com o balanço patrimonial do BNDES de junho de 2010, o BNDES possuía 17,32% do JBS; algo como R$ 3,9 bilhões (participação societária do custo de dezembro de 2009). Essa participação  coloca o JBS entre aquelas empresas nas quais o BNDESpar aposta muito dinheiro, grupo formado pela Eletrobrás (R$ 4,3 bilhões), Vale S/A (R$ 3,7 bilhões), Valepar (R$ 2,6 bilhões) e FIBRIA (R$ 2,3 bilhões) entre outras.

Assim, a relação BNDES-JBS é mais do que um simples empréstimo para o BNDES. É uma aposta de política industrial que o banco fez no grupo para que este pudesse se consolidar como um grande player no mercado de carnes global. O BNDES fez a mesma aposta com a Fibria (30,4% do capital) para o setor de celulose e com o frigorífico Marfrig, no qual o banco detém 13,9% (R$ 987 milhões) do capital.

Dito isso, seguem alguns esclarecimentos.

(1) Ganho Privado versus Ganho Social: o grupo JBS adotou a estratégia correta de crescimento do ponto de vista privado. Eu como empresário teria buscado o BNDES como parceiro e fonte de recursos. O que se questiona não é o JBS, mas sim o BNDES que nunca explicou claramente os critérios para apostar tanto em um setor no qual o Brasil já tinha uma clara vantagem comparativa. Qual o ganho social dessa aposta?  O crescimento da empresa decorreu mais do acesso ao BNDES ou do mérito dos seus administradores?

O JBS fez o jogo correto, quem teria que se explicar deveria ser o BNDES que se restringiu a falar que precisamos criar empresas globais. OK, mas por que o setor público tem que estar por trás dessa estratégia em companhias que já são competitivas? por sinal, há algumas semanas o economista Josér Roberto Mendonça Barros publicou na sua coluna no Estado de São Paulo (clique aqui)uma avaliação dos impactos do crescimento do JBS na economia brasileira.

(2) Banco de Fomento versus Operações de Socorro: Na entrevista de hoje ao jornal estado de São Paulo, o presidente do JBS deixa escapar que:

“….Sabe o que ninguém lembra? É que o Bertin tinha R$ 4 bilhões de dívida com Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil. Por que ninguém pergunta: o Bradesco te pediu para comprar? O BNDES tinha R$ 2 bilhões. O fato é que naquele momento ninguém tinha balanço para comprar o Bertin. Eu acho que ajudei o Bradesco, ajudei o Santander. Quando eu converso com o Fábio (Barbosa, do Santander), eu digo: olha, você lembra, né? Eu poderia até levar vantagem em cima disso. Mas eu nunca faria isso.”

O curioso é que este não foi o único caso. Como já cometei neste blog sobre matéria de outubro na revista Piauí no caso da venda da Sadia para Perdigão:

“Nildemar Secches, antigo presidente da Perdigão e atual presidente do conselho da Brasil Foods, acha que, sem a intervenção do BNDES, teria comprado a Sadia por um preço muito mais baixo. “A Sadia não ia quebrar, quem ia quebrar eram os acionistas”, disse ele a um amigo. “Nós ficaríamos com a empresa por um preço muito menor.”

E exatamente as mesmas observações valem para o caso da venda da Aracruz celulose, que tinha como acionistas os mesmos controladores do Banco Safra,  para a Votorantim Celulose para formar a Fibria. Os empréstimos do BNDES, além de facilitar as vendas, “salvou” os empréstimos dos bancos privados (ou de seus acionistas).

Essas operações nunca foram devidamente explicadas. De qualquer forma, aqui e acolá acaba-se descobrindo que os bancos privados também foram favorecidos pela posição mais ativa que o BNDES adotou desde a crise do final de 2008.

As dúvidas do mercado não são se este ou aquele empresário “atirou pedra na cruz”, mas sim do que estar por trás do crescimento de várias empresas brasileiras, se uma maior facilidade de acesso a recursos públicos ou a competência excepcional dos seus administradores. Como ninguém se dá o trabalho de explicar a “real política industrial”, fica-se com a impressão que nossas grandes empresas crescem rápido devido a condições excepcionais de acesso a recursos do BNDES

Um comentário:

amauri disse...

Bom dia Paulo!
E os progressistas, muitos empresários e banqueiros insistem em dizer que o Brasil é capitalista. Nunca foi.