O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

Mostrando postagens com marcador problemas conjunturais. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador problemas conjunturais. Mostrar todas as postagens

domingo, 30 de maio de 2021

Meu pitaco, de agora a outubro-dezembro de 2022 - Paulo Roberto de Almeida

 Meu pitaco, válido de 29/05/2021 a outubro-dezembro de 2022

Paulo Roberto de Almeida


Vamos ser brutalmente sinceros: os organizadores das manifestações de 29/05 não estão minimamente interessados no impeachment do Bolsovirus; eles só querem enfraquecê-lo para as eleições de 2022. Esse foi o verdadeiro objetivo.

Mas, mesmo que quisessem o impeachment, não iriam conseguir. O Centrão, por oportunismo e conivência com a tradicional corrupção política, o Desprocurador Particular da republiqueta bolsonarista, por interesse próprio, não vão  sequer se mover.

Mas, se colocassem pelo menos as coisas claramente, os organizadores dos protestos seriam menos hipócritas. 

Sorry, meus caros manifestantes; vcs estão legitimamente interessados em afastar um genocida. Os que organizaram os protestos, não querem chegar a isso: usaram vcs como massa de manobra eleitoral. 

Estou aguardando contestação dos hipócritas, o que não vai mudar a realidade das coisas. 

Aqueles que detêm o real poder de mudar o destino do Brasil, não têm a mínima intenção de fazê-lo, nem políticos, nem militares, nem magistrados, nem os donos do Capital, e nem os poucos liberais que clamam no deserto têm a capacidade de mudar alguma coisa de forma decisiva.

Não é que essas supostas “elites” sejam simplesmente medíocres, ou ridículas, o que elas também o são.

A triste verdade é que o Brasil não possui sequer elites dignas desse nome.

Estadistas, então, nem pensar.

Vamos continuar no pântano por mais alguns anos, não sei quantos. 

Mesmo que surgisse, por acaso algum estadista, ele ainda precisaria de votos de eleitores motivados.

A tragédia é que só teria a oferecer algum equivalente funcional do “sangue suor e lágrimas”, o que não é exatamente o que gostariam de ouvir os eleitores das classes C e D, que são os que elegem dirigentes e representantes atualmente.

Portanto, não esperem milagres de aqui até o final de 2022: o que temos é mais ou menos isso que já está aí, com muito poucas surpresas na agenda eleitoral.

O que teremos, então?

Talvez mais do mesmo, o de agora e o de antes. Ou então um outro personagem que terá os mesmos problemas que todos já conhecemos: manobras ingentes e escusas para formar as bases de um presidencialismo de cooptação, ou mais provavelmente de corrupção. 

Esse é o Brasil, a menos de alguma grande tragédia que não é do interesse de ninguém, de gregos ou de goianos.

Vamos continuar afundando mais um pouco? Muito provavelmente, mas sempre lentamente, como é costume por aqui, que ninguém é de ferro.

Um dia conserta? Sim, parcialmente, que o estamento político não é de grandes reformas. Este é o país no qual os progressos dentro da ordem seguem o ritmo de uma lesma. Foi assim com o tráfico negreiro, foi assim com a abolição da escravidão, tem sido assim, desde sempre, com a educação de massa, ainda não se pensa eliminar o patrimonialismo, nem a corrupção política e os privilégios dos donos do Capital. Os militares estão mais interessados na ordem do que no progresso, os magistrados inteiramente satisfeitos com suas prebendas aristocráticas, as corporações de ofício com seus benefícios, e a classe média não tem educação suficiente para reclamar avanços mais ousados.

Quem paga o custo de tudo isso?

Os pequenos e médios empresários e os trabalhadores das classes C e D, os mesmos que elegem os mesmos políticos de sempre, os predadores da riqueza duramente criada pelos primeiros.

Desculpem pelo longo pitaco: era para ser pequeno e puramente conjuntural, mas acabou grande e estrutural. 

Não tenho grandes ilusões quanto ao futuro do Brasil: continuaremos a nos arrastar penosamente em direção à modernidade, que o progresso também é um fatalidade.

Esta é a conclusão a que chegou Mario de Andrade, o principal organizador da Semana de Arte Moderna de fevereiro de 1922 e profeta do modernismo no Brasil. Em 1928, ele publicou Macunaima, um romance passavelmente pessimista.

Não era a minha intenção: eu estava apenas tentando ser realista. 

Sorry, mais uma vez.

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 30/05/2021

terça-feira, 26 de janeiro de 2021

Sobre os grandes problemas do Brasil - Paulo Roberto de Almeida

Sobre os grandes problemas do Brasil: uma visão realista (que tende ao pessimismo)

  

Paulo Roberto de Almeida

(www.pralmeida.orghttp://diplomatizzando.blogspot.com)

[Objetivosintetizar os desafios sistêmicosfinalidadeexpressar opinião] 

 

O Brasil possui problemas conjunturais e problemas estruturais. Entre os primeiros podem ser situados as disfuncionalidades políticas, que são a fragmentação partidária e a desproporcionalidade na representação, que poderiam ser resolvidas por reformas eleitoral e política: sistema parlamentar e voto distrital misto. Mais graves são os de natureza econômica, o baixo crescimento e os ainda mais baixos ganhos de produtividade, que poderiam ser solucionados com abertura econômica e liberalização comercial, além de um foco primordial nas medidas tendentes à melhoria do ambiente de negócios, todas devidamente identificadas nos relatórios anuais de Doing Business do Banco Mundial.

A não solução desses problemas conjunturais ameaça transformá-los em problemas sistêmicos ou estruturais. 

Entre estes, dois — deixo de lado a má qualidade da governança, pois ela é geral e atinge os três poderes, pois deriva da persistência do patrimonialismo, problema “genético” e histórico do Brasil — me parecem especialmente graves, e eles são a corrupção política e a má qualidade da educação.

A corrupção política não existe apenas pelas fraudes e malversações criminosas que políticos individuais possam cometer, dentro do modo “artesanal” de produção de corrupção, que atinge um pouco todos eles, pertencentes à classe aberta dos profissionais da Política, na verdade, uma casta de sanguessugas que vive às custas de trabalhadores e empresários do setor privado, os únicos geradores de riqueza. A corrupção política pode também existir no “modo industrial” de produção da corrupção, como amplamente demonstrado pelo sistema mafioso de extração de recursos públicos e privados organizado pelo PT em seus três mandatos e meio. O Centrão também opera nessa faixa, mas de modo descentralizado, estando entre o modo “artesanal” e o “industrial” de produção de corrupção, pelo fato da extrema fragmentação partidária, que por sua vez alimenta o exército de sanguessugas, ainda e sempre em estado de proliferação.

A despeito de reversões tópicas e momentâneas — como a Operação Lava Jato, ela mesmo revertida e praticamente anulada pelos profissionais da política—, o câncer da corrupção política deve persistir no Brasil durante bastante tempo, uma vez que ele perpassa o funcionamento e está no âmago das próprias instituições republicanas, que até podem ser funcionalmente apropriadas no papel, mas que se dobram e se submetem ao governo de indivíduos, não das leis, cujo respeito é muito relativo no país. Para todos os efeitos, o Brasil NÃO É um Estado de Direito, e sim uma ação oligárquica na qual os donos do poder político e os donos do dinheiro se alimentam mutuamente. Esse tipo de situação é velho, tradicional e muito conhecido histórica e geograficamente, mas atingiu proporções “homéricas” no Brasil. Vai demorar, portanto.

Quanto à má qualidade da educação no país, ela também é histórica e tradicional, com alguns surtos episódicos de reformas modernizadoras, que não se sustentaram em virtude de dois fenômenos inevitáveis: a ampliação do acesso democratizante, ao cobrir faixas e camadas da população antes excluídas, o que coloca em stress o sistema de ensino público, e o reforço dos esquemas corporativos e sindicais, que paralisam as reformas necessárias e atuam como forças reacionárias e contrárias a quaisquer reformas de gestão. A melhoria da educação é uma hipótese ainda mais remota, difícil e delongada do que as reformas política e econômica, uma vez que não existe sequer um consenso, ou um simples entendimento, sobre a natureza do diagnóstico, o que torna ainda mais complicado o estabelecimento de uma correta ação prescritiva, que deveria dirigir-se primordialmente aos dois primeiros ciclos de ensino, com foco na formação dos professores.

 

Estes são os grandes problemas do Brasil, quase insolúveis na inexistência de líderes à altura dos desafios (e nem se está pedindo a aparição de estadistas, uma vez que persiste a mediocridade das elites existentes, de todas elas). Para grande azar da presente geração, tivemos grandes desastres derivados da inacreditável incompetência e corrupção das últimas “equipes” dirigentes: a mega corrupção e inépcia petista, que nos legou a Grande Destruição Econômica de 2015-16 (que foi montada nos dez anos anteriores) e que produziu a mega catástrofe do fenômeno bolsonarista, que representa, por assim dizer, a síntese exacerbada de todos os vícios e deformações políticas, morais e culturais de décadas, ou séculos, de acumulação de disfuncionalidades na construção da nação. 

 

Na verdade, somos ainda uma nação em construção, pois que tardamos séculos em cuidar da educação, demoramos mais do que o razoável em abolir o tráfico negreiro e eliminar e o regime escravocrata — de certa forma ainda preservado, assim como o racismo latente — e nunca nos livramos do patrimonialismo — que pode ter atingido um formato gangsterista nas últimas décadas — e continuamos insistindo em preservar a corrupção política (até em aumentá-la) e em manter a baixa qualidade da educação, o que é especialmente terrível para os mais pobres.

 

Não vou me desculpar pelo tom pessimista destas notas, uma vez que ele corresponde à necessidade de ser minimamente realista quanto a uma possível solução às duas ordens de problemas: os conjunturais — que poderiam ser resolvidos em poucos anos, caso houvesse consenso quanto ao diagnóstico e prescrições — e os sistêmicos ou estruturais, que são de difícil solução no futuro previsível, uma vez que não estão dadas as condições para a sua superação. 

O Brasil parece ser um eterno “país do futuro”, em construção permanente, mas isso não deve ser considerado algo excepcional na História: afinal de contas, os países que lograram certo nível de bem-estar sustentado e sustentável são muito poucos, numericamente, em relação à maioria da Humanidade, que é formada por países e nações que ainda se mantêm no subdesenvolvimento econômico e na corrupção política, sem muita perspectiva de superá-los em prazo razoável. 

O Brasil até que não foi um fracasso completo, tendo construído um sistema industrial relativamente bem sucedido — até retroceder precocemente no período recente — e estruturas de educação superior também relativamente bem sucedidas, com disfuncionalidades persistentes e até agravadas no mesmo período. Tudo pode ser reformado e melhorado, mas tanto as elites, quanto o povo em geral, parecem ter sido afetados por aquela cegueira coletiva de que falava um famoso escritor, que torna mais aleatório e incerto o estabelecimento de um consenso esclarecido em torno das melhores soluções. 

Elas virão, no devido tempo, que não deve ser nesta geração — ou seja, os próximos 20 a 25 anos — e talvez nem na seguinte, pois que insistimos em confirmar o triste vaticínio de Mario de Andrade feito um século atrás: o progresso chega, pois ele também é uma fatalidade.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3847, 26 de janeiro de 2021