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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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quinta-feira, 27 de maio de 2021

Subserviência nunca foi boa conselheira Embaixador - Cesario Melatonio Neto

 Subserviência nunca foi boa conselheira 

Embaixador Cesario Melatonio Neto

O presidente norte-americano Joe Biden sugeriu a quebra de patentes das empresas farmacêuticas que produzem as vacinas contra o novo coronavírus.

A medida foi saudada por cerca de uma centena de países, mas não pelo Brasil. O Brasil já foi mais lúcido, ousado e civilizado em outros tempos, como o da ação do então ministro da saúde, José Serra, para quebrar patentes de medicamentos de combate ao HIV.

O mundo médico e científico-acadêmico foi unânime em reconhecer a importância dessa política sanitária para a sobrevivência dos afetados pelo vírus da AIDS.

Há muitos acadêmicos hoje que estudam a questão da propriedade intelectual e suas consequências para o bem-estar dos cidadãos que vivem no sistema do capitalismo moderno.

É urgente uma renúncia, em caráter emergencial, das regras de propriedade intelectual da organização Mundial do Comércio (OMC).

As corporações farmacêuticas estão concentradas em seus lucros e menos na saúde global, com uma tática de preservar o máximo poder no mercado, com o objetivo de maximizar os benefícios financeiros.

Apenas os governos podem intervir na solução do problema para salvar milhões de vidas. Dezoito farmacêuticas acumularam 588 milhões de dólares de lucro, entre 2009 e 2018. No período, essas empresas recompensaram seus acionistas com 92% sobre os benefícios acumulados. As empresas farmacêuticas poderiam reinvestir mais os lucros em pesquisa e inovação, mesmo que haja diminuição na distribuição de dividendos.

A escassez de vacinas contra o novo coronavírus, em muitos continentes, é consequência dos esforços de laboratórios de porte para preservar seu controle e os lucros.

O Brasil pode estar na contramão da história ao opor-se à mencionada quebra das patentes das vacinas anticovid-19.

Essa subserviência a interesses inconfessáveis pode ser má conselheira e isolar ainda mais o nosso país no panorama mundial. A diplomacia brasileira sempre se caracterizou pela solidariedade com as nações mais pobres e granjeou respeito e credibilidade por essa postura.

Uma revisão dessa postura, contrária aos interesses nacionais, se impõe até mesmo pelo isolamento internacional acarretado pela submissão às empresas farmacêuticas.

Em oposição, no caso da quebra de patentes, a três membros do BRICS (China, Índia e África do Sul), enfraquecemos a unidade do grupo e ainda abrimos confronto com Moscou no caso da vacina russa.

A proteção abusiva e exagerada aos monopólios farmacêuticos demonstra uma passividade ou subserviência diante de extorsões indecentes.

Uma das maiores conquistas dos laboratórios foi o Acordo Internacional sobre a propriedade intelectual na Organização Mundial do Comércio. Com este mecanismo as potentes as patentes de remédios conseguiram a proteção dos mecanismos de solução de controvérsias da OMC e de seus dispositivos de retaliação.

Esse acordo TRIPs denota uma pequena referência insignificante do proprietário das patentes com relação à sociedade, dando ênfase à proteção dos direitos empresariais. Algumas patentes, por exemplo, podem ter vigência por cerca de três décadas.

A pandemia demonstrou a fragilidade e dependência tecnológicas da indústria brasileira de vacinas.

Será que a missão a cumprir, ou cumprida, pelo governo federal é a defesa dos lucros das empresas farmacêuticas, ou a proteção sanitária dos cidadãos brasileiros? 

Donald Trump já deixou a casa Branca e Joe Biden se posicionou, neste tema, contra a postura do antigo mandatário. 

Errar é humano, mas insistir no erro parece inaceitável. Até o governo do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, repito, juntou-se no início do mês a países em desenvolvimento, como Índia e África do Sul para solicitar uma quebra temporária de patentes para vacinas contra a Covid-19, na esperança de que essa medida aumente a produção e permita uma distribuição mais justa em todo o mundo.

Em 21 do mês corrente, em Roma, na Cúpula Global de Saúde, este assunto voltou a ser debatido em um dos principais eventos deste ano para coordenar ações globais contra a pandemia.

A China já anunciou o apoio à quebra da patente das vacinas contra covid-19. Com isso, muitos países pobres e menos desenvolvidos poderão ter acesso e sua população vacinar-se com mais facilidade.

Este é mais um gesto histórico em direção da suspensão dessas patentes. Durante a pior pandemia em 100 anos, o Itamaraty foi usado como instrumento de promoção ideológica abandonando os esforços internacionais para combater o novo coronavírus e enfraquecendo uma resposta global à pandemia.

Chegou a hora de rever esta hesitação em fazer parte da coalizão internacional por vacinas e deixar de lado medidas deliberadas para pôr a política e a ideologia acima da saúde pública.


terça-feira, 11 de maio de 2021

O dificil jogo das patentes de vacinas - Financial Times

 Excelente matéria do Financial Times que demonstra a complexidade da questão, que não será resolvida por uma simples medida populista de suspensão de patentes. Minha proposta era a de uma coordenação mundial, que também é complexa , pois como vimos existe a prevenção contra “transmitir tecnologia de RNA para China e Russia”, o que é velha geopolitica. 

Ou seja, não vamos sair do atoleiro rapidamente. Temos o mundo como ele é: desigual, pouco cooperativo, lento a se ocupar de necessidades dramáticas de populações pobres por considerações de ordem econômica que são, na verdade, de natureza microeconômica (patentes, know-how, trade secrets, lucratividade, etc.).
Paulo Roberto de Almeida



Will a suspension of Covid vaccine patents lead to more jabs?

Washington’s backing for waiver plan is welcomed by WHO but challenges lie ahead

 


India and South Africa are leading a group of mainly low-income countries urging intellectual property rights on Covid-19 vaccines to be waived to boost worldwide production 

 

Hannah Kuchler in London 

May 06, 2021

 


The US has surprised the pharmaceutical industry by backing a plan to waive Covid-19 vaccine patents, in an attempt to boost production of shots needed to inoculate more of the world. Katherine Tai, Joe Biden’s top trade adviser, said the US would support a waiver, while stressing that it “believes strongly” in intellectual property protections. 

 

The move was welcomed by the World Health Organization and activists for greater access to medicines who hope that if the World Trade Organization waives a longstanding agreement designed to protect intellectual property, known as the Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights, or Trips, more manufacturers could make the vaccines. But even if the US move pushes other western countries to do the same, it will not necessarily lead to more shots in arms any time soon. 

 

Who wants intellectual property rights on vaccines suspended? India and South Africa led the push for a Trips waiver, with many other low-income countries having also signed up, arguing it is the only way to ensure “fair, equitable and affordable access” to Covid-19 products, including vaccines and drugs. The proposal comes after a World Health Organization attempt to encourage the pooling of intellectual property — the Covid-19 Technology Access Pool — received limited interest last year from countries and companies holding the IP rights.

 

James Love, director of the non-profit Knowledge Ecology International, said the industry could do more to increase production. “We are definitely going slower than we need to. Companies are hoarding both the knowhow and the intellectual property that could be protecting us not only from the current virus, but also the variants.” Some manufacturers said they could produce more vaccines if they had the intellectual property, according to Ellen t’ Hoen, director of Medicines Law & Policy. She said western governments that had helped fund the development of vaccines should have ensured their distribution would be more equitable. At present, 1.1bn Covid-19 vaccinations have been administered worldwide but fewer than 18m doses have been given in Africa. “Governments have possibly given in too much, and given away these vast amounts of money without securing a commitment for the sharing of IP,” she added. 

 

Who is against waiving rights and why?

 

The UK and the EU have so far opposed the waiver, although the European Commission president Ursula von der Leyen said on Thursday that the EU was “ready to discuss” how the proposal could help address the current crisis “in an effective and pragmatic manner”. The US plan to back the waiver has worried the pharmaceutical industry, including some vaccine makers that have warned officials in the Biden administration that such a change could hand novel technologies — such as messenger RNA platforms — to China and Russia. They hope to use the platforms for new vaccines and even therapeutics in the future. However, the drugmakers’ main argument is that waiving intellectual property is not the solution. Vaccine makers have already pulled out all the stops to supply billions of doses at an unprecedented speed, including signing unusual partnerships with rivals to expand production. 

 

Moderna put its patents online last summer but they are not useful alone. Covid-19 and the business of vaccines Thomas Cueni, director-general of the International Federation of Pharmaceutical Manufacturers & Associations, said vaccines were far more complicated than most medicines so there had never been a compulsory licence for shots. He said the patent was “just the icing on the cake”. “You could get the recipe from Mary Berry for the loveliest cake you can imagine. But if you try to replicate that cake, good luck,” he added. 

 

 

Could new suppliers expand production if they had access to the IP? 

 

Sir Robin Jacob, chair of intellectual property law at University College London, said there was “no evidence” that other companies would suddenly be able to make the vaccines if the patented intellectual property was released.

 

Vaccines often have far fewer patents than drugs — but they are trickier to manufacture, he said, so it is the availability of expertise that is holding back production. Johnson & Johnson said it examined 100 potential partners but concluded only 10 were capable of making its shot. “There’s almost nobody you could license to. They couldn’t do it — you need a huge plant, huge skills, patent or not, it doesn’t matter,” Jacob said. Vaccine makers could send experts to new plants to manage the tech transfer process but that could damage the production already under way, he warned. “If they take people off manufacturing the vaccine now to teach someone in Bangladesh to build a factory that takes three to four years, they won’t be around to make the vaccine now.”

 

(FOTO: Public health officials argue that waiving intellectual property rights would help vaccines such as the BioNTech/Pfizer shot produced at this facility in Germany [fotografia mostrada no text original do FT] be manufactured at more sites around the world.) 

 

Are there enough raw materials? 

 

Efforts to mass produce Covid-19 vaccines on an unprecedented scale have been constrained by various bottlenecks, including limited supplies of materials such as lipid nanoparticles and equipment such as bioreactor bags. New factories would face the same constraints, including export controls that have slowed down the movement of some key parts. Prashant Yadav, a supply chain expert at the Center for Global Development, said patents were unlikely to help in the next six months because of tight supplies but they could be useful to help set up a manufacturing network that could come online in 12 to 18 months. “Activists are asking governments to support the proposal using the immediate opportunity — the time-sensitive burning platform — for what may be helpful in the medium to long term,” he said. He added that while vaccines are challenging to make, a waiver could spur greater equity in the distribution of an antiviral pill for Covid-19, such as the one that Merck is developing.

 

What else could help global access to vaccines?

 

Western countries have prioritised vaccinating their own populations rather than seeking to protect the most vulnerable around the world. Now that the US has enough vaccines for every American, it has bowed to pressure to give away spare shots, starting with its stockpile of the Oxford/AstraZeneca vaccine, which has not been approved in the USOther countries could do the same with surplus shots. Another short-term help would be to ease export controls, so vaccine makers are not restricted in where they send their shots, or ingredients to make them. The WHO is also trying to encourage companies with mRNA vaccines to share their patents and technical knowhow with regional hubs in poorer countries. The scheme, launched recently, could give pharma companies more control over where their intellectual property ends up, while still expanding production. But none of these proposals will dramatically increase the availability of vaccines this year. 

 

Additional reporting by Donato Paolo Mancini in Rome