SEMINÁRIO OLIVEIRA LIMA E A (LONGA) HISTÓRIA DA INDEPENDÊNCIA
DATA: 10 e 11 setembro de 2019
EXPOSIÇÃO: 10/9 a 1/11 de 2019
LOCAL: Auditório István Jancsó - Biblioteca Brasiliana Guita E José Mindlin
Oliveira Lima é, seguramente, o grande historiador da Independência do Brasil. Tratou do tema em vários livros de sua vasta obra, numa perspectiva que hoje poderíamos qualificar de longue durée, de longa duração. Com efeito, escreveu sobre os antecedentes mais notáveis do processo independentista e sobre suas consequências mais duradouras, num arco temporal que atingiria, grosso modo, um século e meio. Entre esses antecedentes, destaque-se a crescente preponderância do Brasil sobre Portugal, cujo ápice se concretizou com um fato inusitado e singular da história da humanidade: a transferência da Corte portuguesa para o Rio de Janeiro, em 1807, primeira vez em que um monarca europeu em funções atravessou a linha do equador. Ao contrário do que afirma uma certa historiografia mais superficial, não se trata aqui de uma simples e precipitada fuga das tropas napoleônicas, conquanto tenha havido certa precipitação na operação logística propriamente dita (cabe lembrar a frase atribuída à rainha dona Maria: “nem tão depressa que pareça fuga, nem tão devagar que pensem que queremos ficar”), mas de projeto estratégico acalentado desde o século XVII, com o padre Antônio Vieira, e do século XVIII, com o diplomata dom Luís da Cunha. Há inclusive quem retroceda essa ideia para o século XVI, quando uma das causas apontadas para a desdita de dom Antônio, prior do Crato, na sua disputa pelo trono português com o poderoso rei de Espanha, Filipe II, teria sido o fato de ter-se ido abrigar nas ilhas atlânticas de Portugal, e não no Brasil.
Entre as consequências duradouras da Independência, destaque-se o estabelecimento no Novo Mundo de uma monarquia de características europeias, também fato único e inusitado. Segundo Oliveira Lima, essa seria uma monarquia híbrida, mestiça, adaptada ao meio tropical, tanto no que se refere ao equilíbrio entre tendências conservadoras e autoritárias, de um lado, e democráticas e liberais, de outro, que caracterizou o Império do Brasil, sobretudo na sua segunda fase, quanto ao que diz respeito à própria natureza mestiça da sociedade tropical.
Oliveira Lima, entre esses antecedentes e essas consequências, descreveu com maestria a sociedade brasileira e a portuguesa; desvendou as intrigas políticas e diplomáticas que caracterizaram o movimento da Independência e o reconhecimento do Império; deixou retratos definitivos de grandes personagens da época, a começar por dom João VI; traçou, enfim, um magnífico panorama, um excelente mural de Brasil e Portugal no século XIX, sobretudo no período que vai de 1808 a 1834.
PROGRAMAÇÃO
PRIMEIRO DIA (10.09.2019)
9h: Abertura oficial
9h30: Conferência de abertura. Oliveira Lima e a historiografia da Independência. Carlos Guilherme Mota
11h-13h: Antecedentes da Independência: a crescente importância do Brasil e a definição das fronteiras: Alexandre de Gusmão (Secretário del Rei).Janice Teodoro, Ricardo Souza de Carvalho, Synesio Sampaio Goes
13h: Abertura da exposição Oliveira Lima e a (longa) história da Independência (Sala Multiuso – BBM/USP)
14h-16h: A consagração de uma realidade: a mudança da Corte e a fundação de um Império no Novo Mundo (Dom João VI no Brasil). Guilherme Pereira das Neves, Teresa Malatian, Nathalia Henrich
16h-18h: Entre ruptura e continuidade: o processo da Independência I – A outra independência (Comentários de Oliveira Lima à História da Revolução de 1817, de Muniz Tavares). Maria de Lourdes Viana Lyra, André Heráclio do Rêgo, George Felix Cabral de Souza
SEGUNDO DIA (11.09.2019)
9h-11h: Entre ruptura e continuidade: o processo da Independência II – O grito do Ipiranga (O Movimento da Independência, O Reconhecimento do Império, O papel de José Bonifácio no movimento da Independência). João Paulo Pimenta, Lucia Bastos Pereira das Neves, Guilherme de Paula Costa Santos
11h-13h: Dom Pedro, monarca em dois continentes: o Portugal brasileiro (Dom Pedro e dom Miguel – a querela da sucessão, Dom Miguel no trono).Lúcia Paschoal, Cecilia Helena de Salles Oliveira, Guilherme Freitas
14h-16h: As consequências: uma monarquia mestiça no Novo Mundo (O Império brasileiro). Paulo Roberto de Almeida, Angela Alonso, Júlio Cesar Vellozo
16h-18h: Conferência de encerramento: o legado historiográfico de Oliveira Lima. Arno Wehling
Comissão organizadora
André Heráclio do Rêgo
Guilherme Carvalho Souza da Rocha Freitas
Carlos Alberto de Moura Ribeiro Zeron
Alexandre Macchione Saes
O projeto 3 vezes 22
Ao completar o bicentenário da Independência e o centenário da Semana de Arte Moderna no ano de 2022, abre-se oportunidade para refletir e redimensionar a história da nossa formação – do Estado e da Sociedade, assim como da cultura histórica brasileira. O projeto 3 vezes 22 não será apenas a celebração de duas datas canônicas, mas uma tentativa de entrecruzar temporalidades, a saber: a Independência (1822), o Modernismo (1922) e a história do nosso tempo presente (2022). As duas efemérides provocam uma reflexão não somente sobre a constituição da Nação no plano político, mas também com relação à definição da comunidade imaginada ou identidades de pertencimento.
A Independência, como acontecimento, conjuga-se com o processo mais amplo de formação do Estado nacional, materializado pela soberania política, econômica e cultural, tanto do ponto de vista interno, por intermédio da busca por um repertório comum, como também na perspectiva de uma afirmação da singularidade nacional perante as demais nações. Como sabemos, no caso brasileiro, a emancipação política não coincidiu com a afirmação da nacionalidade. Como alertou Sergio Buarque de Holanda, a nação precedeu o nacionalismo, não constituindo um desdobramento natural do último: a construção de heróis, de símbolos e, inclusive, da própria narrativa de uma história nacional deu-se ao longo do século XIX e XX. Numa certa perspectiva, o modernismo esteve imbricado com os dilemas culturais suscitados pela ruptura colonial.
A geração modernista encampou a tarefa de refletir sobre esse momento decisivo, rompendo com a tradição estética legada do romantismo, e produzindo uma influente, duradoura e nova interpretação da história do Brasil. Mas, como toda narrativa sobre o passado, a “reescrita da história” estabeleceu um novo panteão por meio da seleção de personagens, de eventos e de conceitos que, se por um lado, iluminaram uma determinada versão da História do Brasil; por outro, obscureceram narrativas e personagens. O entrecruzamento das narrativas históricas de 1822 e 1922 supõe também enfrentar a dialética entre memória e esquecimento para que seja possível revelar personagens, acontecimentos e processos obliterados. Assim, 3 vezes 22 procurará indicar novos horizontes, evidenciando interpretações e autores que, por razões diversas, se tornaram renegados. Compreender a formação dos cânones e dos panteões em sua plena historicidade e temporalidade será um dos desafios propostos pela programação.
O projeto 3 vezes 22, nesse sentido, pretende promover o confronto de três 22s: o da Independência, o da Semana de Arte Moderna e aquele que nossa geração vivenciará. A reflexão crítica mediada pelos desafios do presente contemplará o legado deixado pelas narrativas sobre o movimento modernista, revisitando, portanto, o patrimônio cultural acumulado, mas também trazendo à tona as zonas de sombra dos “tempos renegados”. A BBM possui um acervo valioso para auscultar territórios de pesquisa bibliográfica e documental ainda pouco palmilhados, e rever essas duas datas a partir dos desafios do tempo presente será nosso principal intento. Assim, o projeto 3 vezes 22 vale-se do rico material conservado pela Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin para encontrar nos documentos, nos livros e nos autores esquecidos e renegados pelas vertentes dominantes de nossa historiografia as evidências, as perspectivas e as interpretações que possam contribuir para a análise de nossa história, projetando questões que possam nortear a construção de um horizonte de autonomia, ao menos no plano da cultura e da ciência.