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terça-feira, 13 de julho de 2010

A tragedia educacional brasileira

O leitor José Marcos ofereceu uma contribuição ao post em que eu transcrevia a matéria sobre os recursos alocados para a educação e a não correspondência em matéria de qualidade de ensino, aqui:

Qualidade da educacao nao é uma questao de dinheiro, apenas
A TRAGÉDIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA: GOVERNO LULA NAUFRAGA DE FORMA ESPETACULAR NO DESAFIO DA QUALIDADE
segunda-feira, 5 de julho de 2010

Agradeço ao leitor. Eis a matéria:

Cresce número de professores sem diploma na educação básica do País
Luciana Alvarez, Simone Iwasso
O Estado de S.Paulo, 13 de julho de 2010

Dados do Censo Escolar mostram que a quantidade de docentes sem curso superior lecionando para os ensinos infantil, fundamental e médio saltou de 594 mil em 2007 para 636 mil em 2009; crescimento vai na contramão dos investimentos públicos na área

O número de professores que lecionam no ensino básico sem diploma de curso superior aumentou entre 2007 e 2009, segundo o Censo Escolar do Ministério da Educação. Atualmente, os professores sem curso superior somam 636 mil nos ensinos infantil, fundamental e médio - o que representa 32% do total. Em 2007, eram 594 mil.

O crescimento vai na contramão das políticas públicas adotadas nos últimos anos para melhorar a formação dos docentes no País. Pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996, o Brasil deveria ter todos os seus professores de ensino fundamental e médio com curso superior - projeto de lei atualmente em tramitação no Congresso Nacional prorroga esse prazo por mais seis anos e estende a obrigatoriedade também para o ensino infantil.

A Bahia é o Estado com o maior número de professores que lecionam sem diploma: eles eram 101 mil em 2009, dois terços do total. Mas mesmo em São Paulo ainda há 2.025 docentes sem diploma atuando no ensino médio - teoricamente, a etapa do ensino com mais conhecimentos específicos, como matemática e física, que mais exige uma formação superior.

Para o governo federal, o principal motivo de os índices de professores com formação superior não terem crescido, apesar dos investimentos públicos na formação, está no grande contingente sem diploma na educação infantil, etapa do ensino cuja oferta teve maior aumento no País nos últimos oito anos.

"Devemos fechar este ano com 20% de aumento na oferta de educação infantil. E, até há pouco tempo (2006), as creches eram ligadas à assistência social, portanto a ideia era cuidar, não educar", afirma Maria do Pilar Lacerda, secretária de Educação Básica do MEC.

Ensino infantil. O curso superior não é obrigatório no ensino infantil, mas o Plano Nacional de Educação (PNE), de 2001, tinha como meta que 70% dos professores dessa etapa conseguissem o diploma no prazo de dez anos. Pelo Censo de 2009, quase 5 mil professores do ensino infantil têm formação apenas na educação fundamental e mais de 34 mil possuem o ensino médio, mas não da modalidade normal.

"É muito importante que todo o magistério tenha uma formação adequada. E, no Brasil de hoje, ela se dá por meio do curso superior. E ainda nem em todos os cursos superiores", disse o sociólogo Cesar Callegari, membro do Conselho Nacional de Educação (CNE).

Mas o especialista afirma que esse quadro será revertido em poucos anos. "As metas podem ser atingidas com bastante rapidez, pois não há mais barreiras econômicas ou geográficas para a formação dos que já atuam como professores", diz Callegari.

O governo federal, em parceria com Estados e universidades, tem um programa de ensino a distância para professores, além de créditos e bolsas para os docentes que entram na faculdade. Atualmente, a maior aposta do governo federal está no Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica.

A intenção é formar, nos próximos cinco anos, 330 mil professores que atuam na educação básica e ainda não são graduados. Parte dos cursos é presencial e a maioria, na Universidade Aberta do Brasil (UAB), que oferece graduação para professores de maneira semipresencial. No total, os recursos para a área somam cerca de R$ 1 bilhão por ano. Os esforços, porém, ainda não aparecem nas estatísticas.

Ensino médio. Outro gargalo para o aumento do índice de professores com diploma está no ensino médio, etapa que passa por um crescimento de matrículas, mas para a qual há carências de quadros qualificados em algumas disciplinas, sobretudo física, química e matemática.

Apesar de ter o menor índice de docentes sem curso superior, a proporção dos sem diploma cresceu em dois anos também nessa etapa: eram 6,6% em 2007 e passaram para 8,7% no ano passado. "Há pesquisas mostrando que há pouco interesse dos jovens pela carreira do magistério e, em algumas áreas, a carência se dá em todo o País", afirma Maria Corrêa Silva, vice-presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consede). "Profissionais de outras áreas acabam assumindo." Com isso, docentes sem formação permanecem em sala de aula.

Maria, porém, diz-se otimista com a reversão do quadro geral. "Agora existem políticas públicas. Claro que cada Estado está em um estágio diferente, mas todos podem melhorar." A secretária do Acre lembra que, em 1999, apenas 26% dos professores do Estado tinham formação superior. Dez anos depois, são mais de 50%.

PARA LEMBRAR
Cursos ruins formam 25% dos docentes
Os cursos de Pedagogia se destacaram nas recentes avaliações do Ministério da Educação pelo crescimento de notas ruins e de oferta.
Dados do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) divulgados no ano passado indicam que o número de cursos mal avaliados passou de 28,8% do total (172 cursos), em 2005, para 30,1% (292). Os cursos ruins formam um em cada quatro futuros professores.
Entre 2002 e 2007, a oferta de cursos subiu 85% - um porcentual acima da média geral (63%). Em cinco anos, os cursos de Pedagogia passaram de 1.237 para 2.295. Segundo especialistas, a proliferação ocorre por causa da facilidade de montar um curso.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Qualidade da educacao nao é uma questao de dinheiro, apenas

A TRAGÉDIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA: GOVERNO LULA NAUFRAGA DE FORMA ESPETACULAR NO DESAFIO DA QUALIDADE
Reinaldo Azevedo, 5.07.2010

O governo gastou R$ 400 milhões para melhorar nota de 1.822 municípios e de 28 mil escolas que tiveram desempenho abaixo do esperado, mas muitas cidades com nota até 2 no Ideb/2009 avançaram pouco e, no ciclo de 5ª a 8ª série, 8% pioraram seu índice

Leia trecho de reportagem de Marta Salomon e Lígia Formenti, no Estadão:

Além de medir a qualidade do ensino no País, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2009 revela o tamanho do desafio que é mudar a situação de escolas e cidades com desempenho muito ruim. Municípios e escolas com pior desempenho - cujo resultado é divulgado hoje - receberam prioridade nas ações do Ministério da Educação (MEC), mas em muitos casos, nem essa ajuda extra resolveu.

No foco do ministério encontram-se 1.822 municípios com notas inferiores a 4,2 em 2007 e mais 28 mil escolas com notas até 3,8 no mesmo ano. Desde então, mais de R$ 400 milhões foram liberados para as escolas.

Mesmo recebendo um auxílio em dinheiro e suporte técnico, pouco mais da metade dos piores municípios no ranking nacional conseguiu melhorar o indicador no intervalo de dois anos, entre as duas últimas edições do Ideb (2007 e 2009), a ponto de superar suas respectivas metas.

A reportagem do Estado selecionou 155 municípios com notas até 2 na segunda etapa do ensino fundamental (de 5ª a 8ª série). A nota 2 equivale a menos da metade da média nacional (4,6). O levantamento revela que, na avaliação do desempenho, quase a metade (45%), o que corresponde a 70 municípios, ou não conseguiu alcançar a meta ou piorou a nota - nesse universo, 58 municípios (37,4%) evoluíram, mas não alcançaram a nota, e 12 (8%) andaram para trás entre 2007 e 2009. Os outros municípios melhoraram a ponto de, pelo menos, alcançar a meta.

Na amostra das 4.ª séries selecionada pelo Estado, com 47 municípios que tinham nota 2 no Ideb de 2007, 25 cidades, o que dá pouco mais da metade (53,1%), alcançaram a meta. Outros 22 municípios (47%) não alcançaram a meta. As metas variam de escola para escola e de município para município, dependendo do ponto de partida de cada um.

Um exemplo de município que andou para trás é Chaves, no Pará. Em 2007, a educação da cidade recebeu nota 2 até a 4.ª série. Dois anos depois, quando a meta era chegar a 3,2, a nota foi de 1,4. Itatuba, na Paraíba, está na mesma situação: no intervalo de dois anos, a nota piorou, caindo de 1,8 para 1,4, ainda mais distante da meta de 2,6. O Nordeste concentra as piores situações.

Também houve casos de melhora significativa, a ponto de a meta ser ultrapassada com folga. Foi o que aconteceu em Tucano, na Bahia. Em dois anos, a nota mais do que dobrou, de 2 para 5,4, superando a média nacional. A meta para 2009 era 3.

“Os primeiros resultados deverão aparecer a partir do Ideb de 2011″, avalia Maria do Pilar Lacerda, secretária de Educação Básica do MEC.

Nas próximas duas semanas, técnicos do ministério cruzarão dados do Ideb para avaliar o comportamento das escolas e municípios com pior desempenho. “Reformas educacionais demoram até uma geração, porque há fatores importantes como a escolaridade das mães e a formação de professores”, alega.

Apoio técnico
Maria do Pilar conta que houve dificuldades para definir o apoio técnico e financeiro aos municípios com pior desempenho. O ponto de partida para a ajuda era a apresentação de um plano pelos municípios e escolas. Inicialmente, de cada 10 planos apresentados ao MEC, 7 eram devolvidos, por serem inadequados. “Em um caso, o maior problema era a alfabetização de crianças, mas o plano previa a reforma da cozinha. Isso consumiu o ano de 2008 inteiro. E, no final, apenas um em cada dez planos era devolvido”. Pilar se diz otimista: “Trata-se de uma mudança estrutural, que depende de mobilização, não é pirotecnia.”

sábado, 19 de junho de 2010

Educacao brasileira: a tragedia continua

Dois artigos sobre esse drama brasileiro por dois especialistas da área.

Repetência e aprendizado
Naercio Menezes Filho
Valor Econômico, 18/6/2010

"Pesquisas mostram que a repetência é prejudicial tanto para os alunos como para a sociedade"
Naercio Menezes Filho é coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper e professor associado da FEA-USP. Artigo publicado no "Valor Econômico":

O Conselho Nacional de Educação está votando nesta semana uma proposta para acabar com a reprovação nos três primeiros anos do ensino fundamental nas escolas públicas brasileiras.

O objetivo é evitar que as crianças sejam punidas com a reprovação antes que elas tenham o tempo necessário para completar a primeira parte do seu aprendizado, principalmente agora que a entrada na escola acontece aos seis anos de idade. Essa proposta faz sentido? Será que o fim da repetência iria diminuir mais a qualidade da educação no Brasil?

A discussão sobre reprovação é antiga. Todos nós já ouvimos alguma história sobre a época em que as escolas públicas eram as melhores no Brasil. Na verdade, era mais fácil ter qualidade quando as escolas públicas atendiam apenas a elite da sociedade brasileira.

Em 1940, havia somente 3,5 milhões de alunos no ensino básico, para uma população de 41 milhões de pessoas, em sua maior parte composta de crianças e jovens. Hoje em dia há cerca de 40 milhões de alunos no ensino básico, para uma população de 190 milhões (uma taxa de 21%, para uma população bem mais velha, versus 8,5% em 1940).

Apesar da entrada maciça de novos alunos com nível sócio-econômico mais baixo, as escolas públicas tentaram manter seu nível de exigência. Isso fez a taxa de repetência aumentar fortemente, chegando a atingir 40% na primeira série. Os novos alunos não conseguiam fazer as provas, eram reprovados e tinham que cursar novamente a série. Muitos desistiam e saiam da escola.

Foi assim que, a partir da década de 80, surgiram os ciclos de progressão continuada, em que os alunos não podem ser reprovados por deficiências de aprendizado nas primeiras séries, apenas por faltas. Como resultado desses programas, a taxa de repetência hoje em dia gira torno de 20%, ainda elevada para os padrões mundiais (na Inglaterra, por exemplo, não existe repetência).

Várias pesquisas mostram que a repetência é prejudicial tanto para os alunos como para a sociedade. Altos índices de repetência fazem com que estados e municípios gastem recursos com alunos que cursam a mesma série por vários anos, ao invés de disponibilizar salas para alunos de ensino infantil e médio, que ainda não estão suficientemente atendidos.

Além disso, um estudo recente* comparou as taxas de abandono e de aprendizado nas escolas que adotam o regime de progressão continuada com relação às que mantém o regime seriado, em que os alunos reprovados são obrigados a repetir a série. O abandono é significativamente menor nas primeiras.

Como resultado desses programas, cerca de 800 mil alunos desistem de abandonar a escola todos os anos. A sociedade agradece, pois fora da escola esses jovens poderiam engajar-se em atividades ilícitas que causariam grandes perdas de bem-estar. Não adianta educar somente a elite.

Apesar desses efeitos positivos, o regime de ciclos é questionado em quase todas as eleições estaduais e municipais. Candidatos atribuem ao regime de ciclos a culpa pela péssima qualidade da educação no seu município e prometem abolir o programa. Pais acreditam que seus filhos aprendem pouco por causa da falta de repetência. Professores tampouco gostam do programa, pois perdem autoridade frente aos alunos. Mas será que os programas de ciclo são mesmo responsáveis pela baixa qualidade do ensino no Brasil?

Esse mesmo estudo avaliou o impacto da progressão continuada sobre a qualidade da educação. Os resultados mostram que na 4ª série não há efeitos significativos do programa sobre o aprendizado das crianças, mesmo após levarmos em conta fatores como a escolaridade e a renda dos pais.

Na 8ª série os alunos das escolas que adotam o regime de ciclos têm notas um pouco menores do que os que estudam sob o regime seriado. A diferença, entretanto, é de apenas 2%. O fato é que os alunos das escolas públicas brasileiras aprendem muito pouco, sejam elas seriadas ou de ciclo.

Pesquisas que acompanham alunos repetentes e aprovados ao longo do tempo mostram como uma diferença pequena de proficiência entre eles no ano inicial amplia-se dramaticamente um ano após a reprovação. A reprovação diminui a autoestima e a motivação do aluno, que perde o contato com seus antigos colegas. Além disso, os critérios de reprovação dos professores são bastante discutíveis. Estudos mostram que esses critérios nem sempre são baseados apenas no desempenho dos alunos, medido segundo critérios objetivos.

Assim, os programas de não repetência nas primeiras séries ajustam o fluxo de alunos de acordo com a idade correta, diminuem a evasão escolar e a desigualdade e tem impactos muito reduzidos sobre o aprendizado dos alunos. Qualquer análise de custo-benefício mostraria que a lei proposta seria altamente benéfica para a sociedade.

A culpa pela baixa qualidade da educação pública não é da falta de repetência. Ela é somente o "bode expiatório" de prefeitos e governadores que não conseguem mexer com os interesses corporativos que, esses sim, atrasam a educação brasileira.

* "Avaliando o impacto da progressão continuada sobre as taxas de rendimento e desempenho escolar no Brasil", por Menezes Filho, Vasconcellos, Werlang e Biondi (2009).

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Meritocracia nos sistemas de educação
Maria Alice Setúbal
O Estado de S.Paulo, 18/6/2010

"Um sistema educacional justo, além de garantir bons níveis médios de qualidade, deve também assegurar padrões mínimos de aprendizagem para todos os alunos, independentemente de suas particularidades socioculturais"
Maria Alice Setúbal é presidente do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária. Artigo publicado em "O Estado de SP":

A ampliação do debate da educação para diferentes setores da sociedade tem trazido à tona interpretações e contribuições diversas, com o mérito de envolver a sociedade na discussão de quais seriam os caminhos para que possamos alcançar uma educação de qualidade para todos.

Dentre essas análises, a ênfase nos baixos resultados educacionais medidos nas avaliações nacionais tem ocupado maior espaço na mídia, trazendo para o cerne da discussão a responsabilização da escola e dos professores pelos resultados da aprendizagem dos alunos e, como consequência, a implementação de políticas de incentivo e de premiação por resultados e pelo cumprimento de metas - a chamada meritocracia.

Como essa é uma questão controversa, é importante termos em conta as diferentes dimensões desse posicionamento. No Brasil, estamos longe de alcançar um patamar básico para todas as escolas, mesmo que estas pertençam a uma mesma rede.

Um sistema educacional justo, além de garantir bons níveis médios de qualidade, deve também assegurar padrões mínimos de aprendizagem para todos os alunos, independentemente de suas particularidades socioculturais.

Em nosso sistema educacional - marcado por desigualdades de partida -, o risco de um plano de incentivos aumentar o hiato educacional é grande. O sistema de bonificação a partir de metas pode gerar uma concorrência entre as escolas capaz de reforçar as diferenças entre elas.

As escolas lidam com realidades distintas, principalmente se considerarmos as localizadas nas regiões mais pobres das periferias dos grandes centros urbanos e que atendem a uma clientela de alta vulnerabilidade. Geralmente, essas escolas têm um corpo docente altamente instável e a própria infraestrutura escolar não oferece condições adequadas para o trabalho dos profissionais da educação.

É importante salientar que o sistema de incentivos - qualquer que seja - diferencia negativamente as escolas, porque provavelmente (a conferir) os professores passarão a procurar e se transferir para as escolas mais bem colocadas nas avaliações, com o objetivo de obter maiores chances de bônus ao final do ano.

Se essa situação vier a se comprovar como verdadeira, as escolas com maiores dificuldades ficarão relegadas, cada vez mais, a um corpo docente instável e com menor preparo, tirando de uma parcela significativa da população condições de acesso a uma educação de qualidade - o que poderá comprometer os nossos indicadores de desenvolvimento e de combate à pobreza.

Obviamente, não quero defender, aqui, o professor despreparado e, principalmente, não comprometido com seus alunos. Minha intenção é colocar as diferentes dimensões de uma questão que me parece central no momento atual do debate educacional brasileiro.

Os resultados do Plano Nacional de Educação que enfatizam o não-cumprimento de metas básicas relativas à qualidade do sistema reforçam a importância de se considerar que a gestão da educação tem sentido apenas em função de um projeto pedagógico que organize as atividades de ensino e de aprendizagem dentro da própria escola.

Responsabilização implica colocar não apenas o diretor da escola, mas também o professor no centro das políticas educacionais, por meio da valorização da profissão, da capacitação continuada e do suporte didático para o seu trabalho na sala de aula. Assim, a responsabilização tem que ver com os resultados da escola e também com as políticas educacionais da rede que deem suporte aos resultados. Deve ser uma via de mão dupla.

A responsabilização e o sistema de premiação pelo cumprimento de metas - quaisquer que sejam - têm de ter como limite e eixo central de implementação as questões de equidade e das desigualdades sociais. Nesse sentido, é fundamental pensar políticas de ação afirmativa que ofereçam condições efetivas para que as escolas de mais baixo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) possam atuar dentro de suas redes em direção à melhoria da qualidade do ensino.

Não existe uma receita única, mas várias propostas norteadas pela equidade já estão em andamento em algumas redes de educação. Entre elas, incentivos para os professores permanecerem na mesma escola, combate ao absenteísmo, respeito ao tempo escolar, programas de reforço escolar, aceleração da aprendizagem, estagiários e professores auxiliares, etc.

É preciso articular essas diferentes experiências com as propostas de premiação e incentivo, de modo que se criem condições de equidade, para não cairmos no grande equívoco de deixar para trás uma parcela significativa da população, acarretando um alto custo no médio e no longo prazos nas nossas pretensões de desenvolvimento.

O caminho não é simples e exige um esforço de todos, tanto dos governos quanto da sociedade civil e dos pais de alunos, no sentido de buscarmos uma visão de educação mais sistêmica, ajustada às necessidades do mundo moderno.

Precisamos construir uma política de educação que leve em conta as questões de gestão e, portanto, de seus mecanismos institucionais, de forma simultânea aos aspectos pedagógicos - em que o professor ocupa um lugar central. E, finalmente, o esforço nacional pela melhoria da qualidade da educação passa também pela articulação de políticas sociais de forma integrada à escola.

domingo, 30 de maio de 2010

Educacao no Brasil: salarios e desempenho dos professores

Mudar os professores ou mudar de professores
Artigo • Gustavo Ioschpe
Revista Veja, edição 2167 - 2 de junho de 2010

"A partir da década de 90, ocorreu um aumento substancial de salário nas regiões mais pobres do Brasil, mas não houve melhoria na qualidade do ensino"

Durante muito tempo, quando se falava dos problemas da educação no Brasil, havia uma resposta pronta e definitiva: é preciso aumentar o salário dos professores. Com salário baixo como seria o dos professores, não se poderiam exigir motivação e comprometimento. Nos anos recentes, essa teoria foi seriamente erodida por uma avalanche de fatos que mostram que o problema do professor brasileiro não é de motivação, mas de preparo, coisa que salário não muda.

Pesquisa da Unesco com amos-tra representativa dos nossos professores, publicada no livro O Perfil dos Professores Brasileiros, revela que apenas 12% se dizem insatisfeitos com a carreira. Quase a metade do total (48%), aliás, estava mais satisfeita no momento da pesquisa do que no início de sua carreira. Só 11% dos entrevistados gostariam de dedicar-se a outra profissão no futuro próximo. O segundo prego no caixão dos dinheiristas foi a própria experiência brasileira: a partir da década de 90, ocorreu um aumento substancial de salário nas regiões mais pobres do país através do Fundef, porém não houve melhoria na qualidade da educação. De fato, ela piorou: o Saeb, teste do MEC para aferir a qualidade do ensino básico, mostra que em 2007 estávamos pior do que em 1995. A experiência brasileira em nada difere daquilo que é observado no resto do mundo, aliás: há literalmente centenas de estudos medindo o impacto do salário dos professores sobre o aprendizado dos alunos, e a grande maioria não encontra relação significativa entre essas variáveis.

A inexistência da relação entre salário e aprendizagem, porém, não prejudicou os defensores da causa. Pelo contrário, agora eles vêm com hipótese ainda mais ambiciosa (e cara): os aumentos dados até hoje não surtiram efeito porque são mixurucas; para que deem o resultado esperado, precisam dobrar ou triplicar. Assim, a carreira de professor seria atraente e fisgaria estudantes que hoje pensam em ser médicos ou advogados. A lógica subjacente a essa visão é que os professores em exercício são tão despreparados e intelectualmente deficientes que não há muito que se possa esperar deles. Seria preciso fundar uma nova carreira, com novos candidatos, de outro gabarito. A bíblia dos proponentes dessa teoria é um estudo da consultoria McKinsey que mostra que nos sistemas educacionais de alta performance os professores recebem salário acima da média, tornando a carreira atraente para os melhores alunos.

Sou bastante cético em relação a essa lógica, por vários motivos. Em primeiro lugar, porque não há base empírica sólida. Consultoria não faz ciência; seus estudos não precisam passar pelo crivo da análise de árbitros-experts anônimos, como na publicação de artigos científicos. O estudo em questão sofre de um erro conceitual grave: não é possível determinar nenhuma relação de causa e efeito observando-se apenas aqueles que dão certo. É como se um antropólogo passasse dois anos estudando os hábitos dos 100 empresários mais exitosos do Brasil e concluísse que, para chegar lá, é preciso assistir a jogos de futebol aos domingos, pois a grande maioria dos empresários faz isso. O problema é que os peões das suas fábricas também o fazem, mas você só poderia descobrir que esse hábito é totalmente irrelevante se estudasse uma amostra aleatória de pessoas que representasse a totalidade da população. Quando isso é feito, nota-se que entre os países que mais gastam em educação, e que pagam os maiores salários aos professores, estão tanto países nórdicos de grande sucesso quan-to países da África Subsaariana que têm os piores índices de aprendizagem. Meu segundo problema com essa ideia é histórico: as grandes conquistas da humanidade, desde a existência da capacidade de linguagem até a criação da democracia, se deram através de processos evolutivos, e não revolucionários. São pouquíssimas as revoluções que deixaram saldo mais positivo. Em educação, não é diferente: os países que deram grandes saltos educacionais fizeram o feijão com arroz, de maneira tenaz, obstinada e contínua.

O terceiro obstáculo a essa ideia é conceitual: assim como não acredito que haja alunos que não podem aprender, não creio que haja professores que não podem ensinar. É claro que as pessoas têm habilidades diferentes e que a genética apresenta algumas barreiras intransponíveis, de modo que nem todo aluno ou professor pode ser um Einstein em sua área. Mas fazer o básico, transmitindo conhecimentos de forma eficiente e sistemática, desenvolvendo a capacidade de raciocínio e a curiosidade de seus alunos, está ao alcance de todo professor bem-intencionado. Basta que ele obtenha o preparo necessário.

Por fim, uma duplicação ou triplicação do salário dos professores brasileiros é simplesmente inexequível, dada a realidade fiscal brasileira. Hoje, segundo os dados mais recentes da OCDE, o Brasil gasta praticamente 70% de seu orçamento educacional apenas com a folha salarial. O artigo 212 da Constituição estipula que estados e municípios precisam gastar pelo menos 25% de sua receita com educação. Ora, 70% de 25% é 17,5%. Dobrar o salário de professores implicaria destinar 35% de toda a arrecadação de estados e municípios somente ao pagamento desses funcionários. Triplicar seus salários significaria consumir 52,5% de todo o orçamento. Não vejo como seria possível fazer isso sem quebrar as finanças do país ou solapar totalmente a oferta de outros serviços indispensáveis, como saúde, segurança, transporte.

Se essa fosse apenas uma questão acadêmica, seria só um desperdício de tempo. Mas não é: 3,5 milhões de alunos estão cursando a 1ª série atualmente; perder mais um ano em discussões estéreis significa forçar todo esse contingente a carregar para o resto da vida as marcas de uma educação deficiente.

Centenas de estudos, feitos ao longo de décadas, indicam que existem muitos caminhos baratos ou gratuitos para melhorar a aprendizagem das nossas crianças: a prescrição e correção de dever de casa, a utilização de testes constantes para medir a aprendizagem e corrigir erros, o uso de bons livros didáticos, o conhecimento aprofundado do professor sobre a matéria que ensina, a abolição de tarefas mecânicas, como a cópia de material do quadro-negro, propiciando utilização eficiente do tempo de sala de aula, e tantos outros. A existência dessas alternativas nos impõe a obrigação de tentá-las, antes de partir para soluções caras e incertas.

É uma discussão que me lembra uma passagem do escritor Amós Oz. Conta ele que sua avó sempre lhe dizia: "Não sei por que houve tantos séculos de brigas e perseguições entre judeus e cristãos. Nossa única diferença é que uns acreditam que o Messias já veio à Terra e os outros acreditam que ainda virá. Então basta apenas esperar que o Messias chegue para perguntar-lhe: você está vindo pela primeira vez ou pela segunda? Até lá, vivamos em paz". Poderíamos sugerir a mesma trégua para a discussão educacional: vamos começar com as soluções baratas e simples. Se elas não funcionarem, e somente se elas não funcionarem, é que passaremos a considerar as propostas mirabolantes e caras.

domingo, 23 de maio de 2010

Desconstruindo a educacao brasileira: a marteladas, ao que parece

Vejam o comentário que recebi neste meu post:

domingo, 9 de maio de 2010
Descontruindo a educacao brasileira


O comentarista escreve, anonimamente, comme il faut (ou seja, quando se pretende apenas criticar, sem assumir os custos do comentário publicamente), mas é preciso que se dê o devido destaque ao que ele escreve. Ele começa, e isso eu preciso agradecer, por transcrever o que eu mesmo disse, ainda que de forma incompleta, como comentário à matéria transcrita no post original. Agradeço por dar destaque a uma humilde nota de rodapé, que deveria ser ampliada e desenvolvida (o que vou fazer in due time):

Anônimo deixou um novo comentário sobre a sua postagem "Descontruindo a educacao brasileira":

[PRA: aqui sou eu que estou escrevendo:] " [os países desenvolvidos] não esperaram por Piaget para construir um sistema educacional eficiente e democrático com base em alguns princípios muito simples: o mestre ensina, didaticamente, explicando direitinho para as crianças o que elas precisam saber em termos de língua pátria, matemáticas e ciências elementares, enfia tudo aquilo na cabeça delas, se preciso for um pouco na base da decoreba e da repetição, e depois cobra o que foi ensinado, distribuindo notas boas e más em função do resultado. Quem não aprendeu, é obrigado a refazer a lição até aprender.
Simples não é? Não precisa Piaget para fazer isso. Aliás, não precisa nem de quadro negro, ou quase: só precisa um professor competente e dedicado." [fim PRA]

[Aqui entra o Anônimo correspondente:] SALVAI-NOS ÓH DEUS, É DE FAZER ATEU REZAR!
QUANTO DISPARATE! RASGUEM O DIPLOMA DELE!
SÓ COMPROVA QUE, COMO ELE DISSE, O ENSINO VAI MAU DA GRADUAÇÃO AO PhD, PRINCIPALMENTE LÁ NA BÉLGICA ONDE FORMARAM ELE, POR QUE AQUI NO BRASIL NÃO DERAM O DIPLOMA NÃO...INTERROMPIDO NÉ?


Comento (PRA):
Não preciso acrescentar mais nada. Esse tipo de coisa apenas reforça minha convicção de que a situação da educação brasileira é muito, mas muuuuiiiito pior do que sequer podemos imaginar.
As pessoas sequer têm consciência de quanta "ruindade" se esconde atrás de tudo isso, atrás do que elas próprias pensam...
Paulo Roberto de Almeida

domingo, 9 de maio de 2010

Descontruindo a educacao brasileira

Admiravel o trabalho dessas pedagogas freireanas, que sem saber do que estão falando, se empenham solidamente em afundar a educação brasileira.
O Construtivismo, na verdade, é uma empulhação completa, servida por analfabetos, para manter as crianças analfabetas...
Paulo Roberto de Almeida

Educação: Sob os dogmas do construtivismo
Salto no escuro

Marcelo Bortoloti
REvista Veja, edição 2164 / 12 de maio de 2010

Seis de cada dez crianças brasileiras estudam segundo os dogmas do construtivismo, um sistema adotado por países com os piores indicadores de ensino do mundo

Mais de 60% das escolas públicas e particulares no Brasil se identificam como adeptas do construtivismo. Sendo assim, parece óbvio que seis de cada dez crianças brasileiras estão sendo educadas com base em uma doutrina didática cuja natureza, objetivos e lógica devem ser de amplo conhecimento de diretores, professores e pais. Correto? Errado. Uma pesquisa conduzida pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) desvenda um cenário obscuro. Em plena era da internet, os conceitos do construtivismo parecem ter chegado ao Brasil via as ondas curtas de 49 metros de propagação troposférica, com suas falhas e chiados. Ninguém sabe ao certo como o construtivismo funciona, muito menos saberia listar as razões pelas quais ele foi adotado ou deve ser defendido. Ele é definido erradamente como um "método de ensino". O construtivismo não é um método. É uma teoria sobre o aprendizado infantil posta de pé nos anos 20 do século passado pelo psicólogo suíço Jean Piaget. A teoria do suíço deu credibilidade à concepção segundo a qual a construção do conhecimento pelas crianças é um processo diretamente relacionado à sua experiência no mundo real. Ponto. A aplicação prática feita nas escolas brasileiras tem apenas o mesmo nome da teoria de Piaget. O construtivismo tornou-se uma interpretação livre de um conceito originalmente racional e coerente. Ele adquiriu várias facetas no Brasil. Unifica-as o primado da realidade da criança sobre os conceitos básicos das disciplinas tradicionais. Traduzindo e caricaturando: como não faz frio suficiente na Amazônia para congelar os rios, um aluno daquela região pode jamais aprender os mecanismos físicos que produzem esse estado da água apenas por ele não fazer parte de sua realidade. Isso está mais longe de Piaget do que Madonna da castidade.

A experiência mostra que as interpretações livres do construtivismo podem ser desastrosas – especialmente quando a escola adota suas versões mais radicais. Nelas, as metas de aprendizado são simplesmente abolidas. O doutor em educação João Batista Oliveira explica: "O construtivismo pode se tornar sinônimo de ausência de parâmetros para a educação, deixando o professor sem norte e o aluno à mercê de suas próprias conjecturas". Por preguiça ou desconhecimento, essas abordagens radicais da teoria de Piaget são a negação de tudo o que trouxe a humanidade ao atual estágio de desenvolvimento tecnológico, científico e médico. Sua ampla aceitação no passado teria impedido a maioria das descobertas científicas, como a assepsia, a anestesia, as grandes cirurgias ou o voo do mais pesado que o ar. Sir Isaac Newton (1643-1727), que escreveu as equações das leis naturais, dizia que suas conquistas só haviam sido possíveis porque ele enxergava o mundo "do ombro dos gigantes" que o precederam. O conhecimento que nos trouxe até aqui é cumulativo, meritocrático, metódico, organizado em currículos que fornecem um mapa e um plano de voo para o jovem aprendiz. Jogar a responsabilidade de como aprender sobre os ombros do aprendiz não é estúpido. É cruel.

Em um país como o Brasil, onde as carências educacionais são agudas, em especial a má formação dos professores, a existência de um método rigoroso, de uma liturgia de ensino na sala de aula, é quase obrigatória. A origem latina da palavra professor deveria ser um guia para todo o processo de aprendizado. O professor é alguém que professa, proclama, atesta e transmite o conhecimento adquirido por ele em uma arte ou ciência. Nada mais longe da realidade brasileira, em que menos da metade dos professores é formada nas disciplinas que ensina. À luz das versões tropicais do construtivismo, essa deficiência é até uma vantagem, pois, afinal, cabe aos próprios alunos definir com base em sua realidade o que querem aprender. É claro que um modelo assim já seria difícil funcionar em uma sala de aula ideal, com um mestre iluminado cercado de poucos e brilhantes pupilos. Nas salas de aula da realidade brasileira, é impossível que essa abordagem leniente dê certo. Adverte o doutor em psicologia Fernando Capovilla, da Universidade de São Paulo (USP): "As aulas construtivistas frequentemente caem no vazio e privam o aluno de conteúdos relevantes".

Um conjunto de pesquisas internacionais chama atenção para o fato de que, em certas disciplinas do ensino básico, o construtivismo pode ser ainda mais danoso – especialmente na fase de alfabetização. Enquanto na pedagogia tradicional (a do bê-á-bá) as crianças são apresentadas às letras do alfabeto e aos seus sons, depois vão formando sílabas até chegar às palavras, os construtivistas suprimem os fonemas e já mostram ao aluno a palavra pronta, sempre associada a uma imagem (veja o quadro). A ideia é que, ao ser exposto repetidamente àquela grafia que se refere a um objeto conhecido, ele acabe por assimilá-la, como que por osmose. De acordo com a mais completa compilação de estudos já feita sobre o tema, consolidada pelo departamento de educação americano, os estudantes submetidos a esse método de alfabetização têm se saído pior do que os que são ensinados pelo sistema tradicional. Foi com base em tal constatação que a Inglaterra, a França e os Estados Unidos abandonaram de vez o construtivismo nessa etapa. O departamento de educação americano também o contraindicou para o ensino da matemática – isso depois de uma sucessão de maus indicadores na sala de aula.

O construtivismo ganhou força na pedagogia durante a década de 70, época em que textos de Piaget e de alguns de seus seguidores, como o psicólogo russo Lev Vygotsky (1896-1934), vários dos quais traduzidos para o inglês, foram descobertos nas universidades americanas. Foi a partir daí que a corrente se disseminou por escolas dos Estados Unidos e da Europa. No Brasil, virou moda. Uma década mais tarde, porém, tal corrente começaria a ser gradativamente abandonada nos países que a adotaram pioneiramente. Os responsáveis pelo sistema educacional daqueles países chegaram a uma mesma conclusão: a de que a adoção de uma filosofia que não se traduzia em um método claro de ensino deixava os professores perdidos, deteriorando o desempenho dos alunos. Hoje, são poucos os países ainda entusiastas do construtivismo. Entre eles estão todos os de pior desempenho nas avaliações internacionais de educação. Com seis de cada dez crianças brasileiras entregues a escolas que se dizem adeptas do construtivismo, é de exigir que diretores, professores, pais e autoridades de educação entendam como se atolaram nesse pântano e tenham um plano de como sair dele.

domingo, 18 de abril de 2010

2028) Paulo Freire - um pessimo pedagogo e a insistencia no atraso...

Dois comentaristas se deram ao trabalho de comentar um post meu sobre o arremedo de pedagogo e uma das muitas (estúpidas) unanimidades nacionais, que responde pelo nome do post:

quinta-feira, 8 de abril de 2010
2054) Celebrando o atraso - Paulo Freire nos EUA
Idiotas existem em todas as partes, como comprova a informação abaixo...

Universidade americana comemora 40 anos da tradução de Paulo Freire para o inglês

Um, o José Marcos veio em socorro do Paulo Freire, dizendo que teve, uma vez, a "oportunidade de assistir a uma palestra de Paulo Freire um pouco depois de seu retorno ao Brasil. Com sua voz mansa e pausada, Paulo Freire brindou a assistência com um convite para olharmos o mundo com uma visão mais crítica. Sugeriu que nos conscientizássemos mais da realidade em que estávamos inseridos."

Ela está contente que Paulo Freire faça sucesso nos EUA, afirmando a propósito dos americanos que: "Seduzidos pela magia mefistofélica da ciência, não percebem que, muitas vezes, causam sofrimento desnecessário aos povos que não comungam com os seus ideais."

Pois é, os americanos foram seduzidos por essa magia mefistofélica, menos aqueles, claro, que puderam ler Paulo Freire, e foram guiados pela luz da razão e pela promessa de libertação dos valores vis do capitalismo. Por isso que os americanos são tão atrasados, e os brasileiros, cuja educação é dominada de maneira intensiva e extensiva pelos ensinamentos de Paulo Freire, são tão avançados, progressistas, prósperos e cientificamente na vanguarda da humanidade.

Em seguida, o leitor Rubens perguntou, gentilmente, ao primeiro "se a doutrina Bush é prejudicial ao Direito Internacional, e o com certeza o é, o que dizer da Doutrina Mao Tse-Tung, que Paulo Freire tanto propagava? Não foi nem um pouco prejudicial a tudo aquilo o direito mais quer preservar?"
Rubens sabe bem as diferenças entre os EUA e a China de Mao, e por isso convida o primeiro comentarista a ser mais cauteloso:
""Visão mais crítica da realidade"? Pergunte aos morreram na China comunista se a visão crítica que eles tinham foi respeitada. E o que Paulo Freira achava da educação na China."

Voltou então o José Marcos com uma longa tergiversação formalística sobre o que tinha afirmado Rubens, colocando questões absolutamente superficiais, jamais tocando no âmago da questão.

Vou ajudá-lo na tarefa, resumindo o debate desta forma, ao risco de ser cruel com ambos, isto é, Paulo Freire e seu procurador voluntário José Marcos.

Paulo Freire, junto com outros representantes do marxismo universitário, é um dos muitos publicistas (avant la lettre, no seu caso) do "outro mundo possível". Existem, sim, muitos escritos nos quais ele celebra o sistema chinês -- provavelmente na ignorância completa do que se passava lá -- num momento em que a China era submetida, por aquele lunático econômico, a um dos maiores experimentos de engenharia social de que se tem notícia na história da humanidade.
Talvez o José Marcos não saiba, mas quando Paulo Freire escrevia suas maravilhas pedagógicas e celebrava os feitos do comunismo maoista, a China empreendia sob a liderança de Mao o "grande salto para a frente", que simplesmente resultou na morte -- por fome e outras endemias -- de aproximadamente 25 milhões de pessoas.
Pouco depois, a chamada Revolucao Cultural simplesmente destruiu o que tinha sobrado de universidade na China, mandando professores trabalhar no campo, em aldeias recuadas.

Mas, deixemos a tragédia maoista de lado, pois isso não nos concerne diretamente (embora os acadêmicos brasileiros escolham deliberadamente ignorar essas realidades) e voltemos para Paulo Freire.
Ele certamente foi uma pessoa bem intencionada, ainda que completamente equivocada. Ele queria o bem do povo, apenas que, como muitos outros marxistas vulgares, ele tinha uma visão deformada da realidade, que ele via sempre em preto e branco, conforme os ditames da luta de classes. Se era aristocrata, burguês, classe dominante, capitalismo, tudo isso era intrinsecamente perverso, maléfico para o povo. Se fosse do povo, das chamadas classes subalternas, dos oprimidos, então era literalmente bom, e deveria ser promovido.
O que faltava, ao povo, era uma consciência de classe, que era preciso promover, pela educação, para ele lutar pela sua libertação da opressão (capitalista, obviamente).
O mundo do socialismo -- chinês, ou outro -- era infinitamente superior ao mundo capitalista, odiado por qualquer marxista que se preze.
A educacao do povo deveria ser feita menos do be-a-bá tradicional, do tipo "Ivo viu a uva", e mais com as realidades simples do dia a dia: enxada, foice, martelo, sandálias, cabanas, em contraste com a opulência das elites. Tudo isso seria mudado um dia, se as pessoas do povo tomassem consciência de que eles eram pobres apenas porque os ricos os tinham explorado e roubado.

Estou simplificando um pouco, mas essa era a mensagem de Paulo Freira, um marxismo de botequim extremamente vulgar, para não dizer idiota, assim como são idiotas, ingênuos ou ignorantes aqueles que acham que sua mensagem tenha algo a ver com a atualidade e as necessidades de paises, ricos ou pobres.

O que essas pessoas não percebem é que o "paulofreirismo", dominante nos cursos de pedagogia do Brasil desde o final dos anos 1960 pelo menos, vem sendo praticado nos estabelecimentos de ensino de uma forma ou de outra, com os resultados que se conhecem: o Brasil é um dos últimos lugares em TODOS os exames comparativos de avaliação escolar que se possa fazer pelo mundo afora.

Se os leitores, especialmente o José Marcos, não conhece essa realidade, eu o convido a entrar na pagina da OCDE (www.oecd.org) e buscar por PISA: Program of International Student Assessment, e ver ali o lugar do Brasil nas três áreas selecionadas para avaliação: língua nacional, ciências básicas, matemáticas elementares. O Brasil consegue concentrar seus alunos nas seções inferiores, no que constitui uma tragédia nacional.

Não tenho nenhuma hesitação em atribuir a Paulo Freire uma grande, uma ENORME responsabilidade por essa tragédia.

Paulo Roberto de Almeida
(Dunhuang, China, 18.04.2010)