O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

terça-feira, 3 de outubro de 2023

Conversa com o antropólogo e escritor Antonio Risério : entrevista no YouTube e texto de apoio - Paulo Roberto de Almeida

 1528. Conversa com o antropólogo e escritor Antonio Risério”, entrevista livre sobre temas da diplomacia brasileira em diversos outros assuntos, Notas rápidas, preliminares, para entrevista gravada com o antropólogo Antonio Risério (https://www.youtube.com/@AntonioRiserio_) em 10/09/2023; Exibido no canal YouTube em 2/10/2023 (link: https://www.youtube.com/watch?v=U_SV0vc9Vy0); texto preparado para apoiar a conversa preparado em 4 setembro 2023, 7 p. divulgado neste blog Diplomatizzando em 3/10/2023. Relação de Originais n. 4467.

Conversa aberta sobre a diplomacia brasileira em diversos tempos 

 

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Notas rápidas, preliminares, para entrevista gravada com o antropólogo e escritor Antonio Risério, para seu canal (https://www.youtube.com/@AntonioRiserio_).

  

Recebi convite do antropólogo Antonio Risério – conhecido estudioso das relações sociais e humanas no Brasil, em especial para questões de mestiçagem, sobre as relações entre raças e o identitarismo e outras manias minoritárias – para uma entrevista aberta, em sua página no canal do YouTube (https://www.youtube.com/@AntonioRiserio_), sobre temas de seu interesse, a exemplo das entrevistas que ele já conduziu, nos seus Encontros, com Demétrio Magnoli (https://www.youtube.com/watch?v=wlg0NFxKWeM&t=3891s), Luiz Mott (https://www.youtube.com/watch?v=xPVH8LYYCj4&t=1452s), Mary Del Priore (https://www.youtube.com/watch?v=Opk2Q-JFcAI), e vários outros interlocutores. 

A temática escolhida, como não poderia deixar de ser em meu caso particular, foi a diplomacia brasileira e meu trabalho nos quadros do Itamaraty, assim como sobre a política externa de diferentes governos brasileiros ao longo dos últimos anos. Abaixo, as perguntas formuladas pelo entrevistador, como uma espécie de guia para conduzir a conversa, e apenas algumas notas resumidas de minha parte em torno das questões levantadas, cabendo, evidentemente, deixar elaborações mais completas para a própria gravação online da interação, efetuada no dia 10 de setembro de 2023, material a ser veiculado oportunamente.

 

1 Você já se referiu ao Itamaraty como instituição sempre submissa ao governo da ocasião. Pode desenvolver um pouco isso?

PRA: Diplomatas são mandarins do Estado, como outros tecnocratas governamentais, irmãos quase siameses dos militares, estes detendo um poder efetivo de intervenção sobre a máquina pública e, de forma mais ampla, sobre os rumos da política nacional, um poder totalmente inexistente no caso dos diplomatas, meros burocratas sempre dependentes das instruções e dos favores das elites (as oligarquias) que detêm os comandos do governo e do Estado. Os diplomatas seniores costumam repetir, para si próprios, o bordão comportamental bem mais adaptado à vida militar do que às atividades do serviço exterior; os chefes da Casa sempre se referem aos dois princípios que devem guiar a postura de seus subordinados: a hierarquia e a disciplina. Este bordão, sempre repetido a cada cerimônia da instituição, é a essência do desempenho dos diplomatas, e isso explica a sua submissão à cúpula do poder decisório, que está sempre no presidente, no chanceler, ou nos chefes das unidades orgânicas do ministério. Em linguagem popular, e repetindo uma frase humilhante: “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Diplomatas são ensinados a obedecer desde os bancos escolares do Instituto Rio Branco, socialização a que não fui submetido pois que ingressei na carreira por concurso direto (excepcional) e não por vestibular de acesso à academia diplomática (IRBr).

 

2 Não me lembro onde li a observação que vou citar. Talvez no livro de Luiz Vianna Filho sobre o Barão do Rio Branco, talvez no livro de memórias de Afonso Arinos, não me lembro. Mas é uma coisa dizendo assim que o Barão do Rio Branco queria diplomatas que se interessassem por documentos antigos e não por móveis antigos. O Itamaraty ainda tem esse problema hoje, gente mais interessada em mobiliário chique do que na documentação relevante?

PRA: Deve ter sido Afonso Arinos, pois Luiz Viana Filho fez uma biografia relativamente simpática a Rio Branco, e mais voltada para seus anos de formação e de preparação do que propriamente para seu desempenho como chanceler, objeto da outra biografia oficial, a de Álvaro Lins, que peca pelo tom oficialesco, quase encomiástico em relação ao Barão. Afonso Arinos confessa que, na implementação da Política Externa Independente, ficou chocado pelo conservadorismo dos quadros superiores do Itamaraty, onde se desempenhou duas vezes, sob o curto governo de Jânio Quadros e num dos gabinetes parlamentaristas sob João Goulart. Além do conservadorismo, havia, nesses tempos da diplomacia no Rio de Janeiro, essa afetação e encantamento pelos aspectos formais da diplomacia, mais do que pela substância própria aos interesses nacionais brasileiros. 

Atualmente, é bem diferente: estamos longe daquela feição “ornamental e aristocrática” de que falava Hélio Jaguaribe num dos capítulos do seu livro de 1958, O nacionalismo na atualidade brasileira (agora disponível em edição digital na Biblioteca Digital da Fundação Alexandre de Gusmão). A transplantação da capital para o planalto central em 1960, mas no caso do Itamaraty apenas em 1970, e do Instituto Rio Branco em 1975, representou uma grande mudança no recrutamento, no tipo de seleção, na própria formação dos diplomatas, que atualmente têm maior e melhor formação de origem do que os antigos burocratas, muitas vezes provenientes das famílias tradicionais do Império e da Velha República. Mesmo na República de 1946, ainda perduravam as antigas dinastias diplomáticas, o que começou a mudar nas décadas seguintes, quando o recrutamento “capturou” filhos de imigrantes e gente da classe média urbana. Ou seja, a composição social e a mentalidade dos atuais diplomatas é bem diferente do que existia até os anos 1960-70, mas o enquadramento naqueles dogmas principais do Serviço Exterior – hierarquia e disciplina – ainda predomina.

 

3 Você me informou que está escrevendo um livro sobre os intelectuais do Itamaraty. Não sei se trata de todos os que passaram por serviços diplomáticos ou se se limita aos quadros de carreira do próprio Itamaraty. Porque Roberto Campos, por exemplo, foi embaixador, mas não sei se era do Itamaraty. De qualquer modo, o Itamaraty teve intelectuais admiráveis. Então, eu quero saber se você pode nos dar um trailer do seu livro, dando-nos retratos sintéticos de duas figuras que certamente devem estar nele: San Tiago Dantas e José Guilherme Merquior. Pode ser?

PRA: Desde meu ingresso – quase que por acaso – na vida diplomática, sempre combinei o rigor da carreira com as lides acadêmicas, às quais nunca deixei de estar ligado, por minhas atividades docentes e uma intensa produção de artigos e livros. Sempre procurei acompanhar a produção de colegas intelectuais, e o fato é que os grandes intelectuais da carreira o são não exatamente por suas atividades burocráticas na defesa externa do Brasil – com algumas brilhantes exceções, como Rubens Ricupero, por exemplo –, mas pelo seu trabalho em áreas paralelas – história, ciência política, sociologia – ou até distante, como literatura ou música. 

Em 2001, iniciada antes por Luiz Felipe Lampreia, terminada por Celso Lafer, foi publicada a obra O Itamaraty na Cultura Brasileira – que, quando na direção do Instituto de Pesquisas de Relações Internacionais da Funag, entre 2016 e 2018, fiz questão de digitalizar e colocar à disposição do público interessado em minha página na plataforma Academia.edu (https://www.academia.edu/46849306/O_Itamaraty_na_Cultura_Brasileira_2001_) – que tinha permanecido relativamente desconhecida. Fiz questão de preparar uma terceira edição, agregando aos nomes dos contemplados (terminava por José Guilherme Merquior), seis outros diplomatas que tinham falecido desde então: Sérgio Corrêa da Costa, Roberto Campos (eu mesmo escrevi); Lauro Escorel, Wladimir Murtinho (por Rubens Ricupero), Vasco Mariz (por Mary Del Priore) e José Osvaldo de Meira Penna. Essa edição, preparada em 2018, antes, portanto, da chegada dos “novos bárbaros” ao poder, não foi publicada, por razões burocráticas e orçamentárias, e permanece até hoje inédita.

Confrontado a esta dificuldade, resolvi produzir um novo livro, aproveitando a maior parte dos antigos personagens, mas transformado, na forma e no conteúdo, num volume inteiramente novo, sob o título de “Intelectuais na diplomacia brasileira: a cultura a serviço da nação”. O índice contempla estes grandes intelectuais, não apenas diplomatas de carreira: Rui Barbosa (Carlos Henrique Cardim); Bertha Lutz (Sarah Venites); Afonso Arinos de Melo Franco (Paulo Roberto de Almeida); San Tiago Dantas (Marcílio Marques Moreira); Roberto Campos (Paulo Roberto de Almeida); José Oswaldo de Meira Penna (Ricardo Vélez-Rodríguez); Lauro Escorel (Rogério de Souza Farias); Wladimir Murtinho (Rubens Ricupero); Vasco Mariz (Mary Del Priore); José Guilherme Merquior (Gelson Fonseca Jr.); Sergio Paulo Rouanet (João Almino). Tem ainda dois capítulos meus sobre as relações entre os intelectuais e a cultura.

Sobre os dois grandes intelectuais que você cita, San Tiago Dantas e José Guilherme Merquior, tenho a satisfação de lhe dizer que eles fazem parte, com dezoito outras personalidades, desde José da Silva Lisboa, Hipólito da Costa, José Bonifácio e vários outros, inclusive os dois Rio Brancos, Rui Barbosa, Roberto Campos, até Merquior, justamente, em meu livro Construtores da Nação: projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior (Curitiba: Appris, 2022), cujo índice figura em meu blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/05/construtores-da-nacao-projetos-para-o.html).

 

4 Como foi o quiprocó que gerou uma demissão sua durante o governo de Bolsonaro?

PRA: Foi um episódio menor em minha carreira e inteiramente previsível. Eu já sabia, desde o segundo turno das eleições de outubro de 2018, que eu seria demitindo da chefia do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI), do Itamaraty, desde o dia 1º de janeiro de 2019, dada a minha absoluta incompatibilidade com os “novos bárbaros” que passaram a dominar o governo e a diplomacia brasileira. Demorou um pouco mais: foi só na segunda-feira de Carnaval, no começo de março, e relatei toda a história, pois que publiquei, conjuntamente, uma conferência do Ricupero, um artigo do FHC e um artigo do próprio chanceler acidental, o antiglobalista olavista, em meu blog, chamando a um debate sobre a política externa do desgoverno Bolsonaro: foi às 2hs da madrugada do domingo de Carnaval; as 8hs da segunda-feira fui avisando de minha saída, o que me trouxe enorme alívio, pois nunca teria contemplado servir a um tropa de lunáticos. Tudo está perfeitamente relatado em meu blog Diplomatizzando, conforme os registros abaixo em minha lista de trabalhos: 

3422. “A política externa brasileira em debate: Ricupero, FHC e Araújo”, Brasília, 4 março 2019, 18 p. Introdução, em 2 p., à transcrição de três textos relativos à política externa do governo Bolsonaro, de Rubens Ricupero (25/02/2019), de Fernando Henrique Cardoso (03/03/2019), e do chanceler Ernesto Araújo (3/03/2019). Postado no blog Diplomatizzando (4/03/2019; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/03/a-politica-externa-brasileira-em-debate.html); disponibilizado na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/s/70710c9869/a-politica-externa-brasileira-em-debate-ricupero-fhc-e-araujo).

3423. “Nota sobre minha exoneração como diretor do IPRI”, Brasília, 4 março 2019, 1 p. Explicando o que se passou. Divulgado no blog Diplomatizzando (4/03/2019; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/03/nota-sobre-minha-exoneracao-como.html).

 

5 Com Lula e Celso Amorim, estamos de volta aos tempos de Sukarno, Nasser e Mao Zedong, aos tempos da Conferência de Bandung, na Indonésia, e de mitos nascidos a partir dali?

PRA: Não exatamente, pois o Itamaraty nunca fez parte do Movimento Não Alinhado, nem a China, por sinal, ainda que ela tenha estado na conferência de Bandung, em 1955. Mas, o MNA surge apenas em 1961, com Tito, Nasser, Sukarno e Nehru, principalmente, mas o Brasil sempre foi apenas um observador no MNA. Lula e Celso Amorim pretendiam, nos dois primeiros mandatos, retomar a chamada Política Externa Independente, de Afonso Arinos e San Tiago Dantas, do início dos anos 1960, mas ela foi apenas um arremedo de independência, pois eles vincularam muito fortemente a diplomacia brasileira aos interesses cubanos e chavistas. Atualmente, parece se deteriorar ainda mais, pois o Brasil de Lula e Amorim, supostamente não alinhado, acaba de alinhar ainda mais fortemente o país a duas grandes autocracias, China e Rússia, e a mais meia dúzia de governos altamente suspeitos em suas respectivas orientações de política externa, num projeto pelo menos esquizofrênico: o de criar uma “nova ordem global”, o que supõe que pretendem denunciar a atual ordem mundial e substituí-la por outra, cuja natureza exata desconhecemos; mas esses países não pretendem usar o dólar como moeda em seus intercâmbios externos respectivos.

 

6 Você fala de erros fundamentais do governo de Lula em matéria de política internacional, inclusive no lance dos BRICS. Você pode nos resumir quais são esses equívocos? No afã de se contrapor à hegemonia norte-americana, Lula está se curvando a uma hegemonia chinesa?

PRA: Denunciei desde o início essa ideia de um BRIC, como um equívoco estratégico elementar do primeiro Lula, depois consolidado na gaiola de ferro do BRICS, a partir de 2011, e agora transformado numa armadilha chinesa sob a forma do BRICS+, devotado, como já está dito na pergunta, ao antiamericanismo mais pueril e anacrônico. Lula não pretenderia se dobrar a uma hegemonia chinesa, mas a dependência do Brasil no tocando aos saldos comerciais absolutamente indispensáveis ao equilíbrio da balança de transações correntes tem essa consequência involuntária. O pior, na verdade, é a neutralidade hipócrita, inteiramente e objetivamente favorável à Rússia do criminoso de guerra Putin, em sua guerra de agressão contra a vizinha Ucrânia, o que o transforma em novo Hitler do século XXI. A diplomacia brasileira já esteve em melhores companhias. 

 

7 No caso da guerra da Rússia contra a Ucrânia, podemos dizer que o Brasil, no momento em que ignora as sanções econômicas do mundo ocidental à Rússia e em que compra cada vez mais na mão dos russos, está tomando partido não só diplomaticamente, mas objetivamente, em termos materiais, financeiros, ao lado da ditadura de Putin?

PRA: A postura do Brasil tem mais nuances, ou matizes, pois que a doutrina jurídica da diplomacia profissional fez com que o país aderisse às resoluções da Assembleia Geral da ONU (que são puramente simbólicas) condenando a Rússia pela invasão desde o governo Bolsonaro, mas na prática o Brasil realmente se comporta como um aliado objetivo do invasor e do destruidor da Ucrânia e massacrador do seu povo. Lula, desde que assumiu, fez muito pior do que Bolsonaro, que tinha declarado “solidariedade à Rússia”, mas importou combustíveis e fertilizantes naquele momento de altos preços, e por razões puramente eleitoreiras; Lula aumentou enormemente a importação de combustíveis russos, e se opôs a conversar com Zelensky, o que significa que apoia abertamente a guerra de agressão da Rússia. Isto não passou despercebido pela maior parte dos nossos parceiros ocidentais.

 

8 Você é mais conhecido por suas intervenções no campo da análise e das discussões do Brasil no sistema das relações internacionais. Mas na verdade você tem se manifestado também sobre outros temas. Em meu livro “Em Busca da Nação”, por exemplo, cito um belo texto seu, “A Ignorância Letrada”, sobre a deterioração da qualidade na universidade brasileira na área de “humanas”. Esta universidade, que já foi lugar de inquietude e criatividade, hoje é o túmulo da liberdade intelectual. Como você analisa esse processo?

PRA: Eu, como acadêmico e sociólogo, venho do marxismo, mas nunca fui dogmático, e ao lado de Marx e Lênin, sempre li Raymond Aron e Roberto Campos, o que resultou numa cultura política altamente eclética, que poderia ser classificada de liberal em economia – não apenas pelo estudo, mas pela observação direta dos regimes socialistas realmente existentes, uma miséria material, mas sobretudo uma miséria moral –, socialdemocrata em política, sem qualquer partidarismo, e anarquista em cultura, um pouco como Merquior – a quem nunca conheci – se definia pessoalmente. 

Acompanhei, ao longo das últimas cinco décadas, a deterioração da qualidade de nossa academia, essencialmente nas áreas das humanidades e das ciências sociais, ainda que eu respeite os grandes valores, também ecléticos, que mantêm uma aura de respeitabilidade em diversas instituições públicas e privadas. Mas, como egresso da velha escola pública republicana dos anos 1950 e começo dos 1970, espanta-me constatar que, hoje, um jovem vindo de família pobre, como eu era naqueles idos, não tem a menor chance de aceder a uma universidade pública, salvo casos excepcionais. Todo o meu empenho como cidadão estaria concentrado numa revolução no ensino básico, fundamental e técnico, como condição essencial para retirar o Brasil das agruras do subdesenvolvimento material e espiritual. 

 

9 Você também já abriu mão de uma perspectiva de futuro para o Brasil? Acha que perdemos definitivamente o bonde da história? Ou é dos que pensam que não devemos desistir do Brasil?

PRA: JAMAIS! Outros países vieram da pobreza e, ao longo de uma história de trabalho e de construção da cidadania, souberam construir um presente de relativo bem-estar e de bases razoáveis de uma governança cidadã, com produtividade satisfatória e corrupção controlada. Alguns outros, aqui mesmo na região, saíram de uma pujança outrora alimentada por vantagens comparativas estáticas, para uma decadência inaceitável, feita inteiramente de populismos estéreis, de direita e de esquerda, e hoje amargam uma deterioração econômica e política que pode, no entanto, ser revertida, como outros países conseguiram fazer, à custa de muito trabalho, de lideranças que corresponderam à postura de estadistas, e de um pouco de sorte. Sim, é preciso um pouco de sorte, para tudo de ajeitar como gostaríamos que fosse.

O Brasil por vezes me dá a impressão de ser uma Argentina em marcha lenta, mas assim como, no passado, tivemos lideranças democráticas altamente comprometidas com o desenvolvimento equilibrado do país – cito apenas JK e FHC –, creio que poderemos, com algum esforço educacional e muita vigilância sobre o atual estamento político predatório, e nossas lideranças medíocres, reverter nossa estagnação relativa. O povo brasileiro é dinâmico e muito aberto à modernidade; temos ilhas de excelência – em ciência e tecnologia, no empreendedorismo, nos impulsos de solidariedade social – num mar de pobreza, injustiças, corrupção e muita desigualdade construída pelas oligarquias e pelo próprio Estado, assim que nada nos condena a mergulhar num declínio irreversível, embora estejamos em meio, na atualidade, à exportação de braços e de cérebros. Creio que o aumento gradual, paulatino, dos padrões de qualidade da educação em geral, da pública em especial, fará com que o Brasil, dentro de duas ou três gerações, alcance níveis de bem-estar similares aos países da franja inferior da OCDE atual, o que já seria um tremendo progresso social. 

Todos os meus esforços, durante toda a vida, vindo de uma família realmente muito pobre, estão concentrados em objetivos pedagógicos, no sentido de transmitir aos mais jovens todo o conhecimento acumulado em mais de meio século de estudos, viagens, docência, experiência de trabalho, aprendizado na observação concreta de muitos povos em praticamente todos os continentes. Estou confiante no Brasil, mesmo sabendo que esse futuro não é para mim, nem, provavelmente, para os meus filhos; talvez para os netos e bisnetos; mas ele virá!

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4467, 4 setembro 2023, 7 p.


Jimmy Carter: um homem digno na política, o que é raro

 CRISTOVAM BUARQUE E LUCAS DE SOUZA MARTINS 

Carter, 99 anos

Ex-presidente americano mostrou que fazer política exige causa com valores Morais 

Folha de S. Paulo, 2/10/2023


 Ao completar 99 anos de idade neste domingo (1º), Jimmy Carter se perpetua como o mais longevo dos ex-mandatários de seu país. Comemorar seu aniversário e seu legado é celebrar a boa política. Entre todos os presidentes norte-americanos, nenhum teve um mandato tão digno e uma pós-presidência tão exemplar quanto ele. Seu ativismo pelo que é correto, aliás, precede o seu tempo na Casa Branca. Ao se tornar governador de seu estado natal, a Geórgia, passou a comandar uma região que convivia com as assombrações políticas de um passado segregacionista. "O tempo de discriminação racial acabou", disse ele em seu discurso de posse em 1971. 

Apenas três anos antes, um conterrâneo famoso, o reverendo Martin Luther King, havia sido assassinado por seu ativismo em nome da igualdade racial. Carter ousou ao inserir um retrato de King no Capitólio estadual e se tornou foco de protestos da Ku Klux Klan. Até então, nenhum afro-americano tinha recebido tal homenagem no prédio que abriga os Poderes Executivo e Legislativo da Geórgia, um ex-estado confederado que lutou contra Abraham Lincoln na Guerra Civil. Ao vencer as eleições presidenciais de 1976, Carter representou o triunfo da moralidade em um cenário político delicado. Seu adversário, o presidente e republicano Gerald Ford, chegou a usar do cargo para perdoar o antecessor do mesmo partido, Richard Nixon, implicado com o escândalo do Watergate. 

No cargo, Jimmy Carter foi o primeiro presidente na história dos Estados Unidos a colocar o tema dos direitos humanos como prioridade de Estado. Carter foi um amigo do Brasil democrático. Suas reiteradas condenações a ditaduras na América Latina motivaram o rompimento do Acordo Militar Brasil-EUA (1952) pelo governo brasileiro em 1977. Em visita oficial no mesmo ano, a primeira-dama Rosalynn —escoltada por oficiais do Exército— se encontrou com o arcebispo dom Helder Câmara, em Recife. Em 1978, foi a vez do presidente dos EUA insistir em se encontrar com ativistas pró-democracia em solo brasileiro, no caso o arcebispo dom Paulo Evaristo Arns e o reverendo Jaime Wright. 

 Fora do poder, após perder a eleição presidencial para Ronald Reagan em 1980, Carter demonstrou que seu propósito de vida em prol do aperfeiçoamento da democracia não se limitava a cargos eletivos. Ao criar o Centro Carter dois anos depois, o ex-presidente se engajou na luta contra doenças raras na África e Ásia e em missões de legitimidade e transparência eleitoral pela América Latina. Por esse trabalho incansável, duas décadas após deixar a presidência, recebeu o Prêmio Nobel da Paz, em 2002. Nem o avançar de sua idade impediu o mundo de ouvi-lo sobre os desafios atuais e os perigos do radicalismo político. "Temo que aquilo pelo qual lutamos mundialmente —o direito de eleições livres e justas— tenham se tornado perigosamente frágeis internamente", escreveu o ex-presidente em 2022 para o The New York Times. 

Mais recentemente, nas eleições brasileiras do último ano, o Centro Carter esteve presente no país como observador eleitoral ao lado de delegações da OEA (Organização dos Estados Americanos), do Mercosul e do Ifes (International Foundation for Electoral Systems). Ao celebrarmos seus 99 anos, é notório que o grande exemplo de Carter foi colocar a moral na frente da política interna e dos interesses nacionais de seu país. Talvez por isso perdeu a disputa pela reeleição, mas deixou a marca para as novas gerações: o exercício da política não se justifica sem uma causa com valores morais. 

Brasil no CSNU: diplomatas estufam o peito, mas parao quê exatamente?

 Brasil assume presidência rotativa do Conselho de Segurança da ONU



Brasil assume Conselho de Segurança da ONU sem Ucrânia na pauta e driblando temas espinhosos A guerra não deve ser um tema central e o governo quer evitar indisposições em disputa entre EUA, China e Rússia envolvendo o Haiti 



O velho Palácio do Itamaraty passa por reformas para abrigar o G20 em 2024.

 Um erro histórico nesta matéria::

 Na época, o Itamaraty era a Secretaria de Negócios Estrangeiros. Isso servia de insumo para as tratativas e negociações de território: — Por conta disso, temos todo esse conjunto documental. ”

O Palácio Itamaraty do RJ NUNCA FOI sede da Secretaria dos Negócios Estrangeiros, que era do Império. Só se tornou MRE na República e aí já era Secretaria de Estados das Relações Exteriores e não Negócios Estrangeiros. (PRA)


Para abrigar reuniões do G20 e ampliar público, Palácio Itamaraty vai passar por reforma de R$ 33,2 milhões 

Museu Histórico Diplomático tem mapa-múndi de 1512, cartas com nomes de pessoas que vieram para o país em navios negreiros e mais documentos raros Perto da Central do Brasil, na Avenida Marechal Floriano, onde o vaivém de milhares de pessoas acelera o coração do Centro do Rio, está um dos maiores museus históricos diplomáticos do mundo, 

O Palácio Itamaraty: com mais de 140 mil itens e documentos raros, como o primeiro mapa-múndi com o nome do Brasil, de 1512. Construído em 1855 e tombado em 1938, a primeira sede do Poder Executivo Nacional será revitalizada e ganhará anexos contemporâneos como loja e café para atrair mais público. Outra novidade é que o espaço principal abrigará reuniões do G20, encontro de chefes de estado e de governo, em novembro de 2024 mundo — 

É um resgate da memória, do patrimônio. Vai ter a reforma física dos edifícios, e a apresentação de um museu mais moderno. Ao mesmo tempo, tratamos de um acervo importante da nossa formação como nação, que é fundamental e que deve ser colocado à disposição do grande público. É nossa intenção não só tratar problemas de higienização e deterioração desse material, mas também fazer a digitalização para permitir um pesquisador de Manaus estudar tráfico negreiro sem ter que vir ao Rio — diz Márcia Maro da Silva, embaixadora-chefe do escritório do Ministério das Relações Exteriores no Rio. 

 O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) liberou R$ 16,6 milhões para digitalizar o acervo, restaurar a infraestrutura da biblioteca e preparar alguns salões para as reuniões dos chanceleres. O projeto de revitalização inclui a criação de um espaço de convivência, de frente para o lago onde antigamente três cisnes negros viviam. Em abril, os animais foram transferidos para o BioParque do Rio, em São Cristóvão, na Zona Norte. Em breve, as carpas também sairão dali, já que será instalada uma nova bomba depois que o reservatório for esvaziado. As melhorias no complexo incluem ainda construção de um pequeno edifício para guarda de acervo e a ações de formação de pessoal. União de recursos Além do edital aprovado pelo BNDES, há outras fontes de recursos que estão sendo aplicados no Itamaraty, somando um total de R$ 33,2 milhões. 

A verba, obtida via Lei de Incentivo à Cultura, vem da Vale, da Itaipu Binacional e de outras parceiras, além de uma parte ser do próprio do Ministério das Relações Exteriores. Selecionado em novembro de 2021 no edital Resgatando a História, o projeto será executado pelo Instituto Pedra. Globo — A obra do Palácio que vai ficar pronta para o G20 é recurso de emenda parlamentar; as melhorias do edifício da Cavalariça são de recurso da Itaipu Binacional. 

O dinheiro do BNDES será usado no sistema de prevenção e combate a incêndio e no tratamento de acervos documentais (bibliográficos, arquivísticos e mais) — explica Cynthia Tarrisse, arquiteta do Palácio Itamaraty do Rio. Ações no Rio: Secretário do Ministério da Justiça diz que não haverá pirotecnia; um plano nacional será anunciado segunda-feira Ponto de cultura O Palácio Itamaraty também guarda achados recentes que contam parte da história. São peças encontradas em escavações arqueológicas, durante obras, no Centro. 

Há, por exemplo, objetos de pessoas escravizadas que estavam na região da Pequena África. Eles serão disponibilizados ao público, assim como já estão documentos diplomáticos como os da coleção do Barão do Rio Branco, as cartas de Dom João VI a Dom Pedro I, registros do tratado de delimitação do Acre e papéis que contam as violências pelas quais passaram as pessoas que foram sequestradas e chegaram ao país em navios. Frederico Ferreira, historiador e chefe do Arquivo Histórico do Itamaraty, explica a origem de cartas que têm até nome das pessoas escravizadas e suas características: — No século XIX, havia uma espécie de tribunal que julgava os navios negreiros aprisionados no Atlântico. Era a chamada Comissão Mista Brasil Grã-Bretanha de Combate à Escravidão. Nós temos os processos do aprisionamento dos navios que foram julgados em Serra Leoa e trazidos para o Brasil. 

É uma documentação pouco conhecida, guardada no Itamaraty, e mostra o peso da escravidão na história e até nas relações institucionais. É uma história nefasta que precisa ser conhecida para não ser reproduzida. Carta ao Papa: 'Ao menos, minha filha está sendo lembrada', diz mãe de Eloah, ao repercutir mensagem ao Pontífice Maior da América Latina Lucas Figueiredo, responsável pelo setor da mapoteca histórica, lembra que o acervo começou em 1843 num acordo luso-brasileiro de troca de documentos entre Brasil e Portugal. 

Na época, o Itamaraty era a Secretaria de Negócios Estrangeiros. Isso servia de insumo para as tratativas e negociações de território: — Por conta disso, temos todo esse conjunto documental. Há desde doações de diplomatas, como o Barão do Rio Branco, a aquisições do próprio ministério. São cerca de 30 mil documentos cartográficos e iconográficos no acervo, o que faz dele o maior da América Latina. Todo o complexo do Palácio Itamaraty estará pronto dentro de três anos, mas algumas partes serão entregues a tempo das reuniões do G20. 




domingo, 1 de outubro de 2023

A Arte da Política Econômica: depoimentos à Casa das Garças - organização de José Augusto C. Fernandes (livro publicado)

 A Arte da Política Econômica

depoimentos à Casa das Garças

Organizador: José Augusto C. Fernandes

Rio de Janeiro: História Real, 2023, 560 p.; ISBN: 978-65-87518-5-3

(Editora Intrínseca: www.historiareal.intrinseca.com.br)

    Tendo participado de uma série de depoimentos organizados pela Rio Bravo Investimentos, neste formato: 

1522. “Itamaraty: uma instituição de Estado, pouco independente de governos”, Brasília-São Paulo, 27-30 agosto 2023, 6 p. Nota elaboradas para entrevista na Rio Bravo Investimentos em 1/09/2023, com o jornalista Fabio Cardoso; revisão: Brasília, 9/09/2023. Divulgada no dia 13/09/2023 (link: https://www.youtube.com/watch?v=1JJC4Q9eB7E); blog Diplomatizzando (13/09/2023; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/09/videocast-rio-bravo-as-instituicoes.html); disponível na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/106584032/4464_Itamaraty_uma_instituição_de_Estado_pouco_independente_de_governos_2023_). Relação de Originais n. 4464.

 e também escrito pequeno artigo para a revista publicado pela mesma empresa de investimentos: 

1524. “O discurso de Lula na 78ª Assembleia-Geral da ONU: entre o esperado e o fabricado”, publicado em formato editorial próprio na Revista Órbita (São Paulo: Rio Bravo Investimentos, 25/09/2023; link:https://www.riobravo.com.br/o-discurso-de-lula-na-78a-assembleia-geral-da-onu-entre-o-esperado-e-o-fabricado/ ; link da revista: https://www.riobravo.com.br/orbita/); republicado na versão original no blog Diplomatizzando(30/09/2023; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/09/o-discurso-de-lula-na-78-assembleia.html). Relação de Originais n. 4481.

 

    tive a grata satisfação de receber, por gentileza de Gustavo Franco e do jornalista Fabio Cardoso, o livro que eu estava ansioso por adquirir, cuja capa figura acima.

    Trata-se de obra quase única no gênero – existem depoimentos de economistas organizados anteriormente por acadêmicos da área sobre a história econômica e as ações e pensamento dos grandes representantes da disciplina e de sua prática –, no sentido em que recolhe as entrevistas feitas com três dezenas de economistas e afins que tiveram papel destacado nas concepções, formulação de planos econômicos e condução da política econômica nas últimas décadas no Brasil.

    O sumário, em duas páginas, figura abaixo: 




    Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central e um dos principais economistas formuladores do Plano Real, escreveu uma apresentação, em folha separada, que acompanha o livro em questão, como reproduzido abaixo: 

    Este livro, que vou saborear com deleite e atenção – pois que durante muito tempo fui professor de relações econômicas internacionais em nível de pós-graduação, com ênfase justamente nas políticas econômicas do Brasil –, deu-me a ideia de organizar algo semelhante sobre a política externa e a diplomacia brasileira, uma área bem mais difícil de recolher depoimentos sinceros, dados os naturais constrangimentos que cercam os diplomatas profissionais (sobretudo os que ainda estão na ativa) em relação à política externa conduzida pelos últimos presidentes ainda vivos (praticamente todos, com exceção de Itamar Franco). 

    Em todo caso, recomendo vivamente a leitura destes depoimentos feitos à Casa das Garças, uma vez que eles constituem, praticamente, uma história econômica do Brasil desde a redemocratização (e em vários episódios remontando ao período da ditadura militar, e falta um depoimento de Delfim Netto, ainda vivo, de alguns dos grandes representantes daquela época, como Mário Henrique Simonsen, Roberto Campos, Ernane Galveas e João Paulo dos Reis Velloso).

Agradeço a Gustavo Franco e ao jornalista Fabio Cardoso a remessa do livro.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 10 de setembro de 2023


sábado, 30 de setembro de 2023

Política externa e diplomacia brasileira: uma visão de três décadas - Paulo Roberto de Almeida (revista Crusoé)

Política externa e diplomacia brasileira: uma visão de três décadas

 

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor

Publicado na revista Crusoé (29/09/2023, link: https://crusoe.com.br/edicoes/283/politica-externa-e-diplomacia-brasileira-uma-visao-de-tres-decadas/)

 

 

Entre 1993 e 2023, o Brasil e sua política externa atravessaram turbulências políticas e fases de euforia ou de retraimento, para emergir com promessas de novas realizações, sob a liderança do mesmo presidente que tinha dado grande destaque à presença diplomática do país no decorrer de seus dois primeiros mandatos, no início do presente século. À diferença do “momento unipolar” dos anos 1990, com a visível hegemonia global dos Estados Unidos no quadro de uma fugaz “nova ordem mundial” no seguimento da derrocada do império soviético entre 1989 e 1991, o mundo desta terceira década do século 21 aparece como sensivelmente transformado, num cenário de uma possível “Segunda Guerra Fria”, sobretudo em função da fulgurante ascensão da China como grande ator global e do desafio da Federação Russa aos equilíbrios instáveis da ordem ocidental ainda dominante.

De fato, o contexto político e diplomático do período conheceu seguidas mudanças em relação ao antigo sistema de relações internacionais da Guerra Fria (1947-1991), passando de uma fase de unilateralismo imperial – que correspondeu à grande preeminência estratégica dos Estados Unidos, a partir da implosão e fragmentação da URSS e do declínio da Federação Russa nos primeiros dez anos de sua emergência como o mais importante membro do antigo império soviético – e de profundas alterações na geopolítica europeia, com a adesão da maior parte dos seus satélites da Europa central e oriental às “ferramentas” econômicas ocidentais (Gatt-OMC, União Europeia e OCDE) e militares (OTAN). Essa fase foi seguida pela lenta, mas decisiva, ascensão da China, economicamente um gigante comercial e industrial, e pela restauração da Rússia como poder militar, com capacidade de projeção em teatros regionais. 

Uma “Segunda Guerra Fria” foi anunciada pela postura de competição estratégica dos EUA em relação à China – que se tornou mais assertiva sob Xi Jinping – e, sobretudo, de novos desafios lançados pelo líder russo Vladimir Putin, querendo recompor antigas esferas de influência da finada União Soviética, a partir de sua guerra de agressão contra a vizinha Ucrânia. Abriu-se, assim, um cenário de definições dramáticas a serem tomadas pela diplomacia brasileira nesse novo contexto de vagos projetos de uma “nova ordem mundial”.

(...)


Ler a íntegra do artigo neste número da revista Crusoé: 

 https://crusoe.com.br/edicoes/283/politica-externa-e-diplomacia-brasileira-uma-visao-de-tres-decadas/


O discurso de Lula na 78ª Assembleia-Geral da ONU: entre o esperado e o fabricado - Paulo Roberto de Almeida (revista Órbita)

 Um pequeno artigo analítico publicado recentemente: 

4481. “discurso de Lula na 78ª Assembleia-Geral da ONU: entre o esperado e o fabricado”, Brasília, 20 setembro 2023, 3 p. Comentários sobre os pontos controversos do discurso do presidente na 78ª AGNU, a pedido do jornalista Fabio Cardoso. Publicado em formato editorial próprio na Revista Órbita (São Paulo: Rio Bravo Investimentos, 25/09/2023; link: https://www.riobravo.com.br/o-discurso-de-lula-na-78a-assembleia-geral-da-onu-entre-o-esperado-e-o-fabricado/; link da revista: https://www.riobravo.com.br/orbita/).  Relação de Publicados n. 1524.


Eis a versão original: 


discurso de Lula na 78ª Assembleia-Geral da ONU: entre o esperado e o fabricado

  

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

  

O discurso do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na abertura dos debates na 78ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas – o 9º que ele pronuncia, depois dos oito anteriores já feitos em seus dois primeiros mandatos, entre 2003 e 2010 – não difere muito do tom reivindicativo e até pedagógico (ou seja, ensinando ao mundo como ele poderia se comportar melhor) daqueles precedentes, a não ser pelo fato deste mais recente, em 19 de setembro de 2023, revelar mais abertamente algumas das opções políticas já desveladas por Lula em diversas ocasiões nos últimos nove meses (e até durante a campanha presidencial de 2018). Vamos evidenciar apenas alguns aspectos desse pronunciamento, dadas a sua extensão (cerca de seis páginas) e as suas pretensões abrangentes, de Norte a Sul, de Leste a Oeste.

Cabe, antes de mais nada, registrar que ele possui algumas das características típicas de todos os seus discursos num ambiente diplomático, que são a sua estrutura híbrida e os seus componentes bipolares: de um lado, os elementos habituais dos discursos feitos por burocratas do Itamaraty – num estilo polido e no habitual diplomatês –, e de outro lado, os componentes partidários e ideológicos que são mais frequentemente enxertados no Palácio do Planalto. Antes, nos dois mandatos anteriores, e até no 1,5 mandato de Dilma, essa última tarefa estava ao encargo do apparatchik do partido encarregado dos assuntos internacionais – mais conhecido no Itamaraty como “chanceler para a América do Sul –, agora é o próprio ex-chanceler que se desempenhou da função, provavelmente ajudado por alguns grão-petistas.

Esse primeiro lado, o do diplomatês habitual, é o esperado nos discursos do gênero, com a sucessão de invectivas sobre as desigualdades do mundo, as assimetrias sociais, étnicas e outras, o pouco comprometimento dos países ricos em atender aos requerimentos desejados pela cooperação para o desenvolvimento dos países mais pobres, acrescido das questões mais presentes nas últimas décadas: sustentabilidade ambiental, transição energética, ameaças à paz internacional derivadas das armas atômicas e outras questões desse rol. Não há muito o que comentar nesse particular, pois é o que vêm fazendo todos os chanceleres, desde muitas décadas no passado, e o que farão também os seus sucessores, no futuro previsível. Vamos deixar de lado, então, a questão da fome no mundo, a desigualdade na distribuição de renda ou até a defesa da democracia e dos direitos humanos. Tudo isso já era esperado e habitual.

O mais interessante, portanto, seria comentar o que há de novidade no discurso deste ano, e aí é que entram as tais novidades políticas, ideológicas e partidárias, que parecem ter se acentuado desde algum tempo, talvez coincidente com a volta do mundo a uma nova Guerra Fria, desta vez não mais geopolítica, como entre 1947 e 1989, e mais econômica e tecnológica, desde a ascensão irresistível da China à preeminência comercial planetária. A principal é uma crítica à própria ONU e suas instituições subordinadas, o que não era frequente nos discursos tradicionais preparados pelo Itamaraty. 

Lula disse que “Quando as instituições reproduzem as desigualdades, elas fazem parte do problema, e não da solução”, e o exemplo indicado é o diferencial de ajuda dado pelo FMI aos países europeus – segundo ele 160 bilhões de dólares – e aquele fornecido aos países africanos, apenas 34 bilhões. Ora, se formos considerar o PIB conjunto da Europa e o da África, assim como a amplitude dos desequilíbrios que possam ter sido compensados pela ajuda do FMI, constata-se que os países africanos receberam muito mais, pelo porte das economias e pela renda per capita. Não se vê, por outro lado, onde é que as instituições de Bretton Woods e a OCDE fizeram a “apologia do Estado mínimo”, quando esses órgãos são o mais próximo que se possa ter, nas economias de mercado, de planejamento econômico e de intervencionismo na regulação macroeconômica e setorial. 

Fica também difícil de constatar onde o “neoliberalismo agravou a desigualdade econômica e política que hoje assola as democracias”, sendo que seu legado seria “uma massa de deserdados e excluídos”. Os dois maiores países antes guiados pelo socialismo ou pela ação diretiva do Estado, China e Índia, são justamente aqueles que retiraram centenas de milhões de miseráveis de uma pobreza ancestral graças ao fato de terem abandonado o dirigismo anterior e aderido a versões mais abertas de uma economia de mercado, inclusive por uma inserção deliberada em todos os tipos de transações globalizadas. Mas o argumento mais surpreendente se refere à guerra na Ucrânia: segundo Lula, ela “escancara nossa incapacidade coletiva de fazer prevalecer os propósitos e princípios da Carta da ONU.” Como coletiva? A guerra de agressão foi perpetrada por um violador claramente identificado coletivamente, condenado em resoluções da própria AGNU, mas que NUNCA é referido por Lula, o que se parece bem mais com uma espécie de miopia individual, ou coletiva, dos que escreveram o discurso para o presidente. 

Lula também é crítico de “toda tentativa de dividir o mundo em zonas de influência”, o que é desmentido pela sua exaltação da ampliação do Brics – descrito por ele como “uma plataforma estratégica para promover a cooperação entre países emergentes” – e por seus recorrentes apelos à construção de uma “nova ordem global”, de sabor, teor e finalidades claramente antiocidentais, dadas seus reiteradas críticas aos países ocidentais que “estão sustentando a guerra na Ucrânia pelo fornecimento de armas”, o que é, no mínimo, um convite ao desaparecimento do país invadido pela força das tropas invasoras. O crescimento do Brics, decidido na cúpula de Joanesburgo – mais 120% de membros, mais uma vez pelas mãos da China, como já tinha sido o caso da África do Sul – fortalece, segundo Lula, “a luta por uma ordem que acomode a pluralidade econômica, geográfica e política do século 21”. 

O sentido dessa ampliação aponta claramente para uma oposição ao “neoliberalismo falido”, que, na visão do presidente, foi substituído por “um nacionalismo primitivo, conservador e autoritário”. Algum jornalista talvez devesse perguntar a Lula o que ele está achando do governo de Putin, que tem feito leis de nítido teor conservador, homofóbico e autoritário. O único jornalista do qual ele se lembrou foi Julian Assange: Lula não deve ter sido informado da situação do jornalista russo Vladimir Kara-Murza, condenado por Putin a 25 anos de cadeia supostamente por “espalhar desinformação”. 

Os antigos discursos puramente diplomáticos de Lula eram bem mais coerentes com a democracia e os direitos humanos, que Lula diz defender, e bem menos divergentes com uma realidade fabricada por seus assessores puramente partidários para este discurso de 2023. 

 

Paulo Roberto de Almeida

[Brasília, 4481, 20 setembro 2023, 3 p. 

Revista Órbita (Rio Bravo Investimentos: https://www.riobravo.com.br/orbita/); contato: jornalista Fabio Cardoso]

 


O reconhecimento internacional da independência do Brasil - Paulo Roberto de Almeida (livro comemorativo do Bicentenário)

 Mais recente trabalho publicado: 


O reconhecimento internacional da independência do Brasil

  

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor (diplomatizzando.blogspot.com)

Colaboração a obra digital sobre o bicentenário, coordenado por José Theodoro M. Menck. Brasília, 15 dezembro 2022, 13 p. Publicado in: 1822-2022: Bicentenário da Independência. Brasília: Secretaria Nacional de Economia Criativa e Diversidade Cultural da Secretaria Especial de Cultura do Ministério do Turismo, 2022, p. 602-620; disponível na Biblioteca Digital da Câmara dos Deputados (link: https://bd.camara.leg.br/bd/handle/bdcamara/41362).

Relação de originais n. 4288; Relação de Publicados n. 1527.  

 

A afirmação autônoma do Brasil no cenário internacional teve início ainda antes da independência, mais exatamente em agosto de 1822, quando o príncipe regente D. Pedro autoriza a divulgação de um manifesto às nações amigos, redigido principalmente por seu conselheiro brasileiro em questões diplomáticas, José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838). O processo, na verdade, teve início quando do “Dia do Fico” (9 de janeiro de 1822), a declaração pela qual D. Pedro se recusa a acatar as ordens das Cortes ordenando-o voltar a Portugal. O príncipe regente nomeia um novo gabinete, com José Bonifácio assumindo a pasta dos Negócios Estrangeiros. A independência já estava praticamente encomendada, sobretudo a partir do “manifesto aos governos e às nações amigas”, de 6 de agosto desse ano, pelo qual D. Pedro os convida a “continuarem com o Reino do Brasil as mesmas relações de mútuo interesse e amizade”, que já mantinham com a Corte instalada no Rio de Janeiro desde 1808. 

Mesmo tendo a maior parte do corpo diplomático saído do Brasil depois da partida de D. João VI, a figura de D. Pedro avulta ao mundo nessa declaração, pois que nela ele afirmava que o Brasil estava pronto a trocar ministros e agentes diplomáticos e que os portos brasileiros estavam abertos a “todas as nações amigas e pacíficas”. D. Pedro aprova a ideia de José Bonifácio de enviar “encarregados de negócios do Brasil” para Londres – Felisberto Caldeira Brant Pontes (1772-1842), já para negociar a soberania do Reino –, assim como para outras capitais: Paris, Viena e Estados Alemães, ademais de Buenos Aires. Já tendo o governo português reconhecido, ainda em 1821, no Rio de Janeiro, a independência da Argentina e do Chile, Buenos Aires, no final de 1822, declara reconhecer o escudo de armas e a bandeira do Império brasileiro (não mais do que isso), mesmo se, em agosto do ano seguinte, o governo argentino convida o Império a desistir da posse da Província Cisplatina.

Nesse manifesto aos governos e nações amigas, de agosto de 1822, que constitui o principal documento que ele preparou como responsável pelos negócios estrangeiros durante a gestão de D. Pedro como príncipe regente do reino do Brasil, ainda unido ao de Portugal, José Bonifácio deixou bastante claro sobre quais seriam as principais diretrizes que deveriam guiar a ação externa da quase nação independente. Em vista da viagem de D. Pedro a São Paulo, o manifesto foi enviado por circular ao corpo diplomático e consular em 14 de agosto de 1822, sob a regência de D. Leopoldina. Dois dias antes, em 12 de agosto, numa clara ruptura para com a diplomacia portuguesa, então dominada pelas tentativas de nova colonização do Brasil, tinham sido designados representantes brasileiros para a Inglaterra, França, Estados alemães e para os Estados Unidos. Mas quais eram os principais pontos do manifesto que inaugurou a presença independente do Brasil no mundo? 

1. manutenção das relações políticas e comerciais, sem dar prioridade a qualquer nação;

2. continuidade das relações estabelecidas desde a vinda da família real;

3. adoção plena do liberalismo comercial;

4. respeito mútuo ou reciprocidade no trato internacional;

5. abertura do país à imigração;

6. facilidade de entrada para a vinda de sábios, artistas e empresários;

7. abertura do país para investimentos estrangeiros. 

 (...)


Leia a íntegra neste link da plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/107425385/4288_O_reconhecimento_internacional_da_independência_do_Brasil_2022_


Entrevista para o Boletim de RI Acauã - Paulo Roberto de Almeida

 https://acaua.info/paulo-roberto-de-almeida-entrevista-para-o-numero-11/

Paulo Roberto de Almeida: Entrevista para o Número 11

Entrevista que ampara o Editorial de nº 11, conduzida pelo Editor do Boletim Marcelo de Almeida Medeiros com o Diplomata Paulo Roberto de Almeida. 

Entrevistado: Paulo Roberto de Almeida

Entrevistado: Paulo Roberto de Almeida 

Paulo Roberto de Almeida (São Paulo, 1949) é Doutor em Ciências Sociais (Université Libre de Bruxelles, 1984), Mestre em Planejamento Econômico (Universidade de Antuérpia, 1977). Diplomata de carreira, por concurso direto em 1977; aposentado em 29/10/2021. Foi professor no Instituto Rio Branco, na Universidade de Brasília e no Instituto de Hautes Études de l’Amérique Latine (Sorbonne). Ex-diretor do Instituto Brasileiro de Relações Internacionais (IBRI). De 2004 a 2021 foi professor de Economia Política no Programa de Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado) em Direito no Centro Universitário de Brasília (Uniceub). Como diplomata, serviu em diversos postos no exterior e na Secretaria de Estado, inclusive na embaixada do Brasil em Washington, de 1999 a 2003. De agosto de 2016 a março de 2019 exerceu o cargo de Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI), da Fundação Alexandre de Gusmão (Funag-MRE). É atualmente diretor de Relações Internacionais do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal. Livros mais recentes sobre a política externa e a diplomacia do Brasil: Construtores da Nação: projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior (LVM, 2022); Apogeu e demolição da política externa: itinerários da diplomacia brasileira (Appris, 2021); Contra a Corrente: ensaios contrarianistas sobre as relações internacionais do Brasil, 2014-2018 (Curitiba: Appris, 2019); Miséria da diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty (UFRR, 2019); Nunca Antes na Diplomacia (Curitiba: Appris, 2014).

Entrevistador: Marcelo de Almeida Medeiros

Entrevistador: Marcelo de Almeida Medeiros 

Editor do Boletim Acauã. Professor Titular do Departamento de Ciência Política da UFPE e Pesquisador PQ-1C do CNPq. Possui doutorado em Ciência Política.

Demetrio Magnoli sobre o neoconstitucionalismo dos ministros do Supremo

 Um Congresso de 11

Demétrio Magnoli, Folha de S. Paulo (30/09/2023)

Ao celebrar avanço de juízes sobre pautas do Legislativo, progressistas sacrificam futuro

O longo voto de Rosa Weber pela descriminalização do aborto apresenta-se, quase inteiramente, como um discurso parlamentar. A agenda definida pela magistrada para o Supremo – drogas, marco temporal, aborto – forma uma pauta de deliberações apropriada ao Poder Legislativo. Por aqui, o STF produz legislação enquanto o Congresso dedica-se a distribuir verbas de emendas a clientelas eleitorais e a indicar ministros ou diretores de estatais.

A alegação dos juízes supremos de que apenas interpretam a Constituição não resiste nem mesmo a um escrutínio superficial. Interpretar a Constituição é derrubar o que não pode ser feito; legislar é decidir regras positivas sobre o que deve ser feito. Weber determinou o período de aborto descriminalizado (12 semanas), os magistrados procuram consenso interno sobre o peso exato da maconha de uso pessoal, Fachin elabora regras específicas para atribuição de terras aos indígenas.

O STF embarcou no veleiro do neoconstitucionalismo, doutrina jurídica que, enfraquecendo a separação dos Poderes, atribui aos magistrados a missão de reformar a sociedade a partir de uma interpretação extensiva dos princípios constitucionais. O posto de timoneiro é ocupado por Barroso, um expoente da doutrina. Na equipe, Weber funciona como navegadora.

O neoconstitucionalismo equivale a uma declaração de guerra dos juízes contra Parlamentos conservadores ou reacionários que resistem à expansão de direitos sociais. Na sua fúria legiferante, o STF enxerga-se – e é enxergado – como representação do estrato mais progressista da sociedade. O problema é que, como os juízes não foram eleitos, sua campanha de reforma social tende a gerar consequências contraproducentes.

As regras de origem judicial são leis fracas, sujeitas a bruscos retrocessos. Na Itália, o aborto é um direito forte porque foi decidido pelo Parlamento e confirmado por plebiscito popular. Nos EUA, foi um direito fraco, estabelecido pela Suprema Corte em 1973 e revogado pelo mesmo tribunal, agora com maioria conservadora, ano passado. Ao celebrar o avanço dos juízes sobre prerrogativas parlamentares, os progressistas sacrificam o futuro no altar do presente.

Ruth Bader Ginsburg, icônica ex-magistrada progressista americana, identificou o equívoco. O crescimento explosivo do Movimento Pró-Vida, explicou, foi uma reação política ao voto da Suprema Corte de 1973. Concluiu daí que o caminho certo exigiria a articulação da maioria social para consagrar o direito ao aborto em legislação emanada do Congresso. Na prática, os progressistas que confiam suas pautas a juízes reformadores estão renunciando ao dever de persuadir os cidadãos.

No Brasil, os partidos de esquerda insistem nesse tipo de abdicação: Lula e Dilma recusaram-se a defender em campanha eleitoral o direito ao aborto ou a descriminalização da maconha. Na raiz do silêncio encontra-se a tese de que a maioria da sociedade é atavicamente conservadora –e, que, portanto, precisaria ser resgatada do inferno de suas próprias convicções pela mão providencial dos juízes.

Sondagens de opinião indicam maiorias contrárias à descriminalização do aborto e do uso recreativo de maconha. O Congresso espelha, de certo modo, essas inclinações gerais. Contudo, ideias arraigadas sobre tais temas podem mudar – com a condição de que as lideranças políticas progressistas tenham a coragem de reorganizar os termos do debate público. Impera, porém, o medo, que se traduz pela transferência da responsabilidade ao STF.

Quem ganha são os conservadores e, especialmente, os reacionários. Nos EUA, legislaturas estaduais engajam-se na criminalização irrestrita do aborto. Aqui, tenta-se reverter o direito à união homoafetiva. Nas eleições, ressoará o discurso do voto contra o "governo dos juízes". Um Congresso de 11 togados não reinventará o Brasil.

Às vésperas de uma grande ruptura na política externa? - Paulo Roberto de Almeida, Hoje no Mundo Militar

 Às vésperas de uma grande ruptura na política externa?

A doutrina jurídico-diplomática brasileira se opõe à incorporação forçada de territórios, isso desde antes da ONU: assim fizemos em 1939 (Polônia) e 1940 (Bálticos), tomados por Hitler e Stalin. Lula seria o primeiro a reconhecer usurpação como legal, se continuar apoiando Putin!

Paulo Roberto de Almeida


Hoje no Mundo Militar (30/09/2023):

“Vladimir Putin comemorou hoje o primeiro aniversário da anexação forçada das regiões ucranianas de Luhansk, Donetsk, Zaporizhzhia e Kherson. Apesar de a anexação territorial resultante de guerras ser expressamente proibida pela carta fundadora das Nações Unidas, Putin prosseguiu com a ação, após invadir e ocupar militarmente partes dessas regiões ucranianas. Por esse motivo, tais anexações não são reconhecidas internacionalmente.

Além de Putin, as únicas outras quatro ocasiões nos últimos 84 anos em que guerras foram iniciadas com o propósito de anexar territórios foram com Hitler, em 1939, Stalin, também em 1939, e mais recentemente Saddam Hussein ao invadir o Irã, em 1980, e o Kuwait, em 1990.”