O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Brasil: politica externa mais planejada? - Correio do Brasil


Com Dilma, política externa fica mais planejada e menos política

Najla Passos
Correio do Brasil (Ano XII - Número 4391), 8/1/2012 13:04  
Com Dilma, política externa fica mais planejada e menos política
Primeiro ano de Dilma Rousseff mostra diferenças importantes nas relações internacionais brasileiras. 
Presidenta se expôs e viajou bem menos que Lula e esfriou relações com África, a quem promete ‘atenção especial’ em 2012. 
Mas máquina diplomática foi mais exigida para pensar ações específicas. 
Obama veio ao Brasil, mas relação com EUA continua protocolar.
BRASÍLIA – A presidente Dilma Rousseff pretende dar em 2012 uma “atenção especial” à África na política externa, como disse, em dezembro, em café da manhã com jornalistas. Em seu primeiro ano de mandato, foi só uma vez ao continente, em outubro, para visitar África do Sul, Moçambique e Angola. E recebeu apenas dois líderes africanos no país, nenhum no Palácio do Planalto – os presidentes de Guiné e Cabo Verde estiveram na Bahia, em novembro, para as comemorações do Ano Internacional dos Afrodescententes.
A relação do Brasil com a África é ilustrativa de algumas mudanças na política externa na gestão Dilma. O antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, tinha contatos mais frequentes e intensos com líderes africanos, inclusive com aqueles cuja longevidade no poder sempre custou ao ex-presidente críticas de cumplicidade com ditadores. E gostava, em seus discursos, de enfatizar essa proximidade com o continente a quem o Brasil devia “desculpas” pela escravidão.
Seja por uma visão mais progressista, seja por outra conservadora, é inegável, para observadores da política externa brasileira, que foram mudanças importantes, estas verificadas na passagem do bastão diplomático da dupla Lula-Celso Amorim (ex-ministro das Relações Exteriores) para Dilma-Antonio Patriota (atual ministro).
Segundo Renato Baumann, ex-diretor do Escritório da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal) no Brasil e economista do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), sem ter a mesma força política individual de Lula, Dilma estaria dando mais racionalidade à agenda diplomática. “Ele [Lula] fazia uma visita à África, por exemplo, prometia alguma coisa, e depois o governo corria atrás para concretizar. Não havia muito planejamento”, explica.
Dilma, ao contrário, estaria se baseando mais em análises e planejamento para dar início, por exemplo, à promoção de políticas de complementariedade produtiva com países vizinhos, como a permissão para a Petrobras subcontratar serviços na Argentina e Uruguai. E não hesitou em adotar medidas comerciais protecionistas, por causa da crise econômica global que produziu uma “guerra cambial”.
Como planeja mais se expõe menos, Dilma viajou bem menos do que o antecessor, outra mudança perceptível. Desde a posse, visitou, oficialmente, 15 países diferentes. O ex-presidente viajara para 23 países no primeiro ano do primeiro mandato e para 30, no primeiro ano do segundo.
O ritmo de viagens internacionais de Dilma assemelha-se ao visto com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que percorrera 14 países no primeiro ano do seu primeiro mandato, e 13, no primeiro do segundo mandato.
Para o professor de Economia Política Internacional da Universidade de Brasília (UnB) Carlos Pio, que se classifica como liberal, o que o governo Dilma fez foi retomar uma postura diplomática mais convencional, como era tradição no Itamaraty. “O Lula foi padrão de anormalidade na política externa brasileira. Ele era tão exagerado que chegava a ser caricato. Dilma mantém o mesmo rumo, mas abaixou o tom”, afirma.
Porque não vê mudança de rumo, Pio faz críticas a posturas adotadas pelo Brasil no primeiro ano de Dilma. Para ele, o país continuaria sendo pouco crítico com líderes de países sem muito respeito pelos direitos humanos. Teria faltado condenar o governo da Líbia durante a Primavera Árabe e havido demora no reconhecimento do governo de Honduras, por exemplo.
O analista também contesta a aposta brasileira em relações econômicas e formação de blocos com países em desenvolvimento, como a Comunidade dos Estados Latinoamericanos e Caribenhos (Celac), que não passaria de “jogada de marketing”.
A Celac, que conta com 33 países, teve a semente lançada em 2010, mas só foi criada formalmente em dezembro, em reunião, na Venezuela, de chefes de Estado e de governo. No café da manhã com jornalistas, Dilma destacou a Celac como um acontecimento “muito importante” da política externa em 2011, embora, para ela, não tenha tido o reconhecimento devido. A Celac, disse, demonstra a “consciência elevada da região” sobre seu papel “geopolítico e econômico” no mundo hoje.
O grupo reúne todos os países das Américas, exceto Estados Unidos e Canadá. É, sem dúvida, um bloco que ajuda a minar o poder político norte-americano na região. E, por isso, para analistas como a visão mais conservadora como Carlos Pio, seria um gesto de antiamericanismo fora de moda.
Apesar de o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, ter sido um dos 14 chefes de estado ou governo recebidos por Dilma no Brasil em 2011, o Brasil, tanto para Baumann quanto para Pio, preservou, com Dilma, relações quase protocolares com aquele país. Mas talvez devesse repensar a atitude, pelas potenciais vantagens econômicas.
“Os Estados Unidos ainda são a principal fronteira tecnológica do mundo. É razoável pensar que uma possível aproximação do Brasil com o país possa nos trazer benefícios”, afirma Bauman. “Se o Brasil quer vender manufaturas, e as vende principalmente para os Estados Unidos, porque não aprofundar essa relação, ao invés de insistir apenas no comércio com países como China e Índia?”, diz Pio.
A pauta exportadora brasileira tem aumentado ano a ano a dependência da China, como se viu no relatório sobre o desempenho comercial do país em 2011, divulgado na última segunda-feira (2). O Brasil vende cada vez mais produtos primários (agropecuários e extrativistas) para lá.
No café com os jornalistas, Dilma deu a entender que percebe o aumento da dependência da China, não apenas economicamente, mas também politicamente, e que trabalharia para equilibrar um pouco a situação. Apesar de ter sido um dos 15 países que Dilma visitou em 2011. “O Brasil tem que ter uma visão multipolar, o que não significa abandonar os BRICS”, disse a presidente, referindo-se ao grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.

Franca: taxacao irracional de ativos financeiros - Le Monde

Toda taxação sobre ativos financeiros produz consequências, e não apenas aquelas positivas, como pensam os que se comprazem em acusar os banqueiros, especuladores, financistas como os responsáveis por todos os males do capitalismo e toda a instabilidade econômica que vivemos.
O presidente da França, um pouco por demagogia eleitoreira -- ele enfrentará sua tentativa de reeleição em poucos meses mais -- e um pouco por necessidade (porque os governos gastaram demais e não têm mais de onde tirar, e hesitam em cobrar novos impostos), quer arrancar dinheiro da sociedade.
Para isso, ele gostaria de tirar dinheiro onde ele existe: no sistema financeiro e bancário.
Apenas que, se fizer isso sozinho, vai ser um tiro no pé: as operações financeiras se deslocarão para onde não são taxadas, e assim a França perderia duplamente.
Como não pode taxar as transações financeiras, resolveu se abastecer no mercado de ações, o que também é arriscado, pois aplicadores podem optar por se dirigir a outros mercados.
No assim chamado Fórum Social Mundial, que vai se realizar dentro de alguns dias em Porto Alegre (onde estou atualmente), irracionais, ilógicos e ingênuos vão, mais uma vez, pregar uma Tobin Tax, ou seja, uma tributação sobre todas as transações financeiras transfronteiriças. Não resolve NENHUM dos problemas que é suposta resolver, e ainda cria maiores distorções num mercado que já é suficientemente volátil do jeito que é.
Os ingênuos acreditam que diminuirão a volatilidade e a especulação taxando as transações. O único resultado é aumentar ambas, e criar ainda mais distorções e movimentos erráticos por todo o planeta.
Claro, eu sei que não se pode impedir as pessoas de serem estúpidas, ou simplesmente ingênuas.
Mas sempre se pode acusar a ingenuidade e a estupidez, declarar onde elas existem, e apontar os responsáveis.
Meu blog serve, entre outros objetivos, a essas funções didáticas: acusar ingênuos de ingênuos, chamar os estúpidos de estúpidos, e esperar que respondam a essas acusações com argumentos um pouco mais consistentes do que me acusar de ser especulador, amigo de banqueiros, patrocinador de capitais voláteis e outras bobagens do gênero...
Paulo Roberto de Almeida

La taxe Tobin de Sarkozy ou le simple retour de l’impôt de Bourse sur les actions ?

Nicolas Sarkozy et Angela Merkel à Deauville, en octobre 2010. Crédits : Reuters / Philippe Wojazer
La taxe Tobin annoncée par Nicolas Sarkozy lors de ses vœux le 31 décembre pourrait, au moins dans un premier temps, se réduire à la réintroduction de l’impôt de Bourse, qui taxe les simples achats d’actions. C'est le scénario qui se profile à court terme, alors que Nicolas Sarkozy rencontre Angela Merkel ce lundi 9 janvier à Berlin.
Le chef de l’Etat veut en effet faire payer la finance, responsable selon lui de la crise économico-financière, et adopter la taxe sur les transactions financières, comme l'a proposé en septembre 2011 dans un projet de directive la commission européenne : 0,1 % sur les achats d’actions et les obligations et 0,01 % sur les produits dérivés. La commission s’est fixé pour objectif une mise en œuvre en 2014, tandis que les experts fiscaux des pays européens se sont réunis à deux reprises, le 5 décembre et le 3 janvier. Mais la présidence danoise de l’union européenne (UE) n’a pas encore inscrit le sujet au menu des ministres des finances. La mesure est censée rapporter 57 milliards d’euros par an à partir de 2014.
Elle se heurte à plusieurs problèmes : il est techniquement très compliqué de taxer les produits dérivés, ces informations n’étant pas toujours disponibles et les transactions réalisées au sein d’une même journée pas toujours inventoriées. Il est facile de taxer les obligations, mais Bercy ne veut pas taxer les bons du Trésor, en pleine crise de la dette souveraine. « On va avoir du mal à dire aux investisseurs d’acheter nos OAT [obligations assimilables du Trésor] tout en les taxant »,s’inquiète un ministre, alors que les pays européens ont un programme d’émission massive d’obligations.
Reste la taxe sur les actions, qui reviendrait à remettre au goût du jour l’impôt de Bourse, qui a l’avantage d’exister à Londres sous forme d’un droit de timbre de 0,5 % et qui rapporte selon Bercy 2 à 3 milliards de livres par an. L’idée serait donc de voter avant les élections une loi qui transpose par avance la directive européenne et commencerait par faire entrer en vigueur l’impôt de Bourse, la taxation des obligations et produits dérivés intervenant plus tard, lorsque la crise de la dette se sera estompée, que les produits dérivés seront mieux contrôlés et que Paris ne sera plus isolé. L'Elysée espère que Mme Merkel ira de l’avant fin 2012, début 2013.

O fascismo soft (e ordinario) do poder - Marco Antonio Villa

Os que me leem regularmente, sabem o que eu penso da política, dos políticos, do poder e da economia, atualmente em vigor no Brasil.
Não preciso dar explicações a ninguém sobre o que penso, como penso e por que o faço, desta maneira que faço, ou seja, totalmente independente, espírito anárquico (o que não quer dizer anarquista), sem peias, sem disciplina, sem qualquer submissão ao poder ou aos que mandam. Sou inteiramente livre, para desgosto de alguns que aqui aparecem, que gostariam da mesma rendição às falcatruas que cometem, direta ou indiretamente, da mesma submissão que obtiveram de tantos, por pressão, ameaças, dinheiro ou suposta afinidade ideológica. 
Não sou comprável, nem "submetível", e por isso posso postar, e comentar o que me apraz, até reações raivosas daqueles mesmos que gostariam que todos concordassem com as falcatruas, mentiras, fraudes e desonestidade que veem sendo servidas ao povo brasileiro, com a complacência de políticos -- inclusive os de uma suposta oposição -- que não se pejam em atacar a imprensa, ou seja, os meios livres, pelos poucos ataques que merecem sua conduta a todos os títulos deplorável.
Por isso mesmo, continuo, com meu espaço de resistência à mentira, à fraude, à omissão, à burrice, à má-fé e à desonestidade de todos aqueles que pertencem aos círculos que pertencem não por mérito, mas por adesão ao que de pior a política brasileira já produziu desde tempos imemoriais.
O Brasil, infelizmente, passou a viver, ou já está vivendo, desde algum tempo, sob um regime que poderíamos descrever como de Cleptocracia, ou seja, um sistema organizado com base no roubo sistemático dos bens públicos (que são recursos da sociedade) pelos que controlam o poder, em diversas esferas. A Cleptocracia se espalha por todos os poros da sociedade, como uma peste que sufoca gradativamente a sociedade.
Não que não tivéssemos corruptos e ladrões antes do atual sistema: não, eles existiam e estavam bem vivos. Apenas que o que era feito de forma desorganizada, assistemática, de forma praticamente artesal, no máximo manufatureira incipiente, passou a ser feito de forma sistemática, organizada, em escala industrial, avassaladora, um sistema montado para justamente fraudar os cidadãos e as empresas, arrancando todos os recursos que são possíveis de serem extraídos pelos meios disponíveis, legais e ilegais, de todos os modos.
Cleptocracias, como esta do tipo que se instalou no Brasil, são difíceis de serem extirpadas. Que o diga a Venezuela, que hoje paga o preço da antiga cleptocracia tradicional que tinha se instalado no poder, e que foi substituída por uma nova, mais eficiente do que a anterior.
O Brasil vai ter um imenso trabalho para extirpar a sua. Não imagino uma "limpeza" antes de uma geração completa, aí por meados dos anos 2020, depois dos 200 anos de independência, que podem ser passados ainda sob o mesmo regime que inaugurou a vida nacional: antes eram traficantes de escravos, escravocratas, ladrões de terra, aproveitadores de cargos públicos, enfim, amigos do alheio. Hoje podemos substituir os traficantes de escravos pelos demagogos oportunistas, que se locupletam com base nos muitos pobres e ignorantes que ainda existem no Brasil. Processos históricos são lentos e imprevisíveis. Chegaremos lá, mas vai demorar...
Paulo Roberto de Almeida 

Ministério da Verdade
Marco Antonio Villa, historiador  professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)
Folha de S.Paulo, 9/01/2012

Estamos vivendo um tempo no qual os donos do poder exigem obediência absoluta.
No Congresso, a oposição representa apenas 17,5% das cadeiras. O governo tem uma maioria digna da Arena. Em 1970, no auge do regime militar, o MDB, partido de oposição, chegou a examinar a proposta de autoextinção. Quatro anos depois, o mesmo MDB venceu a eleição para o Senado em 16 dos 22 Estados existentes (no Maranhão, o MDB nem lançou candidato).
Ou seja, a esmagadora maioria de hoje pode não ser a de amanhã. Mas, para que isso aconteça, é necessário fazer algo básico, conhecido desde a antiga Grécia: política.
É nesse terreno que travo o meu combate. Sei que as condições são adversas, mas isso não significa que eu tenha de aceitar o rolo compressor do poder. Não significa também que eu vá, pior ainda, ficar emparedado pelos adversários que agem como verdadeiros policiais do Ministério da Verdade.
Faço essas ressalvas não para responder aos dois comentários agressivos, gratuitos e sem sentido do jornalista Janio de Freitas, publicados nesta Folha nos textos “Nada mais que o Impossível” (1º de janeiro) e “Meia Novidade” (3 de janeiro). Não tenho qualquer divergência ou convergência com o jornalista. Daí a minha estranheza pelos ataques perpetrados sem nenhuma razão (aparente, ao menos).
A minha questão é com a forma como o governo federal montou uma política de poder para asfixiar os opositores. Ela é muito mais eficiente que as suas homólogas na Venezuela, no Equador ou, agora, na Argentina.
Primeiro, o governo organizou um bloco que vai da direita mais conservadora aos apoiadores do MST. Dessa forma, aprova tudo o que quiser, com um custo político baixo. Garantindo uma maioria avassaladora no Congresso, teve as mãos livres para, no campo da economia, distribuir benesses ao grande capital e concessões aos setores corporativos. Calou também os movimentos sociais e sindicatos com generosas dotações orçamentárias, sem qualquer controle público.
Mas tudo isso não basta. É necessário controlar a imprensa, único espaço onde o governo ainda encontra alguma forma de discordância. No primeiro governo Lula, especialmente em 2005, com a crise do mensalão, a imprensa teve um importante papel ao revelar as falcatruas -e foram muitas.
No Brasil, os meios de comunicação têm uma importância muito maior do que em outras democracias ocidentais. Isso porque a nossa sociedade civil é extremamente frágil. A imprensa acaba assumindo um papel de enorme relevância.
Calar essa voz é fechar o único meio que a sociedade encontra para manifestar a sua insatisfação, mesmo que ela seja inorgânica, com os poderosos.
Já em 2006, quando constatou que poderia vencer a eleição, Lula passou a atacar a imprensa. E ganhou aliados rapidamente. Eram desde os jornalistas fracassados até os políticos corruptos -que apoiavam o governo e odiavam a imprensa, que tinha denunciado suas ações “pouco republicanas”.
Esse bloco deseja o poder absoluto. Daí a tentativa de eliminar os adversários, de triturar reputações, de ameaçar os opositores com a máquina estatal.
É um processo com tinturas fascistas, que deixaria ruborizado Benito Mussolini, graças à eficiência repressiva, sem que se necessite de esquadrões para atacar sedes de partidos ou sindicatos. Nem é preciso impor uma ditadura: o sufrágio universal (sem política) deverá permitir a reprodução, por muitos anos, dessa forma de domínio.
Os eventuais conflitos políticos são banais. Por temer o enfrentamento, a oposição no Brasil tenderá a ficar ainda mais reduzida e restrita às questões municipais e, no máximo, estaduais.

domingo, 8 de janeiro de 2012

Ian Buruna on China and Asia - Le Monde


"Le modèle chinois ébranle les certitudes américaines"

LE MONDE CULTURE ET IDEES | 07.01.12 | 17h08   •  Mis à jour le 08.01.12 | 09h15
par Propos recueillis par Sylvain Cypel
Des employées d'une ligne de production dans l'entreprise de matériel électronique Suzhou Etron à Suzhou, en Chine.
Des employées d'une ligne de production dans l'entreprise de matériel électroniqueSuzhou Etron à Suzhou, en Chine.Reuters/© Aly Song / Reuters

NEW YORK, CORRESPONDANT - Installé depuis 2005 à New YorkIan Buruma est devenu l'un des intellectuels les plus en vue aux Etats-Unis. Il collabore à la New York Review of Books, au New York Times et au New Yorker. Polyglotte (néerlandais, anglais, allemand, chinois, japonais et français, quoi qu'il en dise), il a été l'éditeur des pages culturelles de la Far Eastern Economic Reviewà Hongkong, et de The Spectatorà Londres. Aujourd'hui professeur de démocratie, droits de l'homme et journalisme à l'université Bard - "façon de dire que j'enseigne ce que je veux, c'est le charme du système universitaire américain", dit-il en riant -, il est un auteur polyvalent et prolifique. Nous avons interrogé cet intellectuel à focale large, prix Erasmus 2008, sur sa spécialité initiale : la Chine et l'Extrême-Orient.

Votre itinéraire vous place au carrefour de l'Asie, de l'Europe et de l'Amérique. En quoi cela influence-t-il votre regard sur le monde ? 
Mon père est néerlandais, ma mère anglaise d'origine juive allemande. L'Asie puis l'Amérique se sont ajoutées un peu par hasard. Très jeune, étudiant en langue et littérature chinoises, j'étais un cinéphile. Un jour, j'ai vu à Paris Domicile conjugal(1970), de François Truffaut. Le personnage d'Antoine Doinel y tombe amoureux de la Japonaise... et moi aussi ! A l'époque, aller en Chine était impossible. Je me suis donc tourné vers le Japon, où j'ai étudié le cinéma et participé à la troupe de danse Dairakudakan. L'Amérique est venue à moi tardivement, quand on m'a proposé d'y enseigner. Je me sens toujours plus européen qu'américain. Un Européen marié à une Japonaise et parfaitement chez lui à New York, la ville de la mixité.
Vous êtes progressiste et un produit typique du multiculturalisme. Pourquoi dénoncez-vous la "courte vue" des progressistes sur l'islam ?
Je ne suis pas "progressiste". C'est ce pays tellement conservateur que sont les Etats-Unis qui m'a beaucoup poussé à gauche ! Je l'étais moins en Europe et en Asie. Je n'ai jamais admis les complaisances de gens de gauche pour toutes sortes de potentats sous le prétexte d'accepter les différences. Et je suis opposé à l'idéologie du multiculturalisme. Lorsque le terme décrit une réalité, il me convient. Sur le plan factuel, je suis multiculturel. Mais l'idée que les gens doivent impérativement préserver toutes leurs racines est absurde. Dans le cas célèbre d'un crime d'honneur commis en Allemagne, où le juge avait estimé que le criminel avait des circonstances atténuantes en raison de sa culture d'origine, je considère qu'il a tort.
Il y a des choses plus importantes que la culture. Je n'admets pas l'argument culturel pour justifier l'excision. En même temps, je suis plus tolérant que la loi française pour l'affichage des symboles religieux. Qu'une policière ou une enseignante soit interdite de porter le niqab dans ses fonctions, oui. Une personne dans la rue, non. Ce type d'interdiction n'est qu'une façon de dissuader des gens impopulaires d'adhérer à une religion impopulaire.
La peur des Japonais était très forte il y a vingt-cinq ans aux Etats-Unis. Comment expliquez-vous qu'un même phénomène soit aujourd'hui dirigé contre la Chine ?
Les deux phénomènes ne sont pas similaires. Ce qui faisait peur aux Américains il y a une génération, c'était la visibilité des Japonais : Mitsubishi rachetait le Rockefeller Center, Toyota déboulait, etc. Leurs marques étaient très visibles. De plus, dans l'histoire américaine, les Japonais sont suspects. Aujourd'hui, les Américains se disent que, si les Chinois parviennent à la puissance qu'avaient les Japonais, ils seront bien plus dangereux. Mais, sur le fond, la menace nipponne avait été grandement exagérée et la menace chinoise l'est tout autant. D'abord, l'absence de liberté intellectuelle en Chine reste un obstacle très important pour son développement. Ensuite, l'intérêt des deux parties à préserver des liens l'emportera sur les forces poussant au conflit.
Quelle est la part de réalité et de fantasme dans cette tension montante ?
Par fantasmes, vous entendez peur. Elle est fondée : la montée en puissance de la Chine ne pourra que réduire le pouvoir et l'influence américaine dans le monde. Après 1945, les Etats-Unis sont devenus le gendarme de l'Asie. Ce n'est plus le cas. Des peurs populistes sont également fondées sur des motifs socio-économiques. Mais je ne pense pas qu'elles atteignent le niveau des peurs anti-nippones de la fin des années 1980. Et les craintes de l'influence économique chinoise sont surtout concentrées dans les Etats de la vieille économie, où l'industrie lourde est en déclin.
Un sondage de l'Institut Pew a montré que les Américains croient que la Chine est devenue la première puissance économique mondiale. Or elle reste loin des Etats-Unis. C'est un fantasme typique... 
C'est une combinaison d'ignorance et de peurs, exploitées par des chroniqueurs de radios dans le but de blâmer Barack Obama. Mais je le répète : le déclin des Etats-Unis est un fait, comme la montée en puissance économique de l'Asie. Ce déclin génère un choc, dont il ne faut pas s'alarmer inconsidérément. Au début du XXesiècle, l'invention du personnage de Fu Manchu (sorte de génie du Mal incarnant le "péril jaune") avait provoqué un arrêt de l'immigration sino-nipponne en Amérique qui avait même eu un impact en Europe. A suivi la menace communiste, qui était, pour les Etats-Unis, loin d'être aussi réelle qu'on l'a présentée. Mais même la CIA y a sincèrement cru.
Les Etats-Unis sont un pays qui vit sous la peur constante de puissances extérieures qui menaceraient de faire disparaître son espace sécurisé. Ce pays a bâti et a été bâti par une société d'immigrés mais, dans le même temps, il pourchasse ces immigrés pour se protéger. Comme la France, du reste. Et, comme les Français, les Américains s'estiment porteurs d'une mission civilisatrice universelle. Or le "modèle chinois" ébranle leurs certitudes.
Est-ce parce que les Américains fondent leur économie sur l'idée que la liberté est le meilleur garant du succès, alors que les Chinois ont une croissance très supérieure avec un régime dictatorial ?
C'est exactement ça. Ce mélange chinois réussi de capitalisme et d'Etat fort est plus qu'une remise en cause, il est perçu comme une menace. Je ne vois pourtant pas monter une atmosphère très hostile à la Chine dans l'opinion. Depuis un siècle, les Américains ont toujours été plus prochinois que pro-nippons. Les missions chrétiennes ont toujours eu plus de succès en Chine qu'au Japon. Pour la droite fondamentaliste, ça compte. Et, dans les années 1980, des députés ont détruit des Toyota devant le Capitole ! On en reste loin.
Et le regard des Chinois sur les Etats-Unis, comment évolue-t-il ?
Tout dépend de quels Chinois on parle, mais, pour résumer, c'est attirance-répulsion. Surtout parmi les classes éduquées qui rêvent d'envoyer leurs enfants dans les universités américaines et en même temps peuvent être emplies de ressentiment à l'égard d'une Amérique qu'elles perçoivent comme hostile, pour beaucoup à cause de la propagande de leur gouvernement. Du communisme comme justificatif du pouvoir il ne reste rien. Le nouveau dogme est un nationalisme fondé sur l'exacerbation d'un sentiment victimaire vis-à-vis du Japon et des Etats-Unis. En Chine, à Singapour, en Corée du Sud, on constate une forte ambivalence typique de certaines élites, par ailleurs fortement occidentalisées, pour qui le XXIsiècle sera asiatique. Dans les années 1960, au Japon, a émergé une nouvelle droite ultranationaliste, dont les représentants les plus virulents étaient professeurs de littérature allemande ou française. Ils voulaient se sentir acceptés, légitimes en termes occidentaux, et se sentaient rejetés. C'est ce que ressentent aujourd'hui les nationalistes chinois.
En 2010, vous avez écrit que la Chine est restée identique sur un aspect essentiel : elle est menée par une conception religieuse de la politique. Serait-elle politiquement soumise à l'influence du confucianisme, comme l'espace musulman le serait par le Coran ?
Dans le cas chinois, il ne s'agit pas que de confucianisme ; le maoïsme était identique. Il n'y a aucune raison pour que les musulmans ne puissent accéder à la démocratie tout en préservant leur religion. La Turquie, l'Indonésie l'ont fait. La Chine le pourrait tout autant. Des sociétés de culture sinisante comme Taïwan ou la Corée du Sud ont montré qu'un changement est possible. L'obstacle à surmonter, en Chine, est que le confucianisme rejette la légitimité du conflit. L'harmonie est caractérisée par un ordre social ou règne l'unanimité. Donc la plus petite remise en cause apparaît instantanément menaçante.
Qu'est-ce qui pourrait déclencher un processus démocratique en Chine ?
Le plus grand obstacle est l'alliance entre les élites urbaines et le Parti communiste. Les deux ont peur de l'énorme masse paysanne ignorante. Ces élites ont une telle histoire récente de violence et une telle peur d'un retour du chaos qu'elles préfèrent un ordre qui leur assure la croissance, au risque d'avancer vers la démocratie. Pour le pouvoir, la grande faiblesse de ce système est que, le jour où l'économie cesse de croître et que l'enrichissement des élites urbaines s'arrête, l'édifice s'écroule. Dans ce cas, tout pourrait advenir, d'une alliance entre démocrates, ressortissants des nouvelles élites, et une fraction du parti, jusqu'à un coup d'Etat militaire.

Pausa para... um poeta fingidor... - Fernando Pessoa


Autopsicografia

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Fernando Pessoa

China's booming cities: lessons for Europe? - The New York Times


OPINION

What China Can Teach Europe

China Photos/Getty Images
Farmers cover vegetable plants with plastic film in the Chongqing municipality in China in April 2008.
Shanghai

Related

The New York Times
FROM the outside, China often appears to be a highly centralized monolith. Unlike Europe’s cities, which have been able to preserve a certain identity and cultural distinctiveness despite the homogenizing forces of globalization, most Chinese cities suffer from a drab uniformity.
But China is more like Europe than it seems. Indeed, when it comes to economics, China is more a thin political union composed of semiautonomous cities — some with as many inhabitants as a European country — than an all-powerful centralized government that uniformly imposes its will on the whole country.
And competition among these huge cities is an important reason for China’s economic dynamism. The similar look of China’s megacities masks a rivalry as fierce as that among European countries.
China’s urban economic boom began in the late 1970s as an experiment with market reforms in China’s coastal cities. Shenzhen, the first “special economic zone,” has grown from a small fishing village in 1979 into a booming metropolis of 10 million today. Many other cities, from Guangzhou to Tianjin, soon followed the path of market reforms.
Today, cities vie ruthlessly for competitive advantage using tax breaks and other incentives that draw foreign and domestic investors. Smaller cities specialize in particular products, while larger ones flaunt their educational capacity and cultural appeal. It has led to the most rapid urban “economic miracle” in history.
But the “miracle” has had an undesirable side effect: It led to a huge gap between rich and poor, primarily between urban and rural areas. The vast rural population — 54 percent of China’s 1.3 billion people — is equivalent to the whole population of Europe. And most are stuck in destitute conditions. The main reason is the hukou (household registration) system that limits migration into cities, as well as other policies that have long favored urban over rural development.
More competition among cities is essential to eliminate the income gap. Over the past decade the central government has given leeway to different cities to experiment with alternative methods of addressing the urban-rural wealth gap.
The most widely discussed experiment is the “Chongqing model,” headed by Bo Xilai, a party secretary and rising political star. Chongqing, an enormous municipality with a population of 33 million and a land area the size of Austria, is often called China’s biggest city. But in fact 23 million of its inhabitants are registered as farmers. More than 8 million farmers have already migrated to the municipality’s more urban areas to work, with a million per year expected to migrate there over the next decade. Chongqing has responded by embarking on a huge subsidized housing project, designed to eventually house 30 to 40 percent of the city’s population.
Chongqing has also improved the lot of farmers by loosening the hukou system. Today, farmers can choose to register as “urban” and receive equal rights to education, health care and pensions after three years, on the condition that they give up the rural registration and the right to use a small plot of land.
While Chongqing’s model is the most influential, there is an alternative. Chengdu, Sichuan’s largest municipality, with a population of 14 million — half of them rural residents — is less heavy-handed. It is the only city in China to enjoy high economic growth while also reducing the income gap between urban and rural residents over the past decade.
Chengdu has focused on improving the surrounding countryside, rather than encouraging large-scale migration to the city. The government has shifted 30 percent of its resources to its rural areas and encouraged development zones that allow rural residents to earn higher salaries and to reap the educational, cultural and medical benefits of urban life.
I recently visited a development zone composed of small firms that export fiery Sichuan chili sauces. Most farmers rented their land and worked in the development zone, but those who wanted to stay on their plots were allowed to. So far, one-third of the area’s farmland has been converted into larger-scale agricultural operations that have increased efficiency.

Related

More than 90 percent of the municipality’s rural residents are now covered by a medical plan, and the government has introduced a more comprehensive pension scheme. Rural schools have been upgraded to the point that their facilities now surpass those in some of Chengdu’s urban schools, and teachers from rural areas are sent to the city for training.
Empowering rural residents by providing more job opportunities and better welfare raises their purchasing power, helping China boost domestic consumption. And in 2012, Chengdu is likely to become the first big Chinese municipality to wipe out the legal distinction between its urban and rural residents, allowing rural people to move to the city if they choose.
Chengdu’s success has been driven by a comprehensive, long-term effort involving consultation and participation from the bottom up, as well as a clear property rights scheme. By contrast, Chongqing has relied on state power and the dislocation of millions to achieve similar results. If Chengdu’s “gentle” model proves to be more effective at reducing the income gap, it can set a model for the rest of the country, just as Shenzhen set a model for market reforms.
There are fundamental differences, of course: Chengdu’s land is more fertile and its weather more temperate, compared to Chongqing’s harsh terrain and sweltering summers. Life is slower in Chengdu; even the chili is milder. What succeeds in one place may fail elsewhere.
Ultimately, the central government will decide what works and what doesn’t. And that’s not a bad thing; it encourages local variation and internal competition.
European leaders ought to take note. Central authorities should have the power not just to punish “losers” as Europe has done in the case of Greece, but to reward “winners” that set a good example for the rest of the union.

Daniel A. Bell is a professor at Shanghai’s Jiaotong University and Beijing’s Tsinghua University, and co-author of “The Spirit of Cities.”

sábado, 7 de janeiro de 2012

O Brasil e o bonus demografico: preparado? - Revista Epoca


Por que o brasileiro não poupa para o futuro
DANIELLA CORNACHIONE E LEOPOLDO MATEUS
Revista Época, 7/01/2012

Em breve, não seremos mais um país jovem. O rápido envelhecimento da população coloca o Brasil diante de uma questão urgente: como ensinar uma sociedade inteira a economizar

Já fomos um país de crianças e adolescentes. Hoje, somos um país de jovens adultos, com idade média de 32 anos, superior à de outras grandes nações em desenvolvimento, como México e Índia. Em cada dez brasileiros, seis têm entre 20 e 65 anos, a faixa de vida mais produtiva. Isso quer dizer que o país já começou a desfrutar seu "bônus demográfico", um período ótimo no ciclo de vida das nações, em que o número de trabalhadores que produzem supera o de crianças, adolescentes e idosos. Mas David Bloom, o economista e demógrafo da Universidade Harvard que definiu esse conceito, calculou que o bônus costuma durar de 30 a 40 anos, um momento breve em termos históricos. Depois desse ápice, a parcela de idosos no país começa a aumentar, o número de trabalhadores cai e os custos com saúde e aposentadoria sobem. O ideal, para qualquer país, seria formar um bom estoque de poupança, pública e privada, antes do fim do bônus demográfico. Mas o governo brasileiro não poupa nada, os cidadãos poupam pouco e não há no horizonte sinal de que isso vá mudar. O problema também aflige outros países e, por causa disso, ao redor do mundo, experimentam-se soluções envolvendo educação, participação das empresas e até tecnologia de computação gráfica. Será que elas conseguirão mudar o comportamento de sociedades inteiras?
Esse debate é de especial interesse para os brasileiros, pois nosso bônus começará a se esgotar pouco depois de 2040. Parece longe, mas não é. É quando os adolescentes de hoje estarão no auge da vida produtiva, com idade entre 40 e 50 anos. Apesar da urgência do assunto, o país está despreparado. Um novo capítulo da série de pesquisas O futuro da aposentadoria, feito pelo banco HSBC em 17 países, constatou que mesmo entre os brasileiros mais ricos (classes A e B) 60% não poupam o suficiente para a aposentadoria. Os que são pais se mostram mais otimistas com o futuro de sua situação financeira – algo que sugere uma expectativa irreal de depender dos filhos na velhice. Outra pesquisa, da empresa de benefícios e seguros MetLife, mostrou que os brasileiros dão menos valor do que deveriam a planos de aposentadoria oferecidos pelas empresas em que trabalham. Acham mais importante vale-alimentação e seguro odontológico, benefícios instantâneos e de utilidade mais restrita. "É uma questão cultural", diz a economista Myriam Lund, da Fundação Getulio Vargas. "Os anos de inflação, os planos econômicos que levavam nosso dinheiro das aplicações bancárias e a quebra de previdências privadas traumatizaram as pessoas."
O problema pode ser ainda mais antigo. O economista e filósofo Eduardo Giannetti acredita que a cultura brasileira é imediatista desde sua origem, no que chama de "aventura colonial". "Enquanto os imigrantes puritanos que foram para a América do Norte queriam criar o paraíso – constituir uma sociedade que não tivesse os vícios daquela que eles estavam abandonando –, os imigrantes portugueses que vieram para cá, na base da aventura, queriam encontrar e desfrutar o paraíso, não criá-lo", diz. Em seu livro O valor do amanhã, Giannetti afirma que "o animal humano" tem, necessariamente, de escolher entre fazer agora, desfrutar, ou cuidar do amanhã. "São perguntas das quais não se escapa", ele escreve. "Das decisões cotidianas ligadas a dieta, saúde e finanças às escolhas profissionais, afetivas e religiosas, as trocas no tempo pontuam a nossa trajetória no mundo."
O fator cultural ajuda a explicar por que alguns povos poupam mais ou menos que outros. Americanos são tradicionalmente mais gastadores que europeus e asiáticos. Mas o clima econômico de um momento é uma força poderosa a agir sobre os hábitos de uma sociedade. Os americanos que cresceram durante a década de 1930, na Grande Depressão, eram muito mais propensos a poupar que os nascidos nas últimas décadas, diz o pesquisador Shermann Hanna, da Universidade Estadual de Ohio. A Coreia do Sul fez esse mesmo caminho mais recentemente: passou do nível de poupança de 30% do PIB, nos anos 1990, para cerca de 4% hoje. A Austrália oferece um exemplo contrário. Talvez por receio com o futuro da economia, as famílias australianas passaram de um nível de poupança de 2% do PIB até 2006 para mais de 10%, atualmente. Esse exemplo sugere algo importantíssimo: é possível mudar o comportamento de um país inteiro com respeito à poupança. No Brasil, a poupança das famílias equivale a 4,5% do PIB. Ficamos atrás dos europeus e muito atrás dos grandes emergentes asiáticos, Índia, China e Indonésia, onde a poupança das famílias passa de 20% do PIB. E temos pressa. O Brasil vem envelhecendo mais rapidamente do que se projetava até o fim do século XX. Na França, foram necessários 100 anos para que a proporção de idosos aumentasse de 7% para 14% da população. A mesma variação ocorrerá por aqui em apenas duas décadas, de acordo com o Banco Mundial.
Diante desse problema global, têm surgido diferentes propostas e soluções. Uma equipe de pesquisadores americanos testou os efeitos de mostrar a jovens na casa dos 20 anos como eles se parecerão quando forem idosos. Eles exibiram a um primeiro grupo imagens de pessoas mais velhas. Um segundo grupo interagiu, num ambiente virtual, com versões deles mesmos, envelhecidas por computação gráfica – seus avatares idosos. Após três baterias de questionários, os pesquisadores ficaram animados com a maior disposição do segundo grupo de poupar para a aposentadoria. O estudo foi publicado em novembro. "Queríamos ver se a experiência de envelhecimento fotográfico poderia fazer alguém se sentir mais conectado consigo mesmo no futuro. Deu certo", afirma Hal Hershfield, professor de marketing na escola de negócios Stern, em Nova York, e principal autor da pesquisa. Um dos mecanismos que atrapalham a poupança é que jovens têm dificuldade em trocar o prazer imediato em nome do conforto de um "estranho" – ele mesmo, dentro de 40 ou 50 anos. Ao aproximar o jovem do ancião que virá a ser, o avatar rompe esse distanciamento. "Os benefícios que os avatares podem trazer, como ajudar a poupar e emagrecer, logo estarão disponíveis em outras áreas", afirma Jeremy Bailenson, coautor do estudo e autor do livro Infinite reality (Realidade infinita). Os pesquisadores negociam com a empresa de investimentos e seguros Allianz para que clientes e funcionários possam usar esse recurso.
Métodos inovadores para estimular a poupança estão em estudo no mundo todo porque a abordagem tradicional – dizer às pessoas que elas precisam guardar para o futuro – simplesmente não está funcionando. Talvez porque a sociedade ofereça estímulos desproporcionais para o consumo imediato e o endividamento. Talvez porque a natureza humana seja resistente a encarar o futuro. "Em vez de fazer a melhor opção, simplesmente escolhemos a mais fácil", afirma Vera Rita Ferreira, doutora em psicologia econômica pela PUC-SP. Dois americanos ganharam destaque nos últimos anos por propor que as sociedades atropelem a preguiça mental dos indivíduos em benefício da sociedade. O economista Richard Thaler e o jurista Cass Sunstein defendem um novo modelo para as escolhas oferecidas ao cidadão. Eles criticam os "cardápios de investimento" em que todas as alternativas têm igual destaque. Sugerem que se apresente às pessoas a opção mais sensata, sem muita possibilidade de erro. Seguindo essa ideia, um número crescente de companhias americanas define como padrão na contratação que o funcionário seja incluído de forma automática no plano de aposentadoria, alimentado por descontos mensais no salário e depósitos mensais por parte do empregador. Se ele não quiser ficar no plano, terá de fazer um esforço burocrático para cair fora. A maioria fica e poupa para o futuro sem precisar pensar muito. Thaler e Sunstein esmiúçam essa ideia no livro Nudge – O empurrão para a escolha certa.
Entre os estudiosos do assunto, cresce a ideia de preparar também as crianças para a necessidade de poupar. "A educação na infância é muito importante. Ter bancos fictícios nas escolas japonesas incentivou as crianças a poupar mais", afirma a americana Annamaria Lusardi, professora de economia na escola de negócios George Washington e referência mundial em finanças pessoais. Ela acredita que há vários motivos para as pessoas não pouparem, mas insiste no mais óbvio: informação. Mesmo os cidadãos de classe média dos países ricos carecem de educação financeira. As pessoas não conseguem calcular quanto precisarão para a aposentadoria. É preciso instruí-las. O aprendizado nesse assunto pode provocar mudanças de comportamento notáveis, como a do empresário carioca Erick Vils, de 34 anos. Ele diz ter mudado sua forma de pensar sobre o futuro ao ler um livro de finanças. "Eu achava que precisava acumular bens. Comprei casa e carro aos 20 e poucos anos", afirma. Lendo, Vils aprendeu que poderia ganhar mais se investisse melhor. A partir dessa premissa, fez as contas para poder trabalhar menos no futuro e aposentar-se com tranquilidade. "Não tenho filhos ainda, então aproveito para poupar o dinheiro que gastaria com eles." Trata-se de uma questão individual, mas não apenas. Vils e os brasileiros que poupam viverão bem melhor daqui a algumas décadas se, além de ter dinheiro no bolso, não se virem diante de um Estado quebrado – e cercados por amigos idosos e infelizes.
O Brasil a caminho da maturidade
Daqui a uma geração, não terá mais sentido falar em "pirâmide etária" no Brasil – a figura à direita tem poucos jovens na base e muitos idosos no topo. Nos próximos anos, tende a cair a demanda por novas escolas e a crescer o gasto com saúde e aposentadorias.