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sábado, 7 de janeiro de 2012

O Brasil e o bonus demografico: preparado? - Revista Epoca


Por que o brasileiro não poupa para o futuro
DANIELLA CORNACHIONE E LEOPOLDO MATEUS
Revista Época, 7/01/2012

Em breve, não seremos mais um país jovem. O rápido envelhecimento da população coloca o Brasil diante de uma questão urgente: como ensinar uma sociedade inteira a economizar

Já fomos um país de crianças e adolescentes. Hoje, somos um país de jovens adultos, com idade média de 32 anos, superior à de outras grandes nações em desenvolvimento, como México e Índia. Em cada dez brasileiros, seis têm entre 20 e 65 anos, a faixa de vida mais produtiva. Isso quer dizer que o país já começou a desfrutar seu "bônus demográfico", um período ótimo no ciclo de vida das nações, em que o número de trabalhadores que produzem supera o de crianças, adolescentes e idosos. Mas David Bloom, o economista e demógrafo da Universidade Harvard que definiu esse conceito, calculou que o bônus costuma durar de 30 a 40 anos, um momento breve em termos históricos. Depois desse ápice, a parcela de idosos no país começa a aumentar, o número de trabalhadores cai e os custos com saúde e aposentadoria sobem. O ideal, para qualquer país, seria formar um bom estoque de poupança, pública e privada, antes do fim do bônus demográfico. Mas o governo brasileiro não poupa nada, os cidadãos poupam pouco e não há no horizonte sinal de que isso vá mudar. O problema também aflige outros países e, por causa disso, ao redor do mundo, experimentam-se soluções envolvendo educação, participação das empresas e até tecnologia de computação gráfica. Será que elas conseguirão mudar o comportamento de sociedades inteiras?
Esse debate é de especial interesse para os brasileiros, pois nosso bônus começará a se esgotar pouco depois de 2040. Parece longe, mas não é. É quando os adolescentes de hoje estarão no auge da vida produtiva, com idade entre 40 e 50 anos. Apesar da urgência do assunto, o país está despreparado. Um novo capítulo da série de pesquisas O futuro da aposentadoria, feito pelo banco HSBC em 17 países, constatou que mesmo entre os brasileiros mais ricos (classes A e B) 60% não poupam o suficiente para a aposentadoria. Os que são pais se mostram mais otimistas com o futuro de sua situação financeira – algo que sugere uma expectativa irreal de depender dos filhos na velhice. Outra pesquisa, da empresa de benefícios e seguros MetLife, mostrou que os brasileiros dão menos valor do que deveriam a planos de aposentadoria oferecidos pelas empresas em que trabalham. Acham mais importante vale-alimentação e seguro odontológico, benefícios instantâneos e de utilidade mais restrita. "É uma questão cultural", diz a economista Myriam Lund, da Fundação Getulio Vargas. "Os anos de inflação, os planos econômicos que levavam nosso dinheiro das aplicações bancárias e a quebra de previdências privadas traumatizaram as pessoas."
O problema pode ser ainda mais antigo. O economista e filósofo Eduardo Giannetti acredita que a cultura brasileira é imediatista desde sua origem, no que chama de "aventura colonial". "Enquanto os imigrantes puritanos que foram para a América do Norte queriam criar o paraíso – constituir uma sociedade que não tivesse os vícios daquela que eles estavam abandonando –, os imigrantes portugueses que vieram para cá, na base da aventura, queriam encontrar e desfrutar o paraíso, não criá-lo", diz. Em seu livro O valor do amanhã, Giannetti afirma que "o animal humano" tem, necessariamente, de escolher entre fazer agora, desfrutar, ou cuidar do amanhã. "São perguntas das quais não se escapa", ele escreve. "Das decisões cotidianas ligadas a dieta, saúde e finanças às escolhas profissionais, afetivas e religiosas, as trocas no tempo pontuam a nossa trajetória no mundo."
O fator cultural ajuda a explicar por que alguns povos poupam mais ou menos que outros. Americanos são tradicionalmente mais gastadores que europeus e asiáticos. Mas o clima econômico de um momento é uma força poderosa a agir sobre os hábitos de uma sociedade. Os americanos que cresceram durante a década de 1930, na Grande Depressão, eram muito mais propensos a poupar que os nascidos nas últimas décadas, diz o pesquisador Shermann Hanna, da Universidade Estadual de Ohio. A Coreia do Sul fez esse mesmo caminho mais recentemente: passou do nível de poupança de 30% do PIB, nos anos 1990, para cerca de 4% hoje. A Austrália oferece um exemplo contrário. Talvez por receio com o futuro da economia, as famílias australianas passaram de um nível de poupança de 2% do PIB até 2006 para mais de 10%, atualmente. Esse exemplo sugere algo importantíssimo: é possível mudar o comportamento de um país inteiro com respeito à poupança. No Brasil, a poupança das famílias equivale a 4,5% do PIB. Ficamos atrás dos europeus e muito atrás dos grandes emergentes asiáticos, Índia, China e Indonésia, onde a poupança das famílias passa de 20% do PIB. E temos pressa. O Brasil vem envelhecendo mais rapidamente do que se projetava até o fim do século XX. Na França, foram necessários 100 anos para que a proporção de idosos aumentasse de 7% para 14% da população. A mesma variação ocorrerá por aqui em apenas duas décadas, de acordo com o Banco Mundial.
Diante desse problema global, têm surgido diferentes propostas e soluções. Uma equipe de pesquisadores americanos testou os efeitos de mostrar a jovens na casa dos 20 anos como eles se parecerão quando forem idosos. Eles exibiram a um primeiro grupo imagens de pessoas mais velhas. Um segundo grupo interagiu, num ambiente virtual, com versões deles mesmos, envelhecidas por computação gráfica – seus avatares idosos. Após três baterias de questionários, os pesquisadores ficaram animados com a maior disposição do segundo grupo de poupar para a aposentadoria. O estudo foi publicado em novembro. "Queríamos ver se a experiência de envelhecimento fotográfico poderia fazer alguém se sentir mais conectado consigo mesmo no futuro. Deu certo", afirma Hal Hershfield, professor de marketing na escola de negócios Stern, em Nova York, e principal autor da pesquisa. Um dos mecanismos que atrapalham a poupança é que jovens têm dificuldade em trocar o prazer imediato em nome do conforto de um "estranho" – ele mesmo, dentro de 40 ou 50 anos. Ao aproximar o jovem do ancião que virá a ser, o avatar rompe esse distanciamento. "Os benefícios que os avatares podem trazer, como ajudar a poupar e emagrecer, logo estarão disponíveis em outras áreas", afirma Jeremy Bailenson, coautor do estudo e autor do livro Infinite reality (Realidade infinita). Os pesquisadores negociam com a empresa de investimentos e seguros Allianz para que clientes e funcionários possam usar esse recurso.
Métodos inovadores para estimular a poupança estão em estudo no mundo todo porque a abordagem tradicional – dizer às pessoas que elas precisam guardar para o futuro – simplesmente não está funcionando. Talvez porque a sociedade ofereça estímulos desproporcionais para o consumo imediato e o endividamento. Talvez porque a natureza humana seja resistente a encarar o futuro. "Em vez de fazer a melhor opção, simplesmente escolhemos a mais fácil", afirma Vera Rita Ferreira, doutora em psicologia econômica pela PUC-SP. Dois americanos ganharam destaque nos últimos anos por propor que as sociedades atropelem a preguiça mental dos indivíduos em benefício da sociedade. O economista Richard Thaler e o jurista Cass Sunstein defendem um novo modelo para as escolhas oferecidas ao cidadão. Eles criticam os "cardápios de investimento" em que todas as alternativas têm igual destaque. Sugerem que se apresente às pessoas a opção mais sensata, sem muita possibilidade de erro. Seguindo essa ideia, um número crescente de companhias americanas define como padrão na contratação que o funcionário seja incluído de forma automática no plano de aposentadoria, alimentado por descontos mensais no salário e depósitos mensais por parte do empregador. Se ele não quiser ficar no plano, terá de fazer um esforço burocrático para cair fora. A maioria fica e poupa para o futuro sem precisar pensar muito. Thaler e Sunstein esmiúçam essa ideia no livro Nudge – O empurrão para a escolha certa.
Entre os estudiosos do assunto, cresce a ideia de preparar também as crianças para a necessidade de poupar. "A educação na infância é muito importante. Ter bancos fictícios nas escolas japonesas incentivou as crianças a poupar mais", afirma a americana Annamaria Lusardi, professora de economia na escola de negócios George Washington e referência mundial em finanças pessoais. Ela acredita que há vários motivos para as pessoas não pouparem, mas insiste no mais óbvio: informação. Mesmo os cidadãos de classe média dos países ricos carecem de educação financeira. As pessoas não conseguem calcular quanto precisarão para a aposentadoria. É preciso instruí-las. O aprendizado nesse assunto pode provocar mudanças de comportamento notáveis, como a do empresário carioca Erick Vils, de 34 anos. Ele diz ter mudado sua forma de pensar sobre o futuro ao ler um livro de finanças. "Eu achava que precisava acumular bens. Comprei casa e carro aos 20 e poucos anos", afirma. Lendo, Vils aprendeu que poderia ganhar mais se investisse melhor. A partir dessa premissa, fez as contas para poder trabalhar menos no futuro e aposentar-se com tranquilidade. "Não tenho filhos ainda, então aproveito para poupar o dinheiro que gastaria com eles." Trata-se de uma questão individual, mas não apenas. Vils e os brasileiros que poupam viverão bem melhor daqui a algumas décadas se, além de ter dinheiro no bolso, não se virem diante de um Estado quebrado – e cercados por amigos idosos e infelizes.
O Brasil a caminho da maturidade
Daqui a uma geração, não terá mais sentido falar em "pirâmide etária" no Brasil – a figura à direita tem poucos jovens na base e muitos idosos no topo. Nos próximos anos, tende a cair a demanda por novas escolas e a crescer o gasto com saúde e aposentadorias.

Um comentário:

pseudopseud disse...

Lembro quando era pequeno as propagandas da Caixa sobre poupar,nos anos 80,distribuindo porquinhos e tudo.Com a taxa de inflação que tinha,os que tentaram se deram mal.Se o fato do cidadão não poupar já era um problema antes desse período,nos anos 80 o governo oficializou esta cultura de vez.