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sábado, 9 de fevereiro de 2013

Maquiavel: quase 500 anos - Paulo Roberto de Almeida

Aqui, minha homenagem a Maquiavel, um texto de síntese quando terminei de reescrever O Príncipe, no qual eu reflito sobre a atualidade do inventor da ciência política e pergunto: o que nos separa de Maquiavel?.
O Moderno Príncipe: Maquiavel revisitado
Paulo Roberto de Almeida 

Se, por alguma fortuna histórica, Maquiavel retornasse, hoje, ao nosso convívio, com as suas virtudes de pensador prático, quase meio milênio depois de redigida sua obra mais famosa, como reescreveria ele o seu manual “hiperrrealista” de governança política? Seriam os Estados modernos muito diversos dos principados do final da Idade Média?

Este Maquiavelrevisitado, voltado para a política contemporânea, dialoga com o genial pensador florentino, segue seus passos naquelas “recomendações” que continuam aparentemente válidas para a política atual, mas não hesita em oferecer novas respostas para velhos problemas de administração dos homens. Aqui, como em outros aspectos, a constância dos “príncipes” nos desacertos é notável. Essa capacidade de errar e de provocar danos aos cidadãos não parece ter evoluido muito, desde então.

De fato, Maquiavel permanece surpreendentemente atual – com o que concordariam os filósofos e cientistas políticos da atualidade –, mesmo (talvez sobretudo) nos traços malévolos exibidos pelos condottieri contemporâneos e pelos cappi dei uomine. Ainda que envenenamentos encomendados e assassinatos por adagas, tão comuns no Renascimento italiano, não estejam mais na moda – pelo menos fora do âmbito dos serviços secretos –, e que eles tenham sido substituídos por outros métodos para se desembaraçar de concorrentes e de adversários políticos, as técnicas para se apossar do poder e para mantê-lo exibem uma notável continuidade com aquelas descritas pelo experiente diplomata da repubblica fiorentina do Quatrocento.

O que pode estar ultrapassado, no seu “manual” de 1513, é meramente acessório, pois a essência da arte de comandar os homens revela-se plenamente adequada aos dias que correm, confirmando assim as finas virtudes de psicólogo político – avant la lettre – do perspicaz pensador do Cinquecento.

Este Príncipe Moderno representa, antes de tudo, uma singela homenagem ao diplomata italiano que “inventou” a ciência política, ainda que ele o tenha feito nas difíceis circunstâncias do ostracismo, na sua condição de funcionário de Estado “cassado” pelos novos donos do poder em Florença.

Obra de um momento político – talvez não muito diverso daqueles tempos vividos pelo segretario de cancelleria –, este novo Príncipe, que se pretende tão universal em seu escopo e motivações quanto seu modelo de cinco séculos atrás, oferece novos argumentos em torno dos velhos problemas da administração estatal. A bem refletir sobre a política contemporânea, pouco nos separa de Maquiavel, se não é algum desenvolvimento institucional e uma maior rapidez nas comunicações. Quanto aos homens, tanto os condottieri quanto o popolo, eles não parecem ter mudado muito...


Paulo Roberto de Almeida é cientista social e diplomata, com obras publicadas sobre temas de história diplomática, de relações internacionais e de política externa do Brasil.

Leia o prefácio, a dedicatória e uma carta a Maquiavel, neste link:


Maquiavel: 500 anos de O Principe - Renato Lessa

Faz meio milênio, um diplomata florentino caído em desgraça com a mudança de regime em sua república natal, escreveu, no ostracismo, a obra fundadora da política moderna, talvez a obra seminal de todas as políticas. Abaixo apresento um artigo do cientista político Renato Lessa, que trata da obra e do homem, e de seu impacto permanente não apenas na política prática, mas sobretudo no pensamento político moderno.
Eu também me dediquei a pensar sobre o homem e a obra, e a ele dediquei um de meus exercícios de "clássicos revisitados", reescrevendo O Príncipe para os nossos tempos, consignando, também, na introdução e na conclusão, meus sentimentos em relação ao personagem, seu papel na história e as lições que poderiam ser tiradas de certos episódios para nossa reflexão contemporânea.
Meus escritos sobre ele e sua obra podem ser conferidos neste link:
http://www.pralmeida.org/01Livros/2FramesBooks/95maquiavelrevisitadoSen.html
Ainda falaremos de Maquiavel neste ano de 2013.
Paulo Roberto de Almeida

1513-2013: uma aproximação ao Experimento Maquiavel

O cientista político Renato Lessa apresenta o pensamento do autor de 'O príncipe', que enxerga na política o remédio para a condição humana, sempre instável e falível.
Por: Renato Lessa
Revista Ciência Hoje,  31/01/2013
1513-2013: uma aproximação ao Experimento Maquiavel
Nesta série de artigos, publicada no ano da comemoração dos 500 anos de ‘O príncipe’, de Maquiavel, o sobreCultura+ abordará aspectos importantes da obra do pensador florentino, da ideia de representação política ao seu republicanismo, teatro e filosofia.
Maquiavel, Maquiavéis O príncipe, Maquiavel
Há cinco séculos, no ano de 1513, Nicolau Maquiavel, político e pensador florentino, escreveu uma carta a um embaixador de sua cidade noticiando que escrevera “um livreto”, que designa como De principatibus e tornou-se conhecido como O Príncipe. Os termos da carta exalam modéstia e engenho simples: trata-se de investigar o que é o principado – “de que espécie são, como se conquistam, como se mantêm, por que se perdem”. Tal concisão não impediu que o “pequeno livro” se tornasse uma das principais obras da cultura moderna, e não apenas do pensamento político moderno.
Em comemoração aos cinco séculos de O príncipe, o sobreCultura+ revisitará, em abordagem ampliada, vários ângulos da obra geral de Maquiavel. O pretexto da efeméride dará passagem à publicação mensal de ensaios elaborados por estudiosos especialmente convidados.
O título da série – Maquiavel, Maquiavéis – foi tomado de empréstimo do livro da cientista política Maria Tereza Aina Sadek, que gentilmente autorizou seu uso.
O tema da complexidade parece ser, hoje, apanágio das assim chamadas ciências exatas. De fato, complexos são os sistemas orgânicos e, por sua vez, os inorgânicos nada lhes ficam a dever. Tanto uns como outros são avessos à explicação monocausal e, com alguma frequência, manifestam-se de forma caótica, desafiando a velha crença da modernidade de que a estabilidade das causas é garantia da estabilidade dos efeitos.
Há exatos 500 anos, na cidade de Florença, Nicolau Maquiavel (1469-1527), homem público e intelectual, concluiu O príncipe. Não é exagero dizer que antes dos 'filósofos naturais' – nome que então se atribuía ao que hoje definimos como 'cientistas' – terem dado conta da complexidade presente nos fenômenos naturais, o livro introduziu na cultura ocidental o 'fato da complexidade' como constitutivo das relações entre os humanos.
O pequeno livro foi dedicado ao “Magnífico Lorenzo de Medici”, governante florentino e membro da família mais poderosa da cidade. A dedicatória pode sugerir a olhos precipitados um vínculo temático e estilístico do “pequeno volume” – como o designava Maquiavel – com o estilo literário e político conhecido como “espelho de príncipes”. O estilo tinha como traço central a enumeração, com frequência por parte de um autor protegido ou patrocinado para tal fim, das qualidades necessárias para o governo de um príncipe virtuoso. Quando não tendia para a bajulação aberta, procurava fixar uma coleção de bons preceitos diante dos quais o governante deveria se espelhar.
Já na dedicatória, Maquiavel indica a natureza distinta de seu empreendimento. Embora dedicado a um príncipe, a obra parte de uma curiosa e inovadora premissa. Como que se desculpando pela ousadia de dirigir-se a um príncipe como Lorenzo, Maquiavel – que se apresenta como “homem de baixa e ínfima condição” – sustenta que “para conhecer a natureza dos príncipes é preciso ser povo”, assim como “para bem conhecer a natureza dos povos, é preciso ser príncipe”. A natureza do governo, portanto, aparece não como fundada na consulta principesca de um catálogo de preceitos morais e religiosos, mas emerge da interação sempre complexa e um tanto imprevisível entre os 'grandes' e os 'pequenos'.
Se a natureza de um povo é constituída pela direção política à qual se submete, o significado do governo do príncipe é mais bem revelado pela observação que sobre ele fazem seus súditos, ou suas vítimas. Não sendo, pois, um 'espelho de príncipes', do que trata, afinal, este livro, um dos mais importantes da cultura ocidental moderna?

Complexidade política

O tema fundamental de O príncipe é o da 'complexidade da política' e, por extensão, da história. É isto que corre como pano de fundo para o tratamento de diferentes regimes políticos – os principados –, que têm em comum, ao contrário das repúblicas, a presença de sistemas monocráticos e de concentração de soberania.
Em obra iniciada em 1513 e concluída em 1517, os Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio, Maquiavel ocupou-se das repúblicas, tema de grande ancestralidade. A complexidade dos principados não deriva tanto da diversidade de suas formas: há os hereditários, os tomados por conquista, os novos, os eclesiásticos, todos com características próprias, desafios aos governantes e expectativas dos súditos. Mas pode-se dizer que há um suporte de complexidade básica que subjaz à variedade das formas políticas, e ele diz respeito ao lugar ocupado pela política nos assuntos humanos.
Se este é o foco, Maquiavel não pode, por outro lado, ser tomado como um 'pensador político', no sentido de um 'especialista' em política. Sua sensibilidade para fenômenos de natureza política foi envolvida por um conjunto amplo de questões e formas de conhecimento, tais como a antropologia – ou um exame da condição humana –, a história, a cosmologia e a filosofia. Para começar, a própria ideia de política – que comparece ao texto não como termo, mas como problema – deve ser clarificada.
Montagem 'O príncipe'
Em sua obra mais conhecida, 'O príncipe', Maquiavel mostra que a política, na modernidade, supõe a dominação de um soberano sobre seus súditos. Para ele, é justamente este exercício de soberania que torna a sociedade possível.
Os padrões estabelecidos pela Antiguidade – presentes na democracia ateniense e na república romana – fizeram da ideia de política algo que pode ser definido como uma prática de deliberação pública a respeito de assuntos de interesse comum. Se fossemos representar tal prática em termos gráficos, uma linha horizontal seria suficiente. É essa representação que decorre da própria noção grega de 'isonomia' política – ou de equivalência dos cidadãos na vida pública –, presente, como ideal, nas repúblicas.
A política no experimento de Maquiavel aproxima-se mais da linha vertical do que da horizontalidade dos antigos. Aqui, trata-se de mostrar que política, na abertura da modernidade, supõe exercício de dominação de um soberano sobre seus súditos, ou dos grandes sobre os pequenos.
A nostalgia deliberativa da democracia grega e da república romana cede lugar a um experimento que tem no exercício da dominação um 'princípio de vertebração' da sociedade, sem o qual ela colapsa. Em outros termos, o que torna a sociedade possível é o exercício da soberania: há ordem ali onde se faz clara a determinação de quem manda e de quem obedece. É este o sentido da política: instituir na vida social um fundamento implicado no próprio exercício do poder.

Cosmologia precisa

O valor e a necessidade desse fundamento podem ser dados pela antropologia de Maquiavel, apoiada, por sua vez, em uma cosmologia precisa. Os homens habitam, tal como no sistema aristotélico-ptolomaico, o domínio sublunar, distinto do padrão cosmológico do mundo supralunar. Este, de acordo com Aristóteles, é constituído por movimentos naturais, perpétuos e necessários. Perfeição e necessidade são seus atributos centrais, e o conceito de 'movimento natural', egresso da física aristotélica, é fulcral: trata-se do trajeto de um corpo na direção de seu lugar natural.
O cosmo aristotélico, em seu estrato supralunar, é o espaço por excelência dos movimentos naturais. 'Movimentos violentos', por oposição, são aqueles que dirigem corpos a lugares não-naturais – ou lugares que não são seus por natureza –, o que pressupõe a mediação de um agente que introduz no mundo um princípio de desordem e indeterminação.
O cosmo de Maquiavel, tal como ensinado em seu tempo pelos aristotélicos da cidade de Pádua, possui tal fisionomia. O mundo sublunar, mesmo que marcado por regularidades físicas, é o lugar natural dos movimentos não-naturais, pela simples razão de que é apenas nesse estrato inferior que podemos encontrar os humanos. A cosmologia dá, assim, passagem à antropologia, e vemo-nos diante da representação maquiaveliana da condição – ou natureza – humana.
Não são auspiciosas as imagens que disto se seguem. Não é que os humanos sejam maus por natureza, mas são erráticos nas suas paixões, desejam com frequência melhorar sua condição, são capazes de gestos de grandeza, mas podem odiar, invejar e abrigar ambições descabidas; no limite, são letais. Em uma palavra, não há na natureza humana um substrato mínimo de estabilidade; os humanos devem ser contidos de fora para dentro, até mesmo para que aprendam a conter-se de dentro para fora.
A política é tudo, menos estabilidade consolidada. Falar de política implica pôr-se no universo existencial da incerteza. Este é o mantra da 'ciência política' maquiaveliana
Não há em Maquiavel intenção condenatória: para ele essa antropologia é um fato da espécie e manifesta-se por toda parte e por todos os tempos. Se quisermos, é este mesmo um princípio de estabilidade: a instabilidade permanente do comportamento humano. Os humanos não cabem dentro de si. Espinosa e Freud bem entenderam, cada um em seu tempo, as implicações da antropologia de Maquiavel: para o primeiro, a potência da multidão excede sempre as formas institucionais que a procuram conter; para o segundo, por mais que a civilização exerça sobre nós sua disciplina, a energia pulsional segue vigente e igualmente excessiva.
Pois bem, a política é o remédio para a condição humana sempre instável e falível. Tal instabilidade, contudo, tem como um de seus princípios o fato de que tudo que é valioso para os humanos é objeto de inveja e disputa. Tal princípio não pode deixar de afetar a própria política, tornando-a, desta forma, igualmente instável. O próprio lugar do príncipe está, por definição, sempre em disputa; o príncipe não é, além disso, uma exceção antropológica. Ou seja, o princípio de instabilidade é responsável pela introdução continuada de instabilidade. A política é tudo, menos estabilidade consolidada. Falar de política implica pôr-se no universo existencial da incerteza. Este é o mantra da 'ciência política' maquiaveliana.

Fortuna e virtude

Nada mais distante de Maquiavel do que a pretensão de que foi o fundador de uma ciência capaz de tornar os fenômenos políticos explicáveis e previsíveis. Basta levar em conta o papel que atribuiu à 'fortuna' – ou o conjunto de fatores fora de nosso alcance, proporcionados pelo acaso – nos assuntos humanos.
Para ele, nada menos do que a metade de nossas ações é pautada pela fortuna. Isso vale tanto para o cidadão comum – que se agarra às rotinas do hábito como subterfúgio ao assédio do acaso – como para o príncipe, acossado sempre por inimigos e por amigos invejosos e inconfiáveis. Para o príncipe não há como escorar-se no hábito. O que se lhe impõe, na perspectiva de conservar e ampliar seu domínio, é a ação; uma ação que, diante do imponderável – da imprevisibilidade – da fortuna, exige uma qualidade específica, sem a qual tudo colapsa, a virtù.
Para Maquiavel, nada menos do que a metade de nossas ações é pautada pelo acaso
Não se trata aqui da virtude pregada aos príncipes pelos 'espelhos de príncipes'. Não há catálogo de virtudes morais e de preceitos religiosos que nos ensine a lidar com a política tal como ela é, é o que Maquiavel está a dizer. É a capacidade de extrair da fortuna – da indeterminação da vida e da volatilidade da política – um curso de ação positivo. Em linguagem corrente, trata-se de fazer do acaso uma estrutura de oportunidades para novas opções e para a sobrevida e ampliação da capacidade de exercer poder.
Quem detém essa capacidade, tão essencial para a política? Ninguém por direito divino ou de casta. A capacidade política – um dos sentidos da ideia de virtù – é sociologicamente cega: ou seja, não há em Maquiavel nada que a defina como monopólio de aristocratas; um condottiere de extração popular bem pode detê-la.
Por fim, Maquiavel estabelece premissas importantes para o conhecimento da política. Francis Bacon (1561-1626), um dos heróis da ciência moderna, nele reconhecerá uma inovação teórica fundamental, a de proceder segundo princípios indutivos, tomando por base os exemplos históricos.
Francis Bacon
Francis Bacon, considerado um dos pais da ciência moderna, reconhecerá em Maquiavel uma inovação teórica fundamental, a de proceder segundo princípios indutivos, tomando por base exemplos históricos. (imagem: Wikimedia Commons)
A política, assim como a história, são vulneráveis às artes do acaso, mas podem ser conhecidas, em alguma medida. Assim como a natureza se abre à observação do naturalista, os exemplos históricos constituem a ‘natureza’ do historiador Maquiavel. Aprender com o que fizeram, ao longo do tempo – para o bem ou para o mal –, soberanos e diversos potentados, verificar as condições nas quais decisões foram tomadas, seus efeitos etc. – tudo isso forma um grande catálogo de exemplos aplicáveis diante de situações semelhantes. Empreendimento imenso, ilimitado e inacabável. Mais do que isso, sempre vulnerável à imperita coleta de exemplos e à infeliz interpretação. Tudo isso agravado pelo fato de que o conhecimento político é uma exigência da ação política; ele tem o tempo da própria ação, o que lhe imprime imensa falibilidade.
Para entender a política é fundamental ler o livro da História. Mas ao lê-lo, não há qualquer garantia de infalibilidade. A ciência da política é uma tentativa de conhecimento sistemático daquilo que não se dá a conhecer sistematicamente. É esse o legado de Maquiavel e a sua utopia para o conhecimento humano.

Renato Lessa
Laboratório de Estudos Hum(e)anos
Departamento de Ciência Política
Universidade Federal Fluminense

Premio Nobel de Literatura 2012: Mo Yan - Ian Buruma (NYTRBooks)

Folk Opera

‘Sandalwood Death’ and ‘Pow!’ by Mo Yan

Mo Yan, winner of the 2012 Nobel Prize in Literature, has a deft way with similes: salty, sometimes gross, usually unexpected. Comparing women’s breasts to “ripe mangoes” is almost a cliché, but to describe the nipples as “rising gracefully, like the captivating mouths of hedgehogs” is arresting. Passengers disembarking from a train do so “like beetles rolling their precious dung.” A rich meal of pork lies on a man’s stomach, “churning and grinding like a litter of soon-to-be-born piglets.”
Yuko Shimizu

SANDALWOOD DEATH

By Mo Yan
Translated by Howard Goldblatt
409 pp. University of Oklahoma Press. Paper, $24.95.

POW!

By Mo Yan
Translated by Howard Goldblatt
386 pp. Seagull Books. $27.50.
Yan Bo/European Pressphoto Agency
Mo Yan
What gives Mo Yan’s novels their highly idiosyncratic tone is the combination of a great literary imagination and a peasant spirit. Howard Gold­blatt’s translations catch this atmosphere brilliantly. The prose reads well in English, without losing a distinctly Chinese feel, but it is very far from the classical Chinese tradition. There is nothing mandarin, or even urbane, about Mo Yan’s work. He has retained the earthy character of rural Shandong, where he grew up in a farming family.
Like most of his stories, both “Sandalwood Death” and “Pow!” are set in a rustic place resembling Mo Yan’s native village in Gaomi County. Of “Sandalwood Death,” he has written that it might be less suited to sophisticated readers than “to hoarse voices in a public square, surrounded by an audience of eager listeners.” In fact, it is artfully written in the style of a local folk opera called Maoqiang, now almost defunct. One of the main characters is an opera singer. The rhythms, idioms and narrative techniques of ­Maoqiang are ­woven into the text in a seamless way that only a master storyteller can pull off. The art of telling stories is actually the main theme of both novels.
The narrator of “Pow!,” Luo Xiaotong, is a young man who has a horror of growing up, of entering the corrupt adult world where the powerful prey on the weak. As Mo Yan explains in his afterword, Luo is the reverse of little Oskar in Günter Grass’s “Tin Drum,” the boy whose body stops growing even as his mental age progresses. Luo has a child’s mind in a grown-up body. He is the sort of wise simpleton, a kind of Chinese Soldier Schweik, that often turns up in Mo Yan’s novels. When Luo looks at Aunty Wild Mule, his father’s mistress, he feels “like a boy of 7 or 8,” and yet “the pounding of my heart and the stirrings of that thing between my legs declare to me that I am that child no longer.” By observing the adults, Luo realizes that sex can lead people into some very dark places. And so he clings to a kind of innocence. But, as so often happens when the strain of growing up in a corrupted world becomes intolerable, innocence explodes in an act of extraordinary violence. “Pow” can mean two things: It is the bang of an old Japanese Army mortar, used by Luo to blow the adult world to smithereens; it also means to brag, to tell stories, and even, in Beijing slang, to have sex.
Luo’s bizarre story of his childhood is told to a monk in a decaying temple dedicated to the worship of a lecherous idol named the Horse Spirit. Greed, lust and the abuse of power are the main features of the world observed by Luo. The greediest, most lecherous, most powerful figure in the story is also his benefactor, a man named Lao Lan, scion of a landowning family, who sleeps with Luo’s mother and exploits human greed by monopolizing the production of meat in a village dedicated to animal slaughter.
In this fantasy world of meat-eating gluttony, there is even a Meat God Temple and a Carnivore Festival. Lust for meat isn’t really condemned (nor, for that matter, is sex); it’s the natural response of people who have gone hungry for too long, a grotesque binge after a history of famines. Mo Yan himself was born only a few years before Chairman Mao starved China’s rural population in his monstrous Great Leap Forward.
Luo, the meat-eater, is a highly useful asset to Lao Lan’s business. He has a limitless capacity for food. The champion of a meat-eating contest, Luo adores meat and meat loves him back, to the point of speaking to him in voices. He is an artist of meat-eating, the best in China. Eating, sex and power are closely related in Luo’s fantastic tales, as they are in other novels by Mo Yan, including “Red Sorghum,” made into a much-praised film by Zhang Yimou, and indeed in “Sandalwood Death,” to my mind an even better novel than “Pow!”
Indulging our appetites for food and sex is one way of asserting our individual freedom. Perfecting an art, even of meat-eating, is another. The two artists in “Sandalwood Death” are Sun Bing, an opera singer, and Zhao Jia, his executioner, whose son is married to Sun Bing’s daughter. Zhao is a master at his trade, a genius at administering the slow death by a thousand cuts, the greatest artist of the sandalwood death, able to keep his victim alive for five days while spliced on a sandalwood stake.
Sun Bing has been sentenced to this agonizing death because he dared to attack German soldiers involved in crushing the Boxer Rebellion in 1901. A heroic local patriot, Sun Bing hates these arrogant foreigners for strutting about his native region, building a railway line that will change its ways forever. Like many tales of peasant rebellion, Mo Yan’s reworking of the Boxers’ war with the foreign devils is deeply anti-modern. Loyalty to tradition is part of Mo Yan’s peasant spirit, yet he is not sentimental about the past.
Maoqiang opera is the symbol of Chinese tradition in the novel. But so is the art of inflicting cruel punishments “beyond the imagination of any European.” Chinese executions could be seen, in the words of one of the narrators of “Sandalwood Death,” as stage performances “acted out by the executioner and his victim.” At the end of the novel, the two types of theater come together when Sun Bing sings his last aria while spitted on the wooden stake. His fellow actors defy the German soldiers and their treacherous Chinese helpers by performing an opera on the execution ground to honor their dying master. The theater troupe is mowed down by foreign bullets. Sun Bing dies, stabbed in the chest by a compassionate Chinese official who can no longer stand to witness his suffering. In the last words of the novel: “The opera . . . has ended. . . . ”
In sum: Without art, myths, stories, imagination, life isn’t worth living. And that brings us to Mo Yan’s politics. He has been widely criticized for not being more politically outspoken. Salman Rushdie called him “a patsy of the regime.” According to Mo Yan’s fellow Nobel laureate Herta Müller, awarding him the literature prize was “a catastrophe.”
Mo Yan is certainly no dissident. He might even be accused of cowardice. He could have used his prestige to speak up more forcefully for Liu Xiaobo, the brave literary critic who won the Nobel Peace Prize in 2010 while imprisoned for advocating democracy in China. Defending censorship, as Mo Yan did in Stockholm, was also an odd, not to say craven, act for a writer who sets such store on the freedom to tell stories.
Indeed, he refuses to speak out almost as a matter of principle. He has said that his pen name, Mo Yan, meaning “Don’t Speak,” was chosen because his parents warned him not to say things that might cause trouble. “I’ve always taken pride in my lack of ideology,” he writes in the afterword to “Pow!,” “especially when I’m writing.”
Mo Yan does in fact have some strong views. The targets of his satirical barbs are clear: the gross materialism of contemporary China, the venality of government officials, the abuses of political power, the abject opportunism of Chinese collaborators with foreign invaders. But these are rather easy marks. Party leaders are forever denouncing corruption and materialism. It is also a tenet of Communist propaganda that only the party can protect China against foreign depredations.
Perhaps Mo Yan really is in tune with the current Communist regime. Perhaps he simply wants to play it safe. But the political perspective of his fiction is also a reflection of his peasant spirit. To a villager, all politics are strictly local, especially in China, with its vast distances. The capital is far away. National politics aren’t the peasant’s concern. What counts is food on the table, fertility, sex and staying out of trouble, if necessary by appeasing the powerful, be they local or foreign.
This narrow perspective has its advantages. By concentrating on human appetites, including the darkest ones, Mo Yan can dig deeper than political commentary. And like the strolling players of old, the jesters and the public-square storytellers he so admires, Mo Yan is able to give a surprisingly accurate impression of his country. Distorted, to be sure, but sharply truthful, too. In this sense, his work fits into a distinguished tradition of fantasists in authoritarian societies: alongside Mikhail Bulgakov or the Czech master, Bohumil Hrabal.
To demand that Mo Yan also be a political dissident is not only what the Dutch describe as “trying to pluck feathers from a frog.” It’s also unfair. A novelist should be judged on literary merit, not on his or her politics, a principle the Nobel committee hasn’t always lived up to. This time, I think it has. It would be nice if Mo Yan were more courageous, but he has given us some great stories. And that should be enough. 


Ian Buruma is Henry R. Luce professor of democracy, human rights and journalism at Bard College. His most recent book is “Taming the Gods: Religion and Democracy on Three Continents.”

Ah, esses ricos traidores, e suas casas maravilhosas (e vazias...)

Paris perd ses riches

M le magazine du Monde |
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Bien sûr, les façades des résidences en pierre de taille du 16e arrondissement parisien et les balcons des immeubles de Neuilly ne se sont pas hérissés d'une forêt de panonceaux "à vendre". Pourtant, les agences immobilières spécialisées dans le logis de prestige se font du mauvais sang. Voilà plusieurs mois que les biens à céder grossissent leurs catalogues.

Dans ce tout petit marché, on a désormais l'embarras du choix pour un hôtel particulier, une vue dégagée sur le bois de Boulogne ou une maison ultra-chic avec jardin en plein Paris. Les vendeurs ne sont pas toujours faciles à joindre. Ils sont partis, direction Londres, Bruxelles, la Suisse ou les Etats-Unis.
Charles-Marie Jottras, président de l'agence Daniel Féau, en quête d'un acquéreur pour la maison de la rue du Cherche-Midi du plus médiatique des exilés, Gérard Depardieu, est formel. "Le stock de produits de luxe a fortement augmenté ces derniers mois et, pour une proportion importante, à cause de gens qui partent à l'étranger", dit-il. Richard Tzipine, directeur général de Barnes, agence spécialisée dans l'immobilier "de prestige", évalue à un tiers la part des mises en vente imputables à un exil fiscal. "Des biens haut de gamme", décrit-il.
Tel cet appartement au parquet clair de 350 m2, dans le 16e arrondissement. Quatre chambres, bibliothèque et double séjour. Un bijou évalué à 5,2 millions d'euros. A Neuilly, un autre propose, pour le même prix mais pour 150 m2 de moins, une gigantesque terrasse de 100 m2. Dans les deux cas, les propriétaires ont fait leurs valises. L'un d'eux s'est déjà offert une maison à 10 millions d'euros en Suisse. La remise en cause de la taxation à 75 % des plus hauts revenus par le Conseil constitutionnel n'y a pas changé grand-chose ; le climat fiscal sous le gouvernement Ayrault inquiète les grosses fortunes, soupirent les agences. Et le marché du logement très chic patine.
Les transactions au-delà de 2 millions d'euros ont chuté en un an de 42 %, à Paris et en région parisienne. Dans cette catégorie, les prix dévissent avec une baisse de 10 à 15 %, selon une étude de l'agence Barnes.
FIN D'UNE CERTAINE OMERTA
Le marché du très haut de gamme parisien a beau ne représenter que quelques milliers de chaumières, sa déprime est un indicateur qui est pris très au sérieux. Elle apporte de l'eau au moulin de ceux qui, en attendant les chiffres 2012, prédisent que l'exil sous l'ère Hollande battra des sommets.
"Il y a aujourd'hui beaucoup plus de gens qui s'interrogent et davantage encore qui mettent en oeuvre leur délocalisation", affirme Stéphane Jacquin, directeur de l'ingénierie patrimoniale chez Lazard Frères ,Gestion. "Je ne serais pas surpris qu'en 2012, il y ait eu trois fois plus de départs de contribuables que les années précédentes, voire davantage", professe-t-il.
Cet apparent exode sonne aussi la fin d'une certaine omerta dans le milieu feutré de l'immobilier doré. "Est-ce qu'il y en a beaucoup plus qui sont partis en 2012 ? En tout cas, les gens en parlent davantage qu'avant", témoigne Richard Tzipine. Peut-être parce que les aspirants au départ ont changé. "Depuis vingt ans, les grandes fortunes rentières partent à cause de l'ISF, raconte Charles-Marie Jottras. Aujourd'hui, on voit s'en aller des dirigeants, des actifs beaucoup plus jeunes. Ils savent qu'ils vont gagner de l'argent mais ne veulent pas le faire en France."
Leur profil ressemble fort à ceux des "pigeons", ces entrepreneurs qui ont fait plier le gouvernement sur la taxation des plus-values lors de la vente d'une entreprise. Les agences vont devoir se retrousser les manches pour repeupler tous ces luxueux pigeonniers. D'autant qu'il ne faut guère compter sur l'arrivée dans la capitale de David Beckham pour sortir le marché de son marasme. Le footballeur, qui n'a signé que pour cinq mois au PSG, a prévu de laisser sa nombreuse famille à Londres.

A Mao Visivel e a Improvisacao Governamental - Alexandre Schwartsman

Improviso e tema



Se restava ainda alguma dúvida acerca do grau de improviso que tem marcado a condução da política econômica nos últimos anos, a confusão da semana passada deve tê-la dissipado em definitivo. O que talvez não seja tão claro é o motivo da gambiarra.
Não é segredo que a evolução da inflação tem sido pior do que o BC parecia imaginar há pouco. Apenas no primeiro trimestre, apesar do adiamento dos reajustes de transportes coletivos e da redução mais forte dos preços de energia, a inflação deve superar em cerca de meio ponto percentual as previsões do BC feitas em dezembro, um padrão que provavelmente se repetirá ao longo do ano.
Ainda que não tenha explicitado esta preocupação na sua ata mais recente, parece claro que o BC (finalmente) compreendeu as dificuldades, o que talvez explique a ausência de qualquer menção à convergência (linear ou “não linear”) da inflação à meta.  Ao mesmo tempo, porém, se aferra à estratégia de manter as condições monetárias inalteradas “por um período de tempo suficientemente prolongado”, afastando a possibilidade de voltar a subir taxas de juros possivelmente até o final de 2013, senão mais adiante.
A percepção de que o BC abdicou do instrumento monetário, enquanto exprime certo desconforto com a inflação, levou o mercado a se perguntar que ferramenta ainda poderia ser usada.
A resposta veio pouco depois, quando o BC antecipou a rolagem de suas vendas de dólares no mercado futuro, sinalizando a intenção de trazer a taxa de câmbio para baixo do piso informal de R$ 2,00 por dólar que vigorou na maior parte do ano passado. O real mais forte poderia baratear tanto as importações quanto os preços domésticos dos produtos exportados. Curiosamente, houve até menção a fontes da Fazenda sugerindo que isto auxiliaria o investimento, depois de anos alardeando o contrário.
Se tal estratégia existiu (ou existe), foi vítima imediata de “fogo amigo”, manifesto na entrevista do ministro da Fazenda, que afirmou com todas as letras: “não permitiremos uma valorização especulativa do real e isso veio para ficar”. Ato contínuo, reafirmou seu compromisso com o câmbio flutuante, obviamente desde que nos limites que considera apropriados, um oxímoro em construção.
Raras vezes se viu tamanha descoordenação entre partes do governo, mesmo num que não prima pela unidade de propósito. Mais do que acidente de percurso, porém, acredito que o episódio ilustra muito bem as inconsistências no arranjo atual de política econômica.
Não faltam objetivos: o governo quer crescimento alto, inflação baixa, câmbio desvalorizado e uma Selic reduzida. Não há maiores dificuldades quanto ao último objetivo, dado que se trata de variável controlada pelo BC, assim como, em certa medida, pode sê-lo o câmbio. Faltam, porém, instrumentos.
Assim, ao fixar a taxa de juros o governo abre mão do instrumento que deveria ser usado para controlar a inflação. Daí a tentação de usar o câmbio para este fim, colidindo com a meta do dólar caro. Na impossibilidade de usar, de forma torta, o fortalecimento do real para este fim, sobra a possibilidade de atuar diretamente sobre preços, no caso através de desoneração tributária e/ou subsídios, os quais contribuem para erodir o desempenho (já nada brilhante) das contas públicas, obrigando a tentativas cada vez mais complexas de tapar o sol com peneiras contábeis, quando não sacrificando a geração de caixa e a capacidade de inversão das empresas estatais.
O improviso é, pois, decorrência direta do abandono de uma estrutura que combinava objetivos e instrumentos em favor de uma condução discricionária que, em nome de metas conflitantes, nos tem levado a situações como a vivida na semana passada.
Já inflação alta e crescimento baixo não se improvisam; são resultados de uma política deliberada, fruto da mistura ingrata de voluntarismo e ignorância.

Quantidade e qualidade dos diplomatas - Oliver Stuenkel

De quantos diplomatas uma potência emergente precisa?

2012 November 6
by Oliver Stuenkel
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Itamaraty
Um fator importante, porém frequentemente negligenciado quando se analisa a política externa de um país, é o tamanho de seu corpo diplomático. Estratégias inteligentes planejadas no Ministério de Relações Exteriores do país de origem podem não ter o impacto esperado porque o número de oficiais em serviço no exterior é insuficiente para implementar a nova política. Negociações bilaterais complexas podem ser afetadas negativamente se os negociadores de uma das partes não tiverem o devido acesso à informação, como consequência da falta de corpo diplomático e de conhecimento sobre as pressões domésticas que o outro lado está enfrentando. Ademais, manter uma embaixada com quadros insuficientes pode mandar uma mensagem negativa ao país-sede, causando, em alguns casos, mais danos do que abdicar de abrir uma embaixada.
À medida que os países emergentes buscam projetar mais influência no cenário internacional, o número reduzido de diplomatas desses países impõe severas limitações à capacidade de operacionalizar novas políticas. Uma comparação diz tudo: há mais diplomatas americanos servindo em Nova Délhi que diplomatas indianos no mundo inteiro. Isso significa que os Estados Unidos têm mais capital humano para desenvolver sua relação bilateral com a Índia do que a Índia tem para planejar e implementar sua política externa no restante do mundo.
Em um recente artigo de opinião publicado no Times of India, Kanti Bajpai, um professor universitário especializado em política externa indiana, criticou a situação e fez piada, dizendo que, com 600 oficiais, a Índia teria tantos diplomatas “quanto os gigantes Bélgica e Holanda”. Se o Ministério de Relações Exteriores indiano continuar a crescer nesse ritmo, haverá 1.200 diplomatas indianos em 2040 – no entanto, nessa data, a China terá 10.000 diplomatas servindo no exterior. Atualmente, o número de diplomatas americanos já é muito superior a 10.000.
Essa escassez extrema deve afetar negativamente a política externa indiana em vários níveis – da diplomacia pública à dificuldade de estabelecer vínculos com os importantes stakeholders locais no país-sede. Uma das frases mais comuns que se ouve dos pesquisadores de política externa indiana que estão visitando Nova Délhi é que não foi possível “encontrar ninguém no Ministério de Relações Exteriores indiano”.
No entanto, é interessante que Bajpai não diz quantos diplomatas a Índia deveria almejar ter. Qual é o número adequado de diplomatas para uma potência emergente como a Índia, que, aos poucos, começa a atuar em regiões onde, tradicionalmente, tinha pouco interesse?

Apesar de o corpo diplomático chinês ser grande demais para servir de modelo, é interessante notar que os quadros diplomáticos brasileiros são o dobro dos indianos. A despeito disso, há representações diplomáticas brasileiras ao redor do mundo que são tão pequenas – principalmente na África – que é plausível questionar como elas funcionam adequadamente. Há menos de 10 diplomatas brasileiros em Nova Délhi, e menos de 20 em Pequim – provavelmente insuficiente, considerando que a China é o parceiro comercial mais importante do Brasil desde 2009. Entretanto, o problema no Brasil pode não ser o número total de diplomatas, mas sim, o modo como eles estão distribuídos ao redor do mundo – por exemplo, em Roma, há o dobro de diplomatas que em Pequim, o que mostra que o Itamaraty ainda não se adaptou plenamente à atual mudança de poder global, a ascensão da Ásia em detrimento da Europa.
Porém, Bajpai diz que a quantidade de diplomatas não é o único problema na Índia. A qualidade está decaindo também. Ele argumenta que o serviço diplomático deixou de ser uma opção interessante para aqueles que desejam mudar a Índia, e sugere que novos processos de seleção sejam implementados: “devemos também recrutar em outras instituições públicas, incluindo as forças armadas, o setor privado, os círculos universitários, os think tanks e a imprensa”.
Quanto a isso, o Brasil apresenta uma peculiaridade, apesar de o Ministério das Relações Exteriores, outrora isolado, ter perdido um pouco de seu glamour e misticismo, pois, cada vez mais, os diplomatas precisam trabalhar em parceria com outros ministérios. O status social de um diplomata está muito acima de outras profissões, e poucos se preocupam com a qualidade dos candidatos. Enquanto o setor privado frequentemente sonda promissores diplomatas brasileiros com experiência internacional e conhecimentos de línguas estrangeiras, o Ministério de Relações Exteriores do Brasil ainda se recusa a mudar e a adotar o conselho de Bajpai.
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Bloqueado na China
  • Oliver Stuenkel

    Oliver Stuenkel
    Oliver Stuenkel, Professor of International Relations at the Getulio Vargas Foundation
    in São Paulo, Brazil
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Connecticut debaixo de neve: 60 centimetros...

Bem, ainda não chegou no meu andar; está certo que moro no 26, e vai demorar um pouco para a neve chegar até aqui, mas prometo descer para contemplar a alegria das crianças e o sofrimento dos mais velhos.
Por enquanto tudo bem: comida, bebida, livros, internet, tudo em ordem para passar os próximos dias sem sair de casa.
Vamos esperar que os moradores de casas, atingidos eventualmente por cortes de eletricidade, não enfrentem esse tipo de problema durante muito tempo...
Paulo Roberto de Almeida

Nevasca faz Connecticut declarar estado de emergência

Previsões indicam que a tempestade de neve pode atingir região que vai de Nova York e ultrapassa Boston

08 de fevereiro de 2013 | 15h 52
AE - Agência Estado
HARTFORD - O governador de Connecticut, Dan Malloy, anunciou nesta sexta-feira, 8, a decretação de estado de emergência por causa da tempestade de neve que começou a cair na região Nordeste dos EUA nesta manhã.
Segundo o jornal Register Citizen, do condado de Litchfield, as principais rodovias de Connecticut já estavam cobertas de neve às 8h30 locais (5h30 em Brasília) e o tráfego seria suspenso a partir das 12h (15h em Brasília). As escolas do Estado foram fechadas e Malloy determinou que os servidores públicos não essenciais permaneçam em suas casas.As previsões indicam que haverá precipitação de 60 centímetros de neve ao longo do populoso corredor que vai de Nova York e ultrapassa Boston. As pessoas começaram a estocar comida e outros suprimentos. Funcionários das estradas ao longo da costa leste preparavam sal e areia para usar nas pistas, antecipando-se às previsões ruins dos meteorologistas.
Boston e Providence, capital de Rhode Island, também cancelaram as aulas nesta sexta-feira e companhias aéreas cancelaram mais de 2.600 voos, mas deve haver interrupções em todo o território norte-americano.
"Todo mundo vai ficar coberto de neve", disse o meteorologista Alan Dunham, do Serviço Nacional de Meteorologia, sediado em Massachusetts. A expectativa é de que a maior precipitação deve acontecer nesta noite e no sábado.
As rajadas de vento devem atingir até 105 quilômetros por hora e há temores de cortes no fornecimento de energia elétrica, além de enchentes em áreas costeiras, que ainda se recuperam do furacão Sandy, que atingiu a região em outubro.
Em Nova York, são esperados até 35,5 centímetros de neve. O prefeito Michael Bloomberg disse que arados e estoques de 250 mil toneladas de sal foram colocados à disposição. "Esperamos que a previsão para a quantidade de neve esteja exagerada, mas nunca sabemos", disse ele.
Alertas para nevascas estão em vigor para partes de New Jersey e Long Island, em Nova York, assim como em áreas da região da Nova Inglaterra, incluindo Massachusetts, Rhode Island e Connecticut. Os alertas devem se estender também para New Hampshire e Maine.
Com informações da Associated Press e da Dow Jones

Connecticut contra a escravidao, e contra o Lincoln de Spielberg...

Já que estou morando no Connecticut, agora, me solidarizo com o protesto dos cidadãos contra a falta de correção histórica do filme de Spielberg.

Mr. Spielberg, Connecticut Objects!

A scene from David James/Dreamworks and 20th Century Fox A scene from “Lincoln.”
8:43 p.m. | Updated Steven Spielberg has said he was hoping for a high degree of authenticity with “Lincoln,” and certainly his production team worked hard on their antiquing. But there is at least one place where the movie diverts from the historical record, as a Connecticut congressman, Joe Courtney, noted. In the film, two of Connecticut’s representatives are shown voting against the 13th Amendment – voting, in effect, for slavery to continue.
“How could congressmen from Connecticut — a state that supported President Lincoln and lost thousands of her sons fighting against slavery on the Union side of the Civil War — have been on the wrong side of history?” Mr. Courtney wrote in a letter to Mr. Spielberg and DreamWorks this week. After a check of the Congressional Record, Mr. Courtney discovered, that in fact all four House members from his state voted for the 13th Amendment. “Even in a delegation that included both Democrats and Republicans, Connecticut provided a unified front against slavery,” he writes.
Below the Line
Bringing Light to ‘Lincoln’
Lincoln
Janusz Kaminski, the director of photography on “Lincoln,” discusses his work on the film.
In the letter, available here, Mr. Courtney, a Democrat and senior member of the Armed Services Committee who represents the state’s 2nd district (covering Enfield, New London and Old Saybrook), asks Mr. Spielberg for a correction.
“I understand that artistic license will be taken and that some facts may be blurred to make a story more compelling on the big screen,” he writes, “but placing the state of Connecticut on the wrong side of the historic and divisive fight over slavery is a distortion of easily verifiable facts and an inaccuracy that should be acknowledged, and if possible, corrected before ‘Lincoln’ is released on DVD.”
(Not to mention before it graces the Oscar stage.)
Team “Lincoln” did not immediately reply to a request for comment, but the Bagger will update you if Mr. Spielberg or the screenwriter Tony Kushner weighs in to explain what they had against the Nutmeg State.
Update: Is something other than the purity of the historical record – or the sanctity of the Academy Awards – at play here? Over at Awards Daily, Sasha Stone notes that none other than Ben Affleck once campaigned for Mr. Courtney, urging students to vote for him at an appearance at the University of Connecticut in 2006. (Mr. Courtney won the election by 83 votes, according to Salon.) And, Ms. Stone suggests, Mr. Courtney’s plea, delivered in a public statement rather than a private message to the filmmakers, may be as crass as politicking.
“A classy person would have simply sent an email to Tony Kushner but no, it’s Oscar season,” she writes. “Time to puff up like an angry peacock and defend the honor of your state! Or maybe try to give back to someone who once helped you win an election. Someone should tell him Affleck needs no help winning at this point.”
It’s unclear what Mr. Courtney’s position on “Argo” is, but in an interview with the Hartford Courant, the congressman notes that overall, he did like Mr. Spielberg’s movie.
“The portrayal of Lincoln and Thaddeus Stevens is brilliant, and to the extent that people maybe are thinking about how members voted, that’s a healthy thing for our culture to be focused on — our history — as opposed to the other content in movies,” he said.
He makes no mention of Mr. Affleck (who has also campaigned for or donated to Democratic candidates like Elizabeth Warren, Al Gore and John Kerry). In a statement late on Thursday, Mr. Kushner defended his adapted screenplay.
“We changed two of the delegation’s votes, and we made up new names for the men casting those votes, so as not to ascribe any actions to actual persons who didn’t perform them,” he writes. “In the movie, the voting is also organized by state, which is not the practice in the House. These alterations were made to clarify to the audience the historical reality that the 13th Amendment passed by a very narrow margin that wasn’t determined until the end of the vote. The closeness of that vote and the means by which it came about was the story we wanted to tell. In making changes to the voting sequence, we adhered to time-honored and completely legitimate standards for the creation of historical drama, which is what Lincoln is.”
Read his full statement after the jump.

Here is Mr. Kushner’s entire statement:
Rep. Courtney is correct that the four members of the Connecticut delegation voted for the amendment. We changed two of the delegation’s votes, and we made up new names for the men casting those votes, so as not to ascribe any actions to actual persons who didn’t perform them. In the movie, the voting is also organized by state, which is not the practice in the House. These alterations were made to clarify to the audience the historical reality that the 13th Amendment passed by a very narrow margin that wasn’t determined until the end of the vote. The closeness of that vote and the means by which it came about was the story we wanted to tell. In making changes to the voting sequence, we adhered to time-honored and completely legitimate standards for the creation of historical drama, which is what Lincoln is. I hope nobody is shocked to learn that I also made up dialogue and imagined encounters and invented characters.
I’m proud that Lincoln’s fidelity to and illumination of history has been commended by many Lincoln scholars. But I respectfully disagree with the congressman’s contention that accuracy in every detail is “paramount” in a work of historical drama. Accuracy is paramount in every detail of a work of history. Here’s my rule: Ask yourself, “Did this thing happen?” If the answer is yes, then it’s historical. Then ask, “Did this thing happen precisely this way?” If the answer is yes, then it’s history; if the answer is no, not precisely this way, then it’s historical drama. The 13th Amendment passed by a two-vote margin in the House in January 1865 because President Lincoln decided to push it through, using persuasion and patronage to switch the votes of lame-duck Democrats, all the while fending off a serious offer to negotiate peace from the South. None of the key moments of that story — the overarching story our film tells — are altered. Beyond that, if the distinction between history and historical fiction doesn’t matter, I don’t understand why anyone bothers with historical fiction at all.
I’m sad to learn that Representative Courtney feels Connecticut has been defamed. It hasn’t been. The people of Connecticut made the same terrible sacrifices as every other state in the Union, but the state’s political landscape was a complicated affair. The congressman is incorrect in saying that the state was “solidly” pro-Lincoln. Lincoln received 51.4 percent of the Connecticut vote in the 1864 election, the same kind of narrow support he received in New York and New Jersey. As Connecticut Civil War historian Matthew Warshauer has pointed out, “The broader context of Connecticut’s history doesn’t reflect what Courtney had said in his letter. The point is we weren’t unified against slavery.” We didn’t dig into this tangled regional history in Lincoln because a feature-length dramatic film obviously cannot accommodate the story of every state, and more to the point, because that’s not what the movie was about.
I’m sorry if anyone in Connecticut felt insulted by these 15 seconds of the movie, although issuing a Congressional press release startlingly headlined “Before The Oscars …” seems a rather flamboyant way to make that known. I’m deeply heartened that the vast majority of moviegoers seem to have understood that this is a dramatic film and not an attack on their home state.

Onorevole banditi: a inversao da moral no pais dos novos bandidos...

Pois é, cada país tem a máfia que merece. A deles, a dos sicilianos, a legítima, vivia de crimes, assassinatos, tráficos, contrabandos, extorsões, mas tudo à margem da lei, não apenas da Itália, mas também em outros países, notadamente nos EUA, onde ela virou objeto dos melhores filmes de Hollywood, o que glamorizou um pouco o crime ordinário. Mas, seja na Sicília, seja na Itália, seja nos EUA, a máfia nunca chegou ao poder, embora tenha tentado: intimidou figuras políticas, comprou policiais e juízes, chegou a ter senadores, cantores, e talvez até um governandor. Mas nunca chegou à preeminência que alcançou em certos lugares.
Como neste nosso país, por exemplo, onde a máfia alcançou completo sucesso, não apenas em termos de poder econômico e político, mas sucesso de mídia, de publicidade, até de respeitabilidade, quem diria? Se trata da mais formidável inversão moral a que já pudemos assistir. Mafiosos completos, embora de uma espécie diferente dos sicilianos, conseguem se distinguir na sociedade.
Bem, quem tem um Maluf como aliado deve ser mesmo o padrinho dos padrinhos, o poderoso chefão, o próprio Godfather em pessoa.
Paulo Roberto de Almeida

Reinaldo Azevedo, 07/02/2013
às 4:59

Existe um lugar no Brasil em que roubar dinheiro público, corromper e corromper-se transformam as pessoas em heroínas. E não é no PCC!

Existe um lugar no Brasil em que roubar dinheiro do Banco do Brasil, comprar a consciência alheia, vender a própria consciência, usar dinheiro público em benefício pessoal e formar uma quadrilha para cometer crimes transformam as pessoas em guias morais, em celebridades, em referências positivas. E não é numa das “comunidades” a que as UPPs ainda não chegaram. Nada disso! O lugar em que o crime compensa e em que criminosos já condenados pela Justiça são disputados para uma fotografia é o PT. Não fosse a sujeição, nesse caso, voluntária e não fossem os fãs e seus ídolos formados pela mesma têmpera moral, eu juro que iria sugerir a Dilma que mandasse uma UPP para o partido. O objetivo seria libertar aquela pobre gente de seus algozes espirituais. Mas não há inocentes por ali. Todo mundo sabe o que todo mundo sabe. E, mesmo assim, o clima é de festa, de euforia, de algazarra.
A Folha informa que lideranças do partido fizeram em São Paulo, nesta quarta, uma festa em homenagem aos 78 anos de Ricardo Zarattini. Os convidados de honra eram José Dirceu, Delúbio Soares e os deputados José Genoino e João Paulo Cunha. Quando estão juntos, os patriotas somam exatos 36 anos de cadeia.
Mesmo assim, conta a reportagem, os quatro eram muito assediados para tirar fotografias. Imagino. Uns queriam sair ao lado do condenado a 10 anos e 10 meses por corrupção ativa e formação de quadrilha — Dirceu. Outros, quem sabe não se sentindo à altura do chefe do grupo, escolhiam a corrupção passiva, o peculato e a lavagem de dinheiro e reservavam seu melhor sorriso para posar ao lado dos 9 anos e 4 meses de João Paulo. Delúbio rivalizava nos crimes com Dirceu, mas sua pena foi menor: 8 anos 11 meses. É o bastante para deixar honrado quem posa a seu lado. Genoino, com os mesmos crimes desses dois, levou apenas 6 anos e 11 meses. Sabia de tudo, participou de tudo, mas parece que o STF não o considerou  esperto o bastante para estar no comando — embora fosse presidente da legenda.
No morro, os bandidos provam o seu poder, impõem a ordem e mobilizam um séquito de admiradores exibindo suas pistolas e seus fuzis. Os  mensaleiros, em pleno regime democrático e de direito, exibem suas penas quase como galardões conquistados por seu amor à causa. Não é de espantar que os valentes agora comecem a mobilizar a delinquência política latino-americana para vir em seu socorro, a exemplo do embaixador da Venezuela no Brasil, o tal Maximilien Sánchez.
Na festa, João Paulo aproveitou para desfilar seu humor inteligente e sua picardia, dando uma pista de qual será seu destino quando for oficializada a cassação de seu mandato e a suspensão dos direitos políticos: “Dirceu, Genoino e Delúbio foram condenados sem provas. Eu fui condenado contra as provas. Isso não é mensalão, é ‘mentirão’”. O piadista, nesse momento, acusava o Supremo Tribunal Federal de promover uma mentira. Até Marcola é mais respeitoso com a Justiça, não é mesmo?
Por Reinaldo Azevedo

O Ano do Barao (ops, ja' passou), as obras estao completas outra vez...

Ufa! Demorou mas ocorreu:

Boletim Diário do MRE – 7/2/2013
Agenda do Senhor Ministro de Estado das Relações Exteriores
Ato de lançamento das “Obras do Barão do Rio Branco”- Instituto Rio Branco

As obras do Barão foram republicadas, a partir da edição de 1945, mas com novas introduções e o acréscimo de um volume adicional, com os artigos que o Barão escreveu para diversos órgãos de imprensa.
O Prefácio do ministro das Relações Exteriores vem datado de Fevereiro de 2012, cem anos depois da morte do Barão; a divulgação, finalmente, das obras, ocorre um ano depois dessa data.
Nunca é tarde para desfrutar dessas obras, sobretudo porque cada um dos volumes, mesmo o não numerado, inicial, com a Introdução às obras, comporta uma nova introdução por especialista reconhecido.
Pretendo fazer resenhas dessas novas introduções, para falar sobre cada um dos volumes...
As obras estão, em princípio, disponíveis no site da Funag. Digo em princípio porque busquei e não achei, mas o site da Funag é muito ruinzinho, se me permitem a crítica.
Paulo Roberto de Almeida

Como e' que os companheiros reagiriam se...

...se por acaso eles fossem impedidos de sair do Brasil, para gozar de uma bolsa do Ciência sem Fronteiras, por exemplo, ou para fazer compras em Miami, como muitos vão agora, ou até para visitar sua Cuba querida?
Então, por que é que eles continuam a defender uma ditadura ordinária como é a cubana?
Realmente, não entendo os companheiros, tão amantes da liberdade e da democracia, e tão amigos de uma ditadura opressiva...
Paulo Roberto de Almeida

'Não fui nomeada, mas me sinto uma diplomata do povo'

Blogueira cubana e colunista do 'Estado', Yoani Sánchez diz ter tentado autorizações para deixar seu país desde 2008

07 de fevereiro de 2013
Guilherme Russo, O Estado de S. Paulo
 
A blogueira cubana e colunista do Estado Yoani Sánchez afirma ter tentado autorizações para deixar seu país desde 2008. Por 20 vezes, teve a permissão negada. Ela acredita que, com a flexibilização na lei migratória de Cuba conseguirá vir ao Brasil, onde planeja chegar no dia 18, para participar do lançamento da nova edição de seu livro De Cuba, com Carinho (Editora Contexto), em São Paulo, e da exibição do documentário Conexão Cuba Honduras, do cineasta Dado Galvão, na Bahia. A seguir, a íntegra entrevista concedida ao Estado.
Yoani Sánchez consegue visto para vir ao Brasil - Alejandro Ernesto/Efe
Alejandro Ernesto/Efe
Yoani Sánchez consegue visto para vir ao Brasil
Como a sra. recebeu o anúncio da alteração da Lei de Migração cubana?
A primeira sensação, em outubro, quando se anunciou a reforma migratória, foi uma mistura de esperança e ceticismo. Esperança porque, durante muitos anos, nós, cubanos, havíamos esperado flexibilizações para poder entrar e sair de nosso próprio país. O absurdo migratório cubano havia condenado muitas famílias à separação: muitos pais que não tinham voltado mais para ver os seus filhos, muitos avós que nunca conheceram os seus netos. Ou seja, havia um drama familiar humano acumulado por décadas. Então, havia muita esperança de que esse drama terminasse, que chegasse ao fim algum dia. Ceticismo porque, em geral, sempre temos muita desconfiança e muito receio de tudo o que vem do governo. A maioria dos cubanos sempre está se perguntando: "Onde está a armadilha?" Essas foram as primeiras sensações quando do anúncio da lei.
Quais as suas impressões ao ter acesso à íntegra do texto?
Quando comecei a ler o decreto, vi muitos pontos positivos. Por exemplo, que diminuíram os trâmites necessários para viajar, reduziram os custos, passaram a permitir que saíssemos por até 24 meses sem perder o direito a regressar, permitiram a saída a menores...
Mas?
Mas, ao mesmo tempo, também li alguns pontos, que podem ser chamados de "letras pequenas" da reforma migratória, que são algumas restrições que se mantêm sobre, por exemplo, os profissionais de certo nível e os esportistas de alto rendimento. E também há casos que podem ser interpretados como uma certa pena ideológica, ou seja, um cerco político contra opositores, dissidentes ou jornalistas independentes.
Dois artigos da lei determinam isso, não?
Exato: o artigo 23 e o artigo 25, nos incisos H, dizem que uma pessoa pode não obter o passaporte ou não poder sair pelas fronteiras nacionais se as autoridades pensam que não é de interesse público sua viagem. Isso, claro, tem uma interpretação muito ampla e pode ser usado como penalização política, contra críticos, opositores e jornalistas independentes.
Desde o anúncio da reforma, o que mudou?
Durante os três meses entre o anúncio da lei e sua aplicação, houve muitos rumores sobre como seria interpretada essa série de restrições, essas "letras pequenas".
Seu passaporte não tinha folhas suficientes para novos vistos e, por este motivo, a senhora teve que obter um documento novo para poder viajar. Como foi esse processo?
Vinte e quatro horas antes do dia 14 de janeiro (quando passou a vigorar a nova legislação migratória), meu marido (o dissidente Reinaldo Escobar) e eu começamos a fazer fila diante do escritório de migração (de El Vedado, no centro de Havana). Esperamos toda a madrugada e fomos as primeiras pessoas que solicitaram, sob a nova lei, o passaporte no escritório de nossa região.
Como foi?
Foi um momento muito duro para os funcionários desse escritório, porque eles eram os mesmos funcionários que semanas e meses antes haviam estado negando-me a possibilidade de viajar e dizendo-me que eu não estava autorizada a sair do país. Então, quando abriram as portas do escritório pela primeira vez com a nova lei em vigor, encontraram justamente Yoani Sánchez e seu marido, Reinaldo Escobar. Deve ter sido uma sensação muito difícil, não?
Os documentos ficaram prontos no prazo?
Solicitei o passaporte e disseram que eu deveria esperar duas semanas. Duas semanas depois, fui lá - e começaram as evasivas. Evasivas como: "há uma atraso", "os passaportes não chegaram", "ainda não estão prontos", "venham em alguns dias", "venham na próxima semana". Mas denunciei o atraso por meio da rede social Twitter e, para a minha surpresa, uma tarde me chamaram em minha casa para dizer que meu passaporte estava pronto. Isso é muito raro, porque, normalmente, o Ministério do Interior cubano nunca chama um cidadão para dar-lhe boas notícias. Assim que foi uma surpresa para mim me chamarem para dizer "seu passaporte está pronto".
E agora?
Agora já tenho o passaporte na mão, já tenho o visto do Brasil, já tenho o visto da Europa e estou esperando o visto dos EUA e de alguns outros países da América Latina.
Como a sra. se sentia cada vez que o governo lhe negava autorizações de saída para o exterior?
Era muito frustrante. Não somente pela impossibilidade de viajar. Por um lado, porque cada negativa significava que eu perdia uma experiência pessoal e profissional importante para a minha vida. Por exemplo, não me deixavam viajar para uma feira de livro para ir apresentar meu livro Cuba Livre ou De Cuba, com Carinho; ou não me deixavam ir a alguma cerimônia de algum prêmio que eu tivesse ganhado. Eram partes da minha vida, de minhas histórias pessoais e profissionais que o governo me arrancava, me escamoteava. Era uma sensação de muita frustração.
Mas e a esperança?
Havia. Eu tinha a convicção interior de que algum dia ia conseguir viajar. Isso me dava paciência para continuar tentando. E ainda, mais, eu sentia que tinha razão. Ou seja, era uma situação em que eu sabia que estava demandando algo que tinha que ser um direito, um direito pelo simples fato de ter nascido nesse país. Então, as funcionárias que me davam as negativas sempre faziam um papel de difícil, o papel repressor, o papel da pessoa que tem de limitar o movimento de um cidadão. Acho que isso me abriu as portas para insistir: a consciência de que tanto absurdo tinha que terminar.
A sra. já viveu no exterior. Desde quando vinha pedindo autorizações para sair novamente?
Em 2004, voltei da Suíça, estive vivendo dois anos no exterior. Criei meu blog (Generación Y) em 2007. Comecei a pedir permissão para viajar em maio de 2008, quando ganhei o Prêmio Ortega e Gasset de Jornalismo (concedido pelo jornal espanhol El País, que atualmente mantém Yoani como correspondente e articulista em Havana). Basicamente, foram cinco anos de batalha legal para poder sair do país. Uma batalha legal que me levou até a fazer uma queixa à promotoria geral. Ou seja, esgotei todos os caminhos legais dentro de meu país. Não fiquei com os braços cruzados. Não somente continuei com meus pedidos mas, ainda mais, fiz tudo o que legalmente estava ao meu alcance.
Qual é o principal motivo para que os dissidentes deixem Cuba?
Essa é uma magnífica oportunidade para a dissidência cubana. E espero, tenho a esperança, de que vamos aproveitá-la. Temos de nos dar conta que há uma nova etapa, uma nova época que começa. Uma fase em que poderemos aceder aos microfones do mundo para explicar nossos projetos. Explicar também todos esses programas, ideias e propostas para o futuro que temos para o nosso país.
Como Havana utilizou a restrição anterior para que seus cidadãos não pudessem deixar o país?
O governo cubano aproveitou que nós não podíamos sair da ilha para aumentar as campanhas de desprestígio, difamação e mentiras ao redor de muitas figuras da oposição, do jornalismo independente. Como eu, não? Então, acho que agora temos a grande possibilidade de falar com nossa própria voz, narrando nós mesmos, e eliminar muitas dessas campanhas de difamação com nossas verdades, com nossa própria projeção. Isso é muito importante porque o mundo tem de saber que Cuba é plural e diversa, que tem muita gente que ama seu país, mas não está de acordo com o governo. Essa é a grande responsabilidade que eu sinto que tenho nos ombros agora no Brasil. Sinto que tenho o dever de falar por muitos outros (opositores cubanos) que não vão poder sair por uma razão ou por outra: uma negativa no passaporte ou porque não tenham os recursos ou porque agora mesmo não possam viajar por questões familiares e pessoais. Sinto a responsabilidade de ter também que falar em nome deles.
Como lhe surgiu a ideia de vir ao Brasil?
A ideia do Brasil é um sonho muito desejado. Começou com a publicação de meu livro De Cuba, com Carinho, por meio de Jaime Pinsky, da Editora Contexto. Naquele momento, me surpreendeu muito que, em um país tão próximo culturalmente mas tão distante em outras circunstâncias, houvesse gente que lesse meus textos e estivesse entusiasmada com meu blog. Também houve uma entrevista que depois de converteu em um livro. Isso foi me revelando um mundo que me apaixonou. Um mundo de muitas pessoas nesse país que estavam interessadas no tema Cuba. Tanta gente interessada nessa pequena ilha. Desde esse momento, soube que tinha que ir ao Brasil. Depois, apareceu o documentário de Dado Galvão (Conexão Cuba Honduras) e toda a tentativa que ele e o senador (Eduardo) Suplicy, muitos amigos e gente que me lê por meio da rede social Twitter, me pedindo que lhes visitasse... E eu senti que, se tinha que chegar primeiro a algum país, se em algum primeiro lugar teria que dar esses abraços vindos de Cuba, teria que ser irremediavelmente o Brasil.
O que a senhora pretende fazer enquanto esteja no País?
Pretendo aprender. Mais do que narrar ou falar, quero beber de vocês, quero aprender de vocês. Em primeiro lugar, como se constrói uma democracia, como se sai de um autoritarismo e se começa a dar os primeiros passos à aceitação, à pluralidade, à diversidade. Quero aprender também como fazer um jornalismo mais livre, um jornalismo sem autocensura e sem censura, sobre a responsabilidade da informação. Quero caminhar muito pelas ruas das cidades e dos vilarejos do Brasil, perguntar às pessoas quais são os seus problemas, quais são as grandes vantagens que veem em viver aí. Quero fazer contatos profissionais também, porque não quero que essa seja minha última viagem ao Brasil de jeito nenhum. Tenho a esperança de estabelecer relações de amizade, relações de trabalho, relações de simpatia de povo a povo que serão muito duradouras. Vou também em um caráter de "diplomata do povo". Nenhuma chancelaria me nomeou, nenhum palácio de governo me reconhece como representante de nada, mas sinto que devo ajudar a estreitar os vínculos entre uma nação e outra. Sou uma representante da diplomacia popular. Uma diplomacia que não ocorre em nível de governo nem de chancelaria, nem que faz cartas de intenção ou memorandos, mas uma diplomacia que se faz de você a você.
Que tipo de apoio a senhora espera obter no Brasil?
O apoio principal é que tenham a capacidade de me escutar. Esse é o ponto. Se tiverem a capacidade de me escutar, sobre todas as histórias dessa Cuba diversa, plural, em mudança, uma Cuba com anseios de liberdade, uma Cuba com anseios democráticos. Se os brasileiros forem capazes de me escutar - e creio que sim, há muitos ouvidos atentos - então, já valeu a pena sair. Esse é o principal apoio, a principal ajuda que quero. E também, todas as recomendações e todas as críticas são bem-vindas, porque isso nos ajuda, me ajuda, a fazer um trabalho melhor e ser uma pessoa melhor. Mas também quero criar pontes para outras possíveis viagens de outros ativistas, outros blogueiros, outros jornalistas independentes (cubanos), a quem o Brasil poderia criar uma maneira de descobrir, descobrindo a própria Cuba. Quero criar vínculos também do ponto de vista acadêmico, conhecer muitos estudantes e interagir com pessoas que estejam fazendo jornalismo. Isso é basicamente o que quero.