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quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Entrevista sobre a carreira diplomatica e atividades acadêmicas - Paulo Roberto de Almeida (Diplolife)

 Quando concedi essa entrevista, sete anos atrás, não tinha pensado que ela se converteria numa exposição tão completa sobre meu itinerário de carreira e atividades acadêmicas. Acho que ainda pode interessar alguns candidatos...

sexta-feira, 27 de maio de 2016

Entrevista sobre a carreira diplomatica e atividades acadêmicas - Paulo Roberto de Almeida (Diplolife)

Uma entrevista recente, na qual falo da minha carreira diplomática, de minhas outras atividades acadêmicas, da preparação para o ingresso no serviço exterior brasileiro, e de algumas outras curiosidades.
Talvez possa interessar candidatos, colegas e os muito curiosos, também chamados de voyeurs (no bom sentido, claro)...
Paulo Roberto de Almeida  

Entrevista com Paulo Roberto de Almeida

Diplowife, Diplolife, 27 de maio de 2016

http://diplowife-diplolife.blogspot.com.br/2016/05/entrevista-com-paulo-roberto-de-almeida.html 

Paulo Roberto de Almeida, na infância (escola primária em SP)
Nosso entrevistado é o Ministro Paulo Roberto de Almeida. Diplomata de carreira desde 1977, exerceu diversos cargos na Secretaria de Estado das Relações Exteriores e em embaixadas e delegações do Brasil no exterior. Foi ministro-conselheiro na Embaixada do Brasil em Washington (1999-2003), trabalhou como Assessor Especial no Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (2003-2007), foi Comissário Geral Adjunto do Pavilhão do Brasil na Shanghai Expo 2010. Serviu como Cônsul Geral Adjunto do Brasil em Hartford, CT, EUA (2013-2015).
Pós-Doutorado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2008-2009), doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas (1984), mestre em Planejamento Econômico e Economia Internacional pelo Colégio dos Países em Desenvolvimento da Universidade de Estado de Antuérpia (1976), formou-se em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas (1974). 
É professor no Programa de Mestrado e Doutorado em Direito do Centro Universitário de Brasília (Uniceub); foi professor orientador no Mestrado em Diplomacia do Instituto Rio Branco do Itamaraty. Tem sido regularmente convidado para ensinar em universidades brasileiras e estrangeiras. Possui experiência nas áreas de relações internacionais e em sociologia, com ênfase em desenvolvimento comparado, atuando principalmente nos seguintes temas: relações econômicas internacionais, política externa brasileira, história diplomática, desenvolvimento econômico brasileiro, globalização e segurança internacional. Foi professor convidado no Institut de Hautes Etudes de l'Amérique Latine (Sorbonne), Paris, de janeiro a junho de 2012.  Publicou mais de uma dezena de livros individuais, organizou diversas outras obras, participou de dezenas de livros coletivos e assinou centenas de artigos em revistas especializadas
Sua vocação acadêmica é voltada para os temas de relações internacionais, de história diplomática do Brasil e para questões do desenvolvimento econômico. Suas preocupações cidadãs voltam-se para os objetivos do desenvolvimento nacional, do progresso social e da inserção internacional do Brasil. Suas publicações acadêmicas estão disponíveis em: pralmeida.org
É também autor do blog  http://diplomatizzando.blogspot.com.br.

Antes de se tornar diplomata, qual era a sua formação? Onde estudou?

Meu ingresso na carreira diplomática deu-se em condições muito especiais, pois até poucos meses antes de considerar seriamente a hipótese não tinha sequer aventado essa possibilidade, que surgiu por acaso, como agora passo a relatar.

Tendo me politizado numa idade relativamente precoce, simultaneamente, se ouso dizer, ao golpe militar de 1964, quando eu tinha quatorze anos, portanto, desde cedo encaminhei-me para uma postura de acadêmico engajado nos movimentos políticos que passaram a marcar fortemente o Brasil a partir do regime militar. Desde essa data, até o final da década, fui aumentando minha participação nos movimentos estudantis e mesmo grupos de oposição política ao governo militar, ao mesmo tempo em que avançava em meus estudos secundários e me preparava para ingressar na universidade, desde muito cedo orientado para estudos sociais, mais especificamente sociologia política.

Tendo me preparado precocemente para os estudos que pretendia fazer, ou seja, Ciências Sociais na famosa Fefelech, a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, não me foi difícil ultimar algumas leituras, aperfeiçoar o Francês, e inscrever-me para o vestibular que seria feito no final de 1968. Esse foi um ano que não acabou, segundo o título famoso de um livro sobre esse ano conturbado da vida política brasileira: grandes manifestações de massa, de estudantes, intelectuais e outros grupos de oposição ao governo militar do marechal Costa e Silva, ao mesmo tempo em que a guerrilha urbana dava início a uma série de atentados e ataques a quarteis e assaltos a bancos, numa intensificação das ações preconizadas pelos principais movimentos organizados de luta armada. A consequência disso foi a edição do também famoso AI-5, o Ato Institucional número 5, que decretou fechamento do Congresso, novas cassações e uma forte repressão contra todos os setores oposicionistas (inclusive com censura à imprensa e outras medidas desse teor). Pouco antes se deu a famosa “batalha da Maria Antônia”, rua que separava a “velha” Fefelech de uma universidade privada, a Mackenzie, onde era ativo o CCC, o Comando de Caça aos Comunistas, movimento de extrema-direita bastante violento. A “Maria Antônia” foi devastada, inclusive com a morte de um estudante (secundarista) e a faculdade se mudou para o novo campus universitário, na zona sul de São Paulo, onde o curso de Ciências Sociais se abrigou nos famosos barracões, construções pré-fabricadas, de onde nunca mais saiu, diga-se de passagem.

Fui, então, da primeira turma de Ciências Sociais nos barracões da USP, mas bastante esperançoso em relação ao curso, onde pontificavam os mestres da famosa Escola Paulista de Sociologia, entre eles Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso, Octavio Ianni, e outros, cujas obras eu já andava lendo algum tempo antes de ingressar na faculdade. Poucos meses depois, porém, em maio de 1969, esses que seriam meus professores, entre muitos outros, foram cassados pelo AI-5, e meu interesse pelo curso diminuiu bastante. Vinculei-me a alguns movimentos de esquerda para participar da resistência contra o governo militar, mas depois de aproximadamente um ano senti que aqueles exercícios de resistência armada não levariam a lugar nenhum, inclusive porque os movimentos armados estavam completamente isolados, deslocados em relação ao processo de forte crescimento econômico que então começava a marcar a conjuntura brasileira dos anos do “milagre econômico”.

Decidi, então, abandonar o curso, abandonar o Brasil e empreendi um autoexílio que pensava que fosse durar pouco tempo, na Europa. Comprei um passagem de terceira classe num vapor espanhol, o Cabo San Roque, e parti, no final de 1970, para uma Europa completamente desconhecida para mim (já tinha viajado muito pelo Brasil e pelo cone sul latino-americano), sem um completo domínio de línguas estrangeiras. Tive sorte, pois a Europa se encontrava num momento de crescimento econômico, dois anos antes do primeiro choque do petróleo, e, depois de três meses num país da esfera soviética, a Tchecoslováquia socialista, mudei-me para a Bélgica, onde encontrei condições para trabalhar e estudar. Lá fiquei quase sete anos, refazendo inteiramente a graduação em Ciências Sociais, a partir do segundo semestre de 1971, completando um mestrado em 1976, e inscrevendo-me no final desse ano para um doutoramento, sobre um tema que ainda figurava entre as minhas predileções intelectuais: o processo de modernização capitalista e os regimes tendencialmente autoritários ou democráticos, segundo a ocorrência, ou não, de uma revolução burguesa, um tema típico da sociologia política e objeto do magnum opus de um dos meus mestres, Florestan Fernandes, o livro A Revolução Burguesa no Brasil. Dei início ao doutorado, mas meus planos mudaram repentinamente no final de 1976 e o início de 1977.

Conte-nos um pouco sobre como e quando o senhor decidiu seguir a carreira no Serviço Exterior Brasileiro.

Nessa conjuntura, portanto, decidi retornar ao Brasil, aproveitando um momento de abertura do regime militar, a famosa “distensão política” do governo Geisel. Voltei, assim, em março de 1977, justo a tempo de conhecer uma nova fase de fechamento, o famoso “pacote de abril”, com novas cassações e perseguições a opositores. Em todo caso, comecei a dar aulas em faculdades privadas de São Paulo, e a preparar-me para algum concurso de ingresso no corpo docente de alguma universidade pública, sem outros planos que não uma carreira acadêmica. Foi assim que tomei conhecimento, em meados do ano, da abertura de um concurso direto para o Itamaraty, em complemento e paralelamente aos exames vestibulares de admissão ao Instituto Rio Branco, levados regularmente em bases anuais. Como teste, eu também fiz as provas do Rio Branco, mas não pretendia, já tendo mestrado, doutorando e sendo professor, voltar a ser aluno novamente. Mas constituiu, digamos, um bom aprendizado quanto ao formato dos exames, que eu considerei relativamente fáceis, e sem quase preparação adequada, inclusive porque fiz inscrição praticamente na última hora e quase não estudei.

Mas eu visava mesmo o concurso direto, pois ele me permitiria ingressar diretamente na carreira, sem ter de “perder” dois anos nos bancos escolares do Rio Branco. Resultado da grande expansão do Serviço Exterior brasileiro da era Geisel, como consequência do esforço exportador e de ampliação das representações diplomáticas no exterior e de seus serviços de promoção comercial, o concurso direto foi uma modalidade excepcional de seleção e admissão de diplomatas que vigorou unicamente durante cinco breves anos, de 1975 a 1979, sem que tivesse sido renovado em épocas ulteriores. À diferença das cinco ou seis provas escritas do vestibular do Rio Branco, que à época requeriam unicamente dois anos de qualquer curso superior (sendo complementadas por mais dois anos como estudante do Rio Branco), o concurso direto exigia graduação completa e notas acima da barra eliminatória em onze provas escritas e orais, acrescida de entrevista e testes psicológicos.

Como para o vestibular do Rio Branco, passei com facilidade – a despeito de minhas deficiências em direito e em inglês – no concurso direto (segundo lugar nas duas seleções), quase sem estudar (inclusive porque não tinha muito tempo. Mas, como eu tinha anos e anos de leituras acumuladas, eu sabia praticamente tudo do que se exigia como conhecimento em história, geografia, economia, política, relações internacionais e um excelente domínio do francês e do espanhol.

Na verdade, a grande motivação para eu deixar a carreira acadêmica em São Paulo e ingressar na diplomacia do Estado “burguês” que eu ainda queria “destruir”, prendia-se justamente ao fato de querer saber se a ditadura tinha algo contra mim, depois de anos passados na Europa escrevendo e atuando contra o regime, ainda que sob “noms de plume”, ou seja, sob outra identidade. Naquela época, o SNI tinha de fazer a verificação de todo e qualquer indivíduo pleiteando um cargo público. Aparentemente, eu estava “limpo”, o que me deixou tranquilo por mais alguns anos. Outro motivo para decidir-me mudar para Brasília era o de terminar um relacionamento em São Paulo, e voltar a ficar livre novamente de quaisquer compromissos. Foi assim que eu decidi me tornar diplomata, sem que eu tivesse muita ideia, praticamente nenhuma, sobre como era a carreira e o que eu iria fazer nela.

Fale sobre sua preparação para o concurso. Quais foram os maiores desafios e como os superou?

Minha preparação foi extremamente precária, pois como disse, poucos meses antes do concurso eu sequer tinha ideia de que estaria prestando exames de seleção dentro de poucas semanas. Dei uma olhada na bibliografia de referência, obtida junto à representação do Instituto Rio Branco (ou do MRE) junto à Reitoria da USP, consegui alguns livros em bibliotecas, outros não, e fiquei, na verdade, lendo livros paralelos à lista de recomendações. Lembro de ter lido livros como Paulo Mercadante, Consciência Conservadora no Brasil, Thomas Skidmore, Preto no Branco, e outros de interesse geral. Considerava estar preparado em francês, história, geografia e economia, em vista dos longos anos de leituras, justamente, e me preocupei mais intensamente com inglês e direito, que eu nunca tinha estudado realmente. Creio ter passado “raspando” nessas duas matérias, mas fiz notas altas, em alguns casos máximas, nas demais, tanto que meus exames de francês, e talvez de história, e também de economia, ficaram nos manuais de estudo do Instituto Rio Branco durante alguns anos. Considero-me um privilegiado nesse aspecto, mas isso apenas porque fui um “rato de biblioteca” praticamente desde que aprendi a ler, na “tardia” idade de sete anos.

Ao ingressar no Ministério das Relações Exteriores, houve alguma mudança na sua vida?

Como explicitei, nunca frequentei o Rio Branco, pelo fato do concurso direto ter me colocado na carreira imediatamente, e assim comecei a trabalhar, sem qualquer treino ou qualificação anterior, a não ser uns quantos dias de palestras para a nova “turma”, no Instituto Rio Branco justamente. Sei que no início sequer sabia redigir um telegrama ou memorando em linguagem diplomática, mas isso nunca me preocupou muito. Meu interesse era pela substância da matéria: política internacional, relações de poder, economia mundial, era tudo que me interessava.

Minha vida mudou, sim, radicalmente, pois sai na última semana de novembro de 1977 de aulas de sociologia e de economia em São Paulo, para o trabalho na Secretaria de Estado logo na primeira semana de novembro. Não me considerava muito diplomático, e creio que nunca me encaixei no modelo, pois o que sempre me interessou na carreira era seu lado intelectual, não seu lado burocrático, muito hierarquizado e também extremamente disciplinado (coisas que eu sinceramente negligencio quase completamente). Mas, foi uma boa ascensão profissional de imediato, ainda que o salario de um terceiro secretário, nessa época, fosse propriamente miserável. Lembro-me que eu não tinha renda, já não digo para comprar automóvel ou telefone (dois objetos caríssimos nessa época), mas simplesmente para obter crediário numa loja de departamentos para comprar geladeira a prazo. Humilhante como se vê.

Quem me salvou foi a “namorada” que consegui após menos de uma semana no novo emprego: Carmen Lícia era economista, contratada num projeto de comércio exterior pelo MRE, minha subordinada teoricamente na Divisão onde passei a trabalhar, mas ela ganhava o dobro do que eu ganhava, e assim além da futura noiva e mulher, pude ter acesso a carro, telefone, restaurantes, etc. Foi a maior, e melhor, mudança jamais experimentada em minha vida, pois de todos os meus colegas de turma e outros contemporâneos do Brasil, Carmen Lícia e eu formamos, possivelmente, um dos poucos casais estáveis desde o início. Ficamos juntos, além dos motivos usuais de atração, por dois motivos básicos: ambos somos leitores viciados e viciosos, e ambos nômades inveterados, sempre viajando, por quaisquer meios a quaisquer lugares. Cultura, turismo intelectual, restaurantes e prazeres finos, são os motivos que nos unem desde sempre.

Paulo Roberto de Almeida e Carmen Lícia Palazzo
Quais postos no Brasil e no exterior o senhor ocupou?

Depois de meu ingresso no Itamaraty, em dezembro de 1977, permaneci por apenas um ano e meio em Brasília; no final de 1978, exatamente um ano depois, já estava casando com Carmen Lícia Palazzo, economista contratada num projeto de cooperação entre a Seplan e o MRE para participar de um grupo de trabalho sobre o comércio do Brasil com o Leste Europeu, a divisão onde eu trabalhava, e recebemos em seguida convite para um primeiro posto, mais exatamente na embaixada do Brasil em Berna. A Suíça nos pareceu um lugar conveniente para o nascimento de nosso primeiro filho, encomendado pouco depois do casamento, e foi assim que partimos do Brasil em meados de 1979. Lá ficamos até meados de 1982, tendo Pedro Paulo nascido em maio de 1980; logo em seguida retomei meu doutoramento que tinha ficado abandonado desde o início do 1977, quando decidi retornar ao Brasil depois de longos anos de estada na Europa, e para isso refiz minha matrícula de doutoramento, sem mudar, naquele momento substancialmente o projeto, junto à Universidade de Bruxelas.

Depois de três anos de Suíça e desejando ficar ainda na Europa para continuar e terminar a tese de doutoramento, aceitei um posto em Belgrado, na Iugoslávia formalmente socialista, dois anos depois da morte de seu ditador desde 1945, Josip Broz Tito. A despeito das dificuldades materiais – cortes de eletricidade extensivos e intensos durante o inverno, penúria de gêneros de todos os tipos, inclusive de gasolina – o país balcânico – unificado apenas aparentemente – constituiu uma excelente experiência de vida, de aprendizado, de viagens. Por duas vezes tive de separar-me de minha família – deslocada para Roma durante dois invernos seguidos – e aproveitei os momentos de isolamento para redigir a tese, que ficou pronta no primeiro semestre de 1984, com defesa marcada para junho desse ano em Bruxelas. Aproveitamos o restante de nossa estada na Europa, antes de retornar ao Brasil, para viajar muito em diversos países.

Depois de uma curta estada em Brasília, entre 1985 e o início de 1987, saímos novamente para o que seria o nosso terceiro posto, novamente a Suíça, mas desta vez na delegação multilateral em Genebra, outra excelente estada numa bela cidade, muito bem localizada, extremamente gratificante sob todos os pontos de vista: profissional, cultural, familiar, acadêmico, turístico-gastronômico. Foram três anos muito felizes, ao final dos quais ganhamos uma linda filha, a Maíra, e no início de 1990 já estava partindo novamente para meu quarto posto, desta vez Montevidéu, mas não o bilateral e sim o multilateral da Aladi. Aprendi muito sobre integração, essencialmente sobre o Mercosul, que aliás foi o tema de meu primeiro livro, publicado de retorno ao Brasil, em 1993. A estada em Montevidéu foi extremamente curta, apenas dois anos exatos, após os quais eu voltei para trabalhar justamente na unidade de integração regional e outros temas econômicos na Secretaria de Estado.

Meu quinto posto foi Paris, para onde fui em setembro de 1993, chegando justo a tempo de assistir conversações do então ministro da Fazendo Fernando Henrique Cardoso, e de seu presidente do Banco Central, Pedro Malan, com o Tesouro francês, a propósito de nossa dívida externa e dos acordos contraídos no âmbito do clube de Paris. Foram mais três anos de completa felicidade profissional, familiar, cultural, turística e gastronômica, obviamente, com muitas viagens e enriquecimento intelectual. Em Paris me ocupei de temas econômicos, bilaterais e multilaterais (Clube de Paris e OCDE), o que me trouxe uma imensa bagagem – junto com a adquirida anteriormente em Berna, Genebra e Montevidéu – para me orientar definitivamente para os temas de história econômica e políticas de desenvolvimento.

De volta a Brasília, no início de 1996, assumi a chefia da Divisão de Política Financeira e de Desenvolvimento da Subsecretaria de Assuntos econômicos, onde permaneci três “longos anos”, até receber um convite para ser ministro-conselheiro em Washington, para onde fui em setembro de 1999. Lá permaneci quatro anos completos, voltando em outubro de 2003, já com o novo governo lulopetista. Fui então trabalhar como assessor especial de um dos integrantes da troika que cercava o presidente Lula, ocupando-me de temas de planejamento estratégico, um exercício que poderia ter sido extremamente gratificante se não fosso e vezo petista e militar por planos grandiosos, ambiciosos demais para serem efetivamente executados com sentido pragmático.

Depois de uma missão provisória na China, durante oito meses em 2010, onde desempenhei a função do Comissário Geral Adjunto do Pavilhão do Brasil por ocasião da Exposição Universal de Shanghai, retornei ao Brasil para funções anódinas, tomando então uma licença, no início de 2012, para dar aulas no Institut de Hautes Études de l’Amérique Latine, junto à Universidade de Paris 3 (Sorbonne), na rue Saint-Guillaume. Foram mais seis meses de muita cultura, muitas viagens, muito estudo e satisfação.

De volta ao Brasil, aceitei ser, no final de 2012, ser Cônsul Geral Adjunto no Consulado Geral do Brasil em Hartford, Connecticut, mais três anos de livros, viagens, muita cultura (sobretudo em museus e bibliotecas), várias palestras em universidades americanas da costa leste (e até do Illinois), e duas travessias completas, coast to coast, de um oceano a outro (quando conhecemos praticamente todos os estados americanos), decidimos, Carmen Lícia e eu, voltar ao Brasil no final de 2015, por razões basicamente familiares (ficar próximos dos filhos e netos). Estes foram, pois, os meus postos e minhas viagens, todos eles recheados de muito conhecimento, experiência de vida, e de prazeres culturais e gastronômicos.

Como o senhor descreveria a atuação da sua esposa, ao seu lado, nesses quase quarenta anos? 

Carmen Lícia Palazzo sempre foi, desde o início, continua sendo e assim será no futuro previsível, uma companhia excepcional e provavelmente a melhor coisa que me aconteceu na vida desde que ingressei no Itamaraty em dezembro de 1977. Nunca poderia ter casado com alguém que não amasse, mas sobretudo que não partilhasse comigo os mesmos gostos – por livros, por viagens, por cultura, em geral, por uma vida simples, mas repleta de prazeres intelectuais – e que fosse animada pelo mesmo gosto de aventura, por esse nomadismo constante que é intrínseco à carreira, mas que ambos praticamos no mais alto grau, no limite das possibilidades temporais e materiais. Temos origens relativamente similares – famílias imigrantes, trabalhadoras, motivadas pela educação de seus filhos como via de ascensão social, ainda que eu viesse de um meio bem mais modesto e menos educado do que ela – e cultivamos interesses comuns e pontos de vista políticos e filosóficos também amplamente coincidentes, o que também compreendeu projetos de vida largamente orientados para objetivos partilhados, tanto no plano familiar, quanto no profissional, ou simplesmente de vida intelectual. Esses são os pontos de partida que explicam que, no amplo leque de nossa faixa de casais que coincide temporalmente com a trajetória de vida e carreira, sejamos um dos poucos que se manteve estável ao longo de quase 40 anos de itinerário conjunto.

No plano específico da vida em comum, parece inevitável que alguns trade-offs tivessem de ter sido feitos, aceitos e encarados, nem sempre em igualdade de condições. Como apenas eu ingressei na carreira diplomática, Carmen Lícia, por injunções da vida diplomática – remoções, mudanças de modo de vida, filhos, e uma série de outras vicissitudes – teve de abandonar sua carreira pessoal, como economista, para adentrar num tipo de atividade na qual pudesse conciliar suas preferências pessoais com as condições sempre mutantes da minha condição. Ela se orientou então para o magistério, para a pesquisa, na área de história, uma trajetória tampouco isenta de percalços pois sempre condicionada às possibilidades locais em postos do exterior e à sempre renovada necessidade de retomar trabalho nessas áreas quando no Brasil. Nunca é fácil, inclusive também por que, por temperamento, nenhum de nós dois é adepto de serviçais ou de dependentes para os trabalhos domésticos: ainda que amplamente divididas as tarefas da casa, é óbvio que a carga maior sempre fica com quem tem a obrigação de cuidar dos filhos, de se ocupar de sua educação e do funcionamento da casa, em face de uma carreira bastante exigente em termos de invasão das horas vagas e dos fins de semana.

A compensação vem num planejamento conjunto das diversas possibilidades de remoção e de estilo de vida, num engajamento intenso, e comum, nas atividades que ambos cultivamos – leituras, viagens, lazeres culturais e gastronômicos, e várias outras atividades afins – e num despojamento partilhado em relação ao supérfluo e a certa ostentação, que são talvez muito comuns na carreira, em troca de uma vida mais voltada para o que nos une, justamente, afastada de qualquer exibicionismo ridículo. Carmen Lícia, aliás, lê muito mais do que eu, conhece provavelmente muito mais coisas que eu, em termos de história, civilizações, culturas, e está sempre sugerindo algo para fazermos no universo cultural que nos interessa. Devo a ela muito do que sou, do que fiz, do que pude produzir ao longo dos anos: aliás, só pude escrever e publicar tanto, nestes últimos 40 anos, porque Carmen Lícia assegurou as condições ideais, até com certo sacrifício pessoal, para que tudo isso pudesse ser feito.

Por isso não tenho nenhuma hesitação em proclamar meu amor por ela, e dizer que fui, sou, um homem muito feliz por ter como companhia uma mulher excepcional, bem mais inteligente do que eu, muito mais esperta em coisas da vida, dotada de um faro psicológico superior ao meu para coisas e pessoas, enfim, um amor de pessoa.
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Das atividades que o senhor realizou no MRE, quais mais lhe dão orgulho?

Ter participado das primeiras iniciativas de informação, impressa e digital, sobre integração e diplomacia econômica – com edição de revistas, boletins, publicações diversas – entre os anos 1990-93, e depois acompanhado muito do trabalho negociador de diplomacia econômica, seja em Paris (entre 1993 e 95, no Clube de Paris), seja em Brasília, nos temas de investimentos e finanças (entre 1996 e 1999), e depois em Washington, nos mesmos temas, mais ciência e tecnologia. Todos os meus livros, mesmo os de história diplomática, trazem esse universo das relações econômicas internacionais e da história econômica do Brasil, que estão no centro de minhas pesquisas, estudos, escritos e aulas. Atualmente, sem um cargo definido no Itamaraty, na transição de um governo e outro, encontro-me colaborando com atividades de natureza cultural na Funag, tendo já organizado um seminário e livro sobre um historiador-diplomata, Francisco Adolfo de Varnhagen, e preparando outros projetos nesse mesmo universo da história diplomática e da política externa do Brasil.

O que diria sobre a carreira diplomática? Como o senhor a vê?

De espírito e motivações basicamente acadêmicas, só sou diplomata porque encontro essa profissão a mais intelectual de todas as carreiras do serviço público, a que mais se amolda a meu espírito de pesquisador, de escritor, de professor (uma atividade que sempre desempenhei em caráter complementar, mas de forma constante, intensa). Não tenho grandes motivações corporativas, no sentido de fazer da carreira o centro exclusivo de meu interesse profissional ou até de vida, mas considerando-a, de certa forma, como um esteio muito gratificante a esses outros aspectos intelectuais ou culturais que preenchem não apenas a minha vida, mas também a de Carmen Lícia, uma leitora voraz, uma intelectual, uma pesquisadora e professora, como eu. A maior parte de meus colegas, reconheço, fazem da carreira uma verdadeira vocação, um modo de vida e um objetivo central de seus itinerários profissionais, o que não é exatamente o meu caso, ainda que eu considere esses objetivos plenamente válidos, pois eles são, de fato, o constitui a essência da carreira diplomática: informar, representar, negociar.

É o que de certa forma também fiz, ao longo de minha carreira, mas sem jamais abandonar, ou descurar, minhas outras atividades intelectuais, a pesquisa, o estudo, as aulas, palestras, conferências, participação em revistas e grupos de estudo e trabalho na esfera precipuamente acadêmica, no Brasil e no exterior. É o que sempre fui, professor, o que outros reconhecem que sou, e o que me dá maior prazer e satisfação intelectual. Não tenho essa obsessão de outros colegas pelo trabalho puramente burocrático de chancelaria – a não ser o que envolve, justamente, a produção de material substantivo de pesquisa e formulação de posições, com base num estudo detalhado de cada tema diplomático ou cada problema negociador inscrito em nossa agenda – e menos ainda pelo aspecto coloquial dos coquetéis e recepções diplomáticas onde se perde um tempo enorme com banalidades até obter alguma informação relevante para o trabalho próprio do diplomático. Como sou um leitor inveterado, prefiro “perder” meu tempo na companhia dos livros e em outras atividades desse tipo, a frequentar salões e gabinetes nos quais a hipocrisia é de rigor e onde as frases de efeito e os chavões abundam.

Fui e sou muito feliz na carreira diplomática, pois ela me permitiu fazer, e de maneira abundante, o que mais eu e Carmen Lícia gostamos de fazer: viajar, ler, frequentar grandes e pequenos museus, conhecer todos (ou quase todos) os países do mundo, praticar gastronomia (sobretudo italiana, la vera) enfim, circular como nômades com relativo conforto e segurança, satisfazendo nossa insaciável sede de cultura, de conhecimento, de prazer estético, cultural, intelectual.

Em que medida a diplomacia e a academia são complementares ou excludentes?

Para mim elas se entrelaçam profundamente, ainda que colegas diplomatas possam ver nisso algum “desvio de função”. Nunca considerei assim, pois só o hábito de pesquisa, de exposição clara dos fatos, de aprofundamento das razões, origens e desenvolvimento de uma questão qualquer, de suas conexões com o Brasil, podem contribuir para a formulação das melhores posições negociadoras para o país. Ao fazer isso, não é sem orgulho que reconheço ter estado, na maior parte dos casos, e em grande medida na proposição de “soluções” a uma questão negociadora qualquer, à frente do meu tempo, à frente dos meus colegas, o que não é fácil, reconheço desde já. O fato de estudar muito, de pesquisar, de ler intensamente sobre todos os assuntos que me foram atribuídos me habilitou a dispor, se ouso dizer, de um conhecimento aprofundado dessas questões, podendo assim contribuir para a formulação das posições negociadoras que encontro as melhores para o Brasil. Isso nem sempre é visto, e muito raramente é visto, como positivo, uma vez que o Itamaraty, como toda grande instituição burocrática, é eminentemente conservadora, um pouco ao estilo do Vaticano, com seus dogmas e rituais, seus cardeais e seus grandes burocratas, que se apoiam na tradição, bem mais do que nos estudos de vanguarda.

Não tenho nenhum problema assim, de “acusar” o Itamaraty, de ser basicamente conformista com certos mitos do passado, com certos conceitos válidos (talvez) numa certa época, mas que se cristalizaram numa ideologia nacionalista um pouco ingênua, crenças desenvolvimentistas do tipo rústico – ou seja, sem fundamentos econômicos mais refinados – e esse vago terceiro-mundismo onusiano que encontra ultrapassado e que é completamente artificial, para não dizer anacrônico sob todos os pontos de vista. Os companheiros no poder, de 2003 a 2016, ainda consolidaram toda uma ideologia nefasta da divisão do mundo entre países hegemônicos – as economias avançadas, e antigos impérios coloniais – e emergentes – supostamente anti-hegemônicos, e portanto, automaticamente aliados numa causa simplória de reorganização do mundo segundo novas bases, que ainda carregam esse entulho ideológico do desenvolvimentismo de base estatal, protecionista, introvertido e, ao fim e ao cabo, basicamente prejudicial ao nosso desenvolvimento econômico e nossa integração nos circuitos da globalização. O Itamaraty, durante todos esses anos, foi extremamente passivo com posturas e ações totalmente contrários a nossos interesses nacionais, alinhados com algumas das piores ditaduras da região e alhures, totalmente em conformidade com o espírito socialista vulgar dos que estiveram no poder durante esse período.

Atribuo meu ostracismo e alijamento de funções relevantes no Itamaraty durante todo esse período à minha postura claramente opositora, não apenas a esse esquerdismo infantil e anacrônico, mas também a certa passividade ou submissão diplomática em face de iniciativas claramente contrárias a nossos interesses como nação integrada ao mundo, não alinhada a regimes deploráveis no plano da democracia e dos direitos humanos. Nunca deixei de pensar com minha cabeça e de expressar o que penso sobre tudo isso, e mais ainda: de escrever e publicar o que penso. Prefiro ficar em paz com minha consciência, do que fingir uma concordância hipócrita com posturas que sei que são contrárias às melhores tradições diplomáticas de nossa história. Este também é um aspecto que deriva de meu pendor pelos estudos e pelas pesquisas especializadas.


Em visita a Hyde Park, a residência de verão do presidente Franklin Delano Roosevelt e de Eleanor Roosevelt, no verão de 2015.

Quais foram os maiores desafios, ao longo da sua carreira? 

Não posso reclamar de uma carreira que me levou a conhecer alguns dos lugares mais interessantes do mundo, que me permitiu desenvolver quase plenamente todos os meus interesses intelectuais, e que me ofereceu segurança e estabilidade para justamente poder me dedicar, nas horas vagas de uma atividade profissional geralmente intensa – pelo menos até certa etapa –, aos meus hobbies preferenciais e eternos: leituras, escrita, viagens e cultura refinada, no sentido mais intelectual do que artístico. Não obstante, alguns momentos foram desafiadores, ou difíceis, na vida pessoal, familiar, profissional.

Nossa estada na então Iugoslávia, entre 1982 e 1985, foi bastante problemática, inclusive porque, em virtude de racionamento de quase tudo, de penúrias constantes, e de cortes de eletricidade em pleno inverno, Carmen Lícia e Pedro Paulo, então entre 3 e 4 anos, tiveram de se instalar em Roma por dois invernos seguidos, enquanto eu permanecia em Belgrado durante a semana e os visitava nos fins de semana ou nas saídas periódicas. O período coincidiu também com a preparação de minha tese de doutorado junto à universidade de Bruxelas, o que também implicou em separação maior do que o imaginado. Foi, certamente, meu único “posto de sacrifício”.

O outro grande desafio da carreira foi ter enfrentado, por razões claramente políticas – em virtude meus escritos fortemente críticos aos governos do PT –, um veto virtual, efetivo, a cargos e funções na Secretaria de Estado desde praticamente 2003 até o presente momento, quando recém se inicia um novo governo. Fui, provavelmente, um dos críticos mais evidentes e declarados do regime lulopetista, que sempre considerei prejudicial ao Brasil em geral, e especialmente danoso do ponto de vista da política externa e de sua diplomacia. Eu tinha publicado, ainda em Washington, em 2003, depois unificada em um livro coletivo, uma série de análises tópicas sobre temas de política internacional e de diplomacia prática, provocativamente chamada de “Contra a Corrente: Treze Ideias Fora do Lugar”, na qual eu já criticava as concepções que passaram a figurar na base da diplomacia implementada desde então. A consequência foi um veto explícito a qualquer cargo em Brasília, primeiro no Instituto Rio Branco, depois na própria SERE. Fiquei no limbo, portanto, Aproveitei o tempo “livre” para produzir ainda mais, e publicar um número superior de escritos ao que teria sido possível fazer se tivesse tido funções de responsabilidade na SERE.

O que diria aos jovens estudantes que pretendem prestar o Concurso de Admissão (CACD)?

Não tenho grandes conselhos a dar, pois julgo que cada indivíduo possui suas próprias motivações e interesses pessoais, para a sua vida profissional, familiar ou intelectual. Minha vida sempre foi feita de estudos, de leituras, de notas e escritos e acho isso um bom método para quem pretende ser diplomata: ler de tudo (material de boa qualidade, quero dizer), anotar, refletir, sintetizar, expor, colocar as ideias em ordem e saber se expressar claramente, o que só se consegue estudando muito, o que permite pensar de forma abrangente. Quem começa a pensar em estudar para o concurso de ingresso na carreira diplomática de certa forma já começa tarde, pois a atitude correta, para qualquer profissão aliás, é a de estudar sempre, desde pequeno e durante toda a vida, mesmo depois de realizado o objetivo de ingressar na carreira diplomática.

Quanto aos princípios e valores que devem guiar alguém na preparação ou no desempenho de sua carreira diplomática, creio que já escrevi alguma coisa a esse respeito neste pequeno texto que provavelmente merece atualização reflexiva, depois de mais de uma década e meia de redigido:

“Dez regras modernas de diplomacia” (agosto de 2001)


Esta entrevista é a sua publicação de número 1.226, qual é a sua maior motivação para escrever? 

Trata-se de uma compulsão interior, certamente derivada desse meu hábito “insano” de intensas leituras, sempre com anotações, e de uma dedicação paralela, mas também intensa, a atividades acadêmicas, o que me motivou a escrever textos de nítido perfil didático, que a partir de uma determinada etapa se transformaram em livros (mais de uma dúzia), capítulos de livros em dezenas de obras coletivas, e algumas centenas de artigos que são regularmente colocados à disposição dos interessados ou curiosos em meu site (www.pralmeida.org), blog (http://diplomatizzando.blogspot.com) e em plataformas de intercâmbio acadêmico, tipo Academia.edu e Research Gate, além dos veículos que publicam esses materiais.

Já escrevi muito, também, sobre essa minha maneira de ser, justamente, tanto pela vertente diplomática-acadêmica, quanto pela de “escrevinhador” e divulgador dos escritos os mais diversos. Permito-me, portanto, alinhar aqui, alguns desses trabalhos que podem complementar esta breve informação sobre meus métodos de trabalho, sobre minhas atividades intelectuais, sobre minha postura em relação à dupla militância, na carreira diplomática e nas lides acadêmicas. Apenas transcrevo os textos segundo a numeração na lista de originais, eventualmente complementada pela de publicados.

800. “Dez Regras Modernas de Diplomacia”, Chicago, 22 julho 2001; São Paulo-Miami-Washington 12 agosto 2001, 6 p; Ensaio breve sobre novas regras da diplomacia. Postado no blog Diplomatizzando (16/08/2015, link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2015/08/dez-regras-modernas-de-diplomacia-paulo.html). Relação de Publicados n. 282.

1073. “Mensagem aos formandos”, Washington, 4 jul. 2003, 5 p. Texto de saudações elaborado para atender a convite da comissão de formatura do curso de Relações Internacionais da Universidade Tuiuti do Paraná. Encaminhado em 4/07, em versão preliminar. Postado no blog Diplomatizzando (27/05/2016; link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/05/saudacao-formandos-de-relacoes.html).

1089. “Aprenda diplomacia por sua própria conta (e risco), em apenas um dia”, Washington, 2 ago. 2003, 4 p. Paródia aos manuais de auto-aprendizado de economia, imaginando matérias e métodos para um self-made diplomat. Postado no blog Diplomatizzando (27/05/2016; link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/05/seja-diplomata-por-sua-propria-conta-e.html).

1181. “A formação e a carreira do diplomata: uma preparação de longo curso e uma vida nômade”, Brasília, 14 jan. 2004, 3 p. Texto preparado para o Guia para a Formação de Profissionais do Comércio Exterior, das Edições Aduaneiras. Postado no blog Diplomatizzando (27/05/2016; link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/05/preparacao-para-carreira-diplomatica.html).

1345. “A caminho de Ítaca”, Brasília, 18 out. 2004, 7 p. Ensaio sobre como e por que sou professor, de caráter autobiográfico. Postado no site pessoal (link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1344ItacaProfessor.html), no blog DiplomataZ (23.11.2009; link: http://diplomataz.blogspot.com/2009/11/24-por-que-sou-professor-uma-reflexao.html); republicado no blog Diplomatizzando (15/10/2015; link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2015/10/a-caminho-de-itaca-como-e-por-que-sou.html)

1403. “Conselhos de um contrarianista a jovens internacionalistas”, Brasília, 5 março 2005, 6 p. Alocução de patrono na XI turma (2º semestre de 2004) de Relações internacionais da Universidade Católica de Brasília (10/03/2005). Mesmo texto aproveitado para alocução de paraninfo na turma de Relações internacionais da Universidade do Sul de Santa Catarina, Unisul, Tubarão, SC, de 2004 (8/04/2005). Mensagem disponível no site pessoal: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1403Contrarianista.html.

1492. “Postura diplomática”, Brasília, 8 e 12 nov. 2005, 2 p. Comentários a questão colocada a propósito de situações difíceis enfrentadas no trabalho diplomático. Divulgado no blog Diplomatizzando (2/07/2012; link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2012/07/postura-diplomatica-o-contrarianista.html).

1507. “Por que leio tanto? e Meus ‘métodos’ de leitura...”, Brasília, 18 dez. 2005, 3 p. Dois textos sequenciais sobre leituras e métodos, para postagem no meu blog (http://paulomre.blogspot.com). Apresentação ao novo Blog “Textos PRA” (1 p.). Postado no blog Diplomatizzando (27/05/2016; link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/05/por-que-leio-tanto-meus-metodos-de.html).

1529. “O que faz um diplomata, exatamente?”, Brasília, 11 janeiro 2006, 4 p. Resposta a indagações efetuadas sobre a natureza do trabalho diplomático, como remissão a meu trabalho sobre as “dez regras modernas de diplomacia”; Blog n. 153 (link: http://paulomre.blogspot.com/2006/01/153-o-que-faz-um-diplomata-exatamente.html).

1535. “Alguns aspectos da cultura diplomática: respostas a questionário no âmbito de projeto sobre a mulher na diplomacia”, Brasília, 18 janeiro 2006, 12+5 p. Respostas a questionário submetido por professora da USP, no quadro do projeto “Mulheres e Relação entre os Gêneros nas Diplomacias Brasileira e Portuguesa”. Novas perguntas em 20 de fevereiro, respondidas em 25 de fevereiro (total: 17 p). Postado no blog Diplomatizzando (27/-5/2016; link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/05/a-cultura-diplomatica-e-as-mulheres.html).

1558. “Ser um bom internacionalista, nas condições atuais do Brasil, significa, antes de mais nada, ser um bom intérprete dos problemas do nosso próprio País”, Brasília, 8 março 2006, 6 p. Alocução de paraninfo na turma de formandos do 2º Semestre de 2005 do curso de Relações internacionais do Uniceub, Brasília (16 de março de 2006, 20hs, Memorial Juscelino Kubitschek). Colocado à disposição no site pessoal (link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1558uniceub16mar2006.doc).

1563. “As relações internacionais como oportunidade profissional”, Brasília, 23 março 2006, 9 p. Respostas a algumas das questões mais colocadas pelos jovens que se voltam para as carreiras de relações internacionais. Postado no blogpessoal (http://diplomatizzando.blogspot.com/2013/03/as-relacoes-internacionais-como.html). Relação de Publicados n. 627.

1591. “O Ser Diplomata: Reflexões anárquicas sobre uma indefinível condição profissional”, Brasília, 2 maio 2006, 3 p. Reflexões sobre a profissionalização em relações internacionais, na vertente diplomacia. Disponível no site pessoal (link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1591serdiplomata.doc).

1624. “Declaração de princípios: sou um homem de causas”, Brasília, 20 junho 2006, 2 p. Post inaugural no novo blog Vivendo com livros, voltado para os livros e o estudo (http://vivendocomlivros.blogspot.com/). Postado novamente no blog Diplomatizzando (31/01/2014: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/01/e-por-falar-em-blogs-uma-declaracao-de.html).

1670. “Dez obras fundamentais para um diplomata”, Brasília , 29 setembro 2006, 2 p. Lista elaborada a pedido de aluno interessado na carreira diplomática: obras de Heródoto, Maquiavel, Tocqueville, Pierre Renouvin, Henry Kissinger, Manuel de Oliveira lima, Pandiá Calógeras, Delgado de Carvalho, Marcelo de Paiva Abreu e Paulo Roberto de Almeida, para uma boa cultura clássica e instrumental, no plano do conhecimento geral e especializado. Blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2006/09/625-dez-obras-fundamentais-para-um.html). Revisto e ampliado, com explicações e links para cada uma das obras, em 14 de outubro de 2006 (6 p.). Relação de Publicados n. 709.

1688. “Auto-entrevista (ao chegar numa certa idade...)”, Brasília, 19 novembro 2006, 6 p. Algumas perguntas (leves) a um personagem conhecido: um texto comemorativo. Postado no site, link:http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1685AutoEntrevista.pdf.

1704. “Um autodidata na carreira diplomática”, Brasília, 26 dezembro 2006, 4 p. Respostas a questões colocadas por jovem candidato à carreira diplomática. Colocada no blog Diplomatizzando; link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2006/12/667-um-autodidata-na-carreira.html#links.

1705. “Carreira Diplomática: dicas e argumentos sobre uma profissão desafiadora”, Brasília, 27 dezembro 2006, 6 p. Consolidação e compilação de meus trabalhos relativos à carreira diplomática e à profissão de internacionalista, para atender às muitas consultas que me são feitas nesta época. Colocada no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2006/12/669-carreira-diplomatica-dicas.html) e incorporada ao site pessoal, seção “Carreira Diplomática”.

1706. “Retrato do diplomata, quando maduramente reflexivo”, Brasília, 31 dezembro 2006, 5 p. Reflexões pessoais em torno de uma vida dedicada aos livros, ao estudo e ao aperfeiçoamento da sociedade. Postado no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2006/12/679-retrato-do-diplomata-quando.html) e no site pessoal (link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1703RetratoDiplomata.html).

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 27 de maio de 2016


O legado da Constituição de Cádiz na Constituinte de 1823 - Paulo Roberto de Almeida (Seminário CD: 200 anos da Assembleia Constituinte)

O legado da Constituição de Cádiz na Constituinte de 1823

  

Paulo Roberto de Almeida, sociólogo, diplomata e professor.

Notas para exposição oral no quadro do seminário comemorativo dos 200 anos da Assembleia Constituinte de 1823: Assembleia Constituinte de 1823: Antecedentes e Consequências; Mesa 4: “O ideário Jurídico da Constituinte de 1823”; Câmara dos Deputados, dia 9/11/2023, 9:00hs. 


São inúmeros os afluentes doutrinais e conceituais que vão conjugar-se, entre o final do século 18 e o início do 19, na formação do grande rio jurídico que desemboca nos trabalhos da brevíssima primeira Constituinte brasileira, chamada apropriadamente de “Constituinte Interrompida”, segundo o título do livro publicado para o seu bicentenário pelo assessor da Câmara dos Deputados, o historiador José Theodoro Mascarenhas Menck. Ela começou seus debates em meados de 1823, discutindo os fundamentos daquela que deveria ser a Carta inaugural do Império do Brasil, contando com a experiência de representantes escolhidos dentre as melhores inteligências do Reino Unido do Brasil, tornado independente como Império do Brasil poucos meses antes, mas terminou brutalmente cerceada na “noite de agonia” em novembro desse mesmo ano, sem poder concluir seu mandato por édito do imperador, mas também dos inimigos dos Andradas, as principais cabeças pensantes do novo Estado e da sua primeira Assembleia Constituinte. 

Os afluentes doutrinais, no campo do constitucionalismo, podem ser listados, dentre várias outras influências políticas e filosóficas, num itinerário de aprofundamento do constitucionalismo escrito – à diferença do direito costumeiro da tradição anglo-saxã – até as Cartas que foram sendo elaboradas sucessivamente no hemisfério americano e mesmo em alguns reinos europeus. As etapas mais relevantes desse percurso podem ser elencadas cronologicamente: elas partem da Declaração da independência das trezes colônias americanas, passam pela Constituição da Filadélfia, de 1787, pela Revolução francesa de julho de 1789 e sua Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de agosto do mesmo ano e, sobretudo, pelo grande monumento do constitucionalismo liberal representado pela Constituição de Cádiz, de 1812. 

Essa notável e solitária representante do constitucionalismo ibérico teve uma influência direta na Revolução do Porto de 1820, assim como nos trabalhos das Cortes de Lisboa de 1821-22, servindo inclusive de suporte constitucional provisório para Portugal e para o próprio Brasil, assim como nos trabalhos incipientes do nosso primeiro exercício soberano de elaboração constitucional. Todos esses afluentes experimentais, complementados pelas elaborações doutrinais de um Benjamin Constant, vão enriquecer e desembocar no caudaloso rio que marca, justamente, o ideário Jurídico da Constituinte de 1823. Essa história está refletida em muitos ensaios e estudos de diversos especialistas em história constitucional, brasileira, hemisférica e continental europeia, mas a Constituição de Cádiz permaneceu numa espécie de limbo historiográfico, cuja importância merece ser ressaltada.

No plano conceitual, por outro lado, sobressaem, no enriquecimento do debate político em torno da construção progressiva des regimes de monarquia constitucional na Europa e na América portuguesa, os aportes extremamente ricos do jornalista Hipólito da Costa, que seguiu atentamente, nas páginas do seu “armazém literário”, todos os processos revolucionários e de construção jurídica que partiram do tsunami constitucional registrado na França da Convenção, do Diretório, etapas da grande revolução francesa, que ele seguiu atentamente desde o Consulado e o Império napoleônico, até a Restauração. Muitos dos seus artigos e comentários eram escritos de circunstância, mas também são publicadas, nas páginas do Correio Braziliense, análises mais detidas, que incidem, justamente sobre as revoluções constitucionais ibéricas e mesmo a de Nápoles, com destaque para a Constituição de Cádiz de 1812, não particularmente apreciada por Hipólito.

O pai da imprensa livre brasileira formulou críticas à Carta dos liberais espanhóis, em função de sua extrema restrição aos poderes do monarca, um diminuto artigo da Carta, em confronto com o imenso rol de atribuições do Parlamento, muitos deles elaborados justamente para controlar a tradição autocrática dos soberanos espanhóis. Afastada na assunção de Fernando VII ao trono espanhol, a Carta de Cádiz é a principal responsável pela revolta militar do início de 1820, que resultará no breve triênio liberal de 1820-23, refletindo-se ainda em outros impulsos liberais na península e mais além.

A Fênix de Cádiz serviu, em especial, de inspiração ao Sinédrio português, que protagonizou a Revolução do Porto de 1820; ela viu-se adotada temporariamente em Portugal, pelas Cortes de Lisboa, mas também no Brasil, em 1821, na ausência de textos próprios que pudessem preencher o vácuo deixado pelo antigo regime absolutista. A despeito de ter sido depois naturalmente suplantada pelas Cartas Magnas de 1822, em Portugal, e pela de 1824 no Brasil, outorgada pelo imperador a partir de um texto de comissão, ela serviu de inspiração aos constituintes da Constituinte de 1823, em especial ao deputado Antonio Carlos de Andrada, cujas propostas no curso dos breves trabalhos de nosso primeiro exercício constituinte guardam muitas conexões com o texto de Cádiz. O deputado Lafayette de Andrada, presidente da Comissão do Bicentenário da Câmara dos deputados, ao prefaciar o livro de José Theodoro Mascarenhas Menck, 1823, a Constituinte Interrompida, destaca quais eram esses elementos constitucionais: 



O projeto de Constituição de Antonio Carlos trazia conceitos modernos para a época e até hoje consagrados. Consignava a liberdade de expressão, a presunção de inocência, o tribunal do júri, a liberdade de pensamento e de credo religioso, a individualidade das penas, a penalização do abuso de autoridade, a proibição da prisão arbitrária, a prisão somente após condenação, o direito de propriedade, a propriedade intelectual, a inamovibilidade dos juízes; enfim, era um texto bastante moderno para a época. 

Aquele texto serviu de base, de espinha dorsal, para a Constituição do Império de 1824, outorgada por D. Pedro I, que nela acrescentou o Poder Moderador e fez algumas adaptações. No conjunto, a Constituição de 1824, a mais longeva de nossa história, muito se assemelhava à Carta elaborada por Antonio Carlos que vinha sendo discutida na Constituinte de 1823 quando houve a dissolução. (prefácio de Lafayette de Andrada, in: Menck, 2023, p. 20)  


Uma conferência conceitual e comparações textuais entre o tronco exacerbadamente parlamentarista da Carta original de Cádiz e o projeto de Antonio Carlos na Constituinte de 1823, assim como com vários dispositivos constitucionais da Carta outorgada em 1824, revelam essa aproximação e esse legado de Cádiz, embora obscurecido pelas diferenças de itinerários políticos e por um contraste mais significativo, que é o do poder moderador, o sustentáculo oportunista de certa preeminência do monarca sobre as tendências nitidamente parlamentaristas – ao estilo inglês de 1688, “o rei reina, mas não governa” – de quase todos os exercícios de elaboração constitucional aqui referidos. 

Cabe, portanto, relembrar, que o texto de Cádiz chegou a ser temporariamente adotado como base constitucional provisória por ocasião das Cortes de Lisboa, em 1821, e pela própria regência de D. Pedro no Brasil, inspirando as bases para a constituição da monarquia portuguesa, as primeiras eleições gerais no Brasil, assim como o trabalho dos brasileiros nas Cortes Portuguesas e o daqueles que se seguiram em 1823 na Assembleia Constituinte do Rio de Janeiro, em 1823, com diversos reflexos sobre a própria Constituição outorgada em 1824.

Um esquema interpretativo sobre esse legado gaditano pode ser conferido, no plano jurídico-doutrinal, com a ajuda de uma dissertação de mestrado em Direito, defendida em 2013 na Universidade do Rio Grande do Sul, nomeadamente a de Wagner Silveira Feloniuk – A Constituição de Cádiz e sua influência no Brasil –, que mereceria ser editada e publicada em formato de livro, talvez por iniciativa de uma das duas casas do Congresso brasileiro. No plano político-constitucional, a referência incontornável e obrigatória são os muitos textos analíticos, que permeiam os registros puramente factuais e documentais, do Correio Braziliense, de Hipólito da Costa, cujos exemplos mais eloquentes foram reunidos por Sergio Goes de Paula, a partir da transcrição seletiva desses verdadeiros ensaios de direito constitucional que foram elaborados pelo grande pioneiro do jornalismo brasileiro independente, relativos aos anos cruciais de 1820 a 1822, culminando pela própria proposta de Constituição para o reino do Brasil que ele elaborou quase ao término de sua grande aventura de pensador do Brasil como Estado nação. 

 

Referências bibliográficas: 

Costa, Hipólito José da (2002-2003)Correio Braziliense, ou, Armazém Literário. reedição fac-similar; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado; Brasília: Correio Braziliense; coordenação de Alberto Dines e Isabel Lustosa (disponível Biblioteca Mindlin-USP: https://digital.bbm.usp.br/handle/bbm-ext/1303).

Feloniuk, Wagner Silveira (2013). A Constituição de Cádiz e sua influência no Brasil. Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Direito, Programa de Pós-Graduação em Direito; orientador: Professor Doutor Cezar Saldanha Souza Júnior (disponível: https://bdtd.ibict.br/vufind/Record/URGS_0a056903b81ce0108c93cfe5b717fd54).

Goes de Paula, Sergio (org., introdução) (2001). Hipólito José da Costa. São Paulo: Editora 34; coleção Formadores do Brasil.

Menck, José Theodoro Mascarenhas (2023). 1823, A Constituinte Interrompida: obra comemorativa dos 200 anos da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil – a primeira experiência parlamentar nacional. Prefácio de Lafayette de Andrada. 1ª. edição; Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2023; disponível em formatos eletrônico e impresso. 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4488, 8 outubro 2023, 3 p.; revisão: 8/11/2023, 4 p. 

 

Participantes da mesa 4, “O ideário Jurídico da Constituinte de 1823”:

José Bonifácio de Andrada - Subprocurador-Geral do Ministério Federal-MPF e Vice-Presidente do Conselho do MPF.

Paulo Roberto de Almeida - Diplomata e escritor 

Gilmar Mendes - Ministro do Supremo Tribunal Federal

Presidente da mesa: Dep. Arlindo Chinaglia

 

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4488. “O legado da Constituição de Cádiz na Constituinte de 1823”, Brasília, 8 outubro 2023, 4 p. Notas para exposição oral no quadro do seminário comemorativo dos 200 anos da Assembleia Constituinte de 1823: Assembleia Constituinte de 1823: Antecedentes e Consequências; Mesa 4: “O ideário Jurídico da Constituinte de 1823”; Câmara dos Deputados, dia 9/11/2023, 9:00hs. Deve preceder a estudo mais detalhado dessas influências de Cádiz sobre os processos constituintes português e brasileiro, de 1821 a 1824. Postado no blog Diplomatizzando (2/11/2023; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/11/o-legado-da-constituicao-de-cadiz-na.html). Revisão ampliada em 8/11/2023, para refletir o livro de José Theodoro Mascarenhas Menck, 1823, A Constituinte Interrompida: obra comemorativa dos 200 anos da Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil – a primeira experiência parlamentar nacional. Prefácio de Lafayette de Andrada. 1ª. edição; Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2023; disponível em formatos eletrônico e impresso. Novamente disponível no blog Diplomatizzando (8/11/2023; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/11/o-legado-da-constituicao-de-cadiz-na_8.html).

Proteção de Patentes: Adesão do Brasil ao tratado de Budapeste sobre depósito de microorganismos - Irene von der Weid, Manuela da Silva, Luiz Ricardo Marinello

 Adesão do Brasil ao tratado de Budapeste

Irene von der Weid, Manuela da Silva, Luiz Ricardo Marinello

Migalhas, 05 de outubro de 2023


A adesão do Brasil ao tratado de Budapeste e o envolvimento da rede brasileira de centros de recursos biológicos Irene von der Weid, Manuela da Silva e Luiz Ricardo Marinello A iminente assinatura do Tratado beneficia portanto o desenvolvimento e inovação na área de biotecnologia ao permitir redução de custos e simplificação de procedimentos para usuários do sistema de patentes no Brasil. quinta-feira, 5 de outubro de 2023 Atualizado às 08:30 Compartilhar ComentarSiga-nos no A A


O Brasil está a um passo de se tornar signatário do Tratado de Budapeste, o que pode representar um avanço para o país, que busca se posicionar como estratégico no segmento da sócio-bioeconomia.

O presente ensaio aponta o processo de aprovação do Tratado, a sua importância e, notadamente o envolvimento da Rede Brasileira de Centros de Recursos Biológicos.

Uma das condições para a concessão de uma patente é a descrição completa do invento no relatório descritivo do pedido, de forma a possibilitar que um técnico no assunto seja capaz de reproduzir a invenção.

No caso das invenções biotecnológicas, o material biológico que seja essencial para a invenção deverá ser depósitado em uma autoridade depositária internacional (IDA, da sigla em inglês International Depositary Authority) sendo este material entendido como uma suplementação informacional necessária ao relatório descritivo do pedido de patente (Art. 24 § 1º da LPI 9.279/96). Estas instituições devem assegurar a recepção e a conservação dos microrganismos e a remessa de amostras.

O Tratado de Budapeste, criado em 1977 no âmbito da Organização Mundial da Propriedade Intelectual - OMPI, estabelece o reconhecimento do depósito de micro-organismos para fins de patente em qualquer IDA, sendo estas localizadas apenas em países signatários do tratado. Encontra-se em vigor desde 1977 e conta atualmente com 89 países signatários1.

Composto por 20 artigos, o Tratado de Budapeste traz as regras para o depósito de microrganismos para fins de pedido e de concessão de uma patente, em que todos os países signatários são obrigados a reconhecer os microrganismos depositados como parte do procedimento de obtenção de patente.

Um único depósito em uma IDA é válido para todos países signatários do Tratado, independentemente desta IDA estar localizada dentro ou fora do território onde o pedido de patente esteja sendo protocolado. O Tratado também define as características dessas instituições (IDAs) e os critérios para a aquisição deste status junto à OMPI, além de garantir o acesso ao material biológico depositado junto às IDAs por quaisquer partes interessadas uma vez findado o período de sigilo do pedido de patente2.

Uma vez que o Brasil ainda não é signatário do Tratado, o inventor brasileiro que precisa depositar material biológico relacionado à um pedido de patente, necessita enviar este material para uma das IDAs reconhecidas no exterior, arcando tanto com os custos do depósito e manutenção do material na IDA, quanto do transporte e o trâmite burocrático para envio para fora do Brasil.

A compreensão sobre a necessidade do Brasil ter IDAs reconhecidas é antiga. Essa discussão foi iniciada em 1997, quando foi constituído, no INPI, um grupo de trabalho para discutir as ações para o credenciamento de instituições brasileiras para atuarem como centros depositários de material biológico para fins de patente. Em 2001 algumas instituições chegaram a pleitear o cadastramento, mas entendeu-se à época que a atividade de depósito de material biológico para fins de patente seria melhor atendida através da criação de um centro depositário, vinculado ao INPI, órgão responsável pela concessão de patentes.

Na mesma época, essa discussão foi levada para o âmbito do projeto para o estabelecimento da Rede Brasileira de Centros de Recursos Biológicos - Rede CRB-Br, da qual o INPI participava junto com a Fiocruz, Embrapa, Unicamp, Banco de Células do Rio de Janeiro - BCRJ, Inmetro, Centro de Referência em Informação Ambiental (CRIA), Sociedade Brasileira de Microbiologia - SBM e TecPar (que posteriormente foi substituído pela Bioqualis), com o apoio do MCTI. Neste contexto, surgiu o projeto de construção do Centro Brasileiro de Material Biológico (CBMB), que tinha como um dos objetivos receber material biológico para fins de patente, e que teve sua construção iniciada através de uma parceria entre o INPI e o Inmetro, no campus do Inmetro em Xerém.

Em paralelo, em 2007, a Política Nacional para o Desenvolvimento da Biotecnologia - PDB, instituída pelo decreto 6.041, propunha como algumas das suas ações a estruturação de Centros de Recursos Biológicos - CRBs, operando como coleções de culturas prestadoras de serviço, que atendam integralmente aos requisitos nacionais e internacionais de segurança e rastreabilidade e que sejam acreditados como autoridades certificadoras de material biológico; a implantação de um Centro Depositário de material biológico para fins de patente; e a criação de sistema de avaliação e de estrutura interministerial capaz de articular e gerenciar a conformidade de material biológico com a adoção de padrões internacionais, que viabilizem o fortalecimento e a melhoria de capacitação dos CRBs para atuação em rede integrada nacional. Sendo assim, a PDB reforçava a importância do estabelecimento do CBMB e da Rede Brasileira de CRBs.

Em 2009 foi iniciada a elaboração do projeto para a construção do CBMB, que seria projetado de modo a atender a todos os requisitos que o habilitassem a ser credenciado como IDA. Entretanto, em razão de questões técnicas e administrativas, o projeto foi descontinuado no final de 2014.

Apesar disso, em 2016, a portaria 130 do MCTI que institui e regulamenta a Rede Brasileira de Centros de Recursos Biológicos - Rede CRB-Br no âmbito do MCTI, define no Art. 2º, inciso V, como um dos objetivos da Rede CRB-Br, prestar serviços de depósito de material biológico para proteção da propriedade intelectual.

Dessa forma, considerando a relevância e a urgência para o País de uma estrutura para o depósito de material biológico para fins de patente, surgiu a necessidade de redefinição de uma proposta para o atendimento às Diretrizes da Política de Desenvolvimento da Biotecnologia instituídas pelo decreto 6.041 de 2007 e pela portaria 130 de 2016, do MCTI3. Essa redefinição considerou uma mudança de entendimento quanto à necessidade do centro depositário ser vinculado ao INPI, haja vista à constatação de que as coleções de culturas nos Estados Unidos e Europa que atuam como IDA não são vinculadas aos respectivos escritórios de patentes.

No entanto, é importante frisar que a atividade de depósito de material patentário deve permanecer dissociada das demais atividades da coleção de cultura, garantindo a imparcialidade do processo de depósito.

Assim, restabeleceu-se o cenário para que instituições nacionais, como a Fiocruz, Embrapa, Unicamp, BCRJ, entre outras igualmente qualificadas, possam solicitar, via Ministério das Relações Exteriores (MRE), o credenciamento junto a OMPI para atuarem como IDAs. No entanto, esse credenciamento depende da adesão do Brasil ao Tratado de Budapeste.

Atualmente o INPI aceita o depósito de material biológico para fins de patente apenas nas IDAs, de modo que, a adesão do Brasil ao Tratado, além de não acarretar em nenhuma alteração de procedimentos já adotados pelo INPI trará benefícios para diferentes grupos como os depositantes de patentes brasileiros, que poderão depositar material biológico em uma IDA localizada em território nacional, quando esta for reconhecida pela OMPI (com diminuição de custos e burocracia); as instituições nacionais qualificadas, que poderão ser reconhecidas como IDA e poderão obter novas fontes de receita com o depósito de material biológico, não só depósitos de material biológico de nacionais, mas também de outros países, principalmente países da América Latina, que dispõe de apenas uma IDA, de pequeno porte, no Chile; e a comunidade científica, empresas do setor de biotecnologia e a sociedade brasileira em geral, uma vez que o material depositado nas IDAs torna-se público para fins de pesquisas científicas, desenvolvimento tecnológico e inovação, e estarão mais prontamente acessíveis por estar em territorio nacional.

Esta ação está alinhada ainda com os esforços para a estruturação da Rede Brasileira de Centros de Recursos Biológicos, atualmente chamados de Biobancos (de acordo com a definição na ISO 20.387:18 que traz requisitos gerais para atividades de biobancos), a qual tem como um de seus objetivos o estabelecimento de instituições depositárias de material biológico no Brasil para fins de proteção à propriedade intelectual.

Nos últimos anos, foi demonstrado, portanto, que a não participação do Brasil no Tratado de Budapeste culmina no encarecimento e maior dificuldade no processo de reivindicação de proteção patentaria de inventores e depositantes os quais desejem protocolar em múltiplos países um pedido de invenção cuja existência de um microrganismo como elemento inovador tecnológico encontre-se presente.

Assim, uma vez elencados apenas argumentos favoráveis à adesão do Brasil ao Tratado de Budapeste, entendeu-se como oportuno o momento de considerar a existência de IDAs em território brasileiro como instrumentos de segurança jurídica e facilitação logística a inventores e depositantes.

Diante deste cenário, por intermédio de uma solicitação feita pelo Poder Executivo, foi elaborado e submetido para apreciação dos membros do Congresso Nacional nos termos do disposto no art. 49, inciso I, combinado com o art. 84, inciso VIII da Constituição Federal, o Projeto de decreto Legislativo 466/22, cuja proposta reside na análise da pertinência de adesão do país ao Tratado de Budapeste. O referido PDL 466/22 encontra-se neste momento pendente de tramitação em apenas uma comissão permanente da Câmara dos Deputados, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania - CCJC, sendo a matéria ainda sujeita a apreciação no plenário da casa4.

Conclusão

A iminente assinatura do Tratado beneficia portanto o desenvolvimento e inovação na área de biotecnologia ao permitir redução de custos e simplificação de procedimentos para usuários do sistema de patentes no Brasil, bem como o fortalecimento dos Biobancos microbianos e de culturas de células que venham a ser credenciados como IDA e organizados em uma nova rede brasileira, que poderão passar a prestar mais um importante serviço, o depósito de materiais biológicos relacionados a pedidos de patentes.

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1 https://www.wipo.int/budapest/en/

2 Após passado o período de sigilo o material biológico pode ser acessado para fins de pesquisa, e, uma vez finda a vigência da patente, o material biológico passa a estar em "domínio público", podendo ser acessado sem restrições de uso.

3 Revogada pela Portaria MCTIC nº 4.262, de 23.8.19.

4 https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2343485

Irene von der Weid Chefe da Divisão de Estudos e Projetos, Diretoria de Patentes, INPI. Manuela da Silva Gerente Geral do Biobanco Covid-19 da Fiocruz, Fundação Oswaldo Cruz/Fiocruz. Luiz Ricardo Marinello Mestre em Direito pela PUC/SP; Professor na INSPER em Contratos de PI; Professor em Especialização de PI na ESA/SP; Coordenador de Comitê na ABPI; Diretor da ASPI; sócio de Marinello Advogados;

Timothy Snyder on Ukraine, and the duty for Americans and Europeans: Would you sell them out?

Would you sell them out?

A question for American lawmakers about Ukraine

Timothy Snyder

November 8, 2023

 

Imagine that freedom was in decline around the world.  Imagine that things had gotten so bad that a dictatorship actually invaded a democracy with the express goal of destroying its freedoms and its people.  And yet... imagine that this people fought back.  Imagine that their leaders stayed in the country.  Imagine that this people got themselves together, supported and joined their armed forces, held back an invasion of what seemed like overwhelming force.  Imagine that their resistance is a bright moment in the history of democracy this whole century.  We don't have to imagine: that attack came from Russia and those people are the Ukrainians.  Would you sell them out?

Americans have an alliance in North America and Europe which has existed for more than seventy years, with the goal of preventing an attack from the Soviet Union and then from Russia.  Imagine that, when the Russian attack came, the hammer fell on a country excluded from that alliance.  Ukraine indeed took the entire brunt of the invasion, resisted, and turned the tide: a task assigned to countries whose economies, taken together, are two hundred fifty times larger than Ukraine's.  In so doing, Ukraine destroyed so much Russian equipment that a Russian attack on NATO became highly improbable.  With the blood of tens of thousands of its soldiers, Ukrainians defended every member of that alliance, making it far less likely that Americans would have to go to war in Europe.  Would you sell them out?   

(If there is anyone out there who still thinks that NATO had anything to do with Russia’s invasion of Ukraine, consider this: invading Ukraine made Russia far more vulnerable. If Russia actually feared NATO, invading Ukraine would be the last thing it would do. Russian leaders are perfectly aware that NATO will not invade Russia, which is why they can pull troops away from the borders of NATO members Norway and Finland and send them to kill Ukrainians.) 

For this whole century, American politicians and strategists of all political orientations have agreed that the greatest threat for a global war comes from China.  The scenario for this dreadful conflict, in which hundreds of thousands of American soldiers could fight and die, is a Chinese offensive against Taiwan.  And now imagine that this can defused at no cost and with no risk.  The offensive operation the Chinese leadership is watching right now is that of Russia against Ukraine.  Ukrainian resistance has demonstrated how difficult a Chinese offensive operation in the Pacific would be.  The best China policy is a good Ukraine policy.  Will we toss away the tremendous and unanticipated geopolitical gain that has been handed to us by Ukraine?  There is nothing that we could have done on our own to so effectively deter China as what the Ukrainians are doing, and what the Ukrainians are doing is in no way hostile towards China.  Ukrainians are keeping us safe in this as in other ways.  Would you sell them out?

Imagine, because it's true, that the whole world is watching the war in Ukraine.  From everyone else's point of view, whether they like us, hate us, or don't care about us, Ukraine seems like an obvious ally and an easy win for the United States.  Anyone around the world, regardless of their own ideology, knows that Ukraine is a democracy and America is supposed to support democracies.  Anyone around the world, regardless of the state of their own economy, knows that our economy is enormous, far larger than Russia's, and that economic strength wins wars.  Anyone around the world can easily see that Americans are not at risk in Ukraine, and that Americans draw extraordinary moral and geopolitical gains from Ukrainian resistance.  From the point of view of all observers, in other words, defunding Ukraine would demonstrate enormous American weakness.  Is that the face we want to show the world?  Do we want to tell everyone that we are unreliable and unaware of our own interests?  Ukrainians, with American help, make Americans look sensible and strong.  Would you sell them out?

Imagine that this is a winnable war, because it is. Russia's main strategic objective, the seizure of Kyiv, was not achieved.  Ukraine won the Battle of Kyiv.  Russia was forced to retreat from Kyiv and Chernihiv and Sumy oblasts.  Imagine the Russia's campaign to take Kharkiv failed.  Ukraine won the Battle of Kharkiv.  Imagine that Kherson, the one regional capital Russia has taken in this war, was taken back by Ukraine.  Ukraine won the Battle of Kherson.  Snake Island, lost early in the war, has been taken back by Ukraine.  Ukraine has taken back more than half of the territory seized by Russia in this invasion.  Knowing that all is this is true, imagine that Putin knows it too.  Russia's main offensive instrument, the paramilitary Wagner Group, staged a coup against Putin and that Putin had to kill its leader.  Imagine that Putin knows he cannot really take much more Ukrainian land -- not without American help, anyway.  Ukraine has a theory of victory that involves gains on the battlefield. Putin has a theory of victory that involves votes in the US Congress. Putin thinks that he has a better chance in the Capitol than he has in Kyiv.  Should we prove him right?

Imagine a world food system with Ukraine as a major node.  In normal times Ukraine can feed four hundred million people, and usually the UN World Food Program depends upon Ukraine.  Ukrainian exports feed some of the most sensitive parts of the Middle East and Africa.  Much of the instability in those regions is related to shortages of food.  Russia has destroyed a major dam to destroy Ukrainian farmland.  And mined Ukrainian farms on a huge scale.  Russia targets ports and grain storage facilities with its missiles, and claims the piratical right to stop all shipping on the Black Sea with its navy.  And yet...  Imagine that Ukrainians resist here as well.  Ukrainians farmers are hard at work.  Ukraine still supplies food to the World Food Program.  Ukrainians, through their own innovative weapons and clever tactics, managed to intimidate the Black Sea Fleet and open a lane for commercial shipping.  That they are feeding the people who needed to be fed.  Would you sell them out?

Imagine that we were a country that cared about war crimes.  And imagine that there was a law, an international genocide convention, that defined five actions that constitute genocide, and that Russians have committed every one of these crimes in Ukraine.  I cannot keep on writing about "imagining" when I have seen some of the death pits myself.  I cannot say "imagine" when writers I know have been murdered because they represent Ukrainian culture.  I cannot stay with my device when I read that the Russian state boasts of having taken 700,000 Ukrainian children to be russified, when every day Russian propagandists make clear that Russian war aims are exterminationist.  And yet Ukrainians resist and persist.  This is a genocide that can be stopped, that is being stopped.  We are living within the scenario, the one we say that we have been waiting for, when American actions can stop a genocide, simply by helping the people who have been targeted, simply by paying their taxes.  Whenever the Ukrainians take back land, they rescue people.  This is how they think of their liberated territories: as places where no more children will be kidnaped, no more civilians will tortured, no more local leaders will be murdered.  Would you sell out a people to a genocidal occupation?  A people that has done nothing but good for you?

I have heard the excuse that Americans are "fatigued."  I have been in Ukraine three times since the war began.  I have been in the capital and in the provinces.  I have seen almost no Americans, fatigued or otherwise, in the country.  And that is for the simple reason that we are not in Ukraine.  How can we be fatigued by a war we are not fighting?  When we are not even present?  This makes no sense.  It causes no fatigue to give money to the right cause, which is all that we are doing.  It feels good to help other people help themselves in a good cause.  

If we stop supporting Ukraine, then everything gets worse, all of a sudden, and no one will be talking about “fatigue” because we will all be talking about disaster: across all of these dimensions: food supply, war crimes, international instability, expanding war, collapsing democracies. Everything that the Ukrainians are doing for us can be reversed if we give up. Why would lawmakers even contemplate doing so?

If you happened to know lots of Ukrainians, as I do, you would know people who have been wounded or who have been killed.  You would know people who get through their days with dark circles around their eyes, because everyone has dark circles around their eyes.  You would know people who have lost someone, because everyone has lost someone.  You would know people who are grieving and yet who are nevertheless doing what they can do.  You would not know anyone in Ukraine who believes that fatigue is a reason to give up.  Would you sell such people out?

I have heard the other excuse: that we need to audit the weapons we send to Ukraine.  The expenses are minimal and the gains are great: a nickel on our defense dollar, achieving what we cannot ourselves do with all the rest.  And here's the thing: the weapons we send to Ukraine are the only ones in our stockpiles that are being audited.  They are being audited not by accountants in suits and ties but by men and women in camouflage.  They are being used and used well by people whose lives are at stake and whose country's future is at stake.  Ukrainians have used American air defense more effectively than anyone knew that it could be used.  

Ukrainians are using American missiles that we consider outdated to destroy the most advanced Russian assets.  Ukrainians are taking American weapons built in the last century and using them to defend themselves and the rest of us in this one.  In large measure they are literally using arms that we would otherwise be paying to disassemble because we regard them as obsolete.  

If that battlefield audit done by the Ukrainian army is not good enough: well, then, by all means, American lawmakers, come and visit Ukraine and see for yourself.  You and your staffers would be very welcome.  Ukrainians want you to come. It would be a very good thing if more of us visited Ukraine.

I will tell you what I witnessed in Ukraine: when Ukrainians see American weapons systems, they applaud.  Would you sell them out?


O BOLSONARISMO NO ITAMARATY DE LULA - Ana Clara Costa (Piauí)


O BOLSONARISMO NO ITAMARATY DE LULA

Gestão petista deu destino menos implacável a embaixadores engajados no governo anterior

Ana Clara Costa|

Piauí, 08 nov 2023_09h36 

https://piaui.folha.uol.com.br/itamaraty-lula-diplomatas-bolsonarismo-cargos/?utm_source=pushnews&utm_medium=pushnotification


Quando Jair Bolsonaro ganhou a eleição em 2018 e Ernesto Araújo assumiu o Itamaraty, Mauro Vieira, hoje chanceler de Lula, era embaixador do Brasil nas Nações Unidas, em Nova York. Vieira foi enviado ao cobiçado posto na cidade americana por determinação de Michel Temer, assim que o emedebista assumiu o governo, depois do impeachment. O diplomata era ministro das Relações Exteriores de Dilma Rousseff, mas tinha relações tão cordiais com o MDB que Temer até cogitou mantê-lo na chefia do Itamaraty. Não fez o convite porque o posto foi reivindicado pelo PSDB, que participou do enclave para derrubar a petista. Assumiu José Serra.

Vieira partiu para Nova York com poder, mas não se esqueceu dos amigos de outrora. Quando, em 2016, Dilma decidiu fazer uma peregrinação junto aos organismos internacionais para denunciar que sofreu um golpe, o secretário-geral do Itamaraty tucano, Marcos Galvão, avisou as representações brasileiras na ONU que não recebessem a ex-presidente, como forma de invalidar seu discurso. A embaixada em Genebra cumpriu à risca a ordem. Mas Vieira não só a recebeu em Nova York, como a hospedou em sua residência, juntamente com sua comitiva, que incluía o assessor internacional petista Marco Aurélio Garcia. Dizia que, em sua embaixada, mandava ele.

Sob Bolsonaro, Vieira ainda permaneceu alguns meses em Nova York. Sua partida foi selada quando o diplomata se insurgiu contra uma orientação vinda de Brasília. O Itamaraty de Ernesto Araújo ordenou que o Brasil mudasse seu voto sobre o embargo americano a Cuba – o país historicamente, em todos os governos, votava contra o embargo. Vieira enviou três telegramas a diferentes departamentos da chancelaria brasileira informando as razões pelas quais o voto não deveria ser mudado. Ao assinar os telegramas, colocou apenas suas iniciais, e não as de seus subordinados – o que seria praxe nesse tipo de documento. Queria que a culpa da insubordinação recaísse apenas sobre si. Seus apelos não funcionaram, o Brasil mudou o voto e, poucas semanas depois, seu nome foi designado para comandar a embaixada de Zagreb, na Croácia, um posto sem muita importância. Os outros dois ex-chanceleres da petista também foram transferidos para lugares distantes e de menor relevância para a diplomacia brasileira: Antonio Patriota foi despachado para o Cairo, no Egito, e Luiz Alberto Figueiredo, para o Catar.

A atitude persecutória de Araújo tinha um agravante. Vieira foi um dos principais apoiadores de sua carreira diplomática. Quando foi embaixador em Washington, em 2010, o diplomata convidou Araújo para integrar sua equipe de assessores diretos. Nesse período vivendo nos Estados Unidos iniciou-se sua inflexão ao olavismo. Quando Vieira virou chanceler de Dilma, em 2015, trouxe Araújo para trabalhar em seu gabinete. Em uma entrevista à repórter Consuelo Dieguez, da piauí (O chanceler do regressopiauí_151, abril de 2019)Araújo contou que, justamente nesse período em que se adensavam as manifestações contra a petista, ele um dia deixou o gabinete e fora para a rua gritar “Fora Dilma”. “Foi libertador poder gritar pelo impeachment de Dilma, por Lula na cadeia”, disse o chanceler, à época, à repórter. Com Temer, Araújo, já convertido ao radicalismo olavista e tendo publicado textos que reforçavam sua visão, foi promovido a embaixador.

De volta ao poder, Mauro Vieira decidiu desde a largada que evitaria o revanchismo. Seu intuito era acalmar os ânimos na instituição, uma das mais afetadas pela agenda bolsonarista de combate ao que entendem por “globalismo”. De tanto conceder, porém, Vieira também acabou desagradando os que não capitularam sob Bolsonaro – e agora reclamam dos postos prestigiados de alguns de seus apoiadores e da falta de punição. A começar pelo próprio Araújo, que embora tenha feito o que fez na instituição e, depois da vitória de Lula tenha dito em uma live que o novo governo deveria ser derrubado, mantém-se, para todos os efeitos, na carreira. Hoje licenciado e sem remuneração, vive em Hartford, nos Estados Unidos, onde sua mulher, Maria Eduarda Seixas Corrêa, tem um cargo consular.

Carlos Alberto França, que o sucedeu na chancelaria, tornou-se embaixador do governo Lula no Canadá. Vive em Ottawa. Nestor Forster, nomeado por Bolsonaro para comandar a embaixada brasileira em Washington e conhecido por ter apresentado Araújo ao olavismo, foi transferido para o mesmo país: é cônsul em Vancouver. Ambas as nomeações são vistas por alguns diplomatas da instituição como prêmios, em razão da localização geográfica privilegiada. Internamente, a explicação é que França ajudou a construir uma boa transição. Procurou Celso Amorim logo após a vitória de Lula e se colocou à disposição para ajudar. Enquanto muitos ministros de Bolsonaro nem sequer participaram da transmissão de posse, França compareceu à sua e fez um discurso avaliado pelos pares como ponderado. Apesar do ambiente político ainda conflagrado, o ex-chanceler tinha esperanças de ser enviado a algum país europeu. Ganhou o Canadá, o que terminou recebendo de bom grado, embora tenha feito pedidos para cargos de seus subordinados que não foram acatados.

Outro expoente do bolsonarismo, o diplomata Marcos Sperandio, que foi chefe do cerimonial do Palácio do Planalto depois que França, que ocupava o cargo, virou chanceler, está num posto de prestígio na embaixada em Washington. É um dos quatro ministros-conselheiros da embaixadora Maria Luiza Viotti. Ele fora transferido ainda durante o governo Bolsonaro, num posto que fora criado justamente para a sua nomeação. Antes, Forster, que antecedeu Viotti, só dispunha de três ministros-conselheiros.

Apesar do descontentamento de alguns diplomatas, Vieira tem tido o aval de Lula para manter sua posição. Ao assumir, preservou no posto o embaixador brasileiro em Madri, Orlando Leite Ribeiro, que foi secretário da então ministra da Agricultura, Tereza Cristina, antes de ser enviado à Espanha pelo ex-presidente. Vieira tampouco removeu o embaixador brasileiro em Portugal, Raimundo Carreiro, ex-ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), indicado ao cargo por Bolsonaro e amigo de José Sarney.

Quando Lula reclamou com o chanceler sobre haver apoiadores do ex-presidente em bons postos diplomáticos, Vieira respondeu que, se fosse remover todos que serviram ao governo anterior, muitos cargos ficariam vazios. Lula retrucou que quando fosse a Portugal e Espanha, não desejava encontrar-se com os respectivos embaixadores ao longo da viagem. E assim foi feito. Lula tampouco quis cruzar com Nestor Forster quando viajou a Washington, em fevereiro deste ano. Para evitar maiores desconfortos, o então embaixador, que ainda não havia sido removido do cargo, tirou férias durante a visita do presidente.

Outra designação que tem causado polêmica é a do embaixador Eduardo Saboia, que em 2013 ajudou na fuga do ex-senador boliviano Roger Pinto Molina, que estava asilado havia quinze meses na embaixada brasileira em La Paz. Molina fazia oposição a Evo Morales e a atitude de Saboia, que também serviu no gabinete de Celso Amorim quando ele era chanceler de Lula, acabou motivando a queda de Antonio Patriota do posto de ministro. Dilma determinou que Saboia fosse punido, ficando sem designação durante todo o seu governo.

Sob Temer, o diplomata foi tirado do limbo. Bolsonaro também o manteve em bons postos e, em 2022, foi designado para chefiar a secretaria de Ásia e Pacífico do Ministério. Vieira manteve a nomeação. Quando, na cúpula dos Brics, em Joanesburgo, em agosto deste ano, Dilma Rousseff cruzou olhares com Saboia, reclamou com Lula, de forma bastante enfática, que o diplomata estivesse ali depois de tudo o que ocorreu no passado. Afirmou sentir-se desrespeitada. Celso Amorim presenciou as críticas, mas deu de ombros, dizendo que o Itamaraty já não era mais sua atribuição. Vieira soube do ocorrido, mas mesmo assim o manteve no posto, onde Saboia permanece até hoje.

 

Obolsonarismo foi um período difícil para a diplomacia brasileira por exigir que, em muitos casos, diplomatas fossem cobrados a sair em defesa do ex-presidente. Contudo, segundo membros da instituição ouvidos pela piauí, havia formas de navegar a tormenta com relativa dignidade, mantendo o mínimo de imparcialidade. Não foi o caso do embaixador Frederico Arruda, que serviu o governo Bolsonaro em Londres e foi um dos defensores mais fervorosos do ex-presidente. Arruda trabalhou na assessoria internacional de Michel Temer e fora despachado para Londres numa vaga interina ainda durante a gestão do emedebista, em 2016. Fez duras críticas a Dilma na imprensa britânica até ser empossado embaixador, de fato, em 2018. Seu nome teve amplo apoio do Senado, que tem o papel de avalizar todos os chefes de embaixadas.

Em junho de 2020, quando o jornal britânico Financial Times fez um editorial relatando temor pela democracia brasileira no auge das manifestações estimuladas por Bolsonaro contra o STF, durante a pandemia, Arruda rapidamente se manifestou. Numa carta ao jornal, disse que o FT “superdramatizava” a situação e que Bolsonaro em nenhum momento atentou contra as instituições. No ano anterior, ao The Guardian, Arruda escreveu condenando parlamentares britânicos que criticavam as razões da prisão de Lula. Em setembro de 2022, durante o velório da Rainha Elizabeth, recebeu o pastor Silas Malafaia, cabo eleitoral, com pompa e circunstância. De sua sacada em Londres, durante a mesma viagem, Bolsonaro fez um discurso de campanha, dizendo: “Não tem como eu não ganhar no primeiro turno”. Arruda foi tirado de Londres este ano, mas segue embaixador do governo Lula – agora na Austrália.

Um dos poucos, de fato, punidos foi Luís Fernando Serra, que comandava a embaixada em Paris. Serra esticou a corda como nenhum outro membro da Casa. No auge da pandemia, em maio de 2020, enviou carta ao jornal Le Monde dizendo que a conduta de Bolsonaro era exemplar, que ele jamais negara a gravidade do vírus e que os que atentavam contra a população eram justamente os governadores brasileiros, que desejavam desestabilizar o governo. Serra também condenava as medidas de isolamento social. No ano seguinte, quando os hospitais brasileiros não suportaram o número de internações e os cemitérios criaram valas para enterrar mortos, Serra culpou a esquerda pela falta de estrutura hospitalar.

Em 2020, convidado para comparecer a um Congresso brasilianista em Paris, Serra declinou sua presença ao saber que haveria uma homenagem à vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018. 

Serra foi tirado de Paris ainda no final de 2022 e transferido para a representação do Itamaraty no Rio de Janeiro – o equivalente ao “Departamento de Escadas e Corredores”, maneira jocosa com que os diplomatas se referem a quando um de seus pares fica sem função na Casa. Deve aposentar-se compulsoriamente em dezembro, quando completa 74 anos.

 

 

Seminário "Uma Nova Agenda de Infraestrutura para a América do Sul" - Nota do Itamaraty

 Ministério das Relações Exteriores

Assessoria Especial de Comunicação Social 

Nota nº 516

7 de novembro de 2023

 

Seminário "Uma Nova Agenda de Infraestrutura para a América do Sul" – 6 e 7 de novembro de 2023

 

Realizou-se, nos dias 6 e 7 de novembro, no Instituto Rio Branco, em Brasília, o seminário “Uma Nova Agenda de Infraestrutura para a América do Sul”. O evento, apoiado pela ABC e pelo IPEA, integra o calendário de atividades realizadas no contexto de implementação do Consenso de Brasília e de seu Mapa do Caminho para a Integração da América do Sul, documentos adotados pelos presidentes sul-americanos em 30 de maio e 5 de outubro últimos, respectivamente.

O seminário contou com quatro painéis. No primeiro, foram discutidos, a partir da experiência da Iniciativa para a Integração Regional Sul-americana (IIRSA) e do Conselho Sul-Americano de Infraestrutura e Planificação (COSIPLAN) da UNASUL, critérios para identificação de projetos prioritários de infraestrutura, com apresentações de representantes da CEPAL, Tribunal de Contas da União, IPEA e da Universidad Nacional de San Martín, da Argentina. O segundo painel foi dedicado aos desafios do financiamento da infraestrutura da região e contou com expositores do Banco Mundial, FONPLATA, BID e CAF.

O terceiro painel tratou de aspectos operativos e regulatórios que devem ser levados em consideração para facilitar a integração da infraestrutura regional. O quarto e último painel chamou a atenção para a importância de incorporar a dimensão sócio ambiental na definição das iniciativas de integração da infraestrutura regional. Participaram dos painéis representantes de SELA, INFRA S.A, MDIC, OCDE, UFRJ, PUC-Rio e CEPAL

O seminário contou com a participação de representantes de vários órgãos do governo brasileiro com atuação na área de infraestrutura e permitiu um amplo intercâmbio sobre os principais aspectos que devem pautar a retomada do diálogo regional sobre o tema. Ao final do seminário, foi realizada sessão de trabalho entre os representantes dos 12 países em que se discutiram possíveis linhas de ação para aprofundar a cooperação nessa matéria.

A íntegra dos debates está disponível no seguinte link: <https://www.youtube.com/watch?v=FzlaR2L0kvo>.

  

[Nota publicada em: https://www.gov.br/mre/pt-br/canais_atendimento/imprensa/notas-a-imprensa/seminario-uma-nova-agenda-de-infraestrutura-para-a-america-do-sul-2013-6-e-7-de-novembro-de-2023 

El pulso de Maduro por el Esequibo: ¿estamos ante una guerra en el Caribe? - Roberto Mansilla Blanco (ES Global)

 

El pulso de Maduro por el Esequibo: ¿estamos ante una guerra en el Caribe?

Referendo venezuelano para anexar metade da Guiana: um desafio para o Brasil - Marcelo Godoy (OESP)

A ameaça bélica que vem da Venezuela e vira dor de cabeça para os EUA e para Lula 

Marcelo Godoy

O Estado de S. Paulo, 8/11/2023

Regime de Maduro convoca referendo para população votar sobre anexação de mais de metade da Guiana; generais venezuelanos apoiam ação São cinco perguntas.


 Elas serão respondidas no dia 3 de dezembro pelos venezuelanos no referendo convocado pelo regime de Maduro para saber se o país deve anexar pouco mais da metade da vizinha Guiana. No momento em que o mundo vive as guerras da Ucrânia e de Gaza e assiste à ameaça chinesa a Taiwan, a Venezuela leva adiante o plano de tomar o território de Essequibo, uma área de 159 mil km² rica em petróleo e minérios. 

 Trata-se de uma disputa territorial que tem origem no século 19, quando a Inglaterra reclamou a região como parte de sua Guiana. Uma arbitragem internacional patrocinada pelos EUA lhe deu razão. O resultado foi contestado pela Venezuela e nova discussão ocorreu em 1966, quando a Guiana se tornou independente. Tudo foi retomado agora por Nicolás Maduro. Como resposta ao referendo do vizinho, a Guiana apelou à Corte Internacional de Justiça de Haia, a fim de que ação venezuelana seja declarada ilegal. A Corte se reunirá para examinar o caso no dia 14. 

O problema é que a disputa deixou de ser entre uma potência colonial e uma nação sul-americana para envolver dois países da América do Sul. Enquanto isso, o ministro da Defesa da Venezuela, general Vladimir Padrino, manifesta-se diariamente pela anexação do território entre os Rios Cuyuni e Essequibo. O general, um dos homens fortes do regime, disse no dia 25 de outubro: “Nós nos somamos ao poder eleitoral nessa consulta popular para a defesa da Guiana Essequiba, um dever das e dos venezuelano. 

Nos vemos no dia 3 de dezembro!” O general Domingo Hernández Lárez, comandante estratégico-operacional das Forças Armadas da Venezuela, também fez publicações apoiando o referendo: “O Essequibo é da Venezuela!”. Vídeos com deslocamento de tropas para a “frente de Essequibo”, próxima a Roraima, foram publicados, como o do vice-almirante Ashraf Abdel Hadi Suleimán Gutiérrez, que disse à tropa formada: “Esse território, por sua história, pela lei e pela tradição é da Venezuela”. Em seguida, ouve-se os “urras” de seu soldados. 

O próprio Maduro publicou imagens de desfiles militares com a palavras de ordens sobre Essequibo. Diante da escalada, pode-se perguntar: além do direito internacional, de quais meios de dissuasão a Guiana dispõe? O maior é o Comando Sul, dos EUA, país cujos recursos já estão ocupados em se opor ao Irã, à Rússia e à China. Os marines se exercitaram em Georgetown em julho. A um ano do voto, Biden vê surgir nova ameaça. E o que o Itamaraty tem a dizer sobre a crise que se avizinha? Tudo pode ser só mais uma bravata de Maduro. Mas, se há dúvida, quem vai garantir a integridade da Guiana até Haia se manifestar? Ou Lula vai pedir a paz só depois de um novo fato consumado?