Este blog não se ocupa diretamente de questões políticas, pelo menos não de temas partidários, ou de eleições e preferências políticas. Ele se ocupa de ideias, entre outras ideias politicas, mas sobretudo de princípios, valores, políticas públicas. Ele pretende preservar a dignidade das boas ideias politicas e contribuir para a melhora dos "costumes políticos" no Brasil.
Eu raramente, ou quase nunca, postaria uma matéria como essa que vai abaixo, se não fosse por uma legítima indignação com a mentira, a desfaçatez, a cara-de-pau e a sem-vergonhice, tão evidentes no tema básica.
Ou seja, o partido que vem usando golpes baixos, que vem montando dossiês e que mente desbragadamente com respeito a suas patifarias pretende acusar os adversários de fazer todas aquelas trapaças às quais ele mesmo recorre e usa extensa e intensivamente.
Como se diz em linguagem popular: é muita cara-de-pau.
Creio que atitudes como essa, merecem denúncia e repúdio indignado, pelo menos da parte de todos aqueles que gostariam de ver uma campanha presidencial de alto nível, com eleições marcadas pela lisura, pelo debate aberto, pela sinceridade de propósitos, enfim.
Minha contribuição à campanha atual, para manter meus princípios e valores, seria confirmar meu total repúdio a esse tipo de atitude, e dizer o que segue:
1) A campanha política será marcada por uma disputa eleitoral entre dois candidatos em torno dos quais se dará o debate político sobre como cada um pretende conduzir a próxima presidência, com base nas suas percepções pessoais sobre os problemas principais do Brasil e suas propostas de soluções. Não estão em causa a administração FHC e sequer a de Lula. As manipulações e tentativas para desviar o foco do debate e orientá-lo em comparações com o passado são a meu ver equivocadas.
2) A acusação de que a oposição aposta no "quanto pior melhor" é de absoluta má-fé e de distorção da verdadeira realidade. Quem recorre a todos os expedientes para tentar ganhar é o PT, que intervem vergonhosamente num diretório estadual para distorcer a vontade de seus militantes e quadros regionais.
3) Acusar alguém de "submissão internacional" é de tão baixo nível que sequer cabe uma rejeição desse inventado propósito, feito de má-fé, numa atitude praticamente criminosa.
4) Finalmente, quando aos grandes temas propostos para campanha -- "reforma agrária, democratização da comunicação social e implantação do imposto sobre grandes riquezas" -- minhas únicas observações são estas: reforma agrária é uma questão praticamente marginal hoje em dia, pertencendo ao Brasil de um passado de agricultura atrasada e pouco capitalizada; "democratização da comunicação social" é um outro nome para a tentativa autoritária e liberticida de controlar a imprensa, criando o que se chama de "grande irmão censor"; imposto sobre as grandes fortunas pode até ser discutido, mas num contexto eleitoral significa pretender fazer demagogia classista, jogando os pobres contra os ricos, para tentar fazer crer que os pobres estariam em melhor situação se esse imposto fosse criado, já que anima a sanha distributivista dos ingênuos, que não sabem que seria mais uma maneira de dar dinheiro a um Estado já superdimensionado, um ogro insaciável em sua extorsão tributária.
Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 16.06.2010)
PT volta a atacar imprensa e fala em manipulação
Leila Suwwan
O Globo, 16/06/2010
Partido aprova resolução afirmando que oposição usará golpes baixos e grandes meios de comunicação na campanha
Resolução política do PT aprovada na última sexta-feira ataca a imprensa e afirma que a disputa será marcada por "golpes baixos" e "tentativa de manipulação dos meios de comunicação". O documento afirma que a oposição e seus "apoiadores nos meios de comunicação" tentarão influenciar o resultado da eleição. Também conclama a militância a transformar os esforços da chapa Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (PMDB) em uma campanha de massas, e a insistir na comparação entre os governos de Lula e Fernando Henrique Cardoso.
O documentou resultou da reunião do Diretório Nacional do partido, semana passada, em São Paulo, e foi divulgado no site do PT. Na mesma reunião, foi decidida a intervenção no diretório regional do Maranhão para garantir o apoio à reeleição de Roseana Sarney (PMDB) para o governo. O diretório regional havia optado pelo apoio a Flávio Dino (PCdoB).
O documento já antecipava orientações presentes também no discurso do presidente Lula na convenção do partido, no último domingo, quando ele avaliou como "quase absoluta" a chance de vitória. "Devemos estar preparados para uma campanha de golpes baixos. (...) E que sinaliza qual será o comportamento de uma parte da oposição durante nosso futuro governo", diz o texto do partido.
O documento afirma que "a oposição e seus apoiadores nos meios de comunicação já demonstraram, por diversas vezes, estar dispostos a absolutamente tudo para tentar ganhar as eleições". "Farão de tudo para levar a eleição ao segundo turno, apoiando outras candidaturas, estimulando a judicialização da política, usando os grandes meios de comunicação como boletins de campanha, atacando os direitos humanos, torcendo para que a nova etapa da crise internacional altere para pior as condições do Brasil, produzindo crise cambial, alta de juros e primarização de nossa pauta de exportações."
O diagnóstico é baseado em acontecimentos das últimas semanas, sem citar o suposto dossiê e acusando o candidato tucano, José Serra, de usurpar mensagens de continuidade. A análise do partido é de que a estratégia do PSDB não teve êxito. Fala em dianteira nas pesquisas, crescimento de Dilma e "estancamento" de Serra - os candidatos estavam tecnicamente empatados nas últimas sondagens. O PT pede que a militância "não baixe a guarda".
O texto acusa o tucano José Serra de "submissão" internacional: "O candidato da oposição ataca a política externa brasileira, deixando evidente que sua opção é pela submissão aos poderosos de ontem, sem perceber que o mundo está mudando e que nosso país já é um dos protagonistas de uma nova época que está nascendo".
A resolução apresenta uma espécie de manual para discussões eleitorais, ancorado na comparação entre os governos Lula (2003-2010) e Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).
"Interessa explicar as vantagens do modelo de partilha frente ao modelo de concessão; o papel decisivo que os bancos públicos jogaram, para evitar os efeitos mais perversos da crise internacional; o papel da elevação do salário mínimo e de programas de transferência de renda, para estimular um mercado interno que sustentou o crescimento do país", afirma o documento.
O texto pede o envolvimento dos partidos de esquerda, movimentos sociais e intelectuais para aprofundar o caráter popular do governo e alcançar três objetivos: reforma agrária, democratização da comunicação social e implantação do imposto sobre grandes riquezas.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
quarta-feira, 16 de junho de 2010
Por que o Brasil nao vai crescer? duas respostas prontas (e frescas)...
Já fiz dois posts dando as razões de "Por Que o Brasil Não Vai, Não Pode, Não Quer Crescer". Elas são tão evidentes que nem preciso me estender sobre elas (busquem alguns posts atrás, ou usem o instrumento de busca aí do lado).
Creio que vou ter de voltar ao assunto mais vezes, não por que gosto, ou por que pretendo, mas é que as razões são tantas que fica difícil não trazê-las aqui ao conhecimento dos leitores interessados.
Abaixo, vocês têm mais duas, e nem vou comentar, pois acho que não é preciso.
Só falta quantificar os custos diretos (esses são cálculos mais rápidos de fazer) e os indiretos e delongados (mais difíceis, pois as consequências vão se estender durante quarenta anos ou mais, e vão pesar todo ano cada vez um pouco mais nos nossos bolso).
Aposentados
Lula mantém reajuste de 7,7% e veta fim do fator previdenciário.
Plano de carreira
Lula sanciona plano de carreira da Câmara que garante aumento de até 40%.
Estaria bem assim, ou vocês querem mais?
Resta apenas saber o que, exatamente, o governo vai cortar em termos de serviços para a população -- saúde, educação, segurança -- ou de infra-estrutura que não vai ser construída -- escolas, hospitais, delegacias, estradas, enfim, tudo. Investimentos que já são poucos, vão continuar magros, e em algum momento o governo vai meter um pouco mais sua mão suja no nosso bolso e no caixa das empresas para arrancar um pouco mais de dinheiro. Ou então ele vai produzir inflação.
Esse é o preço de quem pretende ser generoso com quem não deveria...
Voilà: duas razões para o Brasil não crescer.
Amanhã deve ter mais...
Paulo Roberto de Almeida
(16.04.2010)
Creio que vou ter de voltar ao assunto mais vezes, não por que gosto, ou por que pretendo, mas é que as razões são tantas que fica difícil não trazê-las aqui ao conhecimento dos leitores interessados.
Abaixo, vocês têm mais duas, e nem vou comentar, pois acho que não é preciso.
Só falta quantificar os custos diretos (esses são cálculos mais rápidos de fazer) e os indiretos e delongados (mais difíceis, pois as consequências vão se estender durante quarenta anos ou mais, e vão pesar todo ano cada vez um pouco mais nos nossos bolso).
Aposentados
Lula mantém reajuste de 7,7% e veta fim do fator previdenciário.
Plano de carreira
Lula sanciona plano de carreira da Câmara que garante aumento de até 40%.
Estaria bem assim, ou vocês querem mais?
Resta apenas saber o que, exatamente, o governo vai cortar em termos de serviços para a população -- saúde, educação, segurança -- ou de infra-estrutura que não vai ser construída -- escolas, hospitais, delegacias, estradas, enfim, tudo. Investimentos que já são poucos, vão continuar magros, e em algum momento o governo vai meter um pouco mais sua mão suja no nosso bolso e no caixa das empresas para arrancar um pouco mais de dinheiro. Ou então ele vai produzir inflação.
Esse é o preço de quem pretende ser generoso com quem não deveria...
Voilà: duas razões para o Brasil não crescer.
Amanhã deve ter mais...
Paulo Roberto de Almeida
(16.04.2010)
De servos e de seres livres
Um Anônimo (sempre essas criaturas que têm medo, ou vergonha, de assumir a própria identidade), que se assina como "ex-servo do Olimpo" [no Brasil??!!], escreveu o que segue a propósito deste meu post:
"Por que o Brasil nao vai crescer?"
Anônimo disse...
Apenas se torna incompreensível que o autor do blog seja um funcionário de alto escalão do próprio Estado, que tanto critica, assim como é pago pelo povo que atribui ser o culpado e tolo. Incoerência ou bipolaridade filosófica ? Talvez pura e mera demagogia, pois se realmente fosse adepto de suas próprias convicções já teria saído do Itamaraty e defendido com mais afinco sua visão liberal de menos Estado na economia! Discurso é fácil, ações é que são difíceis de serem realizadas. A maior liderança é a do exemplo ou estou equivocado (a). Escreveu outrora, sobre a dificuldade de se ter empreendendores no Brasil, então, onde fica o exemplo ? Talvez fosse o caso de ler o Monge e o Executivo para tentar ser líder pelo exemplo e não pelo discurso, já basta o nosso presidente com a sua demagogia exacerbada.
Reflita senhor embaixador...assinado um anônimo facilmente identificável como ex-servo do Olimpo.
Então respondo:
Anônimo servo,
Eu acho incompreensível, da minha parte, que alguém se identifique, não como uma pessoa em sua plena capacidade, mas como um servo de qualquer coisa, seja essa coisa o Olimpo, o Nirvana, o Paraíso, um palácio presidencial ou seja lá o que for.
Prefiro ser um ser livre no pântano, no deserto, que seja numa prisão de algum désposta, do que ser servo de qualquer um ou de qualquer "coisa". Mesmo sendo prisioneiro de alguém, conservarei sempre meu espírito de liberdade, e minha vontade própria, de fazer apenas aquilo que a minha consciência me ditar, e não o que for ordenado por alguém.
Também acho incompreensível o fato de você achar incompreensível o fato de alguém que é temporariamente um servidor do Estado deixar a capacidade de pensar com sua própria cabeça e ter de prestar voto de obediência a quem quer que seja. Uma coisa é o desempenho de funções no Estado, algo que pode me ocupar algumas horas do dia. Outra coisa seria alugar a minha consciência e a minha capacidade de pensar com minha própria cabeça a quem quer que seja, ainda que seja o meu chefe imediato.
Saiba Anônimo Servo que jamais eu concordaria com o meu chefe apenas porque ele me disse para fazê-lo, se eu não estiver pessoalmente convencido daquela mesma coisa. Posso até obedecer uma ordem que não seja ilegal, e que não violente minha dignidade, se aquilo fizer parte de minhas funções, mas jamais submeterei minha capacidade cognitiva, minha disposição de pensar com minha própria cabeça apenas porque sou um funcionário do Estado, jamais o servo de um soberano qualquer. O tempo dos súditos já passou há muito tempo, e se fosse o caso, provavelmente eu nunca aceitaria ser súdito de alguém.
Apenas nas ditaduras, e nos regimes servis, somos obrigados a nos conformar com a vontade do soberano.
Em qualquer regime democrático digno desse nome um cidadão qualquer, em qualquer capacidade profissional, tem o direito de não apenas discordar de seus chefes, mas também de chamar o presidente de incompetente, mentiroso, vagabundo, fraudador, demagogo, populista e sem-vergonha (aplique a quem quiser). Nos EUA, pessoas e grupos políticos acusam o presidente Obama de ser um estrangeiro e até de ser um agente inimigo, e não me consta que, enquanto não atentarem contra a segurança física do presidente ou comprometerem a segurança nacional, qualquer um deles esteja sendo ameaçado pelo presidente ou pela presidência da República americana.
Democracias são assim: as pessoas têm o direito de criticar o Estado e de criticar as políticas públicas com as quais não concordam, as simple as that.
Você, que se intitula "servo do Olimpo" -- e que, portanto, deve ter usufruido de uma educação acima da média -- deveria saber disso, e se escolhe ser chamado de "servo" é apenas por um espírito servil que, repito, para mim é incompreensível.
Você me acusa de criticar o Estado que me paga e até o próprio povo, por ser tolo ou até estúpido, por preferir mais Estado, quando este o espolia de mais da metada da sua renda.
Se você, Anônimo servil, se contenta de servir a um Estado assim espoliador, saiba que eu não, e se como você, pretendo o melhor Estado possível para o Brasil e para os seus cidadãos -- mesmo para os mais tolos, que pagam como carneiros todos os seus impostos sem reclamar -- então, se você tivesse um pouquinho de consciência crítica, chegaria à mesma conclusão que eu cheguei: que o Brasil é uma anomalia no conjunto de economias em desenvolvimento: que o Brasil tem uma carga fiscal de país rico para serviços públicos de país miserável.
Saiba que eu nunca vou me conformar com isso, e estarei sempre disposto a criticar o Estado, o povo, o presidente, os anônimos que me escrevem que se conformam com isso.
Como pessoa que não abandona o cérebro em casa quando vai trabalhar, sempre farei o que sempre fiz: expressar exatamente o que penso, e lutar por ideais, princípios, valores e medidas que estimo, com base numa análise racional da realidade, melhores para o meu país e meu povo.
Saiba Anônimo servil, que isso não é demagogia, nem liberalismo, apenas a expressão da melhor política possível para o maior número. Isso se chama racionalidade e independência de pensamento, duela a quien duela, como diria um dos maiores presidentes fraudadores da história do Brasil. Aliás, o fraudador está em boa companhia atualmente.
Se você for sincero, não pode concordar com um Estado que lhe arranca metade da renda e ainda o obriga a comprar no setor privado os serviços -- de educação, de saúde, de transporte, e talvez até de aposentadoria (salvo se você for um privilegiado do setor público) -- que o Estado lhe deveria prover e que não dispensa, ou presta mal, porcamente.
Saiba que mesmo sendo um funcionário público, jamais concordarei com a estabilidade funcional para servidores públicos -- mesmo para diplomatas -- e jamais concordarei com os privilégios de aposentadoria de que somos beneficiários. Tudo isso é uma indignidade para com o povo brasileiro, que trabalha e paga esses privilégios injustificáveis em qualquer país normal.
Termino: não preciso sair do Itamaraty para dizer o que digo, pois nada do que digo tem a ver com a formulação e a execução da política externa e sim com a minha condição de cidadão pagador de impostos, e dono de um cérebro que ainda permanece livre, mesmo alugado por algumas horas para o serviço exterior brasileiro.
Da próxima vez que me escrever, pode até me criticar, mas, por favor, não se qualifique mais como "servo", pois isso o diminui terrivelmente. Continue anônimo, se de desejar, mas preserve a sua dignidade.
Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 16.06.2010)
"Por que o Brasil nao vai crescer?"
Anônimo disse...
Apenas se torna incompreensível que o autor do blog seja um funcionário de alto escalão do próprio Estado, que tanto critica, assim como é pago pelo povo que atribui ser o culpado e tolo. Incoerência ou bipolaridade filosófica ? Talvez pura e mera demagogia, pois se realmente fosse adepto de suas próprias convicções já teria saído do Itamaraty e defendido com mais afinco sua visão liberal de menos Estado na economia! Discurso é fácil, ações é que são difíceis de serem realizadas. A maior liderança é a do exemplo ou estou equivocado (a). Escreveu outrora, sobre a dificuldade de se ter empreendendores no Brasil, então, onde fica o exemplo ? Talvez fosse o caso de ler o Monge e o Executivo para tentar ser líder pelo exemplo e não pelo discurso, já basta o nosso presidente com a sua demagogia exacerbada.
Reflita senhor embaixador...assinado um anônimo facilmente identificável como ex-servo do Olimpo.
Então respondo:
Anônimo servo,
Eu acho incompreensível, da minha parte, que alguém se identifique, não como uma pessoa em sua plena capacidade, mas como um servo de qualquer coisa, seja essa coisa o Olimpo, o Nirvana, o Paraíso, um palácio presidencial ou seja lá o que for.
Prefiro ser um ser livre no pântano, no deserto, que seja numa prisão de algum désposta, do que ser servo de qualquer um ou de qualquer "coisa". Mesmo sendo prisioneiro de alguém, conservarei sempre meu espírito de liberdade, e minha vontade própria, de fazer apenas aquilo que a minha consciência me ditar, e não o que for ordenado por alguém.
Também acho incompreensível o fato de você achar incompreensível o fato de alguém que é temporariamente um servidor do Estado deixar a capacidade de pensar com sua própria cabeça e ter de prestar voto de obediência a quem quer que seja. Uma coisa é o desempenho de funções no Estado, algo que pode me ocupar algumas horas do dia. Outra coisa seria alugar a minha consciência e a minha capacidade de pensar com minha própria cabeça a quem quer que seja, ainda que seja o meu chefe imediato.
Saiba Anônimo Servo que jamais eu concordaria com o meu chefe apenas porque ele me disse para fazê-lo, se eu não estiver pessoalmente convencido daquela mesma coisa. Posso até obedecer uma ordem que não seja ilegal, e que não violente minha dignidade, se aquilo fizer parte de minhas funções, mas jamais submeterei minha capacidade cognitiva, minha disposição de pensar com minha própria cabeça apenas porque sou um funcionário do Estado, jamais o servo de um soberano qualquer. O tempo dos súditos já passou há muito tempo, e se fosse o caso, provavelmente eu nunca aceitaria ser súdito de alguém.
Apenas nas ditaduras, e nos regimes servis, somos obrigados a nos conformar com a vontade do soberano.
Em qualquer regime democrático digno desse nome um cidadão qualquer, em qualquer capacidade profissional, tem o direito de não apenas discordar de seus chefes, mas também de chamar o presidente de incompetente, mentiroso, vagabundo, fraudador, demagogo, populista e sem-vergonha (aplique a quem quiser). Nos EUA, pessoas e grupos políticos acusam o presidente Obama de ser um estrangeiro e até de ser um agente inimigo, e não me consta que, enquanto não atentarem contra a segurança física do presidente ou comprometerem a segurança nacional, qualquer um deles esteja sendo ameaçado pelo presidente ou pela presidência da República americana.
Democracias são assim: as pessoas têm o direito de criticar o Estado e de criticar as políticas públicas com as quais não concordam, as simple as that.
Você, que se intitula "servo do Olimpo" -- e que, portanto, deve ter usufruido de uma educação acima da média -- deveria saber disso, e se escolhe ser chamado de "servo" é apenas por um espírito servil que, repito, para mim é incompreensível.
Você me acusa de criticar o Estado que me paga e até o próprio povo, por ser tolo ou até estúpido, por preferir mais Estado, quando este o espolia de mais da metada da sua renda.
Se você, Anônimo servil, se contenta de servir a um Estado assim espoliador, saiba que eu não, e se como você, pretendo o melhor Estado possível para o Brasil e para os seus cidadãos -- mesmo para os mais tolos, que pagam como carneiros todos os seus impostos sem reclamar -- então, se você tivesse um pouquinho de consciência crítica, chegaria à mesma conclusão que eu cheguei: que o Brasil é uma anomalia no conjunto de economias em desenvolvimento: que o Brasil tem uma carga fiscal de país rico para serviços públicos de país miserável.
Saiba que eu nunca vou me conformar com isso, e estarei sempre disposto a criticar o Estado, o povo, o presidente, os anônimos que me escrevem que se conformam com isso.
Como pessoa que não abandona o cérebro em casa quando vai trabalhar, sempre farei o que sempre fiz: expressar exatamente o que penso, e lutar por ideais, princípios, valores e medidas que estimo, com base numa análise racional da realidade, melhores para o meu país e meu povo.
Saiba Anônimo servil, que isso não é demagogia, nem liberalismo, apenas a expressão da melhor política possível para o maior número. Isso se chama racionalidade e independência de pensamento, duela a quien duela, como diria um dos maiores presidentes fraudadores da história do Brasil. Aliás, o fraudador está em boa companhia atualmente.
Se você for sincero, não pode concordar com um Estado que lhe arranca metade da renda e ainda o obriga a comprar no setor privado os serviços -- de educação, de saúde, de transporte, e talvez até de aposentadoria (salvo se você for um privilegiado do setor público) -- que o Estado lhe deveria prover e que não dispensa, ou presta mal, porcamente.
Saiba que mesmo sendo um funcionário público, jamais concordarei com a estabilidade funcional para servidores públicos -- mesmo para diplomatas -- e jamais concordarei com os privilégios de aposentadoria de que somos beneficiários. Tudo isso é uma indignidade para com o povo brasileiro, que trabalha e paga esses privilégios injustificáveis em qualquer país normal.
Termino: não preciso sair do Itamaraty para dizer o que digo, pois nada do que digo tem a ver com a formulação e a execução da política externa e sim com a minha condição de cidadão pagador de impostos, e dono de um cérebro que ainda permanece livre, mesmo alugado por algumas horas para o serviço exterior brasileiro.
Da próxima vez que me escrever, pode até me criticar, mas, por favor, não se qualifique mais como "servo", pois isso o diminui terrivelmente. Continue anônimo, se de desejar, mas preserve a sua dignidade.
Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 16.06.2010)
terça-feira, 15 de junho de 2010
Um centro de estudos afro-asiaticos que involui para o racialismo...
Recebi, de um expedidor que colocou como assunto "Solicitação de apoio ao pleito do CEAO", a mensagem in fine, que pode ser lida, se alguém desejar, antes desta minha resposta, que segue imediatamente abaixo.
Ao Gabinete da UFBA e ao
Centro de Estudos Afro-Orientais,
Minha opinião, que certamente não será levada em conta, é a de que o Centro seja efetivamente estruturado para servir de instituição de pesquisa, de reflexões e de debates, e até de trabalhos de pós-graduação, nas áreas que eram originalmente as suas, ou seja, o estudo das sociedades da África e da Ásia e suas relações com o Brasil e o continente sul-americano, no contexto da globalização (um termo que não existia quando ele foi criado, mas que já existia como realidade, ainda que colonial e semi-colonial).
As propostas emitidas no comunicado abaixo evidenciam o propósito de interiorizar o CEAO, de torná-lo um centro para o debate (viciado) de temas brasilo-brasileiros, não internacionais, como seria desejável.
Constato que o CEAO se prepara para converter-se em instituto da UFBA para atender ao mesmo tipo de clientela que vem transformando a agenda dos debates sociais e políticos no Brasil, infelizmente para pior.
Também constato, com tristeza, que o CEAO adere ao mesmo tipo de ideologia que, tendo sido importada dos EUA, pretende reproduzir no Brasil um novo tipo de política racialista, de cunho pretensamente afro-brasileira, mas que nada mais vai fazer senão criar um novo Apartheid numa sociedade que não se distinguia até aqui, pelo menos não no plano da cultura social e no das políticas públicas, por políticas e práticas de cunho racialista.
Considero pessoalmente lamentável que a universidade - que segundo o seu nome deveria ser universalista -- esteja aderindo a orientações e práticas divisionistas no pior sentido da palavra, de natureza racial, o que pode até ser inconstitucional.
Lamentável, também, que uma entidade que se pretendia aberta ao mundo, venha a se enclausurar num tipo de debate viciado e vicioso que está dividindo a sociedade brasileira e que ameaça criar -- a despeito de todos os problemas reais de discriminação e de preconceito -- algo que nunca existiu no Brasil: o conflito aberto de raças e talvez até o ódio racial.
Considero essa involução nefasta para o futuro do Brasil como nação integrada e como sociedade multirracial, pois a proposta implícita a esta consulta visa a separar, não a unir pesquisadores em torno de uma agenda comum.
Triste constatar que a universidade brasileira, no caso a baiana, consiga dar um tremendo passo atrás no sentido da construção de uma sociedade inclusiva, e que ela se renda a uma ideologia nefasta da separação racial que certamente vai criar mais problemas do que pretende resolver.
A despeito de ser pela revitalização do CEAO, sou clara e terminantemente contrário à agenda de trabalho que se pretende criar para seus trabalhos.
Atenciosamente,
Paulo Roberto de Almeida
Diplomata e professor universitário
http://www.pralmeida.org
===============
Mensagem recebida em 15.06.2010:
CEAO - Centro de Estudos Afro-Orientais
Colaboradores/as e parceiros/as do CEAO,
No âmbito das comemorações dos 50 anos do Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO), iniciamos o processo de transformação do Centro em uma nova unidade universitária, de caráter multidisciplinar, dedicada aos estudos étnicos, africanos e afro-brasileiros. Na fase atual, o Projeto de criação do novo Instituto, o parecer técnico sobre o projeto e anexos estão disponíveis na página da UFBA (www.ufba.br) para consulta pública, seguindo o que determina o Estatuto da Universidade.
Em 1959, o Centro de Estudos Afro-Orientais foi concebido como um canal de diálogo entre, por um lado, o Brasil e os países africanos e asiáticos e por outro, entre a universidade e a comunidade afro-brasileira. O CEAO, porém, apesar de, esporadicamente, ter se voltado para o estudo e o ensino de assuntos pertinentes ao Oriente Médio e Ásia, inclusive o ensino de línguas (hebreu, japonês, árabe etc.), concentrou seu foco, ao longo dos anos, nos estudos de temas africanos e afro-brasileiros. Mais recentemente o Centro vem atuando em diversas frentes de pesquisa, ensino e extensão num contexto de crescente preocupação com questões raciais no Brasil, participando ativamente do debate sobre as políticas afirmativas. As atividades atualmente desenvolvidas pelo CEAO evidenciam o preparo dessa instituição para dar o salto qualitativo que a transformará numa unidade universitária no âmbito da UFBa.
O novo Instituto tem como missão participar do processo de construção e socialização de conhecimentos sobre as relações étnicorraciais, as culturas e história de países africanos e as culturas africanas no Brasil e em outros países da diáspora, com vistas à formação acadêmica na área multi/interdisciplinar dos estudos étnicos, afrobrasileiros e africanos. Entre os seus objetivos, consta combater, nas suas relações com a sociedade, o racismo, o sexismo e todas as demais formas de opressão e de discriminação.
Através deste documento solicitamos o envio de comentários, sugestões e manifestações de apoio para os seguintes endereços eletrônicos: gabinete@ufba.br e soc@ufba.br com cópia para ceao@ufba.br.
Atenciosamente,
Coordenação do CEAO
Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO)
FFCH-UFBa
CEAO - Centro de Estudos Afro-Orientais
Pç. Inocêncio Galvão, 42, Largo Dois de Julho - CEP 40025-010. Salvador - Bahia - Brasil
Tel (0xx71) 3322-6742 / Fax (0xx71) 3322-8070 - E-mail: ceao@ufba.br - Site: www.ceao.ufba.br
Ao Gabinete da UFBA e ao
Centro de Estudos Afro-Orientais,
Minha opinião, que certamente não será levada em conta, é a de que o Centro seja efetivamente estruturado para servir de instituição de pesquisa, de reflexões e de debates, e até de trabalhos de pós-graduação, nas áreas que eram originalmente as suas, ou seja, o estudo das sociedades da África e da Ásia e suas relações com o Brasil e o continente sul-americano, no contexto da globalização (um termo que não existia quando ele foi criado, mas que já existia como realidade, ainda que colonial e semi-colonial).
As propostas emitidas no comunicado abaixo evidenciam o propósito de interiorizar o CEAO, de torná-lo um centro para o debate (viciado) de temas brasilo-brasileiros, não internacionais, como seria desejável.
Constato que o CEAO se prepara para converter-se em instituto da UFBA para atender ao mesmo tipo de clientela que vem transformando a agenda dos debates sociais e políticos no Brasil, infelizmente para pior.
Também constato, com tristeza, que o CEAO adere ao mesmo tipo de ideologia que, tendo sido importada dos EUA, pretende reproduzir no Brasil um novo tipo de política racialista, de cunho pretensamente afro-brasileira, mas que nada mais vai fazer senão criar um novo Apartheid numa sociedade que não se distinguia até aqui, pelo menos não no plano da cultura social e no das políticas públicas, por políticas e práticas de cunho racialista.
Considero pessoalmente lamentável que a universidade - que segundo o seu nome deveria ser universalista -- esteja aderindo a orientações e práticas divisionistas no pior sentido da palavra, de natureza racial, o que pode até ser inconstitucional.
Lamentável, também, que uma entidade que se pretendia aberta ao mundo, venha a se enclausurar num tipo de debate viciado e vicioso que está dividindo a sociedade brasileira e que ameaça criar -- a despeito de todos os problemas reais de discriminação e de preconceito -- algo que nunca existiu no Brasil: o conflito aberto de raças e talvez até o ódio racial.
Considero essa involução nefasta para o futuro do Brasil como nação integrada e como sociedade multirracial, pois a proposta implícita a esta consulta visa a separar, não a unir pesquisadores em torno de uma agenda comum.
Triste constatar que a universidade brasileira, no caso a baiana, consiga dar um tremendo passo atrás no sentido da construção de uma sociedade inclusiva, e que ela se renda a uma ideologia nefasta da separação racial que certamente vai criar mais problemas do que pretende resolver.
A despeito de ser pela revitalização do CEAO, sou clara e terminantemente contrário à agenda de trabalho que se pretende criar para seus trabalhos.
Atenciosamente,
Paulo Roberto de Almeida
Diplomata e professor universitário
http://www.pralmeida.org
===============
Mensagem recebida em 15.06.2010:
CEAO - Centro de Estudos Afro-Orientais
Colaboradores/as e parceiros/as do CEAO,
No âmbito das comemorações dos 50 anos do Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO), iniciamos o processo de transformação do Centro em uma nova unidade universitária, de caráter multidisciplinar, dedicada aos estudos étnicos, africanos e afro-brasileiros. Na fase atual, o Projeto de criação do novo Instituto, o parecer técnico sobre o projeto e anexos estão disponíveis na página da UFBA (www.ufba.br) para consulta pública, seguindo o que determina o Estatuto da Universidade.
Em 1959, o Centro de Estudos Afro-Orientais foi concebido como um canal de diálogo entre, por um lado, o Brasil e os países africanos e asiáticos e por outro, entre a universidade e a comunidade afro-brasileira. O CEAO, porém, apesar de, esporadicamente, ter se voltado para o estudo e o ensino de assuntos pertinentes ao Oriente Médio e Ásia, inclusive o ensino de línguas (hebreu, japonês, árabe etc.), concentrou seu foco, ao longo dos anos, nos estudos de temas africanos e afro-brasileiros. Mais recentemente o Centro vem atuando em diversas frentes de pesquisa, ensino e extensão num contexto de crescente preocupação com questões raciais no Brasil, participando ativamente do debate sobre as políticas afirmativas. As atividades atualmente desenvolvidas pelo CEAO evidenciam o preparo dessa instituição para dar o salto qualitativo que a transformará numa unidade universitária no âmbito da UFBa.
O novo Instituto tem como missão participar do processo de construção e socialização de conhecimentos sobre as relações étnicorraciais, as culturas e história de países africanos e as culturas africanas no Brasil e em outros países da diáspora, com vistas à formação acadêmica na área multi/interdisciplinar dos estudos étnicos, afrobrasileiros e africanos. Entre os seus objetivos, consta combater, nas suas relações com a sociedade, o racismo, o sexismo e todas as demais formas de opressão e de discriminação.
Através deste documento solicitamos o envio de comentários, sugestões e manifestações de apoio para os seguintes endereços eletrônicos: gabinete@ufba.br e soc@ufba.br com cópia para ceao@ufba.br.
Atenciosamente,
Coordenação do CEAO
Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO)
FFCH-UFBa
CEAO - Centro de Estudos Afro-Orientais
Pç. Inocêncio Galvão, 42, Largo Dois de Julho - CEP 40025-010. Salvador - Bahia - Brasil
Tel (0xx71) 3322-6742 / Fax (0xx71) 3322-8070 - E-mail: ceao@ufba.br - Site: www.ceao.ufba.br
Novo Codigo Florestal: uma confusao dos diabos...
Felizmente, um agrônomo entendido esclarece um pouco o que está em jogo nesse debate até agora infeliz no Brasil, tanto no Parlamento, quanto fora dele.
Triste Peleja
Xico Graziano - AgroBrasil
O Estado de S. Paulo, terça-feira, 15 de Junho de 2010
Nada positiva essa encrenca sobre o Código Florestal. A opinião pública anda confusa, até assustada. Argumentos esdrúxulos partem de ambos os lados, tanto dos ambientalistas quanto dos ruralistas. Virou um besteirol rurambiental.
Embora contenha defeitos, não é verdade que o relatório Aldo Rebelo escancare as portas da destruição florestal. Tampouco é aceitável acusar, como fez o deputado, as ONGs ambientalistas de servirem ao capital internacional. Agricultor não é sem-vergonha nem ecologista serve à maldade. A radicalização só atrapalha a superação desse sério impasse sobre a legislação florestal do País.
Bandidos contra mocinhos funciona bem no cinema, não na roça. Nessa matéria, que importa ao futuro da sociedade, não pode haver vencedores nem vencidos. Será imperdoável votar uma proposta de modificação do Código Florestal que derrote o ambientalismo, por mais estranhas que sejam certas posições dentro dele. Por outro lado, se o ruralismo perder para a ingenuidade verde, melhor seria decretar o fim da agricultura. Ninguém sabe, assim procedendo, como viveriam os seres humanos.
O dilema entre produzir e preservar não comporta pensamento obscurantista nem simplista. Ao contrário, somente a luz do conhecimento poderá encontrar saídas que levem ao novo, e imprescindível, modelo civilizatório. O mundo alimenta, hoje, 6,5 bilhões de habitantes, seguindo há séculos, no campo e nas cidades, uma trajetória de confronto com a natureza. Até 2050 a população talvez se estabilize em 9 bilhões de pessoas. Vai piorar a pegada ecológica.
Querer praticar a agricultura predatória dos antepassados será burrice incomensurável. Por outro lado, defender a regressão agrícola soa insano. Conclusão: somente a tecnologia agropecuária resolve esse impasse, fundamentando uma proposta conciliadora entre a produção e a preservação. Uma saída negociada que unifique as posições em disputa. Nem tanto a Deus nem tanto ao diabo. O caminho do meio.
A agricultura sustentável deve fazer parte da solução, não do problema ambiental. Um roteiro de consenso para a reformulação do Código Florestal deve começar por expor seus porquês. Vamos lá. Quatro fortes razões justificam alterar a lei elaborada em 1965:
1) Existe dificuldade em conceituar a reserva florestal legal nas propriedades abertas antes da vigência da lei. Áreas de agricultura consolidada exigem tratamento distinto de locais ainda cobertos com vegetação nativa.
2) Certas áreas chamadas de preservação permanente, como várzeas, encostas e topos de morro, servem há décadas à agricultura de arroz, uva, café, entre outras, exigindo sua legalização produtiva.
3) Agricultores que, na Amazônia Legal, abriram terras antes de 1995, quando a reserva obrigatória era de 50% da área da fazenda, não podem ser criminalizados pela posterior elevação dessa proteção ambiental para 80%. Raciocínio semelhante vale para o cerrado.
4) A legislação precisa auxiliar o agricultor a resgatar seu passivo ambiental, favorecendo a recuperação especialmente das matas ciliares, aquelas que protegem rios e nascentes. Corredores ecológicos mais valem que pedaços de reserva isolados no território.
Existem várias possibilidades para avançar nesses quatro pontos básicos, adequando o Código Florestal à realidade presente, sem punir os agricultores de bem. Sendo assim, é aceitável:
1) Permitir a utilização de sistemas agroflorestais que misturem culturas com espécies arbóreas, inclusive exóticas, para facilitar a recuperação de áreas degradadas.
2) Realizar a compensação de passivo ambiental noutro local, fora da propriedade, mesmo ultrapassando o território do Estado quando houver identidade de bioma, na mesma bacia hidrográfica.
3) Incluir a área de preservação permanente (APP) no cômputo da reserva legal (RL), desde que o agricultor firme compromisso de recuperação ambiental com prazo máximo de dez anos.
4) Oferecer aos Estados maior capacidade de normatização e execução prática da lei florestal, estimulando o fortalecimento dos órgãos estaduais e municipais de meio ambiente.
Mas existem limites que não podem ser ultrapassados. É, portanto, inaceitável que o Congresso Nacional:
1) Anistie os fazendeiros que desmataram recentemente suas reservas florestais, afrontando conscientemente a legislação, particularmente após 2001, data da última alteração do Código Florestal.
2) Facilite novos desmatamentos, em qualquer bioma e para qualquer tamanho de propriedade; ao contrário, deve estabelecer uma moratória mínima de cinco anos na supressão de florestas nativas em todo o País.
3) Diminua o tamanho da reserva legal obrigatória, uma instituição genuinamente brasileira.
Decididamente, há espaço para compor uma boa posição entre o ambientalismo e o ruralismo, valorizando ambos. Para tanto, porém, é preciso superar o argumento polarizado. O raciocínio dualista, predominante na tradição ocidental, sempre opõe o bem contra o mal, o certo e o errado, santo contra pecador. Poderosa na religião, tal lógica costuma prejudicar a evolução das ideias e a solução dos problemas da sociedade. Assim acontece agora com a reformulação do Código Florestal.
Será necessário substituir esta briga atual, em que todos saem perdendo, por um jogo de vencedores, bom para o meio ambiente, bom para a agricultura. Acontece que nenhum jogo de futebol da Copa do Mundo chegaria ao final sem arbitragem. A grande culpa por essa encrenca recai sobre o governo Lula, que parece se divertir assistindo à triste peleja entre os agricultores e os ambientalistas.
Um descaso contra a galinha dos ovos de ouro do País.
Triste Peleja
Xico Graziano - AgroBrasil
O Estado de S. Paulo, terça-feira, 15 de Junho de 2010
Nada positiva essa encrenca sobre o Código Florestal. A opinião pública anda confusa, até assustada. Argumentos esdrúxulos partem de ambos os lados, tanto dos ambientalistas quanto dos ruralistas. Virou um besteirol rurambiental.
Embora contenha defeitos, não é verdade que o relatório Aldo Rebelo escancare as portas da destruição florestal. Tampouco é aceitável acusar, como fez o deputado, as ONGs ambientalistas de servirem ao capital internacional. Agricultor não é sem-vergonha nem ecologista serve à maldade. A radicalização só atrapalha a superação desse sério impasse sobre a legislação florestal do País.
Bandidos contra mocinhos funciona bem no cinema, não na roça. Nessa matéria, que importa ao futuro da sociedade, não pode haver vencedores nem vencidos. Será imperdoável votar uma proposta de modificação do Código Florestal que derrote o ambientalismo, por mais estranhas que sejam certas posições dentro dele. Por outro lado, se o ruralismo perder para a ingenuidade verde, melhor seria decretar o fim da agricultura. Ninguém sabe, assim procedendo, como viveriam os seres humanos.
O dilema entre produzir e preservar não comporta pensamento obscurantista nem simplista. Ao contrário, somente a luz do conhecimento poderá encontrar saídas que levem ao novo, e imprescindível, modelo civilizatório. O mundo alimenta, hoje, 6,5 bilhões de habitantes, seguindo há séculos, no campo e nas cidades, uma trajetória de confronto com a natureza. Até 2050 a população talvez se estabilize em 9 bilhões de pessoas. Vai piorar a pegada ecológica.
Querer praticar a agricultura predatória dos antepassados será burrice incomensurável. Por outro lado, defender a regressão agrícola soa insano. Conclusão: somente a tecnologia agropecuária resolve esse impasse, fundamentando uma proposta conciliadora entre a produção e a preservação. Uma saída negociada que unifique as posições em disputa. Nem tanto a Deus nem tanto ao diabo. O caminho do meio.
A agricultura sustentável deve fazer parte da solução, não do problema ambiental. Um roteiro de consenso para a reformulação do Código Florestal deve começar por expor seus porquês. Vamos lá. Quatro fortes razões justificam alterar a lei elaborada em 1965:
1) Existe dificuldade em conceituar a reserva florestal legal nas propriedades abertas antes da vigência da lei. Áreas de agricultura consolidada exigem tratamento distinto de locais ainda cobertos com vegetação nativa.
2) Certas áreas chamadas de preservação permanente, como várzeas, encostas e topos de morro, servem há décadas à agricultura de arroz, uva, café, entre outras, exigindo sua legalização produtiva.
3) Agricultores que, na Amazônia Legal, abriram terras antes de 1995, quando a reserva obrigatória era de 50% da área da fazenda, não podem ser criminalizados pela posterior elevação dessa proteção ambiental para 80%. Raciocínio semelhante vale para o cerrado.
4) A legislação precisa auxiliar o agricultor a resgatar seu passivo ambiental, favorecendo a recuperação especialmente das matas ciliares, aquelas que protegem rios e nascentes. Corredores ecológicos mais valem que pedaços de reserva isolados no território.
Existem várias possibilidades para avançar nesses quatro pontos básicos, adequando o Código Florestal à realidade presente, sem punir os agricultores de bem. Sendo assim, é aceitável:
1) Permitir a utilização de sistemas agroflorestais que misturem culturas com espécies arbóreas, inclusive exóticas, para facilitar a recuperação de áreas degradadas.
2) Realizar a compensação de passivo ambiental noutro local, fora da propriedade, mesmo ultrapassando o território do Estado quando houver identidade de bioma, na mesma bacia hidrográfica.
3) Incluir a área de preservação permanente (APP) no cômputo da reserva legal (RL), desde que o agricultor firme compromisso de recuperação ambiental com prazo máximo de dez anos.
4) Oferecer aos Estados maior capacidade de normatização e execução prática da lei florestal, estimulando o fortalecimento dos órgãos estaduais e municipais de meio ambiente.
Mas existem limites que não podem ser ultrapassados. É, portanto, inaceitável que o Congresso Nacional:
1) Anistie os fazendeiros que desmataram recentemente suas reservas florestais, afrontando conscientemente a legislação, particularmente após 2001, data da última alteração do Código Florestal.
2) Facilite novos desmatamentos, em qualquer bioma e para qualquer tamanho de propriedade; ao contrário, deve estabelecer uma moratória mínima de cinco anos na supressão de florestas nativas em todo o País.
3) Diminua o tamanho da reserva legal obrigatória, uma instituição genuinamente brasileira.
Decididamente, há espaço para compor uma boa posição entre o ambientalismo e o ruralismo, valorizando ambos. Para tanto, porém, é preciso superar o argumento polarizado. O raciocínio dualista, predominante na tradição ocidental, sempre opõe o bem contra o mal, o certo e o errado, santo contra pecador. Poderosa na religião, tal lógica costuma prejudicar a evolução das ideias e a solução dos problemas da sociedade. Assim acontece agora com a reformulação do Código Florestal.
Será necessário substituir esta briga atual, em que todos saem perdendo, por um jogo de vencedores, bom para o meio ambiente, bom para a agricultura. Acontece que nenhum jogo de futebol da Copa do Mundo chegaria ao final sem arbitragem. A grande culpa por essa encrenca recai sobre o governo Lula, que parece se divertir assistindo à triste peleja entre os agricultores e os ambientalistas.
Um descaso contra a galinha dos ovos de ouro do País.
Por que o Brasil nao vai crescer?
Bem, existem muitas razões, mas eu vou dar uma muito simples: porque os brasileiros não querem. Não apenas não querem, mas não deixam, e isso com a ajuda dos políticos, que os convencem que essa é a maneira correta de não crescer.
Os brasileiros adoram o Estado, querem mais Estado, suplicam que o Estado lhes dê empregos, lhes pague bem, lhes garanta uma aposentadoria tranquila (com correção acima da inflação), lhes permita, enfim, todas aquelas bondades da social-democracia e ainda por cima que seja eficiente.
Enfim, os brasileiros também detestam os políticos: acham que são todos uns bandidos, uns ladrões, uns corruptos, uns vagabundos que não trabalham (não vou entrar no mérito das respostas, mas isso é o que se constata em pesquisas de opinião pública).
Os brasileiros são perfeitamente contraditórios: dizem tudo isso dos políticos, e permitem que os politicos os roubem (direta e indiretamente), os corrompam (com promessas irrealizáveis), concedem metade de sua renda a esses políticos, e ainda acham o Estado o máximo.
Isso se chama transtorno bipolar, ou pode ter outros nomes, também, mas é, em todo caso, grave.
Todos sabemos que o Estado arranca da sociedade (indivíduos e empresas) praticamente metade da renda, e que isso está asfixiando a sociedade, impedindo, em todo caso, uma taxa maior de crescimento, e portanto de aumento da renda.
Os brasileiros adoram continuar pobres, ou progredir lentamente.
É isso que se pode deduzir dessa pesquisa, feita no ano passado, mas que se ajusta perfeitamente ao debate neste ano eleitoral.
Bem, outros países já decairam, absoluta ou relativamente, bem mais do que o Brasil, e durante muito tempo.
Talvez esteja na hora de o Brasil decair por mais uma ou duas décadas.
Até que os brasileiros deixem de ser contraditórios.
Paulo Roberto de Almeida
No Brasil, 64% querem maior controle do governo na economia
BBC Brasil
09/11/2009 - 06h48
A pesquisa feita a pedido da BBC em 27 países e divulgada nesta segunda-feira revelou que 64% dos brasileiros entrevistados defendem mais controle do governo sobre as principais indústrias do país.
Não apenas isso: 87% dos entrevistados defenderam que o governo tenha um maior papel regulando os negócios no país, enquanto 89% defenderam que o Estado seja mais ativo promovendo a distribuição de riquezas.
A insatisfação dos brasileiros com o capitalismo de livre mercado chamou a atenção dos pesquisadores, que qualificaram de "impressionante" os resultados do país.
"Não é que as pessoas digam, sem pensar, 'sim, queremos que o governo regulamente mais a atividade das empresas'. No Brasil existe um clamor particular em relação a isso", disse Steven Kull, o diretor do Programa sobre Atitudes em Políticas Internacionais (Pipa, na sigla em inglês), com sede em Washington.
O percentual de brasileiros que disseram que o capitalismo "tem muitos problemas e precisamos de um novo sistema econômico" (35%) foi maior que a média mundial (23%).
Enquanto isso, apenas 8% dos brasileiros opinaram que o sistema "funciona bem e mais regulação o tornaria menos eficiente", contra 11% na média mundial.
Para outros 43% dos entrevistados brasileiros, o livre mercado "tem alguns problemas, que podem ser resolvidos através de mais regulação ou controle". A média mundial foi de 51%.
"É uma expressão de grande insatisfação com o sistema e uma falta de confiança de que possa ser corrigido", disse Kull.
"Ao mesmo tempo, não devemos entender que 35% dos brasileiros querem algum tipo de socialismo, esta pergunta não foi incluída. Mas os brasileiros estão tão insatisfeitos com o capitalismo que estão interessados em procurar alternativas."
A pesquisa ouviu 835 entrevistados entre os dias 2 e 4 de julho, nas ruas de Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Goiânia, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo.
Globalização
O levantamento é divulgado em um momento em que o país discute a questão da presença estatal na economia.
Definir para que caixa vai a receita levantada com a exploração de recursos naturais importantes, como o petróleo da camada pré-sal, divide opiniões entre os que defendem mais e menos presença do governo no setor econômico.
Steven Kull avaliou que esta discussão não é apenas brasileira, mas latino-americana. Para ele, o continente está "mais à esquerda" em relação a outras regiões do mundo.
A pesquisa reflete o "giro para a esquerda" que o continente experimentou no fim da década de 1990, quando o modelo de abertura de mercado que se seguiu à queda do muro de Berlim e à dissolução da antiga União Soviética dava sinais de esgotamento.
Começando com a eleição de líderes como Hugo Chávez, na Venezuela, em 1998, o continente viu outros presidentes de esquerda chegarem ao poder, como o próprio Luiz Inácio Lula da Silva, Evo Morales (Bolívia) e Rafael Correa (Equador).
Mas Kull disse não crer que o ceticismo dos brasileiros na pesquisa "seja necessariamente uma rejeição do processo de abertura dos anos 1990".
"Vimos em pesquisas anteriores que os brasileiros não são os mais entusiasmados com a globalização", disse.
"Eles ainda são bastante negativos em relação à globalização, e o que vemos aqui (nesta pesquisa) é mais o desejo de que o governo faça mais para mitigar os efeitos negativos dela, melhorar a distribuição de renda e colocar mais restrições à atividade das empresas."
Mas ele ressalvou: "Lembre-se de que a resposta dominante aqui é que o capitalismo tem problemas, mas pode ser melhorado com reformas. A rejeição ao atual sistema econômico e à abertura econômica não é dominante, é que há um desejo maior de contrabalancear os efeitos disto".
Os brasileiros adoram o Estado, querem mais Estado, suplicam que o Estado lhes dê empregos, lhes pague bem, lhes garanta uma aposentadoria tranquila (com correção acima da inflação), lhes permita, enfim, todas aquelas bondades da social-democracia e ainda por cima que seja eficiente.
Enfim, os brasileiros também detestam os políticos: acham que são todos uns bandidos, uns ladrões, uns corruptos, uns vagabundos que não trabalham (não vou entrar no mérito das respostas, mas isso é o que se constata em pesquisas de opinião pública).
Os brasileiros são perfeitamente contraditórios: dizem tudo isso dos políticos, e permitem que os politicos os roubem (direta e indiretamente), os corrompam (com promessas irrealizáveis), concedem metade de sua renda a esses políticos, e ainda acham o Estado o máximo.
Isso se chama transtorno bipolar, ou pode ter outros nomes, também, mas é, em todo caso, grave.
Todos sabemos que o Estado arranca da sociedade (indivíduos e empresas) praticamente metade da renda, e que isso está asfixiando a sociedade, impedindo, em todo caso, uma taxa maior de crescimento, e portanto de aumento da renda.
Os brasileiros adoram continuar pobres, ou progredir lentamente.
É isso que se pode deduzir dessa pesquisa, feita no ano passado, mas que se ajusta perfeitamente ao debate neste ano eleitoral.
Bem, outros países já decairam, absoluta ou relativamente, bem mais do que o Brasil, e durante muito tempo.
Talvez esteja na hora de o Brasil decair por mais uma ou duas décadas.
Até que os brasileiros deixem de ser contraditórios.
Paulo Roberto de Almeida
No Brasil, 64% querem maior controle do governo na economia
BBC Brasil
09/11/2009 - 06h48
A pesquisa feita a pedido da BBC em 27 países e divulgada nesta segunda-feira revelou que 64% dos brasileiros entrevistados defendem mais controle do governo sobre as principais indústrias do país.
Não apenas isso: 87% dos entrevistados defenderam que o governo tenha um maior papel regulando os negócios no país, enquanto 89% defenderam que o Estado seja mais ativo promovendo a distribuição de riquezas.
A insatisfação dos brasileiros com o capitalismo de livre mercado chamou a atenção dos pesquisadores, que qualificaram de "impressionante" os resultados do país.
"Não é que as pessoas digam, sem pensar, 'sim, queremos que o governo regulamente mais a atividade das empresas'. No Brasil existe um clamor particular em relação a isso", disse Steven Kull, o diretor do Programa sobre Atitudes em Políticas Internacionais (Pipa, na sigla em inglês), com sede em Washington.
O percentual de brasileiros que disseram que o capitalismo "tem muitos problemas e precisamos de um novo sistema econômico" (35%) foi maior que a média mundial (23%).
Enquanto isso, apenas 8% dos brasileiros opinaram que o sistema "funciona bem e mais regulação o tornaria menos eficiente", contra 11% na média mundial.
Para outros 43% dos entrevistados brasileiros, o livre mercado "tem alguns problemas, que podem ser resolvidos através de mais regulação ou controle". A média mundial foi de 51%.
"É uma expressão de grande insatisfação com o sistema e uma falta de confiança de que possa ser corrigido", disse Kull.
"Ao mesmo tempo, não devemos entender que 35% dos brasileiros querem algum tipo de socialismo, esta pergunta não foi incluída. Mas os brasileiros estão tão insatisfeitos com o capitalismo que estão interessados em procurar alternativas."
A pesquisa ouviu 835 entrevistados entre os dias 2 e 4 de julho, nas ruas de Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Goiânia, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo.
Globalização
O levantamento é divulgado em um momento em que o país discute a questão da presença estatal na economia.
Definir para que caixa vai a receita levantada com a exploração de recursos naturais importantes, como o petróleo da camada pré-sal, divide opiniões entre os que defendem mais e menos presença do governo no setor econômico.
Steven Kull avaliou que esta discussão não é apenas brasileira, mas latino-americana. Para ele, o continente está "mais à esquerda" em relação a outras regiões do mundo.
A pesquisa reflete o "giro para a esquerda" que o continente experimentou no fim da década de 1990, quando o modelo de abertura de mercado que se seguiu à queda do muro de Berlim e à dissolução da antiga União Soviética dava sinais de esgotamento.
Começando com a eleição de líderes como Hugo Chávez, na Venezuela, em 1998, o continente viu outros presidentes de esquerda chegarem ao poder, como o próprio Luiz Inácio Lula da Silva, Evo Morales (Bolívia) e Rafael Correa (Equador).
Mas Kull disse não crer que o ceticismo dos brasileiros na pesquisa "seja necessariamente uma rejeição do processo de abertura dos anos 1990".
"Vimos em pesquisas anteriores que os brasileiros não são os mais entusiasmados com a globalização", disse.
"Eles ainda são bastante negativos em relação à globalização, e o que vemos aqui (nesta pesquisa) é mais o desejo de que o governo faça mais para mitigar os efeitos negativos dela, melhorar a distribuição de renda e colocar mais restrições à atividade das empresas."
Mas ele ressalvou: "Lembre-se de que a resposta dominante aqui é que o capitalismo tem problemas, mas pode ser melhorado com reformas. A rejeição ao atual sistema econômico e à abertura econômica não é dominante, é que há um desejo maior de contrabalancear os efeitos disto".
Ilegalidades estatais: sempre presentes
Apenas agora, em junho de 2010, consegui colocar em ordem uma fileira imensa de postagens sob a forma de comentários enviados a este meu blog desde o ano passado, e por isso já me desculpei com os leitores e postadores (ugh!) que se deram ao trabalho.
Entre as mensagens recebidas, figura esta abaixo, que não pude responder na ocasião, mas que faço agora, mesmo se o seu autor, não identificado, não a possa ler. Outros lerão, e talvez aproveitem...
Tales Cardeal [sem endereço] deixou [em 13.10.2009] um novo comentário sobre a sua postagem "1420) Brasil, um pais sem lei, e quem patrocina isso é o governo":
Doutor Paulo R. de Almeida,
Estaria correto designar o Brasil como um governo misto entre o republicanismo e a anarquia?
Porque me parece, sou estudante do ensino médio ainda, que em muitas questões que são apontadas pelo povo brasileiro ele tem que se virar sozinho não tendo grande apoio ou ajuda do governo.
Por exemplo, se queremos ter informações sobre nossos parlamentares ou sobres nossas Casas precisamos ir até uma ONG como o "Transparência Brasil", se queremos abrir uma empresa temos que correr atrás e lutar contra a burocracia ao invés de ser apoiada por ela, se queremos entrar na faculdade e prestar uma prova tranquila temos que contar com a boa vontade de um ministério que pensa ser fácil reformular e aplicar uma prova a 4,1 milhões de estudantes em um ano.
Hoje são poucas as instituições nas quais deposito orgulho, como o caso do Itamaraty, não por serem vergonhosas mas por apresentarem uma série de ações que acabam por manchar suas imagens como o caso do MEC nesta prova do ENEM.
Estaria o Brasil como a França na Revolução? Um país rico com um governo pobre?
Quanto ao Sr. E. Baldi acredito ser o problema o seguinte, temos pessoas de gigantescas capacidade no campo político mas o sistema atual não deixa que estas pessoas se sobressaiam, como o Sr. mesmo diz: "O problema reside nos órgãos de cúpula"
Alguma idéia para resolver este problema?
================
Tales,
Me parece que você, muito jovem, começa por inverter a ordem natural das coisas. Em todos os lugares do mundo, ou quase todos, é o povo quem constitui o Estado, para que este possa servir a determinados fins coletivos. Só em países anormais, o Estado se serve do povo para seus fins próprios (você pode encontrar facilmente países anormais assim). Mas, falar de Estado é um engano, pois Estado, enquanto tal é um conjunto de instituições semi-permanentes, ou estáveis, construídas ao longo do tempo, mas tudo isso é meio abstrato. O Estado é feito pelas pessoas que ocupam essas diversas instituições, sendo que em determinados países algumas são mais relevantes do que outras.
Nos EUA, por exemplo, o Legislativo predomina, mas o Supremo tem a palavra final. O Executivo não tem a preeminência que ele tem no caso do Brasil, que compra parlamentares para seus fins próprios, ou seja, para servir às pessoas que ocupam o poder executivo.
Ainda assim estamos melhor do que na vizinha Venezuela, onde o caudilho que se chama presidente emasculou o Legislativo e subordinou o Judiciário à sua vontade exclusiva.
Você me pergunta, ademais, se:
"Estaria o Brasil como a França na Revolução? Um país rico com um governo pobre?"
Respondo: não, ao contrário, não estamos em revolução, mas em consilidação democrática, ainda que nossa democracia seja de baixa qualidade e certas pessoas e partidos se empenham em torná-la ainda mais frágil.
No Brasil, o Estado é rico, e o povo é pobre, e este é pobre justamente porque o Estado arranca seu dinheiro de várias maneiras.
O Brasil é uma completa aberração em matéria de carga fiscal. É o ÚNICO país no mundo que tem uma carga tributária de 40% do PIB para uma renda per capita que é inferior a 10 mil dólares.
Essa situação se reflete, por exemplo, numa remuneração de magistrados que seja a ser 60 ou 70 vezes (e não estou contando as mordomias) um salário mínimo, quando em países decentes essa relação não alcança a 10 ou 12.
Tenho muitas ideias para resolver os problemas do Brasil, muitas delas refletidas em dezenas de artigos que tenho assinado desde muito tempo, e em alguns livros publicados.
Não creio, porém, que o Brasil, ou a sociedade brasileira esteja preparada para começar um processo sério de reformas. Acho que vamos decair um pouco mais, e talvez ter até um desastre fiscal e um rebrote inflacionário, quem sabe até uma crise econômica e social, antes de enfrentar as reformas. Nada digo sobre a qualidade da educação, que infelizmente continuará decaindo pelos anos à frente, parda maior desgraça do povo brasileiro.
Vamos chegar nos 200 anos de independência sem ter conseguido fazer deste país uma nação mais justa ou desenvolvida. Infelizmente.
Posso estar errado, mas é o que vejo atualmente.
Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 15.06.2010)
Entre as mensagens recebidas, figura esta abaixo, que não pude responder na ocasião, mas que faço agora, mesmo se o seu autor, não identificado, não a possa ler. Outros lerão, e talvez aproveitem...
Tales Cardeal [sem endereço] deixou [em 13.10.2009] um novo comentário sobre a sua postagem "1420) Brasil, um pais sem lei, e quem patrocina isso é o governo":
Doutor Paulo R. de Almeida,
Estaria correto designar o Brasil como um governo misto entre o republicanismo e a anarquia?
Porque me parece, sou estudante do ensino médio ainda, que em muitas questões que são apontadas pelo povo brasileiro ele tem que se virar sozinho não tendo grande apoio ou ajuda do governo.
Por exemplo, se queremos ter informações sobre nossos parlamentares ou sobres nossas Casas precisamos ir até uma ONG como o "Transparência Brasil", se queremos abrir uma empresa temos que correr atrás e lutar contra a burocracia ao invés de ser apoiada por ela, se queremos entrar na faculdade e prestar uma prova tranquila temos que contar com a boa vontade de um ministério que pensa ser fácil reformular e aplicar uma prova a 4,1 milhões de estudantes em um ano.
Hoje são poucas as instituições nas quais deposito orgulho, como o caso do Itamaraty, não por serem vergonhosas mas por apresentarem uma série de ações que acabam por manchar suas imagens como o caso do MEC nesta prova do ENEM.
Estaria o Brasil como a França na Revolução? Um país rico com um governo pobre?
Quanto ao Sr. E. Baldi acredito ser o problema o seguinte, temos pessoas de gigantescas capacidade no campo político mas o sistema atual não deixa que estas pessoas se sobressaiam, como o Sr. mesmo diz: "O problema reside nos órgãos de cúpula"
Alguma idéia para resolver este problema?
================
Tales,
Me parece que você, muito jovem, começa por inverter a ordem natural das coisas. Em todos os lugares do mundo, ou quase todos, é o povo quem constitui o Estado, para que este possa servir a determinados fins coletivos. Só em países anormais, o Estado se serve do povo para seus fins próprios (você pode encontrar facilmente países anormais assim). Mas, falar de Estado é um engano, pois Estado, enquanto tal é um conjunto de instituições semi-permanentes, ou estáveis, construídas ao longo do tempo, mas tudo isso é meio abstrato. O Estado é feito pelas pessoas que ocupam essas diversas instituições, sendo que em determinados países algumas são mais relevantes do que outras.
Nos EUA, por exemplo, o Legislativo predomina, mas o Supremo tem a palavra final. O Executivo não tem a preeminência que ele tem no caso do Brasil, que compra parlamentares para seus fins próprios, ou seja, para servir às pessoas que ocupam o poder executivo.
Ainda assim estamos melhor do que na vizinha Venezuela, onde o caudilho que se chama presidente emasculou o Legislativo e subordinou o Judiciário à sua vontade exclusiva.
Você me pergunta, ademais, se:
"Estaria o Brasil como a França na Revolução? Um país rico com um governo pobre?"
Respondo: não, ao contrário, não estamos em revolução, mas em consilidação democrática, ainda que nossa democracia seja de baixa qualidade e certas pessoas e partidos se empenham em torná-la ainda mais frágil.
No Brasil, o Estado é rico, e o povo é pobre, e este é pobre justamente porque o Estado arranca seu dinheiro de várias maneiras.
O Brasil é uma completa aberração em matéria de carga fiscal. É o ÚNICO país no mundo que tem uma carga tributária de 40% do PIB para uma renda per capita que é inferior a 10 mil dólares.
Essa situação se reflete, por exemplo, numa remuneração de magistrados que seja a ser 60 ou 70 vezes (e não estou contando as mordomias) um salário mínimo, quando em países decentes essa relação não alcança a 10 ou 12.
Tenho muitas ideias para resolver os problemas do Brasil, muitas delas refletidas em dezenas de artigos que tenho assinado desde muito tempo, e em alguns livros publicados.
Não creio, porém, que o Brasil, ou a sociedade brasileira esteja preparada para começar um processo sério de reformas. Acho que vamos decair um pouco mais, e talvez ter até um desastre fiscal e um rebrote inflacionário, quem sabe até uma crise econômica e social, antes de enfrentar as reformas. Nada digo sobre a qualidade da educação, que infelizmente continuará decaindo pelos anos à frente, parda maior desgraça do povo brasileiro.
Vamos chegar nos 200 anos de independência sem ter conseguido fazer deste país uma nação mais justa ou desenvolvida. Infelizmente.
Posso estar errado, mas é o que vejo atualmente.
Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 15.06.2010)
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