quarta-feira, 16 de junho de 2010

De servos e de seres livres

Um Anônimo (sempre essas criaturas que têm medo, ou vergonha, de assumir a própria identidade), que se assina como "ex-servo do Olimpo" [no Brasil??!!], escreveu o que segue a propósito deste meu post:

"Por que o Brasil nao vai crescer?"


Anônimo disse...

Apenas se torna incompreensível que o autor do blog seja um funcionário de alto escalão do próprio Estado, que tanto critica, assim como é pago pelo povo que atribui ser o culpado e tolo. Incoerência ou bipolaridade filosófica ? Talvez pura e mera demagogia, pois se realmente fosse adepto de suas próprias convicções já teria saído do Itamaraty e defendido com mais afinco sua visão liberal de menos Estado na economia! Discurso é fácil, ações é que são difíceis de serem realizadas. A maior liderança é a do exemplo ou estou equivocado (a). Escreveu outrora, sobre a dificuldade de se ter empreendendores no Brasil, então, onde fica o exemplo ? Talvez fosse o caso de ler o Monge e o Executivo para tentar ser líder pelo exemplo e não pelo discurso, já basta o nosso presidente com a sua demagogia exacerbada.
Reflita senhor embaixador...assinado um anônimo facilmente identificável como ex-servo do Olimpo.


Então respondo:


Anônimo servo,

Eu acho incompreensível, da minha parte, que alguém se identifique, não como uma pessoa em sua plena capacidade, mas como um servo de qualquer coisa, seja essa coisa o Olimpo, o Nirvana, o Paraíso, um palácio presidencial ou seja lá o que for.
Prefiro ser um ser livre no pântano, no deserto, que seja numa prisão de algum désposta, do que ser servo de qualquer um ou de qualquer "coisa". Mesmo sendo prisioneiro de alguém, conservarei sempre meu espírito de liberdade, e minha vontade própria, de fazer apenas aquilo que a minha consciência me ditar, e não o que for ordenado por alguém.
Também acho incompreensível o fato de você achar incompreensível o fato de alguém que é temporariamente um servidor do Estado deixar a capacidade de pensar com sua própria cabeça e ter de prestar voto de obediência a quem quer que seja. Uma coisa é o desempenho de funções no Estado, algo que pode me ocupar algumas horas do dia. Outra coisa seria alugar a minha consciência e a minha capacidade de pensar com minha própria cabeça a quem quer que seja, ainda que seja o meu chefe imediato.
Saiba Anônimo Servo que jamais eu concordaria com o meu chefe apenas porque ele me disse para fazê-lo, se eu não estiver pessoalmente convencido daquela mesma coisa. Posso até obedecer uma ordem que não seja ilegal, e que não violente minha dignidade, se aquilo fizer parte de minhas funções, mas jamais submeterei minha capacidade cognitiva, minha disposição de pensar com minha própria cabeça apenas porque sou um funcionário do Estado, jamais o servo de um soberano qualquer. O tempo dos súditos já passou há muito tempo, e se fosse o caso, provavelmente eu nunca aceitaria ser súdito de alguém.

Apenas nas ditaduras, e nos regimes servis, somos obrigados a nos conformar com a vontade do soberano.
Em qualquer regime democrático digno desse nome um cidadão qualquer, em qualquer capacidade profissional, tem o direito de não apenas discordar de seus chefes, mas também de chamar o presidente de incompetente, mentiroso, vagabundo, fraudador, demagogo, populista e sem-vergonha (aplique a quem quiser). Nos EUA, pessoas e grupos políticos acusam o presidente Obama de ser um estrangeiro e até de ser um agente inimigo, e não me consta que, enquanto não atentarem contra a segurança física do presidente ou comprometerem a segurança nacional, qualquer um deles esteja sendo ameaçado pelo presidente ou pela presidência da República americana.
Democracias são assim: as pessoas têm o direito de criticar o Estado e de criticar as políticas públicas com as quais não concordam, as simple as that.
Você, que se intitula "servo do Olimpo" -- e que, portanto, deve ter usufruido de uma educação acima da média -- deveria saber disso, e se escolhe ser chamado de "servo" é apenas por um espírito servil que, repito, para mim é incompreensível.

Você me acusa de criticar o Estado que me paga e até o próprio povo, por ser tolo ou até estúpido, por preferir mais Estado, quando este o espolia de mais da metada da sua renda.
Se você, Anônimo servil, se contenta de servir a um Estado assim espoliador, saiba que eu não, e se como você, pretendo o melhor Estado possível para o Brasil e para os seus cidadãos -- mesmo para os mais tolos, que pagam como carneiros todos os seus impostos sem reclamar -- então, se você tivesse um pouquinho de consciência crítica, chegaria à mesma conclusão que eu cheguei: que o Brasil é uma anomalia no conjunto de economias em desenvolvimento: que o Brasil tem uma carga fiscal de país rico para serviços públicos de país miserável.
Saiba que eu nunca vou me conformar com isso, e estarei sempre disposto a criticar o Estado, o povo, o presidente, os anônimos que me escrevem que se conformam com isso.
Como pessoa que não abandona o cérebro em casa quando vai trabalhar, sempre farei o que sempre fiz: expressar exatamente o que penso, e lutar por ideais, princípios, valores e medidas que estimo, com base numa análise racional da realidade, melhores para o meu país e meu povo.

Saiba Anônimo servil, que isso não é demagogia, nem liberalismo, apenas a expressão da melhor política possível para o maior número. Isso se chama racionalidade e independência de pensamento, duela a quien duela, como diria um dos maiores presidentes fraudadores da história do Brasil. Aliás, o fraudador está em boa companhia atualmente.
Se você for sincero, não pode concordar com um Estado que lhe arranca metade da renda e ainda o obriga a comprar no setor privado os serviços -- de educação, de saúde, de transporte, e talvez até de aposentadoria (salvo se você for um privilegiado do setor público) -- que o Estado lhe deveria prover e que não dispensa, ou presta mal, porcamente.
Saiba que mesmo sendo um funcionário público, jamais concordarei com a estabilidade funcional para servidores públicos -- mesmo para diplomatas -- e jamais concordarei com os privilégios de aposentadoria de que somos beneficiários. Tudo isso é uma indignidade para com o povo brasileiro, que trabalha e paga esses privilégios injustificáveis em qualquer país normal.

Termino: não preciso sair do Itamaraty para dizer o que digo, pois nada do que digo tem a ver com a formulação e a execução da política externa e sim com a minha condição de cidadão pagador de impostos, e dono de um cérebro que ainda permanece livre, mesmo alugado por algumas horas para o serviço exterior brasileiro.

Da próxima vez que me escrever, pode até me criticar, mas, por favor, não se qualifique mais como "servo", pois isso o diminui terrivelmente. Continue anônimo, se de desejar, mas preserve a sua dignidade.

Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 16.06.2010)

terça-feira, 15 de junho de 2010

Um centro de estudos afro-asiaticos que involui para o racialismo...

Recebi, de um expedidor que colocou como assunto "Solicitação de apoio ao pleito do CEAO", a mensagem in fine, que pode ser lida, se alguém desejar, antes desta minha resposta, que segue imediatamente abaixo.

Ao Gabinete da UFBA e ao
Centro de Estudos Afro-Orientais,

Minha opinião, que certamente não será levada em conta, é a de que o Centro seja efetivamente estruturado para servir de instituição de pesquisa, de reflexões e de debates, e até de trabalhos de pós-graduação, nas áreas que eram originalmente as suas, ou seja, o estudo das sociedades da África e da Ásia e suas relações com o Brasil e o continente sul-americano, no contexto da globalização (um termo que não existia quando ele foi criado, mas que já existia como realidade, ainda que colonial e semi-colonial).
As propostas emitidas no comunicado abaixo evidenciam o propósito de interiorizar o CEAO, de torná-lo um centro para o debate (viciado) de temas brasilo-brasileiros, não internacionais, como seria desejável.
Constato que o CEAO se prepara para converter-se em instituto da UFBA para atender ao mesmo tipo de clientela que vem transformando a agenda dos debates sociais e políticos no Brasil, infelizmente para pior.
Também constato, com tristeza, que o CEAO adere ao mesmo tipo de ideologia que, tendo sido importada dos EUA, pretende reproduzir no Brasil um novo tipo de política racialista, de cunho pretensamente afro-brasileira, mas que nada mais vai fazer senão criar um novo Apartheid numa sociedade que não se distinguia até aqui, pelo menos não no plano da cultura social e no das políticas públicas, por políticas e práticas de cunho racialista.
Considero pessoalmente lamentável que a universidade - que segundo o seu nome deveria ser universalista -- esteja aderindo a orientações e práticas divisionistas no pior sentido da palavra, de natureza racial, o que pode até ser inconstitucional.
Lamentável, também, que uma entidade que se pretendia aberta ao mundo, venha a se enclausurar num tipo de debate viciado e vicioso que está dividindo a sociedade brasileira e que ameaça criar -- a despeito de todos os problemas reais de discriminação e de preconceito -- algo que nunca existiu no Brasil: o conflito aberto de raças e talvez até o ódio racial.
Considero essa involução nefasta para o futuro do Brasil como nação integrada e como sociedade multirracial, pois a proposta implícita a esta consulta visa a separar, não a unir pesquisadores em torno de uma agenda comum.
Triste constatar que a universidade brasileira, no caso a baiana, consiga dar um tremendo passo atrás no sentido da construção de uma sociedade inclusiva, e que ela se renda a uma ideologia nefasta da separação racial que certamente vai criar mais problemas do que pretende resolver.
A despeito de ser pela revitalização do CEAO, sou clara e terminantemente contrário à agenda de trabalho que se pretende criar para seus trabalhos.
Atenciosamente,
Paulo Roberto de Almeida
Diplomata e professor universitário
http://www.pralmeida.org

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Mensagem recebida em 15.06.2010:

CEAO - Centro de Estudos Afro-Orientais
Colaboradores/as e parceiros/as do CEAO,

No âmbito das comemorações dos 50 anos do Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO), iniciamos o processo de transformação do Centro em uma nova unidade universitária, de caráter multidisciplinar, dedicada aos estudos étnicos, africanos e afro-brasileiros. Na fase atual, o Projeto de criação do novo Instituto, o parecer técnico sobre o projeto e anexos estão disponíveis na página da UFBA (www.ufba.br) para consulta pública, seguindo o que determina o Estatuto da Universidade.

Em 1959, o Centro de Estudos Afro-Orientais foi concebido como um canal de diálogo entre, por um lado, o Brasil e os países africanos e asiáticos e por outro, entre a universidade e a comunidade afro-brasileira. O CEAO, porém, apesar de, esporadicamente, ter se voltado para o estudo e o ensino de assuntos pertinentes ao Oriente Médio e Ásia, inclusive o ensino de línguas (hebreu, japonês, árabe etc.), concentrou seu foco, ao longo dos anos, nos estudos de temas africanos e afro-brasileiros. Mais recentemente o Centro vem atuando em diversas frentes de pesquisa, ensino e extensão num contexto de crescente preocupação com questões raciais no Brasil, participando ativamente do debate sobre as políticas afirmativas. As atividades atualmente desenvolvidas pelo CEAO evidenciam o preparo dessa instituição para dar o salto qualitativo que a transformará numa unidade universitária no âmbito da UFBa.

O novo Instituto tem como missão participar do processo de construção e socialização de conhecimentos sobre as relações étnicorraciais, as culturas e história de países africanos e as culturas africanas no Brasil e em outros países da diáspora, com vistas à formação acadêmica na área multi/interdisciplinar dos estudos étnicos, afrobrasileiros e africanos. Entre os seus objetivos, consta combater, nas suas relações com a sociedade, o racismo, o sexismo e todas as demais formas de opressão e de discriminação.

Através deste documento solicitamos o envio de comentários, sugestões e manifestações de apoio para os seguintes endereços eletrônicos: gabinete@ufba.br e soc@ufba.br com cópia para ceao@ufba.br.

Atenciosamente,
Coordenação do CEAO
Centro de Estudos Afro-Orientais (CEAO)
FFCH-UFBa
CEAO - Centro de Estudos Afro-Orientais
Pç. Inocêncio Galvão, 42, Largo Dois de Julho - CEP 40025-010. Salvador - Bahia - Brasil
Tel (0xx71) 3322-6742 / Fax (0xx71) 3322-8070 - E-mail: ceao@ufba.br - Site: www.ceao.ufba.br

Novo Codigo Florestal: uma confusao dos diabos...

Felizmente, um agrônomo entendido esclarece um pouco o que está em jogo nesse debate até agora infeliz no Brasil, tanto no Parlamento, quanto fora dele.

Triste Peleja
Xico Graziano - AgroBrasil
O Estado de S. Paulo, terça-feira, 15 de Junho de 2010

Nada positiva essa encrenca sobre o Código Florestal. A opinião pública anda confusa, até assustada. Argumentos esdrúxulos partem de ambos os lados, tanto dos ambientalistas quanto dos ruralistas. Virou um besteirol rurambiental.

Embora contenha defeitos, não é verdade que o relatório Aldo Rebelo escancare as portas da destruição florestal. Tampouco é aceitável acusar, como fez o deputado, as ONGs ambientalistas de servirem ao capital internacional. Agricultor não é sem-vergonha nem ecologista serve à maldade. A radicalização só atrapalha a superação desse sério impasse sobre a legislação florestal do País.

Bandidos contra mocinhos funciona bem no cinema, não na roça. Nessa matéria, que importa ao futuro da sociedade, não pode haver vencedores nem vencidos. Será imperdoável votar uma proposta de modificação do Código Florestal que derrote o ambientalismo, por mais estranhas que sejam certas posições dentro dele. Por outro lado, se o ruralismo perder para a ingenuidade verde, melhor seria decretar o fim da agricultura. Ninguém sabe, assim procedendo, como viveriam os seres humanos.

O dilema entre produzir e preservar não comporta pensamento obscurantista nem simplista. Ao contrário, somente a luz do conhecimento poderá encontrar saídas que levem ao novo, e imprescindível, modelo civilizatório. O mundo alimenta, hoje, 6,5 bilhões de habitantes, seguindo há séculos, no campo e nas cidades, uma trajetória de confronto com a natureza. Até 2050 a população talvez se estabilize em 9 bilhões de pessoas. Vai piorar a pegada ecológica.

Querer praticar a agricultura predatória dos antepassados será burrice incomensurável. Por outro lado, defender a regressão agrícola soa insano. Conclusão: somente a tecnologia agropecuária resolve esse impasse, fundamentando uma proposta conciliadora entre a produção e a preservação. Uma saída negociada que unifique as posições em disputa. Nem tanto a Deus nem tanto ao diabo. O caminho do meio.

A agricultura sustentável deve fazer parte da solução, não do problema ambiental. Um roteiro de consenso para a reformulação do Código Florestal deve começar por expor seus porquês. Vamos lá. Quatro fortes razões justificam alterar a lei elaborada em 1965:

1) Existe dificuldade em conceituar a reserva florestal legal nas propriedades abertas antes da vigência da lei. Áreas de agricultura consolidada exigem tratamento distinto de locais ainda cobertos com vegetação nativa.

2) Certas áreas chamadas de preservação permanente, como várzeas, encostas e topos de morro, servem há décadas à agricultura de arroz, uva, café, entre outras, exigindo sua legalização produtiva.

3) Agricultores que, na Amazônia Legal, abriram terras antes de 1995, quando a reserva obrigatória era de 50% da área da fazenda, não podem ser criminalizados pela posterior elevação dessa proteção ambiental para 80%. Raciocínio semelhante vale para o cerrado.

4) A legislação precisa auxiliar o agricultor a resgatar seu passivo ambiental, favorecendo a recuperação especialmente das matas ciliares, aquelas que protegem rios e nascentes. Corredores ecológicos mais valem que pedaços de reserva isolados no território.

Existem várias possibilidades para avançar nesses quatro pontos básicos, adequando o Código Florestal à realidade presente, sem punir os agricultores de bem. Sendo assim, é aceitável:

1) Permitir a utilização de sistemas agroflorestais que misturem culturas com espécies arbóreas, inclusive exóticas, para facilitar a recuperação de áreas degradadas.

2) Realizar a compensação de passivo ambiental noutro local, fora da propriedade, mesmo ultrapassando o território do Estado quando houver identidade de bioma, na mesma bacia hidrográfica.

3) Incluir a área de preservação permanente (APP) no cômputo da reserva legal (RL), desde que o agricultor firme compromisso de recuperação ambiental com prazo máximo de dez anos.

4) Oferecer aos Estados maior capacidade de normatização e execução prática da lei florestal, estimulando o fortalecimento dos órgãos estaduais e municipais de meio ambiente.

Mas existem limites que não podem ser ultrapassados. É, portanto, inaceitável que o Congresso Nacional:

1) Anistie os fazendeiros que desmataram recentemente suas reservas florestais, afrontando conscientemente a legislação, particularmente após 2001, data da última alteração do Código Florestal.

2) Facilite novos desmatamentos, em qualquer bioma e para qualquer tamanho de propriedade; ao contrário, deve estabelecer uma moratória mínima de cinco anos na supressão de florestas nativas em todo o País.

3) Diminua o tamanho da reserva legal obrigatória, uma instituição genuinamente brasileira.

Decididamente, há espaço para compor uma boa posição entre o ambientalismo e o ruralismo, valorizando ambos. Para tanto, porém, é preciso superar o argumento polarizado. O raciocínio dualista, predominante na tradição ocidental, sempre opõe o bem contra o mal, o certo e o errado, santo contra pecador. Poderosa na religião, tal lógica costuma prejudicar a evolução das ideias e a solução dos problemas da sociedade. Assim acontece agora com a reformulação do Código Florestal.

Será necessário substituir esta briga atual, em que todos saem perdendo, por um jogo de vencedores, bom para o meio ambiente, bom para a agricultura. Acontece que nenhum jogo de futebol da Copa do Mundo chegaria ao final sem arbitragem. A grande culpa por essa encrenca recai sobre o governo Lula, que parece se divertir assistindo à triste peleja entre os agricultores e os ambientalistas.

Um descaso contra a galinha dos ovos de ouro do País.

Por que o Brasil nao vai crescer?

Bem, existem muitas razões, mas eu vou dar uma muito simples: porque os brasileiros não querem. Não apenas não querem, mas não deixam, e isso com a ajuda dos políticos, que os convencem que essa é a maneira correta de não crescer.
Os brasileiros adoram o Estado, querem mais Estado, suplicam que o Estado lhes dê empregos, lhes pague bem, lhes garanta uma aposentadoria tranquila (com correção acima da inflação), lhes permita, enfim, todas aquelas bondades da social-democracia e ainda por cima que seja eficiente.
Enfim, os brasileiros também detestam os políticos: acham que são todos uns bandidos, uns ladrões, uns corruptos, uns vagabundos que não trabalham (não vou entrar no mérito das respostas, mas isso é o que se constata em pesquisas de opinião pública).
Os brasileiros são perfeitamente contraditórios: dizem tudo isso dos políticos, e permitem que os politicos os roubem (direta e indiretamente), os corrompam (com promessas irrealizáveis), concedem metade de sua renda a esses políticos, e ainda acham o Estado o máximo.
Isso se chama transtorno bipolar, ou pode ter outros nomes, também, mas é, em todo caso, grave.
Todos sabemos que o Estado arranca da sociedade (indivíduos e empresas) praticamente metade da renda, e que isso está asfixiando a sociedade, impedindo, em todo caso, uma taxa maior de crescimento, e portanto de aumento da renda.
Os brasileiros adoram continuar pobres, ou progredir lentamente.
É isso que se pode deduzir dessa pesquisa, feita no ano passado, mas que se ajusta perfeitamente ao debate neste ano eleitoral.
Bem, outros países já decairam, absoluta ou relativamente, bem mais do que o Brasil, e durante muito tempo.
Talvez esteja na hora de o Brasil decair por mais uma ou duas décadas.
Até que os brasileiros deixem de ser contraditórios.
Paulo Roberto de Almeida

No Brasil, 64% querem maior controle do governo na economia
BBC Brasil
09/11/2009 - 06h48

A pesquisa feita a pedido da BBC em 27 países e divulgada nesta segunda-feira revelou que 64% dos brasileiros entrevistados defendem mais controle do governo sobre as principais indústrias do país.
Não apenas isso: 87% dos entrevistados defenderam que o governo tenha um maior papel regulando os negócios no país, enquanto 89% defenderam que o Estado seja mais ativo promovendo a distribuição de riquezas.
A insatisfação dos brasileiros com o capitalismo de livre mercado chamou a atenção dos pesquisadores, que qualificaram de "impressionante" os resultados do país.
"Não é que as pessoas digam, sem pensar, 'sim, queremos que o governo regulamente mais a atividade das empresas'. No Brasil existe um clamor particular em relação a isso", disse Steven Kull, o diretor do Programa sobre Atitudes em Políticas Internacionais (Pipa, na sigla em inglês), com sede em Washington.
O percentual de brasileiros que disseram que o capitalismo "tem muitos problemas e precisamos de um novo sistema econômico" (35%) foi maior que a média mundial (23%).
Enquanto isso, apenas 8% dos brasileiros opinaram que o sistema "funciona bem e mais regulação o tornaria menos eficiente", contra 11% na média mundial.
Para outros 43% dos entrevistados brasileiros, o livre mercado "tem alguns problemas, que podem ser resolvidos através de mais regulação ou controle". A média mundial foi de 51%.
"É uma expressão de grande insatisfação com o sistema e uma falta de confiança de que possa ser corrigido", disse Kull.
"Ao mesmo tempo, não devemos entender que 35% dos brasileiros querem algum tipo de socialismo, esta pergunta não foi incluída. Mas os brasileiros estão tão insatisfeitos com o capitalismo que estão interessados em procurar alternativas."
A pesquisa ouviu 835 entrevistados entre os dias 2 e 4 de julho, nas ruas de Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Goiânia, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo.

Globalização
O levantamento é divulgado em um momento em que o país discute a questão da presença estatal na economia.
Definir para que caixa vai a receita levantada com a exploração de recursos naturais importantes, como o petróleo da camada pré-sal, divide opiniões entre os que defendem mais e menos presença do governo no setor econômico.
Steven Kull avaliou que esta discussão não é apenas brasileira, mas latino-americana. Para ele, o continente está "mais à esquerda" em relação a outras regiões do mundo.
A pesquisa reflete o "giro para a esquerda" que o continente experimentou no fim da década de 1990, quando o modelo de abertura de mercado que se seguiu à queda do muro de Berlim e à dissolução da antiga União Soviética dava sinais de esgotamento.
Começando com a eleição de líderes como Hugo Chávez, na Venezuela, em 1998, o continente viu outros presidentes de esquerda chegarem ao poder, como o próprio Luiz Inácio Lula da Silva, Evo Morales (Bolívia) e Rafael Correa (Equador).
Mas Kull disse não crer que o ceticismo dos brasileiros na pesquisa "seja necessariamente uma rejeição do processo de abertura dos anos 1990".
"Vimos em pesquisas anteriores que os brasileiros não são os mais entusiasmados com a globalização", disse.
"Eles ainda são bastante negativos em relação à globalização, e o que vemos aqui (nesta pesquisa) é mais o desejo de que o governo faça mais para mitigar os efeitos negativos dela, melhorar a distribuição de renda e colocar mais restrições à atividade das empresas."
Mas ele ressalvou: "Lembre-se de que a resposta dominante aqui é que o capitalismo tem problemas, mas pode ser melhorado com reformas. A rejeição ao atual sistema econômico e à abertura econômica não é dominante, é que há um desejo maior de contrabalancear os efeitos disto".

Ilegalidades estatais: sempre presentes

Apenas agora, em junho de 2010, consegui colocar em ordem uma fileira imensa de postagens sob a forma de comentários enviados a este meu blog desde o ano passado, e por isso já me desculpei com os leitores e postadores (ugh!) que se deram ao trabalho.
Entre as mensagens recebidas, figura esta abaixo, que não pude responder na ocasião, mas que faço agora, mesmo se o seu autor, não identificado, não a possa ler. Outros lerão, e talvez aproveitem...

Tales Cardeal [sem endereço] deixou [em 13.10.2009] um novo comentário sobre a sua postagem "1420) Brasil, um pais sem lei, e quem patrocina isso é o governo":

Doutor Paulo R. de Almeida,
Estaria correto designar o Brasil como um governo misto entre o republicanismo e a anarquia?

Porque me parece, sou estudante do ensino médio ainda, que em muitas questões que são apontadas pelo povo brasileiro ele tem que se virar sozinho não tendo grande apoio ou ajuda do governo.
Por exemplo, se queremos ter informações sobre nossos parlamentares ou sobres nossas Casas precisamos ir até uma ONG como o "Transparência Brasil", se queremos abrir uma empresa temos que correr atrás e lutar contra a burocracia ao invés de ser apoiada por ela, se queremos entrar na faculdade e prestar uma prova tranquila temos que contar com a boa vontade de um ministério que pensa ser fácil reformular e aplicar uma prova a 4,1 milhões de estudantes em um ano.
Hoje são poucas as instituições nas quais deposito orgulho, como o caso do Itamaraty, não por serem vergonhosas mas por apresentarem uma série de ações que acabam por manchar suas imagens como o caso do MEC nesta prova do ENEM.
Estaria o Brasil como a França na Revolução? Um país rico com um governo pobre?

Quanto ao Sr. E. Baldi acredito ser o problema o seguinte, temos pessoas de gigantescas capacidade no campo político mas o sistema atual não deixa que estas pessoas se sobressaiam, como o Sr. mesmo diz: "O problema reside nos órgãos de cúpula"

Alguma idéia para resolver este problema?


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Tales,
Me parece que você, muito jovem, começa por inverter a ordem natural das coisas. Em todos os lugares do mundo, ou quase todos, é o povo quem constitui o Estado, para que este possa servir a determinados fins coletivos. Só em países anormais, o Estado se serve do povo para seus fins próprios (você pode encontrar facilmente países anormais assim). Mas, falar de Estado é um engano, pois Estado, enquanto tal é um conjunto de instituições semi-permanentes, ou estáveis, construídas ao longo do tempo, mas tudo isso é meio abstrato. O Estado é feito pelas pessoas que ocupam essas diversas instituições, sendo que em determinados países algumas são mais relevantes do que outras.
Nos EUA, por exemplo, o Legislativo predomina, mas o Supremo tem a palavra final. O Executivo não tem a preeminência que ele tem no caso do Brasil, que compra parlamentares para seus fins próprios, ou seja, para servir às pessoas que ocupam o poder executivo.
Ainda assim estamos melhor do que na vizinha Venezuela, onde o caudilho que se chama presidente emasculou o Legislativo e subordinou o Judiciário à sua vontade exclusiva.

Você me pergunta, ademais, se:
"Estaria o Brasil como a França na Revolução? Um país rico com um governo pobre?"

Respondo: não, ao contrário, não estamos em revolução, mas em consilidação democrática, ainda que nossa democracia seja de baixa qualidade e certas pessoas e partidos se empenham em torná-la ainda mais frágil.
No Brasil, o Estado é rico, e o povo é pobre, e este é pobre justamente porque o Estado arranca seu dinheiro de várias maneiras.
O Brasil é uma completa aberração em matéria de carga fiscal. É o ÚNICO país no mundo que tem uma carga tributária de 40% do PIB para uma renda per capita que é inferior a 10 mil dólares.
Essa situação se reflete, por exemplo, numa remuneração de magistrados que seja a ser 60 ou 70 vezes (e não estou contando as mordomias) um salário mínimo, quando em países decentes essa relação não alcança a 10 ou 12.

Tenho muitas ideias para resolver os problemas do Brasil, muitas delas refletidas em dezenas de artigos que tenho assinado desde muito tempo, e em alguns livros publicados.
Não creio, porém, que o Brasil, ou a sociedade brasileira esteja preparada para começar um processo sério de reformas. Acho que vamos decair um pouco mais, e talvez ter até um desastre fiscal e um rebrote inflacionário, quem sabe até uma crise econômica e social, antes de enfrentar as reformas. Nada digo sobre a qualidade da educação, que infelizmente continuará decaindo pelos anos à frente, parda maior desgraça do povo brasileiro.
Vamos chegar nos 200 anos de independência sem ter conseguido fazer deste país uma nação mais justa ou desenvolvida. Infelizmente.
Posso estar errado, mas é o que vejo atualmente.
Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 15.06.2010)

Bertrand Badie - La Diplomatie Contestaire

Os franceses, de direita ou de esquerda, têm um enorme problema de semântica, ou de vocabulário. Eles não gostam da palavra "globalisation", e preferem escrever e falar "mondialisation".
Pura birra, como diria alguém, com os americanos. Sim, de esquerda ou de direita, os franceses também não suportam ouvir ou ler que os americanos os salvaram duas vezes dos alemães, sem o que eles teriam perdido duas guerras -- como perderam, de fato -- e estariam, ou teriam ficado, muito piores sem a ajuda, fundamental, americana.
Eles não gostam de serem lembrados desses fatos tão simples.
Bem, talvez seja por isso que eles aderem a essa tal de "diplomacia contestadora", com a qual certamente concordarão vários partidários aqui.
Sim já se disse que o Brasil é capaz de dizer não, como se isso fosse um traço distintivo de uma diplomacia que se preze.
Em todo caso, deixo vocês com um francês que conhece bem o Brasil, já foi convidado dezenas de vezes, vem com prazer, e fala o que gostam de ouvir seus interlocutores tupiniquins...
Paulo Roberto de Almeida

"Le ressort de la diplomatie contestataire sera cassé quand nous comprendrons le mot mondialisation"
Bertrand Badie
Le Monde Idées, 15 Juin 2010

Zoo : Que signifie exactement diplomaties contestataires ? Après tout, chaque Etat est souverain, n'a-t-il pas le droit de dicter sa propre conduite des affaires ?
Bertrand Badie : Dans la vision classique, les relations internationales étaient affaire de compétition entre puissances.
Dans l'Europe du XIXe siècle, et même encore jusqu'à la seconde guerre mondiale, des Etats de puissance comparable venaient à s'affronter, espérant chacun pouvoir l'emporter sur les autres ou du moins améliorer sa propre situation.
La bipolarité a, d'un certain point de vue, confirmé et simplifié cette vision, puisque deux blocs de puissance équivalente s'affrontaient avec l'espoir de tirer un avantage sur l'autre.
Aujourd'hui, les choses ont profondément changé : les acteurs sont beaucoup plus nombreux, et surtout, de puissance très inégale. A tel point que la plupart des Etats qui composent la scène internationale n'ont pas le moindre espoir de faire jeu égal avec ceux qui prétendent la dominer.
Dès lors, le jeu des petits ou des moyens renvoie à un dilemme nouveau : soit être clientélisé par une superpuissance, soit se replier sur sa faiblesse pour n'avoir aucune existence au plan international.
Ceux des Etats qui refusent une telle alternative construisent une diplomatie non plus fondée sur la puissance, mais sur la contestation : celle-ci est à la portée de tous, elle est considérablement moins coûteuse, elle mobilise des moyens rhétoriques, symboliques ou, à la rigueur, des instruments très élémentaires de puissance ; elle permet d'exister sur la scène internationale, d'y acquérir même une certaine visibilité, souvent plus grande que le poids réel des Etats qui la pratiquent, et elle peut même créer une situation de nuisance qui pèse grandement sur le jeu diplomatique mondial.
A la limite, le petit et le faible, se trouvant moins entravés par tout un ensemble de contraintes communes aux grandes puissances, peuvent, sur ces bases, développer une politique proactive là où les puissances classiques sont alors condamnées à être réactives.
De tous ces points de vue, la diplomatie contestataire se révèle payante, même si elle connaît des gradations : entre la contestation autoritaire et martiale de la Corée du Nord et celle, plus rhétorique et symbolique, du Venezuela de Chavez, il y a une marge très grande dans laquelle on retrouve des acteurs aussi différents qu'Ahmadinejad, Robert Mugabe ou Loukatchenko.
A l'extrême limite, des diplomaties qui connaissent une assise et une modération plus grandes peuvent également y recourir de manière partielle, à l'instar du Brésil de Lula, de l'Afrique du Sud ou même de la Turquie.
Il ne faut pas tenir une telle diplomatie pour dérisoire ; ce serait une erreur de ne voir chez toutes que de la nuisance : elles contribuent aussi à transformer le système international, à réviser certaines conceptions figées qui s'y sont enkystées, à remettre en cause des dominations faciles et évidentes au premier coup d'oeil, mais dysfonctionnelles à long terme.

Albert : N'est-il pas légitime de contester l'évolution des relations internationales devant l'hégémonie américaine qui tend à dominer l'ordre mondial ?
Bertrand Badie : Oui, cette diplomatie contestataire a sa part de légitimité.
Surtout que, depuis 1989, une sorte de consensus forcé s'est imposé sur la scène internationale. La superpuissance ne trouve plus son pareil ; un bloc "occidental" prétend se constituer sur une ligne oligarchique, revendiquant un droit naturel d'imposer sa propre vision sur l'ensemble de la scène internationale.
Outre qu'une telle évolution est douteuse sur le plan éthique, difficilement acceptable par ceux qui ne s'identifient pas à un tel bloc, elle crée les conditions d'un conservatisme politique, économique et social, pour ne pas dire culturel, qui peut se révéler dangereux et qui, loin d'avoir éteint les principaux conflits, tend aujourd'hui, au contraire, à les aggraver.
Aux facteurs que vous énoncez, il convient d'ajouter la paralysie du multilatéralisme, notamment depuis le départ de Kofi Annan, la montée en puissance des diplomaties de club et des nouvelles formes d'oligarchie plus ou moins formalisées, autant d'éléments qui rétrécissent le débat, qui l'insèrent dans un cadre limitant les possibilités de réforme et de transformation de l'espace mondial.
Il convient de redonner au monde les vertus d'un réel pluralisme sans lequel la mondialisation risque d'être dévoyée et utilisée par certains de manière néfaste : le langage de la contestation en cela peut faire sens, encore faut-il que les règles du système international et les idéologies qui se développent à la marge de celui-ci ne donnent pas à cette contestation une dimension de violence et de négation de l'altérité qui pourrait aggraver encore les formes nouvelles de conflictualité.
Robert : Cette contestation est tout de même condamnable?
Bertrand Badie : Toute contestation n'est pas en soi condamnable. Au contraire, elle s'inscrit dans un débat nécessaire.
Ce sont les formes et les usages de cette contestation qui, comme je l'indiquais à l'instant, peuvent conduire à des pratiques bien sûr dangereuses et condamnables.
En fait, on ne s'étonnera pas de retrouver à l'échelle mondiale ce que l'on a constaté à l'échelle des sociétés européennes au XIXe siècle : face à une domination qui n'est pas institutionnellement limitée ou contrôlée, se forment des contestations qui dérivent très vite dans la violence, l'arbitraire ou l'absolue intolérance.
Ce terrible face-à-face que les vieilles sociétés européennes ont connu au début de l'ère industrielle n'a disparu que grâce à un effort d'institutionnalisation, de redistribution, et surtout, de reconnaissance des altérités.
Les choses sont devenues moins graves le jour où les classes ouvrières européennes ont pu accéder à la citoyenneté : on peut souhaiter qu'il en soit rapidement de même pour les peuples marginalisés au sein de l'espace mondial.
Andrew : Pour qu'il y ait contestation, il faut qu'il y ait une tendance majoritaire. Or, aujourd'hui, les Américains ont moins la main sur la gestion des affaires mondiales, l'Europe est malade, les BRIC, pas assez convainquant pour proposer une alternative crédible. N'est-ce pas dès lors plus facile de contester dans ces conditions ?
Bertrand Badie : Vous avez en grande partie raison. La contestation à l'échelle mondiale n'aurait certainement pas cette vigueur si les formes actuelles de domination n'étaient pas en crise, tant sur le plan matériel que symbolique.
On est même, de ce point de vue, dans une situation optimale, des plus favorables à la montée en force des contestations les plus radicales. Car d'une part, les puissances dominantes sont affaiblies, mais d'autre part, elles revendiquent avec force leur unité, notamment à travers la réhabilitation de l'idée d'"Occident", et elles cherchent, depuis le néoconservatisme et ses succédanés européens plus récents, à pérenniser leur leadership en adhérant à des formules de plus en plus particularistes, exclusives, stigmatisant l'autre, et manquant au grand principe kantien du respect, consistant à valoriser l'autre surtout lorsqu'il vous est très différent.
La campagne de stigmatisation de l'islam, qui confond souvent des formes de radicalité extrémiste avec toute une culture ou une religion, en est un exemple particulièrement probant mais extraordinairement dangereux.
Mag : La politique étrangère américaine depuis 2003 (invasion de l'Irak) peut-elle être qualifiée de "contestataire" étant donnée qu'elle va parfois à l'inverse des positions du conseil de sécurité de l'ONU, à l'instar des diplomaties iraniennes ou Nord-Coréennes ?
Pauline : L'ingérence des Etats-Unis n'est ce pas de la diplomatie contestataire ?
Bertrand Badie : Certes, on est toujours le contestataire de quelqu'un : il arrive même au Medef de contester des politiques ou des pratiques économiques...
C'est d'ailleurs dans la ligne de ce que vous venez de dire que les Etats-Unis ont été plusieurs fois qualifiés à leur tour d'Etat voyou. Mais il convient ici non pas d'isoler des pratiques de contestation, mais de comprendre des choix politiques et de gouvernement faisant de la contestation une arme pour exister et pour défier une puissance dominante.
Les Etats-Unis marquent leur domination en défiant certaines règles et certaines institutions, mais certainement pas en cherchant à dénoncer des formes de leadership qui s'exerceraient à leurs dépens.
Prado : Quels sont les effets pour le Brésil d'avoir parrainé l'Iran, la Venezuela et Cuba ?
Bertrand Badie : Non, le Brésil ne "parraine" ni l'Iran, ni le Venezuela, ni Cuba. La diplomatie brésilienne est en réalité beaucoup plus subtile. Elle s'inscrit dans une relecture de la mondialisation en considérant que celle-ci n'est viable que si les politiques étrangères des uns et des autres gardent le contact avec tous, luttent contre les phénomènes d'isolement ou de marginalisation qui ont mécaniquement et toujours conduit à la radicalité.
Il faut quand même bien comprendre, et il serait temps, que la mondialisation ne conduit pas tant à la compétition de puissances et à la confrontation qu'à l'interdépendance et l'interpénétration des Etats.
C'est une lecture partielle et surpolitisée qui tend à réintroduire, souvent de manière artificielle et excessive, les formes anciennes de conflictualité.
Les puissances émergentes comme le Brésil, la Turquie, l'Afrique du Sud, ont une excellente carte à jouer. Etant à la charnière des pauvres et des riches, des anciens forts et des toujours faibles, elles peuvent accomplir une médiation active dans un contexte où les tensions Nord-Sud sont de plus en plus vives et de plus en plus dangereuses. Elles ont l'avantage d'être audibles et crédibles par tous ou presque tous : le Brésil et la Turquie ont cette qualité exceptionnelle d'être en bons termes et en situation de respect avec à peu près tous les acteurs de l'espace mondial. Ils bénéficient ainsi d'un avantage diplomatique considérable par rapport aux grandes puissances d'hier.
La stabilité internationale passera tôt ou tard par la reconnaissance de leur posture médiatrice, à condition que ces Etats s'accrochent à ces nouvelles pratiques qu'ils ont inaugurées et ne s'en trouvent pas maladroitement dissuadés.
BreakingNews : La poussée diplomatique du Brésil (accord de Téhéran) oblige-t-elle le Venezuela, la Colombie et l'Argentine à prendre des initiatives internationales pour suivre le rythme de Lula ?
Bertrand Badie : Le jeu du Venezuela est depuis quelques années assez clair, consistant à déborder Lula sur sa "gauche", pratiquant une diplomatie un ton plus contestataire que celle du grand voisin brésilien.
A ce jour, l'habileté de Lula a contribué à marginaliser quelque peu le jeu de Chavez, dont effectivement on entend moins parler.
La grande question est de savoir si, avec la prochaine élection présidentielle au Brésil, cette option pourra être conservée à Brasilia et si le leader vénézuélien ne tirera pas profit de l'avènement d'une nouvelle équipe à la tête de son grand voisin.
La Colombie d'Uribe a joué dans cette compétition la carte américaine, qui a été confirmée lors de la récente élection présidentielle. Tout indique que la puissance andine continuera à jouer la carte des Etats-Unis dans le subcontinent de demain.
Enfin, l'Argentine maintient ce rôle difficile d'éternel second face à son voisin du nord : au hasard des élections, ce rôle fluctue entre un suivisme diplomatique de Brasilia, qui a été pratiqué par le président Kirschner, puis son épouse, et un retour vers l'orbite américaine, comme on a pu le constater autrefois et comme on pourrait bien le voir à nouveau lors de la prochaine élection présidentielle.
Dans tous les cas de figure, c'est bien le paradigme d'une contestation modérée qui structure, en point ou en contrepoint, les diplomaties latinoaméricaines qui en tout cas ont durablement coupé du suivisme étatsunien qu'on a connu autrefois.
007 : Pour vous, la Turquie est-elle entrée dans le club des diplomaties contestataires ?
Bertrand Badie : Encore une fois, nous prenons la contestation non pas comme une catégorie unique, mais comme une hypothèse qui permet de décrire toute une gradation de pratiques diplomatiques réelles.
Il y a évidement une part de contestation dans la nouvelle diplomatie turque : d'une part, parce que Ankara en a besoin pour s'affirmer comme puissance régionale compatible avec tous ses voisins, d'autre part, parce que le refus que l'Union européenne lui a opposé a généré chez les dirigeants comme au sein de l'opinion publique turque un goût nouveau pour la dénonciation des formes consacrées de domination.
Le vote turc au Conseil de sécurité lors des débats sur la résolution 1929 sanctionnant l'Iran est un inédit que les chancelleries auraient intérêt à méditer. Il y avait bien longtemps que la Turquie n'avait pas exprimé de façon si nette et si claire son opposition à la politique occidentale qui ce jour-là entendait mener le jeu.
Phil : Quelle est désormais la marge de manoeuvre de l'Iran ?
Bertrand Badie : Justement, le propre de la diplomatie contestataire est d'avoir une marge de manoeuvre bien plus large que celle des Etats qui accomplissent une politique de domination.
La contestation peut s'émanciper de principes acquis, voire de règles reconnues. Elle ouvre un éventail d'options considérablement plus large que la poursuite d'objectifs précis et programmés.
La diplomatie iranienne a déjà remporté un succès non négligeable en réussissant à mettre la question du nucléaire israélien au centre des débats sur la non-prolifération. Si on continue à la sanctionner et à lui montrer des muscles, elle peut s'ingénier à renforcer sa contestation et à faire monter les enchères avec les puissances qui la menacent.
Le paradoxe de la diplomatie contestataire tient au fait que plus on s'occupe d'elle et l'invective, plus elle se renforce et accroît ses capacités de nuisance.
Beau programme en perspective qui, soit dit en passant, contribue aussi à museler un peu plus l'opposition au sein de la société iranienne, qui ne peut en aucune façon risquer de gêner les crispations nationalistes de ses dirigeants !
Scpo bdx : Que pensez-vous de la situation en Corée du nord à court terme ?
Bertrand Badie : Le paradoxe tient au fait que la Corée du Nord a besoin d'interdépendance, ne serait-ce que pour survivre. Par le choix contestataire, elle cherche à créer les conditions de sa rentrée dans le jeu international et de son acceptation comme partenaire, comme déjà les précédents épisodes (1994) l'avaient révélé.
Ses interlocuteurs tendent en ce moment à jouer le jeu inverse, renforçant un peu plus l'isolement de Pyongyang, croyant avec beaucoup d'illusions que cette attitude pourrait conduire le système nord-coréen à changer.
Krusty : Si les diplomaties contestataires sont le signe de la crise de légitimité de la structure actuelle des relations internationales, le fait de réformer le Conseil de Sécurité peut-il, par exemple, être un moyen de trouver un nouvel équilibre ?
Bertrand Badie : C'est effectivement le signe d'un manque de légitimité de notre système international, mais pas seulement.
Comme je le suggérais tout à l'heure, c'est aussi une façon d'exister, de ne pas disparaître dans l'anonymat du cortège des 192 Etats, et c'est également une manière de gouverner sa propre société.
Dès lors, si une réforme positive du système international peut aider à décrisper cette contestation, il faudrait que cette réforme puisse aller bien au-delà d'une simple adaptation institutionnelle.
Bien sûr, un Conseil de sécurité réformé et élargi serait un signal fort et positif. Mais outre qu'une telle réforme paraît pour l'instant très improbable, elle n'aurait d'effet qu'à la surface du système tel que nous le connaissons aujourd'hui.
Le ressort de la diplomatie contestataire ne sera vraiment cassé que lorsque nous comprendrons enfin ce que veut dire "mondialisation", ce que signifie pour la première fois dans l'histoire de l'humanité la coexistence d'Etats si profondément inégaux dans leurs ressources, leur niveau de vie et la reconnaissance dont ils disposent.
Jamais dans l'histoire de tels fossés n'ont été officialisés comme aujourd'hui. On ne sait pas passer d'un système international fait d'un club d'ego à un système englobant une humanité tout entière dont les décalages matériels et symboliques qui les séparent sont si grands.
CM : La politique de la main tendue d'Obama est-elle encore crédible ?
Bertrand Badie : Elle sonnait juste car elle tentait de rectifier une politique étrangère qui, justement, était totalement ignorante de l'altérité. A ce titre, elle a été largement bien accueillie.
Mais le plus dur reste à faire : un an après le discours du Caire, le passage à l'acte devient indispensable pour maintenir la crédibilité des propos.
Du coup, un grand problème vient à apparaître : les politiques étrangères dominantes ont-elles les moyens pratiques de désamorcer les contestations, de les décourager et de les décrédibiliser ? La difficulté du président américain à dénoncer les récentes initiatives israéliennes montre que le chemin est particulièrement ardu.
Telenil : L'anti-américanisme se retrouve dans le discours de plusieurs des pays qui pratiquent la "diplomatie contestataire". Faut-il y voir une ligne commune, ou ces pays critiquent-ils séparément la première puissance mondiale, sans se rapprocher les uns des autres ?
Bertrand Badie : L'antiaméricanisme est un ciment des diplomaties contestataires pour une raison évidente : la contestation est un discours qui s'adresse bien sûr au dominant.
Maintenant, il y a entre les antiaméricanismes des différences de substance : celui qui s'est établi au Moyen-Orient est très nettement dominé par l'alignement de Washington sur Tel-Aviv, tandis que celui qui s'est installé en Amérique latine est beaucoup plus diffus, renvoyant à une mémoire beaucoup plus vaste.
C'est probablement pour cela qu'il serait simpliste de postuler l'homogénéité des diplomaties contestataires et leur capacité de se confondre dans un même moule. Toutes les tentatives récentes ou plus anciennes de fusion ont abouti à l'échec.
La vraie crainte, que j'aimerais ne pas avoir, est qu'un dénominateur commun vienne à se constituer autour d'une répudiation globale d'un bloc occidental qui se reconstitue sur sa prétention hiérarchique.
A ce moment-là, la contestation se confondrait avec la volonté de dépasser une humiliation commune : le risque serait alors élevé que la diplomatie de contestation se transforme en conflit d'humiliation.

Aquecimento da economia brasileira? - Antonio Correa de Lacerda

O autor provavelmente tem razão na interpretação dos indicadores. O problema é que como a parte fiscal (Ministério da Fazenda) não faz o seu dever, o BC tem de se encarregar de todo o trabalho de evitar a inflação...
Paulo Roberto de Almeida

Não há superaquecimento da economia
Antonio Corrêa de Lacerda - São Paulo
Terra Magazine
Quinta, 10 de junho de 2010, 08h20

O desempenho do PIB (Produto Interno Bruto) referente ao primeiro trimestre do ano, com crescimento de 2,7% em relação ao trimestre anterior tem suscitado uma preocupação exagerada e infundada a respeito do risco de um alegado superaquecimento da economia brasileira. Algo que não se sustenta à luz da interpretação dos indicadores. O comportamento das vendas, no comércio varejista ampliado, do próprio IBGE, por exemplo, apontam um crescimento robusto, de 9,6%, no acumulado de doze meses. No entanto, além do efeito estatístico da base de comparação muito baixa dos primeiros meses do ano anterior, há o impacto do estimulo proporcionado pela redução de impostos em setores como móveis e automóveis, por exemplo.

Ambos os efeitos serão amenizados nos próximos meses, na medida em que a base de comparação for maior e também refletir o final da vigência de medidas de incentivo ao consumo. A expansão do crédito, outro fator de impulso das vendas, também mostra sinais de esgotamento, pela própria limitação da capacidade de endividamento dos consumidores. Portanto, o ritmo vai gradualmente refluir.

Já, na indústria, o quadro é bem diferente. Nos doze meses acumulados até março, comparativamente aos doze meses imediatamente anteriores, a produção física da indústria, do IBGE, ainda apresenta uma queda (sic) de 1,2% ! A indústria mergulhou profundo na crise e o vale foi o primeiro trimestre do ano passado. Desde então, vem se recuperando, mas ainda não voltou aos níveis pré-crise.

De forma estratificada, os dados são ainda mais impactantes. A produção de bens de capital, pelo mesmo critério, apresenta uma diminuição de 10% ! Embora haja uma perspectiva de crescimento industrial forte para o ano de 2010, nada indica um quadro de crescimento excessivo.

Não há, por outro lado, um risco de esgotamento da capacidade industrial. O nível de utilização da capacidade industrial, da CNI, vem de fato crescendo mês a mês. Os dados refletem uma pesquisa realizada junto ás indústrias sobre o quanto estão utilizando da sua capacidade instalada. O indicador é proveitoso, mas precisa ser qualificado, por três motivos principais:

i) as empresas têm capacidade de ampliar rapidamente a sua capacidade de produção, sem grandes novos investimentos. Isso se dá mediante adaptações nas linhas de produção, modernização e, o mais importante, adoção turnos adicionais e o trabalho em períodos ociosos, como horário noturno, ou finais de semana;
ii) é muito difícil sistematizar e confrontar a análise da fotografia do uso da capacidade instalada com os novos investimentos em realização e previstos, de forma a indicar qual a nova capacidade de produção que poderá ser atingida no médio prazo;
iii) o coeficiente de importação vem aumentando, o que altera a estrutura da base produtiva, portando gerando mais espaço para crescimento.

Conjunturalmente, há ainda um fator de enorme incerteza que é o desdobramento da crise na Europa e seus impactos para o Brasil. Há, pelo menos três aspectos significativos: i) do lado comercial, com o bloco europeu crescendo menos, isso vai impactar diretamente 22% das nossas exportações para lá direcionadas; ii) a redução dos fluxos de capitais, leia-se investimentos diretos, inversões na bolsa de valores, e financiamentos, que farão diminuir a liquidez no mercado brasileiro; iii) uma queda nos preços, especialmente das commodities.

Há muitas variáveis em jogo, muitas delas imponderáveis. O risco envolvido é o de exagerar no freio de mão, quando as condições da pista já envolvem, seja pelos efeitos estatísticos, seja pela mudança brusca das condições metereológicas, uma redução natural da velocidade média do veículo.

O BCB vai ter que ter muita perícia para tomar decisões sobre taxas de juros e outros, que só farão efeito para o nível de atividades, daqui a cinco, seis meses. Para isso, terá que olhar menos para o retrovisor - os indicadores passados - e mais para o parabrisa, um tanto nebuloso à frente. O que vai lhe exigir muito feeling, intuição. Os dados passados ajudarão pouco e as variáveis estão mudando substancialmente.

Antonio Corrêa de Lacerda é professor-doutor do departamento de economia da PUC-SP e autor, entre outros livros, de "Globalização e Investimento Estrangeiro no Brasil" (Saraiva). Foi presidente do Cofecon e da SOBEET.
Fale com Antonio Corrêa de Lacerda: alacerda@terra.com.br

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