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sábado, 30 de dezembro de 2023

500 anos da primeira viagem de volta ao mundo: postagem sobre os livros mais relevantes sobre Fernão de Magalhães

Uma postagem antiga, mas ainda válida: 

 

sábado, 12 de janeiro de 2019

Fernão de Magalhães: livros sobre a primeira viagem de circunavegação


Projeto Fernão de Magalhães - leituras

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: mini-resenhas; finalidade: preparar projeto]
  
Leitura de alguns livros sobre Fernão de Magalhães, com notas sintéticas.

Resumo sobre o custo da primeira viagem de circunavegação: pode-se calcular que o custo total da viagem de Fernão de Magalhães foi, em preços atualizados de hoje (um ducado espanhol do início do século XVI equivalente aproximadamente a US 150), de 3 milhões e setecentos mil dólares.


1) José Maria Latino Coelho: Fernão de Magalhães, com um prefácio de Júlio Dantas; 4a ed.; Lisboa: Empresa Literária Fluminense, 1921
 “Pour écrire en prose, il faut avoir quelque chose à dire.” – Maupassant.
“Designado Fernão de Magalhães por capitão-mor da expedição entrou a governar a Trinidad, que ia por capitania. A segunda caravela Santo Antoniocapitaneava João de Cartagena. A terceira, por nome Concepción, mandava Gaspar de Quesada, e fazia nela o ofício de piloto o celebrado Elcano, que mais particularmente partilhou com Magalhães as glórias desta longa navegação e descobrimento. A quarta, cuja invocação era Victoria, comandava Luiz de Mendonça. Na caravela Santiago embarcou de capitão João Serrano, que era ao mesmo tempo piloto-mor de toda a frota. Tripulavam ao todo as cinco embarcações duzentos e trinta e sete homens...” (152-3). 
“Fernão de Magalhães foi a Burgos, onde estava  imperador e lhe beijou a mão, e o imperador lhe deu mil cruzados de acostamento para gasto de sua mulher enquanto fosse sua viagem...” (p. 154, Gaspar Corrêa, Lendas da Índia, tomo II, parte II, p. 627).
“Largou de Sevilha a armada em 1 de agosto de 1519, e aos 27 de setembro desaferrou do porto de San Lucar, aproando ao rumo das Canárias. Tomando terra em Tenerife para refrescar, e aperceber-se de vitualhas, passando na volta de Cabo-Verde e endireitando para a América, surgiram na baia de Santa Luzia, de onde saíram a 27 de dezembro. Chegando ao rio da Prata, foi a nau Santiago pelo rio acima, até 25 léguas de sua foz, e veio trazendo nova de que o rio se alargava para o norte.” (p. 156)
Citação de Gaspar Corrêa: “Partiu-se de Canarias de Tenerife e foi demandar Cabo-Verde, donde atravessou à costa do Brasil, e foi entrar num rio que se chama Janeiro... E daqui foram navegando até chegarem ao cabo de Santa Maria, que João de Lisboa descobrira no ano de 1514...” (p. 159) 
Revolta de João de Cartagena e outros: “Usou Fernão de Magalhães de extrema severidade para com os capitães que se haviam alevantado contra ele e andavam apostados para o matar. Foi sumaríssimo o processo, com que os sentenciou à pena capital,... e fez neles justiça crudelíssima.”(p. 161) “Veio depois Fernão de Magalhães junto da caravela de João de Cartagena, e por ardil de que usou para evitar um rencontro, onde poderia derramar-se muito sangue, entrou na embarcação e ao Cartagena prendeu e mandou esquartejar com pregão de traidor...” (p. 162; cita Gaspar Corrêa, Lendas da Índia, tomo II, parte II, p. 629).
“Não era apenas a vida que o lustre português havia de perder, se chegasse a vingar a sedição dos espanhóis. Era a própria empresa em que se empenhava, e a glória que já sonhara para si, e os louros imortais de ousado aventureiro e de feliz descobridor. (p. 163-4). 
“A 24 de agosto de 1520 se fizeram de novo ao mar as caravelas.
“Pouco depois naufragou, na violência de uma borrasca, a nau Santiago, em que ia o piloto-mor João Serrano, sem que houvesse que lastimar a perda da tripulação e da fazenda.” (p. 165) “Navegaram as quatro caravelas que ainda restavam, até darem fundo num rio a que deram o nome de Santa Cruz, e guarnecendo-se ali contra os temporais, e fazendo aguada e provisão do que a terra podia ministrar, a 18 de outubro se aventuraram de novo ao Oceano.” (p. 165-6).
Fugiu uma nau [Santo Antonio, de Mesquita] de volta à Espanha. Sobraram Concepción, Victoria e Trinidad, que engolfaram-se pelo estreito, e “saiu afinal no Mar do Sul, a 27 de novembro de 1520, depois de ter gastado vinte e dois dias nesta derrota.” (p. 168-9). 
“Navegando sempre a noroeste passou Fernão de Magalhães a 13 de fevereiro de 1521 o equador, e chegando aos 13o de latitude boreal, descobriu um arquipélago, a que chamou de ilha dos Ladrões, por lhe parecer que os índios seus habitadores eram mui inclinados à rapina.” (p. 172) Morte de Magalhães. 
De volta à Espanha, Sebastian de Elcano recebeu de Carlos V o galardão de alta façanha, e por divisa de seu brazão o moto Primus circumdedisti me. (p. 192-3)

2) Visconde de Lagoa: Fernão de Magalhães: a sua vida e a sua viagem. Lisboa: Seara Nova, 1938, 2 vols. 
“As cinco naus, adquiridas de segunda mão, importaram em 1.315.750 maravedis, sendo deficientíssimo seu estado de conservação, a julgar pelas longas e dispendiosas reparações que sofreram, e ainda pelas seguintes palavras com que Sebastião Alvares as descreve ao rei de Portugal, ‘sam muy velhos e remêdados... e certifico a vossa alteza que pa Canaria navegaria de maa vontade neles..” (p. 251). 
“Sumario de todo el coste que tuve la armada de Magallanes (p. 257)
1519, sem outra data (maravedis)
3.912.241 – coste de las cinco nãos de la armada, con sua aparejos
415.000 – cosas de despensa y cobre, aparejos para pesqueria, cartas...
1.589.551 – viscocho y vino, carne, aceite y pescado, quesos...
1.154.504 – sueldo de cuatro meses para 237 personas (capitanes...)
1.679.769 – ropas de seda y paño para dadivas, mercadorias de rescate...
__________
8.751.125 – Así parece monta en todo el gasto de la dicha armada (p. 258)
8.334.335 – Costo total menos rebate abajo
416.790 – rebate de las cosas que quedaron en la Casa de Contratación (Sevilla)
6.454.209 – fornecido por S.M.
1.880.126 – fornecido por Cristobal de Haro
8.334.335 – Custo total, “equivalentes a pouco mais de 20.000.000 de réis ouro”

 [Problema PRA: qual o valor do reis ouro em 1500?]


“É curioso notar que o custo total da expedição de Cristovão Colombo foi apenas de 1.167.542 maravedis”. (p. 259) [Nota de rodapé a esta informação: “Em 1919, por motivo do 427 aniversário da América, publicaram alguns periódicos americanos um extrato das despesas feitas com a primeira viagem de Colom. Dele extractamos as verbas seguintes: “Seis meses de soldo ao Almirante: 500 pesetas; ao capitão da Pinta, 450; ao da Nina, 400; às tripulações das três caravelas em número de 120 homens, 10.500; equipamento da frota, 14.000; víveres, 2.900; dinheiro adiantado a Colombo, 52.492; ao capitão Alonso Pinzón, 14.000. Total: 65.242 pesetas”. (p. 259).

3) Queiroz Velloso: Fernão de Magalhães: a vida e a viagem. Lisboa: Editorial Império, 1941.
“Em 20 de outubro de 1517, chegou Fernão de Magalhães a Sevilha...” (...) (p. 33: cap. V: A Capitulação ajustada com Carlos I). “Magalhães já casara com a filha do seu hospedeiro, Beatriz Barbosa, que lhe trouxera um dote de seiscentos mil maravedis.” (p. 34-5) “Carlos I desembarcara em 19 de setembro de 1517, num porto das Astërias, e a 18 de novembro chegara a Valladolid. Muito novo, empreendedor, desejoso de engrandecer seus Estados, as circunstâncias era favoráveis à pretensão de Magalhães.” Com rapidez impressionante, a 22 de março de 1518, promulgava o rei a Capitulação com o bacharel Rui Faleiro e Fernão de Magalhães, autorizando a projetada viagem, que não seria feita en la demarcación é limites del Serenísimo Rey de Portugal. Comprometia-se Carlos I a dar-lhes a veyntena dos lucros, com o título de Adelantados (p. 36) é Governadores de todas as terras e ilhas descobertas; a mandar armar cinco navios, com 234 homens, abastecidos de víveres e munições para dois anos; e a transmitir imediatamente a respectiva ordem à Casa da Contratação das Índias. No mesmo dia assinou o monarca três cédulas, uma nomeando Magalhães e Faleiro capitães da armada, com poderes ilimitados, as outras fixando a cada um deles o soldo anual de 50.000 maravedis. De caminho para Saragoça, em Aranda de Duero, por cédulas datadas de 17 de abril, mandou repartir igualmente pelos dois 60.000 maravedis, como ajuda de custo; e aumentou-lhes o soldo com 8.000 maravedis mensais, durante todo o tempo que servissem na armada.” (p. 37)
A Casa de Contratação fez saber ao rei que não havia dinheiro. Atrasou-se o empreendimento. (...)
“Em Barcelona, onde chegara a 15 de fevereiro de 1519, tomou Carlos I uma série de providências, assaz reveladoras do interesse que merecia a empresa. A 30 de março foram publicadas três cartas régias: uma, mandando entregar a João de Cartagena a capitania do terceiro navio – dos dois primeiros eram capitães Fernão de Magalhães e Rui Faleiro – com o soldo anual de 40.000 maravedis; outra, nomeando o mesmo João de Cartagena vedor da armada, com o soldo de 60.000 maravedis: e a última, nomeando tesoureiro Luiz de Mendoza, com vencimento anual igual ao do vedor.” (p. 41-2)
“Em 8 de maio, promulgou Carlos I as instruções que deviam reger a armada, desde a sua partida até a posse das terras a que se destinava. É um diploma excessivamente minucioso, como todos os Regimentos da época. (...) Nas instruções aparece, mais uma vez, a proibição de tocarem nos domínios do rei de Portugal.” (p. 44)
“O anúncio da expedição chamara a Sevilha muitos matalotes de Portugal. Magalhães contratara-os, não como compatriotas, mas por serem os mais hábeis marinheiros do mundo.” (p. 46)
VIII – O Custo da Armada (p. 49-52)
“(...) Segundo a Relación de todo gasto de la armada de cinco nãos que van al decubimiento de la Especeria, o rei dispendeu na compra e reparação dos navios, aparelhos, armamento, munições, mantimentos, mercadorias e adiantamentos de soldo, 6.870.999 maravedis. Deduzidos, porém, 416.790 maravedis, importância das mercadorias, armas e pólvora, que não seguiram na expedição e ficaram armazenadas em Sevilha, monta o gasto do rei a 6.454.209 maravedis, ou 18.600 ducados e 9 marvedis, à razão de 374 maravedis por ducado.” (p. 49-50)
“Cristovão de Haro forneceu à Casa da Contratação, para aquisição de mercadorias, 1.616.781 maravedis; e mais 263.345 maravedis que pagó en las cosas necessárias a la armada... (...) Juntando, (...) podemos fixar o custo total da armada r, 8.546.349 maravedis, ou 24.629 ducados e 86 maravedis.”(p. 50)
IX – A Organização da Armada
“Na quarta-feira, 10 de agosto de 1519, após uma salva de artilharia, saiu a armada de Sevilha para a foz do Guadalquivir.” (p. 54)
Naus: Trinidad (11 toneladas); San Antonio (120 t.); Concepción (90 t.); Victoria (85 t.); Santiago (75 t.). Pigafetta diz que a tripulação se compunha de 237 homens. (p. 55) “Entre eles figuram italianos, franceses, alemães, flamengos, gregos e um inglês. Espanhois, comparativamente, alistaram-se poucos, alegando a insuficiência de soldo e a repugnância de servir um capitão português. Carlos I, afinal, permitira que, além dos pilotos, pudessem seguir mais dez portugueses.” (p. 55-6)
“Aos sobresalientes da Trinidad pertencia também Antonio Pigafetta, alistado sob o nome de Antonio Lombardo... [Nota de rodapé: percebia o soldo mensal de mil maravedis. Antes da partida recebeu quatro meses adiantados. Depois do regresso – pois foi um dos dezoito que voltaram ao porto de saída – cobrou, além da respectiva quintalada, 32.924 maravedis, correspondentes à duração da viagem.] (p. 56)
“A 29 de novembro de 1519, passam ao largo do cabo de Santo Agostinho, na costa do Brasil. A 8 de dezembro avistam terra, e a 13, havendo dobrado o Cabo Frio, fundeiam na baia do Rio de Janeiro. Nesta região paradisíaca permaneceu a armada duas semanas para descanso da tripulação. A 26 ou 27, depois de bem provida de água, peixe, frutas, aves e lenha, continuou a viagem, paralelamente à costa.” (p. 60-1) 
Fernão de Magalhães morreu em Cebu, em 27 de abril de 1521. (...) “A morte impediu que Fernão de Magalhães voltasse a Sevilha pelo Cabo da Boa Esperança; e, no entanto, pode-se legitimamente afirmar-se que o grande navegador deu a volta ao mundo. Pelo meridiano de Greenwich, a ilha de Cebu fica situada entre 123o e 124o de Longitude Leste;” (p. 95)
Camões, nos Lusíadas, C. X, est CXL, o coloca nos versos: 
            O Magalhães, no feito com verdade
            Português, porém não na lealdade.

“O Chile considera-se descoberto pelo navegador; em 1920 comemorou, com grande solenidade, o 4o centenário da travessia do Estreito. Para assistir a essas festas convidou todas as nações da América e três da Europa: Espanha, Portugal e Inglaterra. As festas terminaram com a inauguração, em 16 de dezembro , da estátua de Fernão de Magalhães, erigida na cidade de Punta Arenas, situada sobre o Estreito e capital do território de Magallanes. ” (nota p. 98) 
A nau Victoria foi a única que retornou a Sevilha: a 6 de setembro de 1522 ancorava em San Lucar de Barrameda; e a 8 fundeava em Sevilha, com dezoito tripulantes europeus, e quatro indígenas malaios. O valor da carga – só o cravo foi estimado em 7.888. 684 maravedis – excedeu consideravelmente todas as despesas da expedição. (p. 105)

4) Stefan Zweig: Fernão de Magalhães: história da primeira circunavegação. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, s.d.; tradução de Elias Davidovich.


Lista das despesas feitas com a frota de Magalhaes, p. 281-92; extraído do 4 volume da “Coleccion de los viajes y descubimientos” de D. Martin Hernandez de Navarrete, Madrid, 1837. 
Resulta dessas despesas a soma de 8.751.125 maravedis, a deduzir 416.790, dos bens que ficaram em Sevilha; importância exata das despesas: 8.334.335; adiantado por S. Majestade: 6.454.209; adiantado por Christopher de Haro: 1.880.126. (p. 292) 

Ver postagem realizada no blog Diplomatizzando em 9/04/2018: 



O livro contém, em apêndice, o contrato concluído entre o rei espanhol Carlos I (depois Carlos V, ao realizar-se a união com os Habsburgos, da Áustria) e os dois navegadores encarregados de montar o empreendimento: Rui Faleiro e Fernão de Magalhães, feito na cidade de Valladolid, em 22 de março de 1518, segundo registro feito no quarto volume da “Colección de los viajes y descubrimientos”, de D. Martin Hernandez de Navarrete (Madrid: 1837). 
Pelas descobertas e serviços a serem prestados ao rei, assim como pelos perigos em que incorreriam, eles teriam direito a 20%, ou seja, um quinto, dos rendimentos e lucros em todas as ilhas e terras que descobrissem, além do título de governador dessas terras, para eles e para seus herdeiros, por todos os tempos. Eles também teriam licença para mandar dessas terras e ilhas o valor de mil ducados anualmente, assim como poderiam vender ou adquirir o que desejassem, bastando pagar o vigésimo como contribuição, à isenção de qualquer outro imposto, anterior ou posterior. Isso, porém, só seria válido quando do regresso da primeira viagem, e não antes. Para dar mais uma recompensa, eles poderiam reter para si, depois de escolhidas seis para o rei, duas ilhas para seu próprio usufruto (mas pagando a quinta parte nos rendimentos e lucros). 
Entrando nos detalhes de sua prestação, o rei prometia, para levar a cabo as promessas de volta ao mundo, aprestar cinco navios: dois de 130 toneladas, dois de 90 e um de 60 toneladas, equipados com tripulação, canhões e víveres para dois anos, para 234 pessoas, incluindo capitães, marinheiros e grumetes para a condução da armada. 

Quanto custou o afretamento da primeira viagem ao redor do mundo?
Mas, quanto custou tudo isso? Stefan Zweig relaciona, em um outro apêndice, a lista das despesas com a frota de Fernão de Magalhães, conforme consta do mesmo 4o. volume da “coleção de viagens e descobrimentos”, de Navarrete, de 1837. Todos os valores estão expressos em maravedis, a unidade de conta usada na Espanha entre os séculos XI e XIX, primeiro sob a forma de moedas de ouro cunhadas pelos ocupantes Almorávidas, depois sob diversas formas metálicas pelos reis católicos da Reconquista e seus descendentes, várias vezes desvalorizadas em relação à sua cunhagem original (de ouro para prata, depois vários tipos de metais, entre eles cobre). A lista resumida a seguir indica os valores dos navios e de diversas outras despesas com a frota, como segue:  
1) Navio “Concepción”, de 90 toneladas: 228.750 maravedis;
2) Navio “Victoria” (o único que retornou), de 95 toneladas: 300.000 maravedis;
3) Navio “San Antonio”, de 120 toneladas: 330.000 maravedis;
4) Navio “Trinidad”, de 110 toneladas: 270.000 maravedis;
5) Navio “Santiago”, de 75 toneladas: 187.500 maravedis.


O valor total dos navios era, portanto, de 1.316.250 maravedis. Com todos os seus equipamentos, canhões, pólvora, armaduras e lanças, o custo total da frota ascendeu a 3.912.241 maravedis. Os víveres (bolacha, vinho, azeite, peixe, carne seca, queijo e legumes, barris e garrafas para vinho e água) representaram 1.589.551 maravedis. Por sua vez, o soldo a ser pago durante 4 meses a 237 pessoas, incluindo os capitães e oficiais, requeria 1.154.504 maravedis. Mais 2 milhões de maravedis foram empregados em objetos diversos, além de mercadorias para permutas e presentes, entre eles sedas e panos. A importância total das despesas feitas com a armação completa dos cinco navios correspondia a 8.334.335 maravedis, dos quais 6.454.209 foram adiantadas pelo rei Carlos I e outros 1.880.126 maravedis por um “capitalista”: Christofer de Haro. 

Como avaliar esses valores? Seria possível atualizar o valor das despesas?
Caberia, agora, verificar o valor desses maravedis do início do século XVI, quando a Espanha começa a conhecer a grande inflação provocada pelos carregamentos de ouro e prata trazidos do Novo Mundo, e traduzir esses totais em valores correntes de nossos tempos. Segundo leio numa informação sobre as moedas usadas na Espanha em torno desse período, o maravedi passou a ser usada mais como unidade de conta do que como moeda efetiva para as transações, desde a introdução de uma nova moeda, o real, pelo rei Pedro I, de Castilla, em meados do século XIV, por um valor de 3 maravedis (Wikipedia: “Spanish real”; link: https://en.wikipedia.org/wiki/Spanish_real). A taxa de câmbio aumentou até 1497, quando o real, doravante emitido sobre a base de um composto de prata, foi fixado num valor de 34 maravedis. Segundo essa nota, o famoso “peça de oito” (peso de a ocho), também conhecido como dólar espanhol, foi emitido no mesmo ano como moeda de intercâmbio. Em 1566, o escudo cunhado em ouro passou a ser emitido, num valor de 16 reais de “prata”. Um século depois, dois reais de “meia prata” valiam 1 real de prata pura. O maravedi estava então cotado a esse real de “meia prata” à razão de 68 maravedis por cada unidade da moeda. Teoricamente, portanto, cada real de prata forte seria equivalente a 136 maravedis, e o escudo de ouro poderia valer 2.176 maravedis. 
Talvez se possa aproximar os valores expressos contabilmente em maravedis dos reais de prata, o que representaria mais ou menos o seguinte: o total da expedição teria custado 245.127 reais de prata, ou 15.320 mil escudos de ouro. Não posso, no entanto, no estado atual de meus conhecimentos, traduzir o valor real das despesas da frota de Fernão de Magalhães em cifras precisas suscetíveis de atualização. Caberia, a partir daí, tentar representar esses valores em pesetas do século XIX, com base nas frequentes desvalorizações dos antigos reais de prata, e trazer esses valores para cifras próximas dos dólares do século XX. O site Measuring Worth(http://eh.net/howmuchisthat/), da rede de história econômica à qual recorro frequentemente, promete para um breve futuro índices para conversão da peseta espanhola do século XIX (a partir de 1850), mas o site ainda não está pronto (https://www.measuringworth.com/spaincompare/coming-soon.php). Vamos aguardar, ou pedir a historiadores econômicos espanhóis, que um cálculo mais preciso seja feito.

Comentários recebidos em 10 de janeiro de 2019 do economista Leonidas Zelmanovitz, Senior Felow do Liberty Fund (Indiana, USA): 

“Vou ter que ficar lhe devendo uma conversão precisa dos Maravedis.
A conversão que eu fiz em uma ocasião, foi a do Ducado, moeda usada por Carlos V para fazer o controle das receitas e despesas do seu reino. 
Em 1537, por exemplo, um Ducado, com 91,7% de ouro, tinha um peso equivalente a 10% de uma onça de ouro.
Considerando que hoje em dia uma onça de ouro equivale a aproximadamente mil e trezentos dólares, o conteúdo de ouro de um Ducado equivaleria a aproximadamente 130 dólares e com uma margem para seigniorage, eu diria, que o valor aproximado de um Ducado seria de 150 dólares hoje em dia.
Como o Maravedi era uma moeda de cobre, cuja cunhagem foi muito abusada, a "taxa de câmbio" entre o Maravedi e o Ducado variava consideravelmente. 
Eu diria que para essa primeira metade do século 16 uma boa média dessa equivalencia seria de uns 300 maravedis para um ducado, ou de 50 centavos de dolar por Maravedi.
As fontes que eu trabalhei em 2012 foram James D. Tracy "Emperor Charles V, Impresario of War," e Thobar Carande "Carlos V y sus Banqueros", mas eu encontrei a referência abaixo, que pode lhe ajudar.
Leonidas  

Source: Fiat Money in 17th Century Castile, by François R. Velde, Federal Reserve Bank of Chicago, and Warren E. Weber, Federal Reserve Bank of Minneapolis and University of Minnesota.

Footnote 1 states:
The ducat disappeared as a coin in 1537 but remained as a unit of account, representing 375 maravedis.
Table 2 Castilian monetary system, ca. 1590 (before the onset of vellón inflation) lists the following in the column "Purchasing Power":
·       maravedis -- 1/2 lb bread
·       15 maravedis -- 1 bottle wine
·       50 maravedis -- 1 spring chicken
·       80 maravedis -- 1 day skilled labor
·       200 maravedis -- 1 ga. olive oil
·       350 maravedis -- 1 bushel wheat
·       1450 maravedis -- minimum weekly middle class income

So 1 ducat was the rough equivalent of 1/4 the minimum weekly middle class income. It would have bought you four and a half days of skilled labor. Or 7 (live!) chickens, a bottle of wine and a pound of bread. ¡Buen provecho! "

==========
Addendum para novos cálculos: 
Com base nos cálculos acima de Leonidas Zelmanovitz e nas informações coincidentes, pois originárias da mesma fonte, constantes dos livros de Queiroz Velloso e de Stefan Zweig, pode-se calcular que o custo total da viagem de Fernão de Magalhães foi, em preços atualizados de hoje (um ducado espanhol do início do século XVI equivalente aproximadamente a US 150), de 3 milhões e setecentos mil dólares.
Se aceitarmos que o valor da carga que trouxe o Victoria era de 7.888. 684 maravedis, e que essa moeda poderia equivaler a 50 centavos de dólar por maravedi, teríamos então um retorno de US$ 3.994.342,00, ou, seja, um “lucro” aparente de 250 mil dólares. Não estamos computando, obviamente a perda dos homens e dos navios, pois dos cinco navios apenas um retornou, e dos 240 homens partidos apenas 18 retornaram a Sevilha. Uma empresa de seguros poderia fazer o cálculo do valor humano da primeira viagem de volta ao mundo? Os navios ficam pela amortização em 3 anos...

Vale!


Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 12 de janeiro de 2019


A grande viagem de Fernão de Magalhães ao redor do globo, por Laurence Bergreen

 Por indicação de Walmyr Buzatto, estou lendo o sample deste estupendo livro:

Laurece Bergreen: 

Over the Edge of the World: Magellan's Terrifying Circumnavigation of the Globe

(2003 e 2019)

Reproduzo abaixo duas passagens para comprovar, mais uma vez, como as especiarias já foram, mais de 5 séculos atrás, o "petróleo" do mundo, e como os portugueses saíram na frente das navegações e descobertas.



Recomendo também a bela biografia do Fernão de Magalhães por Stefan Zweig, cujo anexo, sobre os custos da expedição de circumnavegação, me induziu a tentar determinar quanto teria custado, aos preços atuais, essa viagem fantástica, equivalente às explorações espaciais atuais.

Leiam a postagem aqui: 

https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/01/fernao-de-magalhaes-livros-sobre.html


sexta-feira, 20 de outubro de 2023

Brazil’s isolation: a love affair - Bill Hinchberger (Global Finance)

 Brazil loves its isolation, says an ex-president. Is the country ready to play a larger role on the global stage?    

Author: BILL HINCHBERGER
Luiz Inácio Lula da Silva seems to log more time on his souped-up Airbus than he does at the Alvarado Palace, the presidential mansion in Brasília.
His jet-setting started in November with the COP27 climate summit in Sharm El-Sheik, where the then president-elect was “welcomed like a rock star,” according to the French newspaper Le Monde. He promised to clean up after his predecessor, climate skeptic Jair Bolsonaro, who oversaw a notable uptick in deforestation in the Amazon.

Since his inauguration in January for a second stint (on top of two terms from 2003-2011), Lula has visited over a dozen countries, outpacing even his American counterpart Joe Biden for his presence on the global arena.

Yet “Brazil remains closed,” states veteran Brazilian businessman Roberto Teixeira da Costa in a new book, “Is Brazil Afraid of the World? Discussing Brazilian Foreign Affairs and Challenges.” Of the world’s 15 largest economies, Brazil has ranked “among the lowest” when it comes to the importance of international trade to its economy, he said in the book. This even before Bolsonaro turned Brazil into a “pariah,” says the author, who founded and served as the first president of the Brazilian Security and Exchage Commission (CVM) and is currently chairman of the Arbitrage Chamber of the São Paulo Stock Market (Bovespa).

Relative to its size, Brazil scores lower than one would expect on international participation in all realms, including trade and historic incoming and outgoing FDI. Teixeira da Costa doesn’t blame foreign bullies for blocking Brazil. Instead, he quotes former President Fernando Henrique Cardoso: “Nothing makes Brazilians happier than isolation.”

Part diagnosis, part prescription, Teixeira da Costa’s book may serve as a primer for those who wonder why a continent-size nation of 215 million is often marked down as absent during important international roll calls. For Brazilians, it poses a series of Socratic questions designed to fuel debate, concluded reviewer Marcelo Consentino in the daily Estado de São Paulo.

“The thesis of the book is that Brazil fails to recognize the role it should play in international relations, and instead accepts a secondary role,” Teixeira da Costa says. “Brazil should become a protagonist.”

Many well-informed, well-meaning, and experienced Brazilians remain unconvinced, at least when it comes to the “just do it” modus operandi. “Brazil’s capacity is modest,” says Paulo Roberto de Almeida, a diplomat and director of international relations at the Institute of History and Geography of the Federal District University in Brasília. “First, because of its level of economic development, the average strength of its military force, and the limited resources devoted to international cooperation.”

National pride matters, as it does everywhere, but practical considerations loom large—including a longing to put to rest an old joke. Granted a permanent visa by President Getúlio Vargas during World War II, exiled Austrian writer Stefan Zweig published a book titled, “Brazil, Land of the Future.” Cynical Brazilians began to quip, “Land of the future, and always will be.”

Teixeira da Costa believes that greater international integration can help Brazil address sticky domestic problems, notably poverty and inequality, and help muffle that ostensibly antiquated joke. Brazil perennially ranks near the bottom on the Gini Coefficient, which measures economic inequality. At 12.4% in December 2022 (CEIC Data), Brazil’s low domestic savings rate means that it cannot go it alone. “We have to attract [foreign] investment,” said Teixeira da Costa.

Based on historical data, one would expect inflows from the United States and Europe. These traditional partners must shore up supply chains, given weaknesses revealed by Covid-19 restrictions and fallout from the Russian war in Ukraine. Brazil shores might seem to offer safe ports.

Reticence could be traced in part to the now infamous Custo Brasil (Brazil Cost), which Teixeira da Costa defined in the book as: excessive bureaucracy; high and complicated taxes; high labor costs; high social security costs; frequent regulatory changes; excessive legislation; and conflicts among federal, state and local governments. One example: As a technologically advanced, post-lockdown world adopts more flexible and creative working relationships, Brazilian labor laws remain mired in a model designed for early-20th century factories. “All of this insecurity messes things up,” says Lika Takahashi, head of equity strategy at Fator Asset Management in São Paulo, while referring to a few recent debates over big issues in Congress.

Abrupt alterations and intergovernmental conflicts create uncertainty. This inconsistency is particularly evident in the foreign policy realm.

Of the post-dictatorship presidents since 1985, Teixeira da Costa points to Cardoso and Lula as “particularly active abroad.” (He could have included Fernando Collor de Mello. Before his impeachment on corruption charges, Collor cut tariffs, facilitated foreign investment, hosted the 1992 Earth Summit in Rio de Janeiro, and signed the Mercosur regional pact with Argentina, Paraguay and Uruguay.)

Look at the contrasts between the Cardoso and Lula administrations. Cardoso proved “more balanced,” as Teixeira da Costa said in our interview, whereas Lula focused on South-South relations and what some would call “Third World-ist” policies. Now consider what the book calls the “Bolsonaro administration’s blind march toward Donald Trump’s America.” Add to that the lack of reliable foreign policy interlocutors in Congress or the business community. You can understand why outsiders might get weirded out.

One external actor appears willing to wade through the weirdness: China. As with the United States, Teixeira da Costa devoted an entire chapter to Brazilian-Chinese relations. Even under the watch of Trumpista Bolsonaro, “In the first half of 2020, for every dollar Brazil exported to the United States, US$3.4 went to China,” states the book.

Given his South-South proclivity and enthusiasm for the BRICS+, Lula might be expected to lean more firmly into China for FDI. With 11 members, the new BRICS+ accounts for over one-third of global GDP and nearly half of world population, though it is top-heavy with China on both accounts.

When it comes to prescriptions, Teixeira da Costa can seem exceedingly nitpicky and refreshingly specific. Do problems exist at all levels of government and business? Yes. And they can all be addressed. Poor language skills and understanding of the world? More and better education in those realms. If your company is big enough, the board should be required to examine opportunities abroad. Navel-gazing industrial associations should lift their heads and look around.

The 20th century Brazilian composer and poet (and career diplomat) Vinicius de Moraes, perhaps best known for his collaborations with Tom Jobim and other Bossa Nova personages, wrote the song “Medo de Amar (Afraid to Love).” A quarter of a century after de Moraes was expelled from the foreign service by the military dictatorship, it might be time for Brazil to overcome its fear of the global stage.

Or maybe it is time for Brazil to just get down and dirty. In the book, Teixeira da Costa recalls a comment he made in the 1990s to Bill Clinton’s special envoy to the Americas, Mack McLarty: “He who does not make dust, eats dust!” According to the Brazilian, they still get a laugh out of that one.


sábado, 6 de maio de 2023

Por que o Brasil não deu certo - Jaime Pinsky (Chumbo Gordo)

Cinco anos atrás, Jaime Pinsky me convidou para escrever sobre as relações internacionais do Brasil num livro que organizou pensando num próximo governo empreendedor e inovador. Mas isso foi no primeiro semestre de 2018. No segundo semestre daquele ano começou a degringolada.

Apresentei o livro nesta postagem, retomada cinco anos depois: 

Brasil: o futuro que queríamos em 2018, e que aind...

Paulo Roberto de Almeida

BRASIL


Por que o Brasil não deu certo

Jaime Pinsky

E a gente acreditando no futuro do Brasil. A triste conclusão, depois de tudo, é que o país não vai. Vai é ser sempre o que já é: uma terra de gente simpática, agradável, sociável, mas um país de segunda, com enorme desigualdade social, uma elite econômica tendendo para a arrogância, o povo defendendo-se com certa dissimulação, corrupção endêmica e estrutural…

BRASIL

PUBLICADO ORIGINALMENTE NO SITE DO AUTOR, www.jaimepinsky.com.br - MAIO - 2023

Houve um tempo em que se discutia o futuro do Brasil. O escritor Stefan Zweig, muito famoso na ocasião, saiu da Áustria e veio se refugiar nestas terras tropicais, tentando fugir do nazismo. Após escrever um livro em homenagem à terra que o recebeu (“Brasil, país do futuro”), deu fim à sua própria vida. Os Estados Unidos haviam crescido de forma vertiginosa no século XIX, enquanto nós havíamos marcado passo, graças a um sistema agrário arcaico, que explorou mão de obra escrava até nos tornarmos o último país ocidental a conservar esse tipo de força de trabalho, humilhante para explorados e exploradores (além de pouco eficaz). Mesmo assim havia os que acreditavam no futuro do país e Zweig não foi o primeiro nem o último.

Minha geração também acreditou. Em alguns momentos parecia faltar pouco para deslancharmos de vez. Mas, alguma coisa sempre acontecia. Ou era um governo particularmente ruim, ou a conjuntura internacional que nos desfavorecia, ou falta de infraestrutura, ou pouca gente fazendo faculdade, ou muita gente fazendo faculdade, ou dengue, ou tantas outras coisas… E a gente acreditando no futuro do Brasil. A triste conclusão, depois de tudo, é que o país não vai. Vai é ser sempre o que já é: uma terra de gente simpática, agradável, sociável, mas um país de segunda, com enorme desigualdade social, uma elite econômica tendendo para a arrogância, o povo defendendo-se com certa dissimulação, corrupção endêmica e estrutural, governantes de todos os poderes usufruindo as benesses de seus cargos e o país, como um todo, distanciando-se, cada vez mais, das economias principais, seja dos tigres asiáticos, dos ursos europeus, dos cangurus australianos e até das lhamas andinas.

Sim, temos um motivo estrutural para isso: o Brasil tornou-se em 1822, formalmente, um estado nacional, mas não era nada disso. A maior parte dos países se organiza de baixo para cima, criando, paulatinamente uma consciência de identidade nacional e só depois busca se constituir politicamente, desvincular-se de ligações que eventualmente tinha (dependência política, heterogeneidade cultural e/ou religiosa, libertação nacional, etc.). O estado nacional vem depois, não antes. Basta pensar como se constituíram estados nacionais tão diversos como Estados Unidos, França, Rússia, Israel ou Angola para que esses processos históricos fiquem claros. No Brasil ocorreu algo bem diferente: tivemos um filho do rei de Portugal liderando um suposto movimento em um país onde representantes de povos indígenas e africanos, que constituíam a maioria da população, não foram sequer consultados e, no caso dos cativos (formalmente escravizados ou não), sequer libertados.

Por outro lado, temos que reconhecer que a razão estrutural, esse “pecado original” de nossa formação, não pode explicar tudo. Afinal, tivemos mais de duzentos anos depois da independência formal para superar esse problema e não o fizemos. Entra governo, sai governo e continuamos atrás. Pesquisas recentes, publicadas por economistas respeitáveis, chamam a atenção para o fato de continuarmos atrasados.  Há décadas corríamos atrás da China. Depois, dos demais “tigres asiáticos”. Também ficamos vendo a poeira levantada pelos grandes felinos. O diagnóstico é o de sempre: nossa mão de obra é pouco eficaz, tanto técnica quanto cientificamente. Não preparamos adequadamente as pessoas e o resultado é a baixa rentabilidade. Isso não tem a ver com inteligência ou habilidade de nossa mão de obra. Tem a ver com formação, escolaridade.

Ora, uma boa escola precisa de bons professores. Não adianta ter programas e mais programas de livros para os alunos. Um bom professor consegue dar aulas com livros de alunos de qualidade sofrível, mas para um professor mal formado não adianta os alunos terem os melhores livros. São os professores que precisam ter os melhores livros, os mais atualizados. São eles os formadores de cientistas, técnicos e operários. Se não tivermos bons professores, decentemente remunerados e sabiamente exigidos, não poderemos ter gente qualificada e eficaz em suas atividades. Há 30 anos, no governo Itamar Franco, uma comissão de professores, intelectuais e representantes da sociedade foi formada para discutir o assunto no Ministério de Educação e a conclusão foi que professores do ensino público deveriam receber livros de qualidade para sua formação. Essa comissão, dirigida pela grande educadora recentemente falecida, Magda Soares, fez um belo trabalho. Contudo, como aqui não há política de Estado e sim política de Governo, a coisa não se manteve.

Hoje precisamos de muito mais que livros para professores (embora esses continuem imprescindíveis). Contudo, pelo que se vê e lê, o Brasil parece ter outras prioridades. Mas como não falta combustível para levar o pessoal de volta aos currais eleitorais nos fins de semana, está tudo bem por aqui.

JAIME PINSKY: Historiador, professor titular da Unicamp, autor ou coautor de 30 livros, diretor editorial da Editora Contexto. Autor de vários livros sobre preconceito, cidadania e escravidão. Organizador e coautor do livro “Novos Combates da História“.

jaimepinsky@gmail.com

www.jaimepinsky.com.br


 

quarta-feira, 3 de maio de 2023

Constituições do Brasil: a contribuição de Edson Emanuel Simões: uma enciclopédia constitucional - Paulo Roberto de Almeida

 


Uma enciclopédia da democracia e das constituições, no Brasil e no mundo

 

 

Prefácio ao livro de Edson Simões, Constitucionalismo e Constituição de 1988, volume 1 da coleção Constituições e Democracia no Brasil e no mundo – da antropofagia à autofagia (São Paulo: Almedina, 2022, p. 7-14; ISBN: 978-65-5627-477-5). Relação de Publicados n. 1488; divulgado no blog Diplomatizzando (5/01/2023; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/01/edson-simoes-uma-enciclopedia-do.html)

 

 

Esta excepcional obra de erudição política e constitucional, dividida em cinco densos livros, poderia ser chamada, seguindo a terminologia desenvolvida pelo historiador francês Fernand Braudel, de trabalho de “longa duração”. De fato, Edson Simões deve ter passado muitos anos compulsando sua imensa bibliografia de referência, ademais de uma leitura atenta dos periódicos, para compor este vasto panóptico analítico-interpretativo sobre a evolução constitucional do Brasil, ademais de um igualmente ambicioso panorama cronológico sobre o itinerário histórico dos regimes políticos, desde os modelos ideais pensados pelos antigos filósofos até as modernas democracias de mercado. O conjunto da obra poderia também ser conhecida por um título grandioso, sem, no entanto, deixar de ser verdadeiro: “tudo o que sempre você quis saber sobre as constituições, em especial as do Brasil, e suas conexões com os diferentes regimes democráticos ao longo da história, da antiguidade à contemporaneidade”. 

O panorama assim traçado é tão vasto que ele precisou ser dividido em nada menos do que cinco alentados volumes, que cobrem praticamente, o amplo espectro das constituições brasileiras, que abrem e fecham a obra, depois de magnífico percurso pela história, pela filosofia e pelo direito dos regimes políticos, desde a antiguidade até a era contemporânea, como resumido a seguir. O primeiro volume é dedicado às constituições do Brasil (1824-1988), do Império à atualidade; o segundo cobre a contribuições de grandes pensadores e suas contribuições à formulação de modelos para a organização dos estados e para a construção das ordens políticas as mais diversas; o terceiro se ocupa justamente da luta pela democracia, da Grécia à finada União Soviética, que deu lugar à Rússia parcialmente democrática de nossos dias; o quarto volta a tratar da história do Brasil, desde o descobrimento até a República Velha; o quinto, finalmente, continua a se ocupar da construção da democracia no Brasil, da era Vargas aos nossos dias, com dois grandes experimentos autoritários no caminho, o Estado Novo (1937-1945) e a ditadura militar, que durou pouco mais de duas décadas (1964-1985). 

Pela amplitude, vastidão de tópicos – o que se constatará facilmente pelos sumários detalhados de cada um dos volumes, trata-se de empreendimento inédito no mercado editorial brasileiro, carente de títulos que tratem, simultaneamente e de forma integrada, de temas de direito e de história constitucional, com uma enorme análise, não apenas complementar, mas absolutamente essencial, sobre os conceitos e as realidades dos regimes democráticos, desde suas origens às modernas democracias de mercado. De fato, uma consulta a cada um dos índices dos volumes revela uma profusão verdadeiramente enciclopédica de subcapítulos e de seções em cada uma das suas centenas de partes, algo surpreendente nos dias atuais em termos de esforços ciclópicos, como este que Edson Simões tomou a braços, em face de sínteses bem mais modestas que são publicadas atualmente. 

A bibliografia geral, usada pelo autor, assim como as referências específicas a cada um dos volumes, podem ser consideradas como verdadeiramente esmagadoras para um único autor, pois também revelam uma ampla diversidade de leituras, provavelmente ao longo de anos, senão de décadas. Um somatório tentativo das leituras de Edson Simões – que não é matemático, pois há que considerar todo acúmulo de leituras da mídia diária, o seguimento do noticiário em outros veículos e, desde alguns anos, tudo aquilo que nos entra pelas redes sociais – resulta num inacreditável cômputo final de 565 títulos, sendo que não menos de dez pertencem ao próprio autor (dos quais vários em obras coletivas ou em coautoria), aos quais este prefaciador poderia agregar oito de sua própria autoria, títulos mais propriamente de relações internacionais e de história do que exatamente de ciência política ou direito.

Mas, estes são apenas os aspectos volumétricos, ou quantitativos, desta obra de fato monumental, o que requereu, justamente, sua divisão em volumes, em função de sua dimensão assombrosa. Sem pretender uma comparação quanto ao conteúdo, inclusive porque são de gêneros completamente diferentes, pode-se pensar – quanto ao volume de trabalho que a obra dever ter custado ao autor, numa labuta de longos anos – no famoso Dictionary of the English Language, do não menos famoso Samuel Johnson. O dicionário do inglês, biografado por James Boswell, tomou não menos do que nove anos para ser completado: de 1746 a 1755; sua composição gráfica, com muitas ilustrações e uma infinidade de citações – “examples from the best writers”, entre os quais se incluíam, sobretudo, Shakespeare e Milton –, custou bem mais ao editor que o compôs, em dois volumes, do que Samuel Johnson recebeu para compô-lo. 

Sabemos que outros autores também foram prolíficos escritores, como, por exemplo, no terreno do Direito, Pontes de Miranda, ou mais ainda, Rui Barbosa (sem que ele, na verdade, tenha publicado um único volume durante toda a sua longa vida), cujas obras completas, aos cuidados da Fundação que leva o seu nome, ainda não se terminaram de publicar, mas já somam mais de uma centena de volumes. Aliás, Edson Simões não cita Rui Barbosa em seus quase seiscentos títulos da bibliografia, mas é porque o grande jurista baiano – conterrâneo, portanto, de Edson Simões – é tomado como um verdadeiro personagem de nossa história constitucional e política, muito mais atuante na vida parlamentar e nos debates de imprensa, do que propriamente como doutrinador. Mas, Rui Barbosa também foi um estadista e um diplomata – sobretudo nas negociações em torno da compra do Acre, depois, de maneira magistral, na segunda conferência da paz da Haia (1907) e, finalmente, como representante brasileira nas comemorações do primeiro centenário da independência argentina, em 1916 –, tendo formulado contra as pretensões dos imperialismos arrogantes, na Haia, um dos princípios basilares do multilateralismo brasileiro e peça básica da doutrina diplomática do Brasil: a igualdade soberana dos estados. Rui Barbosa, mais até do que um advogado de grandes causas, de jurista respeitado internacionalmente e, até mesmo, um estadista de envergadura mundial – foi escolhido praticamente por unanimidade, inclusive pelas grandes potências, para ser o primeiro juiz brasileiro na Corte de Justiça Internacional, só não assumindo por já se encontrar doente –, era um escritor compulsivo, e a maior parte de sua obra entraria, talvez, na categoria do jornalismo erudito. Edson Simões honra a memória do “homem mais inteligente do Brasil” (segundo os baianos certamente).

Em matéria de dicionários, Edson Simões usou extensivamente, ou recorreu para consultas tópicas, a nada menos do que duas dezenas de dicionários de Política (entre eles o famoso de Norberto Bobbio), de História (três da história brasileira, outro da história universal, sendo um da civilização grega e outro da Roma antiga, e um da Revolução Francesa, que possui um estupendo prefácio de José Guilherme Merquior), de Filosofia e dos filósofos (inclusive cobrindo Rousseau, além de um “gramsciano), sem mencionar os que são propriamente da área constitucional e parlamentar, um do “politicamente correto”, ademais daqueles especificamente da língua portuguesa (Houaiss, o grande lexicográfico brasileiro, como o britânico Samuel Johnson, mas ele foi um diplomata cassado pelo regime militar). Edson Simões também se revelou um misto de “dicionarista”, de “enciclopedista”, de cronista dos tempos recuados e modernos em matéria de constituições e democracias, um autor dotado de uma pena surpreendentemente abrangente.

Na verdade, pela amplitude de sua escrita, não se trata apenas de uma “pena quilométrica”, e sim de uma capacidade de digitação fenomenal, uma espécie de Balzac do direito constitucional, um autor tão volumoso e denso quanto, em outros gêneros, o velho Chateaubriand (que vendeu suas “memórias do além-túmulo”, por uma renda permanente, muito antes do esperavam seus editores), ou, em outro exemplo mais literário, quanto Marcel Proust (que era capaz de escrever várias páginas simplesmente sobre o aroma que lhe despertava uma “madeleine” sobre uma xícara de chá). Ainda neste terreno da literatura em grande volume, as centenas de páginas desta respeitável obra em cinco volumes de Edson Simões cobrem facilmente, em extensão, as aventuras que Georges Simenon imaginou para o Comissaire Maigret, em suas 75 pequenas novelas de mistério policial. 

No caso de que nos ocupamos, não há absolutamente nenhum mistério, mas total transparência e lucidez quanto aos critérios do autor na abordagem de seu triplo objeto: os pensadores da Política, do Estado, da Justiça e do Direito; as aventuras da senhora Democracia, da antiga Grécia (a “mãe da democracia”) aos embates entre autoritarismo e democracia, na Alemanha contemporânea, passando pela Inglaterra, França e Estados Unidos, entre outros exemplos; e, finalmente, ao início e ao final, o próprio Brasil, seja na sua sucessão de constituições, desde a mais longeva, aquela outorgada pelo primeiro imperador, até a mais recente, que já é uma “balzaquiana”, mas que carrega mais emendas do que as dezenas de volumes da Comédia Humana, do ilustre novelista francês do século XIX. O caráter enciclopédico da obra é justamente confirmado pela pletora de casos tratados no terreno da política, das desventuras da democracia ao redor do mundo, da Grécia e da Roma antigas às modernas democracias de mercado e, sobretudo, confirmado pela profusão de pensadores das doutrinas e dos regimes políticos abordados, dos sofistas (os primeiros aprendizes de filósofos, mas dotados de pouca lógica) aos contemporâneos, passando por medievais, renascentistas e modernos, sem descurar alguns adeptos do terror político, Robespierre, Marat e Danton en tête (que levaram vários outros a perder a cabeça, antes deles). 

O primeiro volume da obra revela um comentarista erudito, mas também irônico, sobre as constituições do Brasil, que teriam saído da “antropofagia” para chegar à “autofagia”, tantas foram nossas tentativas de democracia, para terminar com o que ele caracteriza como “uma colcha de retalhos”. De fato, a Constituição de 1988, a sétima ou oitava da série, segundo se considere certas anomalias ditatoriais, constitui um vasto conjunto de dispositivos concedendo muitos direitos, mas exigindo poucas obrigações, como sempre lembrou o economista e diplomata Roberto Campos, aqui citado pelas suas memórias, um passeio pela história do Brasil no século XX e por cinco de suas constituições, uma das quais, a de 1967, ele ajudou a elaborar, pelo menos no capítulo econômico. 

E é justamente no capítulo econômico que se situam os principais problemas do arranjo constitucional atual, uma vez que a Carta de 1988 garantiu todos os direitos a que os cidadãos tinham direito (e sempre mais alguns, segundo a generosa disposição dos legisladores de encontrar o verdadeiro caminho da felicidade legal). Mas, ao mesmo tempo, ela forjou uma ordem econômica que gera baixo nível de investimentos para alimentar um processo de crescimento sustentado, com transformações estruturais e distribuição social dos benefícios de crescimento que não vem, desde exatamente a promulgação da “Constituição cidadã”, do dizer de Ulysses Guimarães. Não exclusivamente por causa de seus dispositivos econômicos – pois também ocorreu a crise da dívida dos anos 1980, as hiperinflações se alternando a planos frustrados de estabilização macroeconômica e uma introversão negativa do aparelho produtivo, isolando o Brasil das pressões competitivas da economia global –, mas sobretudo pela tentativa de distribuir benesses a todos e a cada um, a Constituição tornou-se um óbice a uma maior taxa de investimentos produtivos, ao dirigir boa parte das receitas fiscais ao próprio Estado. Este é um ogro famélico que captura um terço de todas as riquezas criadas por empresários e trabalhadores, muito acima do que justificaria o nível de renda per capita do Brasil no confronto com países de características similares (nossa carga fiscal se situa dez pontos acima, no PIB, à de outras economias emergentes, quase no mesmo nível que os países avançados da OCDE, que possuem uma renda per capita cinco ou seis vezes superior à nossa (aliás, estagnada há vários anos). 

A chave – ou, se poderia dizer, o ferrolho – de todos os problemas brasileiros se situam amplamente nos terrenos político e institucional, temas cruciais de nossos impasses sociais, e que são objeto de profundas considerações do autor tanto ao início quanto ao final desta obra verdadeiramente completa, tão completa que vai dos “antecedentes do descobrimento do Brasil” e da própria “formação e evolução de Portugal”, até Dilma, Temer e Bolsonaro, para mencionar apenas os mais recentes personagens de uma trama que confirma o que Edson Simões chama de “erosão da República e da democracia em pleno século XXI”. De fato, impossível não concordar com ele, quando se contempla a lenta demolição das instituições, que vão das manifestações contra o poder político na década passada, às “contradições do Poder Judiciário”, como também explicitado ao final da primeira parte da obra. Aqui, caberia talvez retornar ao velho Rui Barbosa, crítico contumaz do militarismo da República – tendo ele enfrentado, em 1910, o sobrinho do primeiro marechal-presidente, Hermes da Fonseca, habitual em intervir nos conflitos estaduais –, que ele considerava como o principal perigo à democracia brasileira: de fato, os militares nunca deixaram de intervir nos assuntos políticos, em mais de 130 ano de República.

O amontoado heteróclito de problemas institucionais, constitucionais, econômicos e sociais recomendaria uma ampla reforma política, que reverteria a atual fragmentação partidária e limitaria a chantagem recíproca que se exercem os poderes executivo e legislativo, na disputa por nacos de um orçamento quase que totalmente comprometido com gastos obrigatórios. De fato, como se sabe, o orçamento brasileiro reserva muito pouco das receitas a investimentos produtivos, ou para a correção das imensas desigualdades distributivas, e no período recente vem sendo objeto de um verdadeiro estupro orçamentário, ao acomodar dois fundos ilegítimos – o partidário e o eleitoral, já que partidos são de direito privado – e uma pletora de “emendas orçamentárias” que simplesmente distorcem qualquer sentido de planejamento racional de despesas públicas, ao fragmentar bilhões de recursos em projetos paroquiais que nunca deveriam ser de responsabilidade federal. Mas é justamente essa reforma política que se revela praticamente impossível em face de um parlamentarismo de fato, não de direito, feito de superpoderes do estamento político, especialmente dedicado a disputar os despojos do Estado e pouco voltado para a correção dos inúmeros impasses quanto ao funcionamento das instituições. 

Às vésperas do bicentenário da formação de um Estado independente, em setembro de 2022, a construção da nação permanece inacabada, pois, assim como ela permaneceu refratária à abolição do tráfico e da escravidão no momento oportuno, ela se mostrou impérvia à implantação de um verdadeira sistema de educação de massas de qualidade, assim como, num passado não muito remoto, esqueceu-se da distribuição da propriedade e da integração dos antigos escravos e dos rurícolas marginais aos benefícios da alfabetização e dos cuidados elementares de saneamento básico, e até hoje permanece indiferente ao grau elevado de violência urbana, que atinge sobretudo as populações pobres das favelas. O Brasil do bicentenário de sua independência nos aflige, profundamente, e a maior parte das razões estão muito bem descritas, esmiuçadas, explicadas e criticadas nesta obra monumental. 

A feliz coincidência de que esta obra multivolumes esteja sendo publicada às vésperas do bicentenário oferece, precisamente, um guia, um manual seguro, um diretório dos nossos impasses democráticos e constitucionais, um manancial de informações e de argumentos que podem nos ajudar a identificar os problemas e traçar um roteiro de sugestões para sua correção ao início do terceiro centenário de nossa vida independente, como Estado soberano. O diagnóstico, não apenas constitucional, mas sobretudo compreensivo, no sentido weberiano da expressão, para que possamos congregar esforços na busca de caminhos democráticos, consensuais, para superar os atuais impasses da nacionalidade. Apenas com uma compreensão sofisticada dos problemas que se colocam à “brasilidade” será possível formular as prescrições adequadas para a adoção das medidas corretivas que devem ser aprovadas pela representação política.

O diagnóstico já foi feito por Edson Simões, a crítica dos erros passados também, os modelos oferecidos pelas democracias de mercado exitosas comparecem nesta sua obra que pode ser considerada uma síntese perfeita de uma trajetória intelectual das mais completas. Tive enorme prazer em percorrer suas densas páginas, o que me fez relembrar de quando, jovens adolescentes em São Paulo, trocávamos sugestões e exemplares de livros para enriquecer nossa formação inicial: entre esses autores estava Stefan Zweig, que havia projetado um futuro luminoso para o Brasil, em 1941, uma esperança até aqui frustrada em várias de suas dimensões. Aos 80 anos do suicídio do escritor, em pleno Carnaval de 1942, em Petrópolis, cabe esperar que o “país do futuro” almejado pelo grande intelectual austríaco, possa realizar-se no curso das próximas décadas, como nossos filhos e netos têm todo o direito de almejar. Com esta afetiva rememoração, encerro meus cumprimentos ao Edson Simões, seguro de que ele ofereceu o melhor de si nestes magníficos volumes.

 

Paulo Roberto de Almeida

Fevereiro de 2022