O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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quarta-feira, 20 de junho de 2018

Rui Barbosa em Buenos Aires em 1916: os deveres dos neutros na Grande Guerra

Em 1916, Rui Barbosa foi designado embaixador extraordinário pelo governo brasileiro para as comemorações do primeiro centenário da independência argentina. Ao lado da participação nas cerimônias oficiais, Rui Barbosa foi convidado para fazer uma conferência na Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires.
No navio que o levava do Rio de Janeiro à capital argentina, Rui Barbosa redigiu rapidamente uma  grande palestra que ficou conhecido como "Conceptos Modernos del Derecho Internacional", resumida pelos jornais argentinos e brasileiros, e depois corrigida para integrar suas obras completas, cujo link está aqui:

Cem anos depois, eu escrevi um pequeno artigo sobre essa base conceitual da diplomacia brasileira:

3006. “Rui Barbosa e o direito internacional”, Brasília, 7 julho 2016, 3 p. Artigo sobre os 100 anos da conferência realizada por Rui Barbosa em Buenos Aires, sobre os conceitos modernos do direito internacional, mais conhecida como o dever dos neutros.

Reproduzo abaixo esse artigo.

Rui Barbosa e o direito internacional

Paulo Roberto de Almeida
  
            Cem anos atrás, quando a Argentina comemorava o primeiro centenário de sua independência, o governo brasileiro designou o senador Rui Barbosa para ser o seu representante nos festejos daquele evento. Ademais de participar das cerimônias oficiais, Rui Barbosa foi convidado a fazer uma palestra na Faculdade de Direito e Ciências Sociais de Buenos Aires, ali pronunciando uma das alocuções mais importantes da história do direito internacional no Brasil. Dada a importância de suas reflexões para a própria construção da doutrina jurídica que sustenta a essência da política externa brasileira, bem como para a afirmação dos mais importantes valores e princípios da diplomacia sempre defendida pelo Itamaraty, cabe relembrar alguns dos aspectos importantes dessa conferência, inclusive para os nossos dias.
            Para facilitar a tarefa, temos à nossa disposição a excelente edição dessa conferência pela Fundação Casa de Rui Barbosa, através da qual, em 1983, Sérgio Pachá estabeleceu um texto definitivo do original em espanhol, realizando ele mesmo a tradução, acompanhada de notas e de uma excelente introdução a esse texto, de enorme repercussão, à época (e ainda hoje) na Argentina), durante muito tempo conhecido como "O Dever dos Neutros". Rui Barbosa não era desconhecido na Argentina, onde já havia vivido em 1893, fugindo da perseguição que lhe movia o governo de Floriano, por ter batalhado pelos envolvidos na revolta da Armada. Ele começa a parte substantiva de sua conferência de 1916 relembrando justamente esse episódio, defendendo a liberdade nas palavras de um de seus mais admirados promotores argentinos, Juan Batista Alberdi: "A civilização política é a liberdade. Mas a liberdade não é senão a segurança: a segurança da vida, da pessoa, dos bens."
            Ele continua, então, por um verdadeiro hino em louvor à nova "civilização argentina", não sem antes lembrar a barbárie dos antigos caudilhos que tinham levado o país à anarquia e à tirania. Num exercício arriscado de profetismo, Rui Barbosa anunciava aos argentinos da audiência que "há muito que consolidastes a vossa civilização. Vinte e cinco anos, pelo menos, de governo estável, ordem constante e progresso ininterrupto vos libertaram para sempre das recaídas no mal da anarquia. Um desenvolvimento colossal da riqueza, as acumulações do trabalho na prosperidade, uma abundante transfusão do sangue europeu, um civismo educado nos melhores exemplos da liberdade conservadora, grandes reformas escolhidas com discrição, adotadas com sinceridade e praticadas com inteireza depuraram dos últimos vestígios da antiga doença vosso robusto organismo, talhado para um crescimento gigantesco, asseguraram-vos no mundo uma reputação definitiva e fizeram da República Argentina um dos centros da civilização contemporânea, uma nação cujo invejável progresso pode resumir-se numa palavra, dizendo-se que a República Argentina é um país organizado." A Argentina de fato era, cem anos atrás, um dos países mais ricos do mundo, possuindo uma renda per capita superior à de vários países europeus, equivalente a 73% da renda média nos EUA (já então o mais rico de todos) e cinco vezes maior do que a renda per capita dos brasileiros. 
            Depois de repassar os episódios mais relevantes do itinerário político argentino, iniciado em 1806, caminhando para a independência já em 1810 e consagrado definitivamente no Congresso de Tucuman, em 9 de julho de 1816, quando se proclama solenemente, em nome de todo o povo argentino, a autonomia completa em face do soberano espanhol, Rui Barbosa chega ao cerne de sua conferência: um novo exercício da força bruta, contra o direito, representado pela Grande Guerra, especialmente a invasão da Bélgica neutra pelas tropas do Império alemão, em total desrespeito aos princípios da neutralidade, discutidos poucos anos antes na Segunda Conferência da Paz da Haia, na qual Rui havia sido o chefe da delegação brasileira. Suas palavras, em defesa desse princípio, foram muito claras: “Entre os que destroem a lei e os que a observam não há neutralidade admissível. Neutralidade não quer dizer impassibilidade; quer dizer imparcialidade; e não há imparcialidade entre o direito e a injustiça. (...) O direito não se impõe somente com o peso dos exércitos. Também se impõe, e melhor, com a pressão dos povos”. 
            Esse exato discurso de Rui Barbosa foi relembrado pelo chanceler Oswaldo Aranha, em 1942, quando o Brasil se viu confrontado à extensão da guerra europeia ao continente americano, instando, então, o Brasil, a assumir suas responsabilidades no plano dos princípios do direito internacional e dos valores da solidariedade hemisférica. A Alemanha tinha, mais uma vez, violado a neutralidade da Bélgica, para invadir a França. A postura de Aranha – que havia recepcionado Rui, como jovem estudante no Rio de Janeiro, quando o jurista desembarcou na volta ao Brasil –, foi decisiva para que, ao contrário da vizinha Argentina, então controlada pelo Grupo de Oficiais Unidos, de orientação simpática ao Eixo, o Brasil adotasse uma postura compatível com a construção doutrinal iniciada por Rui e de acordo a seus interesses nacionais, nos contextos hemisférico e global, em face do desrespeito brutal ao direito internacional cometido pelas potências nazifascistas na Europa e fora dela.  
            Vinte anos depois, o chanceler San Tiago Dantas soube preservar o patrimônio jurídico da diplomacia brasileira ao defender, de maneira clara, o respeito ao princípio da não intervenção nos assuntos internos de outros Estados, que estava em causa nas conferências e reuniões pan-americanas em torno do caso de Cuba. Outros juristas e diplomatas brasileiros, ao longo do século, a exemplo de Raul Fernandes, Afrânio de Melo Franco, Afonso Arinos de Melo Franco e Araújo Castro, participaram dessa construção doutrinal e pragmática dos valores e princípios da diplomacia brasileira. Há que se reconhecer, no entanto, que Rui Barbosa foi um dos grandes iniciadores e batalhadores pela afirmação dessas grandes diretrizes políticas que hoje integram plenamente o patrimônio consolidado da diplomacia brasileira. 
Paulo Roberto de Almeida, ministro da carreira diplomática, é diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, da Funag, e professor no Uniceub.



Sistema comercial multilateral e regional: artigos de imprensa

Referências recebidas do Google Alert, em 18/06/2018:

comércio internacional do Brasil
Atualização semanal  19 de junho de 2018
NOTÍCIAS 
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) participou no dia 12 de junho de 2018 de audiência pública na Câmara dos Deputados ...
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O Mercosul quer lançar uma ofensiva pelo livre comércio no próximo semestre para chegar a acordos comerciais com os grandes blocos mundiais ...
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Para analistas, o Brasil sairá perdendo com a guerra comercial, em ... a taxar em 25% esses produtos americanos, o resultado global será negativo. ... de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), ...
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Busca-se retomar a prioridade de liberalização comercial e de consolidação do Mercosul, formado por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, disse ...
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Morar nos Estados Unidos era um sonho antigo para Brenda Nadal, que no Brasil estudava Comércio Internacional e trabalhava em uma empresa do ...
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Se dentro dos estádios da Copa do Mundo de 2018 é só festa, fora deles os turistas estão encontrando dificuldades nos altos preços de hotéis, ...
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O secretário americano de Comércio, Wilbur Ross, que negocia com os parceiros comerciais dos Estados Unidos, ainda mantém laços com ...
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O Canadá quer ratificar rapidamente o acordo de livre-comércio ... (11) o ministro de Comércio Internacional, Francois-Philippe Champagne.
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Brasil é eleito para conselho econômico e social da ONU ... formular recomendações sobre desenvolvimento, comércio internacional, industrialização ...
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... o aumento da tensão internacional pode reduzir os preços das commodities, ... O primeiro impacto das barreiras levantadas pelo governo Trump no Brasil se ... Para José Augusto de Castro, da Associação Brasileira de Comércio ...

Mister Trump parte em guerra (comercial) - Paulo Roberto de Almeida (Gazeta do Povo)

Meu artigo sobre a "guerra comercial" deliberadamente provocada e deslanchada pelo presidente americano, escrito depois que ele anunciou as primeiras medidas de sobretaxas (de US$ 50 bilhões), mas antes que ele ameaçasse recrudescer em mais US$ 200 bilhões.
Ou seja, o que deveria ser uma ameaça de rusga bilateral, mas com armas de guerra, pode redundar em uma guerra aberta, com equipamento pesado e mobilização de todas as frentes e corpos bélicos, o que fatalmente atingirá outros países, mesmo os "neutros", onde o Brasil gostaria de estar. 
Como nos dois grandes conflitos bélicos do século XX, essas guerras, começadas num contexto regional limitado, logo se transformam em enfrentamentos globais, atingindo todos os países.
Vamos seguir o teatro de operações.
Paulo Roberto de Almeida 

Rumores de guerra comercial já não são

 mais exagerados

Depois da Guerra Fria geopolítica, o que temos hoje é uma Guerra Fria econômica

Gazeta do Povo (Curitiba, 18/06/2018)


Ficou conhecida a frase de Mark Twain, em comentário a jornalistas, quando confrontado a um obituário publicado a seu respeito: “Os rumores sobre a minha morte são grandemente exagerados”. O mesmo poderia ser dito, até recentemente, sobre as ameaças de uma guerra comercial, continuamente anunciada pelos jornais nos últimos meses, mas que ainda não tinha sido aberta de verdade. Não mais, agora já é um fato: o presidente Trump anunciou sua decisão de impor sobretaxas a produtos exportados pela China num valor aproximado a US$ 50 bilhões. A China anunciou imediatamente que iria retaliar por um montante equivalente, alvejando produtos da exportação americana para a China. Ou seja, a declaração de guerra já foi expedida: resta ver como serão feitos os movimentos dos batalhões respectivos das políticas comerciais nacionais.
Nunca foi tão importante estar bem informado.Sua assinatura financia o bom jornalismo.
Em primeiro lugar, é preciso ficar claro que o anúncio americano não atinge apenas produtos chineses exportados para os EUA – muitos dos quais, por sinal, podem ser feitos na China, mas sob licença americana, ou seja, servindo aos interesses das empresas e dos consumidores americanos –, e sim os fluxos de comércio dessas linhas de produtos de quaisquer origens e destinações. A explicação é que as sobretaxas aplicadas pelas autoridades aduaneiras americanas atingem produtos, não fornecedores, como sempre ocorre com as salvaguardas (que são diferentes de outros mecanismos de defesa comercial, como pode ser o antidumping, que foca um fornecedor determinado).
Trump justificou a imposição dessas medidas como sendo por motivos de “segurança nacional”, o que é altamente discutível, e poderá ser facilmente desmentido por uma investigação no âmbito da OMC (como fatalmente ocorrerá a partir de reclamações de parceiros prejudicados, e não apenas a China, como já revelado no caso do alumínio e do aço). O problema é que uma investigação na OMC, e a consequente condenação de uma medida claramente violadora do Código de Salvaguardas do Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e Comércio (GATT), costuma demorar mais de ano e meio, talvez dois anos, para ser concluída, e a única coisa que o painel arbitral conseguirá aprovar será, provavelmente, uma autorização para retaliações legais dos atingidos, o que não resolve o problema para ninguém, uma vez que o comércio não se faz como mera expressão da vontade, e sim por razões de preço e qualidade. Assim, as contramedidas conseguem apenas agravar o problema original.
O comércio não se faz como mera expressão da vontade, e sim por razões de preço e qualidade
Uma coisa precisa ficar clara: os déficits comerciais dos EUA, atualmente gigantescos, não são uma novidade, mas um fenômeno praticamente crônico há várias décadas, ainda que eles tenham conhecido flutuações cíclicas – ao sabor das paridades cambiais e dos ciclos econômicos nas principais economias do planeta –, assim como o imenso desequilíbrio no intercâmbio comercial com a China, crescente desde o final do século passado. Dos quase 900 bilhões de dólares de déficit na balança comercial dos EUA, um terço é realizado por exportações chinesas em excesso de suas importações da mesma origem, uma conta que é largamente compensada pelos ganhos obtidos pelos EUA a partir dos serviços, rendas do capital (em diversas rubricas) investido sob a forma de investimento direto ou de aplicações de portfólio.
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A concepção primitiva que o presidente americano mantém a respeito do comércio internacional faz com que ele veja um “prejuízo” para o seu país cada vez que se manifesta um déficit bilateral, o que é absolutamente considerado uma insensatez por qualquer economista sério. O déficit geograficamente considerado a partir do território dos EUA é amplamente compensado pelas exportações das empresas americanas ao redor do mundo, como resultado de décadas de investimentos diretos em quase todos os quadrantes do planeta. Muitos outros países exibem balanças comerciais cronicamente deficitárias, mas cobrindo essas “lacunas” por retornos em outros capítulos do balanço de pagamentos, o que é exatamente o caso dos EUA, que justamente exporta sua moeda nacional ao resto do mundo. O euro não confirmou até o momento as expectativas de que poderia representar parte substancial das reservas nacionais e dos fluxos de pagamentos de fatores para um volume mais significativo dos intercâmbios mundiais.
O Brasil, por exemplo, país notoriamente protecionista, sempre manteve um estrito controle sobre os fluxos de sua balança comercial, uma vez que esses saldos são o único recurso de que dispõe para compensar uma balança de serviços cronicamente deficitária, mas justamente com os EUA acumula saldos negativos desde vários anos, o que não o impediu de ser também atingido pelas salvaguardas de Trump sobre o aço e o alumínio, cabendo-lhe apenas aceitar as sobretaxas (para o alumínio) ou redução dos volumes exportados, as chamadas “restrições voluntárias”, claramente ilegais aos olhos da OMC. Registre-se, desde já, que as mesmas medidas foram aplicadas contra os parceiros americanos do Nafta, Canadá e México, o que é propriamente incrível, pois entre os três países deveria vigorar o livre comércio.
A China saberá responder adequadamente – o que não quer dizer sem prejuízos para si mesma e outros países, entre eles o Brasil – a esse novo desafio lançado por um presidente claramente equivocado tanto no plano conceitual quanto no aspecto prático. Os primeiros prejudicados serão as empresas, os consumidores e os trabalhadores americanos, de uma ampla gama de setores (e segundo uma escolha chinesa visando atingir em primeiro lugar os eleitores de Trump em determinados estados). Pode-se, também, colocar esse complicado contencioso num quadro mais amplo, marcado pela irresistível ascensão da China a certa preeminência internacional, sobretudo no campo econômico, e pelo declínio relativo dos EUA como superpotência indiscutível em todas as vertentes do “grande jogo” geopolítico.
De fato, depois da Guerra Fria geopolítica conhecida durante as quatro décadas em que vigorou a bipolaridade EUA-União Soviética, o que temos hoje é uma Guerra Fria econômica, num contexto de crescente multipolaridade a partir da emergência de potências ascendentes fora do eixo norte-atlântico tradicional. Tanto em termos táticos, quando no plano estratégico, a China deve sagrar-se vencedora desse embate, na medida em que possuiu uma visão clara de quais são os seus objetivos permanentes, a despeito mesmo de suas práticas claramente oportunistas no âmbito comercial. O presidente Trump parece completamente perdido na condução de sua política comercial, uma vez que promete impor novas sanções, pelo dobro do valor, caso a China responda às suas medidas não apenas irracionais, como claramente ilegais segundo as regras da OMC.
O que vai ocorrer? Provavelmente uma crise inédita nas relações econômicas internacionais, provocada por um personagem também inédito na governança da maior potência planetária. Os americanos já “inventaram” a Lei de Murphy – o que pode dar errado, dará, da pior forma possível – e também conhecem a “lei das consequências involuntárias”, que é exatamente o que acontecerá neste caso. O presidente Trump vai conseguir prejudicar não só os seus próprios eleitores, como todos os cidadãos, dezenas de empresas americanas e o papel dos EUA na manutenção da ordem econômica mundial. Parece muito, mas ainda é pouco para um personagem nitidamente desequilibrado, o primeiro a governar o seu país – e a pretender mandar no mundo – a partir de seus tweets diários, já na altura de algumas dezenas de milhares. Podemos esperar novos e tresloucados gestos nas próximas semanas e meses. Parafraseando o título de uma antiga série da TV americana: incrível, mas verdadeiro!
Paulo Roberto de Almeida é diplomata de carreira, professor universitário e especialista do Instituto Millenium.

terça-feira, 19 de junho de 2018

Caso raro: um ex-ministro israelense espionando para o Iran

MANCHETES DE ÚLTIMA HORA



ALTA TRAIÇÃO: EX-MINISTRO ISRAELENSE ACUSADO DE ESPIONAR PARA O IRÃ
O ex-ministro Gonen Segev foi indiciado na semana passada por espionar o Estado de Israel para o Irã, disseram nesta segunda-feira a Polícia de Israel e o Shin Bet. Segev foi acusado de espionagem, ajudando um inimigo em tempo de guerra, bem como fornecendo informações para o inimigo. Segev, o ex-ministro da energia e infra-estrutura, é suspeito de fornecer informações sobre a indústria de energia de Israel, sites de segurança no país, instalações estratégicas e funcionários políticos e militares, entre outras coisas. O ex-ministro, que vive na Nigéria nos últimos anos, tentou entrar na Guiné Equatorial em maio de 2018, onde foi impedido de entrar por causa de seu passado criminoso e, conseqüentemente, transferido para Israel. Ele foi preso e interrogado pelo Shin Bet e pela Polícia de Israel depois que a inteligência reunida sobre ele levantou a suspeita de que ele estava em contato com a inteligência iraniana e auxiliando-os em suas ativida des contra Israel. A investigação descobriu que Segev foi recrutado e foi operado como um agente da inteligência iraniana. Ele foi contatado pela primeira vez por funcionários da embaixada iraniana na Nigéria, em 2012 e, em um estágio posterior, viajou duas vezes ao Irã para reuniões com seus manipuladores - embora estivesse plenamente ciente de que pertenciam à inteligência iraniana. Ao longo dos anos como agente iraniano, Segev reuniu-se com seus manipuladores em apartamentos e hotéis em todo o mundo, o que ele disse aos interrogadores que ele acredita serem usados ??para atividade secreta iraniana. Ele também recebeu um sistema de comunicações criptografadas para ocultar a troca de mensagens entre ele e seus manipuladores. Para obter a informação que lhe foi pedida por seus manipuladores iranianos, Segev manteve contatos com israelenses que têm ligações com a segurança, a defesa e as relações exteriores de Israel. Ele trabalhou para colocar as autoridades israelenses em c ontato com elementos de inteligência iraniana, enquanto tentava enganá-los e apresentar os iranianos como empresários inócuos. Segev foi eleito pela primeira vez para o 13º Knesset, em 1992, como parte do partido Tzomet de Rafael Eitan, onde ele atuou como MK de oposição e membro do Comitê de Finanças do Knesset. Em fevereiro de 1994, Segev e dois outros MKs se separaram do Tzomet e formaram a facção Yiud. Em janeiro de 1995, Segev se tornou o ministro de energia e infraestrutura do governo de Yitzhak Rabin e continuou ocupando o cargo no governo de Shimon Peres depois do assassinato de Rabin. Depois de sua carreira política, Segev se tornou um homem de negócios. Ele foi preso em abril de 2004 por tentar contrabandear milhares de comprimidos de ecstasy de Amsterdã para Israel, alegando que eles achavam que eram M & M's. Ele também foi acusado de estender ilegalmente seu passaporte diplomático com um lápis para evitar ser submetido a uma busca por autoridades aeroportuárias holandesas.

Brazil as a Failing State (or, is it already a Failed State?) - Paulo R Almeida (Estoril Political Forum 2017)

Na próxima semana estarei no 26. Estoril Political Forum, organizado pelo IEP-UCP, como informei nesta postagem, já colocando o meu texto à disposição: 

https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/06/de-la-non-democratie-en-amerique-latine.html

No ano passado, no 25. Estoril Political Forum, quando ali fui pela primeira vez, estávamos a um ano do "golpe" do impeachment, como proclamavam os companheiros, esquecendo que, pela sua extraordinária incompetência e gigantesca corrupção, foram eles que provocaram a Grande Destruição, a maior recessão de nossa história e a mais ampla deterioração das instituições públicas no Brasil, sem falar do descalabro moral, que se disseminou em todos os espaços públicos (e ate privados).
Nessa situação, eu me perguntava se o Brasil era um país em estado falimentar, ou se ele já era um Estado falido.
Aqui está o início do texto, o resto podendo ser lido na plataforma Academia.edu: 
https://www.academia.edu/36866539/Brazil_as_a_Failing_State_or_is_it_already_a_Failed_State_-_Estoril_Political_Forum_2017

Brazil as a Failing State


Paulo Roberto de Almeida
Political sociologist, university professor (Uniceub)
 [Estoril Political Forum; Panel Brazil, June 27, 2017]


1. Brazil: the democracy that failed
2. The scenario built by the new Barbarians
3. A schizophrenic Constitution, deepening our failures
4. The conquest of the State by the political mafia of PT
5. What’s the way out of this?
6. Reforms: what is possible and what is impossible?

1. Brazil: the democracy that failed
I started this draft text, for the purpose of delivering an oral statement, some three months ago, around March, just after having accepted the invitation by the organizers to take part in the Brazil panel of the Estoril Political Forum. At that moment, the second title was not the question of Brazil being already a Failed State, but just a doubt, expressed with this almost affirmative interrogation: “will it become a Failed State?” It may be the case, judging by recent developments in the last few weeks, in the political, judicial, and police spheres, all of them very busy with too many cases of corruption, protests, and institutional impasses. So, in less than three months, I had to rephrase and strengthen my title, just to emphasize the true state of political affairs in my country: the scenario is deteriorating rapidly, to say the least.
With this new introduction, in the form of the above paragraph, I will have to be direct, sharp and may be unduly severe: Brazil is, if not already a Failed State, at least a Failing State, in many dimensions of this concept. In fact, its political system, under whatever criteria we may choose, has already failed. This is the result not only of the kleptocratic behavior exhibited by some of its members, but also because of the very well known rent-seeking attitude of many, if not all, representatives of the Brazilian elites, entrepreneurs, politicians, trade-unionists and the rest. The present scenario is on the verge of anomie, not only because of episodic factors, such as the current political crisis or economic recession, but because of a structural deterioration of Brazilian institutions, despite an apparent resiliency of its formally democratic architecture. The true Brazilian crisis nowadays is of a moral order, the very glue that maintains a nation united behind its values and principles: Brazilian citizenship today does not trust anymore any of the three branches of government, the Executive, the Legislative and the Judiciary.
Brazil is a deteriorating polity that, in view of the lack of any real consensus around the necessary reforms in its ailing institutions, promises to continue to be weakening gradually for the next few years, towards its first two hundred years of existence as an independent nation, and irrespective of the general elections in 2018. Indeed, in 2022, income per head of the average Brazilian will be the same, perhaps even less, than its level attained ten years before; the state of its public debt will be on the verge of bankruptcy, if not already insolvent; and the ominous fragmentation of its political system will be worsening to the point of a governance disaster. 
Those are threatening features that pale when confronted with the moral dereliction of our so-called political elites, together with the promiscuous capitalists and bankers that have been funding the former, in a rare neglect of duty (perhaps it was intentional) for a country formally modern, proud of its democratic institutions, and possessing one truly sophisticated State among developing countries of the Western Hemisphere, if not in the global South. Has Brazil become a toxic State?
(...)
Ler a íntegra aqui: 

Na parte final, eu listo aquelas que me pareciam ser as reformas possíveis (otimista que eu era, ou seria pessimista?) e as outras, impossíveis. Aqui: 

Possible reforms:  
1) A radical shrinking of the weight of the State over the productive life of the nation, starting by the reduction to half in the number of ministries, with a proportional elimination of a wide range of public entities. Decrease in the Kafka-like bureaucracy of the Federal Revenue Service. End of any type of privileges linked to public functions.
2) Reduction and simplification of the fiscal charge, which is very difficult because of various levels of taxation in the federation and regional differences in fiscal repartition of the receipts; therefore, the reform could start by a linear decrease in the various rates, for instance 0.5% annually during a ten-year period, while a discussion on the quality and amount of each type of taxation, and its appropriation by states and municipalities, can take place in a orderly manner.
3) A new fiscal deal: suppression of the unconstitutional figure of conditional budget allocation by the Executive, as well as pork barrel individual additions to the budget, which has to applied and implemented exactly as approved by the Parliament; 
4) Elimination of the complete machine for governmental self-propaganda, only allowed information campaigns with a true finality of public order (vaccination, and natural catastrophes, for instance); communication is well served by private channels.
5) Resumption of a general reform in the social security systems, unification of the common and public sector schemes, elimination of all residual privileges, and the establishment of a sustainable intergeneration mechanism, compatible with the moving demography and the sectorial financing of the new system.
6) A complete revision in the National Health Service, nowadays working under a fictional non-paid, universal access system, towards a market-based, multiple system of insurance companies, with subsidies only for the confirmed low income strata.

Impossible reforms:  
1) A political reform aimed at the complete elimination of the Party Fund, a State sponsored stipend to every party recognized as such by the Electoral Tribunal, which is an inducement to the creation of new legends, and the fragmentation of the existing parties, giving financial support to “for-rent-parties” (or, an electoral business of the worst sort); current system allows a total segregation between the party machine and the electorate, which is, in sum, a rent-seeking approach to politics. No public financing of campaigns of any kind: parties are private law undertakings.
2) Immediate extinction of 50% of all commissioned jobs in the public sector, in all levels and spheres of governmental activities, with a concomitant establishment of a parliamentary and executive commission designed to reduce and align the remaining jobs, to be filled by open meritocratic recruitment, without the current stability at entrance; complete interdiction of reciprocal nepotism and other forms of preference.
3) Education: creation of a new class of teachers and professors, paid according to merit and benchmark results, without stability, but with a constant program for training and capacitation, proportionate to remuneration.
4) Privatization of every public or state company not linked to an essential and exclusive public service (defense and justice, for instance). 
5) Elimination of all tax and fiscal exemptions, and other privileges, linked to the so-called “religious entities”, now turned into a thriving “industry”. The same applies to trade unions, another “big industry”: elimination of the “syndical taxation”, complete freedom of association, no public resources whatsoever for the “centrals”. 

This is my personal list for reform in Brazil, that could be integrated to an agenda for reform during the next few years, if – and that’s a Big If – there could be any chance of real consensus among political elites and entrepreneurs in that direction. We all know that reforms, in general, are always difficult, as Tocqueville recognized in relation to the transition from the Ancien Régimeto a constitutional system in his own country, France. If not implemented as a result of a consensual governance outlook among the governing or dominant elites, reforms become disruptive, and are usually initiated after a deep societal crisis, which is perhaps not yet the case in Brazil, at least not in the same extension that those that occurred in recently in Greece, in Argentina, and currently in Venezuela. 
Could Brazil descend into the chaos that those countries were, or are today? Not of this kind, at least in the foreseeable future, although disruptive events cannot be at all excluded. What instead could happen in Brazil would be a protracted crisis made of low growth, partial or imperfect sectorial reforms, and a clear loss of legitimacy of the three branches of government. Worse, the current political mess in Brazil offers plenty of raw materials for all types of dark humor, that is political jokes of a derogatory nature against government and State institutions. In fact, political humorists in Brazil do not need to invent or create anything, do not have to have any inspiration for their jokes: all they need is offered on total freedom and gratuity by the official institutions and their representatives. To be true, those public figures constitute an unfair competition and an informal concurrence to professional humorists. That’s not a joke, it’s a political tragedy!

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, June 12, 2017
Divulgado no blog Diplomatizzando(26/06/2017; link: http://diplomatizzando.blogspot.pt/2017/06/brasil-existe-uma-crise-da-democracia.html),