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domingo, 24 de maio de 2009

1116) Producao cientifica no Brasil: os numeros e a realidade

Transcrevo, em primeiro lugar, um boletim oficial quanto ao aumento da produção científica no Brasil. Depois apresentarei alguns comentários.

Produção científica cresce 56% no Brasil
O Brasil alcançou na 13ª posição na classificação mundial em produção científica em 2008 e ultrapassou a Rússia (15ª) e a Holanda (14ª). De 19.436 artigos em 2007, essa produção subiu para 30.451 publicações no ano passado, crescimento de 56%. Os dados são do National Science Indicators, base de dados estatísticos sobre pesquisa e ciência que reúne dados atualizados de mais de 180 países.
Segundo o ministro da Educação, Fernando Haddad, o resultado alcançado pelo Brasil se deve, entre outros fatores, ao aumento no orçamento das universidades federais; à ampliação do número de mestres e doutores no Brasil e ao crescimento no número de bolsas concedidas pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
“O indicador mostra o esforço nacional e o vigor das universidades federais”, disse o ministro. Haddad afirmou, que, se a produção científica brasileira mantiver o ritmo de crescimento, o País poderá estar, dentro de pouco tempo, entre os dez maiores produtores de conhecimento científico do mundo.
Estados Unidos, China, Alemanha, Japão e Inglaterra são os cinco primeiros colocados no ranking, seguidos da França, Canadá, Itália, Espanha, Índia, Austrália e Coréia do Sul. Com o aumento registrado na produção científica em 2008, o Brasil passa a contribuir com 2,12% dos artigos de todos países monitorados pela base de dados.
Portal - Outro fator que contribui para o a boa colocação do Brasil no ranking é o acesso livre ao conhecimento gerado mundialmente, oferecido pelo Portal de Periódicos: www.periodicos.capes.gov.br.
Quando foi criado, em 2000, o portal contava com 1,8 mil títulos. Em 2009, são 13 mil periódicos, 126 bases de dados referenciais e seis bases dedicadas exclusivamente a patentes.
Nesse período, o número de consultas ao portal passou de 1.735.606 acessos às bases de texto completo e 1.287.545 às bases referenciais para 21.111.922 textos completos baixados e 39.591.556 pesquisas aos abstracts (resumos) oferecidos pelas bases referenciais, o que totaliza 60.703.478 acessos ao conteúdo assinado.
Cresceu também o número de instituições que fazem pesquisas no portal - de 72, em 2001, para 268 em 2009. A intenção da instituição é incentivar ainda mais a internacionalização da pesquisa brasileira por meio de acordos com editoras para permitir o livre acesso no mundo a artigos científicos publicados por autores brasileiros.
Capes - Criada em 1951, a Capes é uma autarquia do Ministério da Educação que cumpre papel estratégico na qualidade da educação superior e na formação de mestres e doutores. Em 2007, a Capes passou a investir também na formação de professores da educação básica (educação infantil e ensinos fundamental e médio). O aumento do número de doutores e mestres é uma das prioridades da política nacional de educação e de ciência e tecnologia do governo federal.

Comentários PRA:
Esse tipo de atitude auto-congratulatoria com os pretensos progressos da pesquisa cientifica no Brasil é totalmente mistificador da verdadeira realidade da pesquisa cientifica no Brasil, uma especie de auto-engano coletivo.
Os dados se referem ao volume (portanto quantitativo) de artigos supostamente "cientificos" publicados em veiculos especializados, a vasta maioria dos quais nacionais, e de faculdades nao preciso lembrar.
Ora, quem conhece o ambiente universitario brasileiro, sobretudo e especialmente (desculpem a redundancia) a area de humanidades, sabe muito bem que mais da metade dessa pretensa producao academica, que nao tem nada de cientifica, sequer seria considerada por revistas cientificas serias, com selecao rigorosa dos publicaveis com base em criterios de "blind evaluation".
Como a Capes comecou a pontuar esse tipo de "coisa" (desculpem mas o termo se aplica), ocorreu uma corrida nas faculdades para a "edicao" de revistas, com equipes editoriais na base do compadrio e a publicacao quase sem nenhuma avaliacao de conteudo ou de qualidade.
No mundo cientifico, o que vale, realmente, sao os citation indexes, que coleta a "produtividade" de um artigo a partir de sua citacao por outros pesquisadores, o que aproxima um pouco mais a producao do seu valor substantivo.
O resto é transpiracao de quem precisa de pontos nos sistemas brasileiros de avaliacao, muito pouco rigorosos...
Nao querendo ofender ninguem, eu diria que povo com cultura cientifica boa é povo com Premios Nobel (ainda que seus criterios possam ser questionaveis em determinados aspectos) e povos com muitas patentes produzidas.
O Brasil nao tem absolutamente nada nos dois criterios...

5 comentários:

Gláucia disse...

Professor,

Cem por cento de acordo. É um deserto de cegos, nem um olho é preciso ter...

Paulo Roberto de Almeida disse...

Grato pela concordância, minha cara Glaucia, por uma vez você concorda comigo, mas neste caso, realmente, nao havia o que discordar.
Quem conhece o ambiente de nossas "universidades" (não sei se elas merecem o nome), em especial nas seções de Humanidades, e quem conhece as revistas produzidas e os artigos publicados nelas, não pode considerar seriamente essas estatísticas quantitativas sobre produção de artigos "científicos" (o epíteto certamente não se jistifica para grande parte da produção).
Tenho ficado chocado com o ambiente cada vez mais medíocre do debate universitário, e acho que o termo debate nem se aplica, na verdade.
Recomendo voltar vinte anos atrás, e reler "A Sinecura Acadêmica", de Edmundo Campos Coelho. O quadro ali descrito, relativo ao final dos anos 1970 e início dos anos 1980, é estarrecedor. Desde então ele só fez se agravar, aprofundando-se todos os vícios ali descritos.
Recomendo a leitura, de fato...
Ainda vou fazer uma resenha atrasada sobre ele...

Anônimo disse...

Bravo!!! Uma prova de que não temos que buscar quantidade é sim qualidade em nossos trabalhos científicos.

Faltam insights à maioria dos nossos pesquisadores. Gostei muito da palestra (A tarefa do direiro brasileiro) proferida pelo ministro Mangabeira Unger. Nela ele faz referencia sobre a glosa filosófica que se abateu sobre o brasil...

Marcos-DF

André disse...

A parte do compadrio constitui o maior obstáculo aos pesquisadores independentes...

Glauciane Carvalho disse...

Elogios a Mangabeira Unger...Éh! tem gosto para tudo nesse mundo!
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Mais uma vez suas palavras foram afiadas como uma navalha para aqueles que acham que quantidade e pontuação no Lattes é produção científica. Sinceramente, eu amei seus comentários que são de uma coragem discernida e de uma sinceridade sem precedentes.(Acho que é por isso que sou tão viciada neste blog ...)Quando eu crescer quero ser igual ao senhor!

São de profissionais assim, que este país precisa, para acabar ou pelo menos diminuir a hipocrezia que norteia as casas científicas brasileiras. E são professores com este perfil que deveriam estar nos dando aula para conscientizar os acadêmicos, verdadeiramente, do que é produção científica. Nós que acompanhamos, ininterruptamente, este blog somos privilegiados, mas e aqueles que não conhecem este endereço ? Quem irá orientá-los ?
Parabéns por mais uma postagem de sucesso dentre inúmeras que tem nos presenteado! Esse espaço é de utilidade pública, indiscutivelmente ! Continue nesta sua missão linda e grandiosa de esclarecimento para a comunidade científica brasileira!
E tenha certeza, que esta postagem me levou a uma tremenda reflexão para o meu futuro científico!
O sentimento que tenho dentro de mim, neste exato momento, é de absoluta gratidão por tão profícua e concisa orientação. Sou eternamente sua discípula, meu caro mestre !