Só agora tomei conhecimento, por esses acasos do Santo Google, do trabalho abaixo transcrito, que não sei exatamente quando foi publicado.
Quem souber me diga, pf.
Paulo Roberto de Almeida
revista CADE-FMJ
Diplomacia Econômica Brasileira no Século XX:
Grandes Linhas Evolutivas
Beatriz Silva Gonçalves
O governo brasileiro tem-se destacado pela atuação da política externa, que busca alcançar novos parceiros comerciais e fortalecer a posição do país em disputas internacionais. Um dos principais analistas da ação externa da política oficial brasileira é o diplomata Paulo Roberto de Almeida, prolífico autor de grande quantidade de livros e artigos. O presente trabalho visa a apresentar parte da análise de Almeida quanto à evolução da diplomacia econômica brasileira, apresentada em livro recentemente publicado, de grande utilidade para que se perceba melhor a lógica dos movimentos do atual governo no cenário externo.
Almeida inicia sua abordagem sobre a diplomacia brasileira apontando seus pontos positivos; como se consolidou no decorrer do século XX e principalmente as características básicas da “conhecida diplomacia brasileira”. A adjetivação se deve principalmente ao fato de que o país dispõe, neste campo, da atuação reconhecidamente profissional e qualificada do Itamaraty, o Ministério das Relações Exteriores.
A ela são creditados ganhos políticos importantes, tanto num passado distante, em termos de conformação do território pátrio, por exemplo, como no presente, sob a forma da boa convivência regional, do continuado respeito que o país ostenta aos princípios do direito internacional (...). (p. 233)
No entanto, a idéia central do autor, quando discorre acerca da diplomacia brasileira, não é somente reconhecer seus pontos positivos, mas problematizar o tema e conhecer a contribuição da diplomacia nacional ao desenvolvimento, principalmente econômico, da nação.
Até o século XIX o cenário diplomático era basicamente constituído de acordos bilaterais de amizade, comércio e navegação. Somente no período entre guerras (1914-1945) o panorama mundial experimentou seu primeiro grande exemplo de tratado multilateral – o Tratado de Versalhes. Porém, esse tratado de grande relevância mundial permaneceu arraigado dos princípios, instrumentos e mecanismos dos tratados bilaterais, não apresentando relevante evolução para o processo diplomático. Aliás, sua visão tradicionalista incorporou aspecto altamente problemático, que foram as punições à Alemanha, corretamente apontadas por Keynes, à época, como desencadeadoras do processo que levaria a uma nova guerra mundial vinte anos depois da assinatura do Tratado.
Somente a partir da segunda metade do século XX, podem-se observar exemplos concretos de tratados multilaterais que começam a sobrepor os mecanismos historicamente construídos ao longo do século XIX e meados do século XX.
Na verdade, os instrumentos multilaterais emergem com o intuito de garantir a reordenação econômica e política após períodos de guerra e crise econômica. Os Estados Unidos da América preconizaram esse movimento, com a criação das instituições de Bretton Woods, o Banco Mundial e o FMI, entre outras. Foi, de fato, uma tentativa de reorganizar o mundo à feição americana. O Brasil participou de todo o processo. À época, não tendo sido possível criar a Organização Internacional do Comércio, por oposição do Congresso americano, que não via interesse em partilhar o amplo poder de que o país saiu investido, ao final da II Guerra Mundial, a delegação brasileira participou ativamente da constituição do Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e Comércio, conhecido pela sigla inglesa GATT, que, através de sucessivas rodadas de negociações, procurou liberalizar o comércio internacional, privando os países em desenvolvimento de usarem recursos de que os desenvolvidos lançaram mão, décadas atrás.
Como se pode perceber, aliás, todo o processo de criação do aparato e mecanismo das relações internacionais foi para amparar e solucionar “conflitos” ou negociações no âmbito econômico. Tem-se, como exemplo, a criação da nova Organização Mundial do Comércio (OMC).
A OMC, por exemplo, passou a ser encarregada de administrar, desde 1995, os resultados da mais complexa rodada de negociações comerciais multilaterais, envolvendo agricultura, serviços, investimentos e propriedade intelectual, por exemplo, já conhecida na história econômica contemporânea. (p.234)
Esse movimento de ampliação das relações econômicas evidenciadas desde o século XIX comprova que o processo de desenvolvimento não pode mais ser visto apenas no âmbito nacional.
Segundo o autor, futuramente, a “ordem econômica” estará cada vez mais ligada às organizações internacionais, mas sempre guardará a importância dos Estados nacionais. A grande questão está localizada na forma de correlação entre essas duas dinâmicas político-econômicas.
Almeida continua seu texto apresentando contrastes acerca da realidade política e econômica entre os séculos XIX e XX, que influenciou e ainda influencia na construção da “nossa diplomacia”:
(...) caberia ter presentes as enormes diferenças bem como os respectivos cenários políticos e econômicos internacionais sob os quais teve de atuar a cautelo- sa diplomacia imperial e sob os quais deve atuar, atualmente,a diplomacia republicana agora centenária. (p.235)
O autor aponta algumas diferenças entre o que seria “diplomacia” no século XIX para a atual “idéia” dela. Dentre elas, está a transformação da quantidade e qualidade dos atores “participando do chamado jogo internacional”.
Para Almeida, essa transformação, hoje vista com mais clareza, não é apenas de cunho exclusivo do processo político-econômico. Trata-se também da “democratização” do sistema internacional, já que ocorreu no século XX uma ampliação dos paises membros nos acordos, tratados e conferências internacionais.
Muito embora os bloqueios e a diplomacia da canhoneira possam estar ainda eventualmente em uso, deve se reconhecer que a força do direito tende a ampliar sua margem de atuação em relação ao direito da força. (p.236)
Em contrapartida, o sentido de “liberal” oferecido pela ordem econômica internacional do século XIX deu lugar ao intervencionismo e protecionismo enfatizado no século XX.
O autor observa que, com o decorrer do tempo e com as transformações citadas acima, um fenômeno se destaca: é cada vez mais evidente a interdependência do mundo econômico contemporâneo.
No apanhado geral sobre o sistema internacional atual, Almeida afirma que, no limite, há avanços significativos na construção do “multilateralismo econômico”, quando comparado aos tratados desiguais do século XIX. Já o multilateralismo político, embora desejado pela maior parte dos países, é contestado justamente pelo país que possui o maior peso no cenário internacional, os EUA, o que, em grande medida, serve para que a diplomacia econômica brasileira se comporte como o está fazendo, procurando novas parcerias, novos mercados.
Na segunda parte do texto, Almeida discute o papel da diplomacia brasileira. E, para essa avaliação, apresenta algumas características da relação econômica externa do Brasil.
(...) considerando tratar-se se um país periférico, dispondo de poucos excedentes de poder político e econômico, e de reduzida capacidade de projeção externa. (p.237)
Isso sem mencionar os dados históricos em relação à diplomacia no Brasil.
Para o autor, as relações econômicas internacionais no Brasil se transformaram entre os séculos XIX e XX.
No século XIX, a diplomacia brasileira era também denominada diplomacia primária, já que era baseada na promoção de alguns produtos para exportação. Hoje, a diplomacia nacional está voltada para aindustrialização substitutiva e da capacitação tecnológica (...), recebendo o nome de diplomacia secundária.
O Brasil caminha para a implementação do que Almeida chama de diplomacia terciária, que consiste no tratamento de uma diversidade de temas, principalmente no setor de serviços, que caracteriza o mundo atual e o sistema econômico.
Para a ampliação da discussão sobre o processo da diplomacia brasileira, tem-se conhecimento do texto proferido no III Encontro Nacional de Estudos Estratégicos, realizado em outubro de 1996, no Rio de Janeiro.
Com base nesse texto, conclui-se que o Brasil ostenta um futuro promissor quando o assunto é a inserção internacional, se conseguir garantir continuidade às políticas de estabilização, abertura econômica, desestatização, retomada do crescimento e principalmente a reforma social.
Nessa conferência, um tema foi muito enfatizado, pois os interlocutores no exterior entendem que o investimento eficiente nas políticas sociais e a recuperação dos nossos indicadores poderão prover um efeito social sustentável, expresso na melhoria do padrão alimentar e de consumo da população de mais baixa renda.
Para projetar a inserção do Brasil no processo econômico internacional no século XXI, o país precisa ampliar a idéia, consolidar a democracia e promover o sentimento de inclusão da população e conexão com o sentimento de Nação.
Esse processo evolutivo da diplomacia brasileira foi intensificado no governo de Fernando Henrique Cardoso, pois preparou um “terreno fértil” para o desenvolvimento econômico e social que atenda as necessidades do país e os parâmetros da política externa.
Esse patrimônio será enriquecido pelo fortalecimento do multilateralismo econômico, comercial e regulatório nos próximos anos: regras universais e transparentes para as múltiplas esferas do relacionamentoeconômico, financeiro, comercial e tecnológico devem facilitar o desenvolvimento das relações do Brasil com cada um dos seus parceiros individuais, à medida que a economia brasileira continue a crescer em complexidade, dinamismo e grau de inter-relação com o mundo.
Hoje podemos antever o Brasil e sua relação com a economia externa, pois, dando continuidade ao processo inaugurado no século XX,poderá consolidar-se como uma potencia média estável politicamente.
Bibliografia
ALMEIDA, Paulo Roberto de. Os primeiros anos do século XXI. O Brasil e as relações internacionais contemporâneas. São Paulo: ed. Paz e Terra, 2002.
Nota: Texto proferido no III Encontro Nacional de Estudos Estratégicos. Rio de Janeiro, 1996.
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