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sábado, 6 de abril de 2024

Brasil evita se indispor com parceiros comerciais ao não apoiar investigações contra Irã e Rússia - Luiz Henrique Gomes (O Estado de S. Paulo)

 Brasil evita se indispor com parceiros comerciais ao não apoiar investigações contra Irã e Rússia

País se absteve de duas resoluções no Conselho de Direitos Humanos da ONU que investigam violações no Irã e na invasão russa da Ucrânia; analista diz que posição expressa perda de protagonismo da ONU

Luiz Henrique Gomes 

O Estado de S. Paulo, 05/04/2024 


A decisão do Brasil de se abster em duas resoluções do Conselho de Direitos Humanos (CDH) das Nações Unidas que investigam violações no Irã e na invasão russa da Ucrânia demonstra a prioridade do País em não se indispor com dois parceiros comerciais importantes, avalia o pesquisador e professor de relações internacionais Roberto Uebel. Segundo eles, a posição da diplomacia brasileira também expressa uma perda de protagonismo da ONU como espaço para se resolver questões internacionais.

Aprovadas por maioria de votos, as resoluções estendem duas investigações da ONU de violações de direitos humanos causadas pelos governos de Teerã e Moscou, parceiros comerciais do Brasil no Brics. Outros membros do bloco, como aÁfrica do Sul, Índia e Emirados Árabes Unidos (no caso do Irã) também se abstiveram. A China foi mais enfática e votou contra os dois documentos.

Para Roberto Uebel, pesquisador e professor de relações internacionais da ESPM, a posição do Brasil nas duas questões demonstra uma tentativa do País construir um pragmatismo na relação às duas nações. “Mostra que o País não quer se indispor, para não causar um distanciamento de dois parceiros comerciais importantes”, disse.

No caso do Irã, o CDH investiga violações cometidas contra mulheres, crianças e minorias étnicas e religiosas depois da morte da jovem Mahsa Amini em 2022. O embaixador brasileiro na ONU, Tovar da Silva Nunes, reconheceu e criticou as violações, mas expressou confiança de que Teerã vai “fortalecer os esforços para melhorar a situação” e se absteve com base “no diálogo construtivo”.

“Encorajamos o Irã a seguir aumentando seu envolvimento com mecanismos de direitos humanos num espírito de cooperação e abertura”, declarou Nunes.

De acordo com Uebel, o discurso do embaixador brasileiro expressa um “apoio crítico”, mas mal calculado. “A fala do representante brasileiro enfatiza que o Brasil condena qualquer violação de direitos de mulheres, mas o País prefere a abstenção por acreditar que o Irã vai cooperar nessa matéria. É um cálculo político que eu avalio como equivocado. O Irã dificilmente irá repensar essas práticas”, afirmou.

Com relação à resolução que investiga as práticas da Rússia na Ucrânia, o representante brasileiro em Genebra também reconheceu a existência de violações, mas classificou o texto de “desequilibrado” e disse que poderia impedir o diálogo entre os dois lados em guerra.

“Permanecemos descontentes com o texto diante de nós. A resolução é desequilibrada e coloca o fardo das violações dos direitos humanos apenas em um lado do conflito, não deixando espaço suficiente para o diálogo que poderia criar condições para prevenir violações de direitos humanos e construir uma paz duradoura na região”, afirmou o chefe da missão brasileira em Genebra.

Uebel avalia que neste caso o posicionamento brasileiro expressa tanto o pragmatismo com a Rússia quanto envia uma mensagem crítica à Kiev. “É um recado para que a Ucrânia também dialogue para a guerra chegar ao fim”, disse. “Neste caso, o Brasil está esgotado com essa questão. Desde o início, a diplomacia brasileira preza pelo diálogo, e inclusive já se colocou à disposição para mediar, mas hoje entende que a Ucrânia precisa estar disposta a esse diálogo, e ela não está por suas questões territoriais”, avaliou.


Perda de protagonismo da ONU

As abstenções no CDH também exprimem uma perda do protagonismo da ONU como fórum multilateral, afirma o analista. Com o surgimento do Brics e do G-20, por exemplo, o Brasil passa a acreditar – como externou o embaixador brasileiro na resolução do Irã – no diálogo em outras instâncias além das Nações Unidas.

A ONU tem sido ineficaz para a resolução de conflitos, a exemplo da Ucrânia e da guerra de Israel contra o Hamas, o que também contribui para esse movimento.

Segundo Uebel, o descumprimento de resoluções da ONU externam um enfraquecimento dos Estados no papel das relações internacionais. “Você tem outros atores, que são empresas, bancos internacionais, sociedade civil, que estão discutindo e podem ter peso nestas questões”, disse. “Se você quer construir uma relação internacional forte, é preciso ter reformas e o engajamento maior desses outros atores em questões relativas aos direitos humanos, por exemplo.”

 

O Itamaraty lulopetista choca pela desfaçatez das posições em favor de criminosos de guerra e violadores dos direitos humanos (Estadão)

Brasil muda de posição e se abstém sobre inquérito sobre crimes na guerra da Ucrânia

Lula: "Conheci o Putin no G7, no G20, na ONU. Nós fazemos partes de várias organizações internacionais que você tem a participação heterogênea de muitos países, muita gente que você não concorda, mas faz parte", 

Estadão, 5/04/2023

O governo brasileiro se absteve numa votação no Conselho de Direitos Humanos (CDH) das Nações Unidas e deixou de apoiar um pedido de extensão do prazo de trabalho da comissão de inquérito sobre crimes de guerra na Ucrânia. A comissão havia sido criada em março de 2022, com voto favorável do Brasil, após a invasão do território ucraniano por tropas russas.

O Brasil foi um dos 17 países que se abstiveram na votação, realizada nesta quinta-feira, dia 4, em Genebra, na Suíça. A resolução, no entanto, foi aprovada por 27 votos a favor e 3 contra.

Com isso o mandato da Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre a Ucrânia foi renovado por um novo período de um ano. Em abril de 2023, a comissão de inquérito havia sido postergada por 12 meses - ela seria encerrada caso não recebesse a nova extensão do mandato agora. No ano passado, o Brasil não era parte do conselho e portanto não participou da votação.

O Estadão pediu esclarecimentos ao Itamaraty sobre o que motivou a abstenção do Brasil e questionou se o posicionamento não se choca com políticas do atual governo de promoção dos direitos humanos. Até o momento não houve resposta. O espaço segue aberto para manifestação.

Durante a votação nesta quinta-feira, o embaixador Tovar da Silva Nunes, representante permanente do Brasil junto às Nações Unidas em Genebra, afirmou que os termos da resolução aprovada poderiam impedir o diálogo entre os dois lados na guerra.

Tovar Nunes ponderou que o país manifesta "profunda preocupação" com a situação na Ucrânia, "particularmente com as alegadas violações envolvendo crianças deslocadas e deportadas, ataques a civis e o crescente número de mortes".

"No entanto, permanecemos descontentes com o texto diante de nós. A resolução é desequilibrada e coloca o fardo das violações dos direitos humanos apenas em um lado do conflito, não deixando espaço suficiente para o diálogo que poderia criar condições para prevenir violações de direitos humanos e construir uma paz duradoura na região", afirmou o chefe da missão brasileira em Genebra.

"Desde a sua criação em 2002, o Brasil argumentou que a comissão de inquérito não parecia ser o mecanismo adequado para revisar os fatos no terreno. No momento de sua concepção, referências a processos judiciais futuros antecipavam o resultado das investigações propostas. À luz desses fatos, o Brasil vai se abster nesta resolução."

O embaixador também questionou menções no texto da resolução aprovada a iniciativas jurídicas contra a Rússia, no TPI e na Corte Internacional de Justiça (CIJ), dizendo que poderiam ser "prejudiciais".

A diplomacia de Kiev rebateu o argumento brasileiro de que o conteúdo da proposta fosse tendencioso ou impedisse o diálogo. A representante da Ucrânia disse que o único pedido era que o conselho mantivesse o monitoramento das "atrocidades cometidas pela agressão russa" e que o mecanismo internacional independente verificasse a dor enfrentada diariamente pelo povo ucraniano.

Na mesma resolução aprovada, o CDH da ONU cobrou que o governo Vladimir Putin pare imediatamente violações de direito humanos e abusos contra a lei humanitária internacional na Ucrânia. Exigiu também a retirada rápida, do território ucraniano, das tropas militares invasoras e de grupos mercenários aliados de Moscou. E cobrou que o governo Putin não recrute ilegalmente residentes do território invadido para suas Forças Armadas.

O CDH disse ainda que a Rússia deve parar a deportação forçada e ilegal de civis do território ucraniano. Putin é alvo de um mandado de prisão em aberto, expedido pelo Tribunal Penal Internacional, acusado de transferência forçada de crianças, um crime de guerra.

O governo Luiz Inácio Lula da Silva tem feito uma série de gestos em favor da Rússia. Autoridades do governo têm dito, por exemplo, que Putin seria bem-vindo ao país para a cúpula do G20 e argumentam que ele gozaria de certas prerrogativas e imunidades por ser chefe de Estado.

Em uma discussão paralela, na Comissão de Direito Internacional da ONU, o Brasil se posicionou a favor da imunidade de autoridades governamentais e contra o alcance de ordens de prisão do TPI a países - e a seus representantes - que não integrem o estatuto fundador da corte, como é o caso da Rússia desde 2016. O Itamaraty, no entanto, argumento que o debate é genérico e não teria implicação no caso da vinda de Putin ao Rio para o G20.

O governo brasileiro tem objetado tentativas de países aliados da Ucrânia e adversários de Moscou, entre eles os EUA e membros do G-7, de excluir Putin da arena internacional. O Brasil também se opôs a sanções e, em mão contrária, ampliou o comércio com os russos, que atingiu US$ 11 bilhões no ano passado.

Em setembro de 2023, no G20 da Índia, Lula defendeu em entrevista a uma rede de TV indiana que Putin não seria preso no país. Depois, em entrevista coletiva, voltou atrás de criar obstáculos a uma eventual ordem de prisão no país e afirmou que o caso caberia à Justiça brasileira.

Na esteira da controvérsia, o governo já discutiu inclusive a possibilidade de reavaliar a participação no Estatuto de Roma, que criou o TPI, por considerar que ele não funciona de forma adequada. A revisão tem apoio de Celso Amorim.

"Conheci o Putin no G7, no G20, na ONU. Nós fazemos partes de várias organizações internacionais que você tem a participação heterogênea de muitos países, muita gente que você não concorda, mas faz parte", argumentou Lula, na quinta-feira, dia 28. "Faz parte do processo democrático conviver democraticamente na adversidade. Não são fóruns de iguais, são de Estados, de países e temos de respeitar o direito de cada um fazer o que quer no seu país, criticando o que não concorda."

Os posicionamentos de Lula a respeito da guerra na Ucrânia afetaram a popularidade do presidente e provocaram a impressão, entre parceiros ocidentais, que ele apoia o regime russo. Lula já cogitou que a Ucrânia deveria ceder a Crimeia para firmar um acordo de paz e disse que tanto Putin quanto o presidente ucraniano Volodimir Zelenski tinham o mesmo grau de responsabilidade pela guerra. A Ucrânia, porém, foi invadida unilateralmente pelos russos, em 24 de fevereiro de 2022.

Ele afirmou ainda que os EUA e países europeus incentivavam a guerra ao fornecer armas e dinheiro para defesa de Kiev. Lula vetou a exportação de equipamentos bélicos fabricados no Brasil. O petista fracassou na tentativa de se colocar como potencial mediador do conflito.

Na semana passada, disse ainda que não era obrigado a ter o mesmo "nervosismo" dos europeus com Putin e disse que os "bicudos vão ter de se entender". O presidente e o PT enviaram cartas de cumprimentos pela reeleição de Putin, numa eleição sem controlada que foi alvo de contestação internacional.

quarta-feira, 3 de abril de 2024

O Brasil e a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia: o que sabemos e o que não sabemos - Paulo Roberto de Almeida


O Brasil e a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia: o que sabemos e o que não sabemos

  

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Artigo sobre a postura do Brasil em face da guerra de agressão da Rússia à Ucrânia.

  

Nós sabemos quando e como a guerra de agressão da Rússia contra Ucrânia começou.

Não foi em fevereiro de 2022, mas bem antes disso: começou em 2014 com a invasão e a anexação ilegal da península ucraniana da Crimeia, e com os distúrbios fabricados simultaneamente pela Rússia na região do Donbas, mas essas invasões e a própria guerra de agressão já estavam, provavelmente, nos planos de Putin desde o início dos anos 2000, mais concretamente desde 2007-2008.

Não sabemos, ainda, quando ou como essa guerra terminará.

Mas já sabemos que ela provocou uma mudança radical nas relações internacionais, uma fratura por enquanto irremediável entre a potência invasora (e seus apoiadores diretos, como a Belarus) e todos os demais países que simplesmente defendem o Direito Internacional e a Carta da ONU e que, ipso facto, estão do lado da Ucrânia em sua ação defensiva contra a potência agressora. Estes não ultrapassam quatro dezenas de Estados, se tanto. 

Sabemos também, perfeitamente, que uma maioria de Estados, também membros da ONU, permanece, infelizmente, absolutamente indiferente à sorte da parte agredida, ainda que condenando formalmente a Rússia pela invasão. Nisso eles também contrariam a Carta da ONU, pois que esta comanda a solidariedade e o apoio de todos os membros à parte agredida e uma ação correspondente de todos eles contra a parte agressora. É um dever político e uma obrigação moral, ainda que não um requerimento jurídico.

Isso está no espírito e na letra da Carta da ONU, que, no entanto, se vê na tolhida pelo uso abusivo do direito de VETO, no tocante a uma possível e necessária ação do Conselho de Segurança, que é o PRINCIPAL (main) garantidor da paz e da segurança internacionais, mas que não é o ÚNICO, nem o EXCLUSIVO.

Esse “direito de veto” é arrogante e absurdo, uma vez que é um membro permanente o RESPONSÁVEL pela violação do principal artigo da Carta, que é a guerra de agressão. Nisso o Brasil já tinha sido pioneiro em sua posição contrária a essa falcatrua desde o debate, em 1945, em torno dos artigos da Carta. Essa posição estava expressa em parecer fo Consultor Jurídico da delegação brasileira em San Francisco, Hildebrando Accioly.

Também sabemos, infelizmente, que o Brasil, a sua diplomacia e os seus governos, o precedente e o atual, se alinham entre os “indiferentes”, condenando, formalmente, a Rússia, mas se eximindo de qualquer ação mais incisiva em defesa ou solidariedade à parte agressora e até renunciando a condenar de maneira mais explícita a parte agressora.

O dirigente anterior, um rústico em matéria de diplomacia e de política internacional chegou pateticamente a se dizer “solidário” com a parte russa, provavelmente por razões oportunistas e eleitoreiras: fornecimento de fertilizantes e de combustíveis, como se isso estivesse acima de considerações de natureza diplomáticas ou até morais.

Mas, o dirigente atual faz muito pior, pois que demonstra, já demonstrou, em inúmeras oportunidades, seu apoio objetivo à parte agressora, assim como sua total indiferença em face dos crimes de guerra, dos atos terroristas, e até dos crimes contra a humanidade (sequestro de crianças, por exemplo), perpetrados pela parte agressora contra o país e contra a população ucraniana.

Isso tudo já sabemos e já constatamos. Não sabemos ainda, como dito, quando a guerra terminará, ou se, numa outra vertente, a postura do governo do Brasil e de sua diplomacia continuará sendo de apoio objetivo à parte agressora, ou se tal posição poderá mudar, neste ou num próximo governo. 

Tenho, pessoalmente, minhas hipóteses, ou quase certezas, sobre as razões que estão na base das opções e escolhas do atual governo quanto à guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia (cabe sempre insistir no conceito por inteiro, pois esse é o objeto do Artigo 1o. da Carta da ONU). Elas têm muito a ver com ideologia e interesses políticos do atual governo, o que pode ser expresso pelo termo alemão de Weltanschauung, ou “visão do mundo”. Essa visão do mundo sempre esteve impressa na diplomacia partidária, presidencial e pessoalíssima em todos os mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, desde o início do governo (e implicitamente desde sempre).

A postura se tornou “encomendada”, digamos assim, desde a concepção e formação do BRIC, entre 2006 e 2009, se viu confirmada na criação do BRICS, em 2011, e foi consolidada na aceitação, talvez de forma relutante, do BRICS+, em 2023-24, dobrando o número de seus membros.

Ela se tornou uma espécie de “gaiola de ferro” para o dirigente brasileiro, por razões que me parecem óbvias, mas que não explicitarei neste momento. Reservo a uma oportunidade posterior a análise de todas as implicações da atual postura, para o Brasil e para a sua diplomacia, da “gaiola de ferro” que foi criada a partir da guerra aberta de agressão da Rússia contra a Ucrânia. As consequências e desafios me parecem ponderáveis e relevantes. Por isso, retornarei ao assunto.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4624, 3 abril 2024, 3 p.



War in Ukraine: Conflict, Strategy, and the Return of a Fractured World
Hal Brands (ed.)
Johns Hopkins University Press, 2024.

Project MUSE. muse.jhu.edu/book/122782



quinta-feira, 28 de março de 2024

Brasil, um país de ponta-cabeça? As propostas constitucionais de Modesto Carvalhosa - Paulo Roberto de Almeida (Revista de Direito do IESB)

Brasil, um país de ponta-cabeça?

As propostas constitucionais de Modesto Carvalhosa

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, doutor em Ciências Sociais pela Universidade Livre de Bruxelas (1984);

Mestre em Planejamento Econômico pela Universidade do Estado de Antuérpia (1976). Diretor de Relações Internacionais no Instituto Histórico e Geográfico do DF.

Publicado: Revista de Direito do IESB: Trabalho, Sociedade e Cidadania (Brasília: vol. 15, n. 15, jul./dez/ 2023; ISSN: 2448-2358; DOI: https://doi.org/10.61541/3x5gve70, p. 60-105, link: https://revista.iesb.br/revista/index.php/ojsiesb/issue/view/15; pdf do artigo: https://revista.iesb.br/revista/index.php/ojsiesb/article/view/197/174). Relação de Publicados n. 1555.

 

Resumo:

O último (sétimo) processo de elaboração constitucional do Brasil se fez em circunstâncias similares aos anteriores, sempre como resultado de uma ruptura de um determinado regime político e a inauguração de um novo. A despeito de todos os objetivos idealistas da CF-1988, a atual carta constitucional brasileira não logrou reduzir, como pretendido por muitos dos constituintes, os inúmeros privilégios ainda contidos ou implícitos ao texto constitucional, ou ampliar as oportunidades para a maioria do povo trabalhador. Estes dois conceitos, privilégios e oportunidades, situam-se no âmago do livro publicado pelo jurista Modesto Carvalhosa, em 2021, Uma nova constituição para o Brasilde um país de privilégios para uma nação de oportunidades; é em torno deles que se situa o presente texto analítico, mas de um ângulo bem especial: a perspectiva municipalista, que segundo o autor, deveria estar na base do sistema político brasileiro, mas que se tornou um mero apêndice de estados e da própria União. O que propõe Modesto Carvalhosa é a regeneração do Brasil pela sua base.

Palavras-chave: reforma constitucional; sistema administrativo; produtividade; municípios; história política brasileira.

 

Brazil, an upside-down country?

Modesto Carvalhosa’s constitutional proposals

 

Abstract:

The last (seventh) undertaking of constitutional reform in Brazil was done in similar circumstances to the previous exercises, always the outcome of a disruption of a former political regime, and the inauguration of a new. Despite its idealistic objectives, the 1988 Federal Constitution did not reach an optimistic result, as expected by the members of the Constitutional Assembly: the reduction of privileges still embedded in the chart, and the enlargement of opportunities for the whole working people. These two concepts, privileges and opportunities, are at the core of the work published in 2021 by the jurist Modesto Carvalhosa, A new Constitution for Brazil: from a country of privileges to a nation of opportunities; it is from that perspective that departs this analytical essay, but from a special angle: a municipality approach, which should be at the founding layer of the Brazilian political system, according to this author, albeit turned into a mere appendix of states and the Union itself. What Modesto Carvalhosa conversely proposes is the regeneration of Brazil taking support from its very basis. 

 

Keywords: constitutional reform; administrative system; productivity; municipal circumscriptions; Brazilian political history.

 

 

No Brasil o Estado é hegemônico, não restando à cidadania nenhum papel em nossa construção civilizatória. A sociedade civil é dominada por um Estado que se estruturou para preencher todos os espaços.

Esta dominação é fundada numa oligarquia que tem como instrumento a Constituição de 1988, que outorga privilégios institucionais à classe política e ao estamento burocrático, em detrimento daqueles que trabalham e empreendem no setor privado.

(CARVALHOSA, 2021, p. 27)

 

 

1. O Brasil de ponta cabeça?

Karl Marx, num de seus trabalhos mais pretensiosos da juventude – possivelmente na Ideologia Alemã, obra composta com a colaboração de seu amigo Friedrich Engels –, se vangloriava de ter colocado o sistema hegeliano sobre os seus pés, ou seja, invertido a filosofia dialética, que, supostamente, estaria de ponta-cabeça na concepção do filósofo prussiano, ao colocar a razão do Estado como elemento fundacional da nação. Para Marx, o substrato básico de toda formação social estaria nas forças produtivas da nação, e sua organização social seria determinada, em grande medida pelas relações de produção; estas, por sua vez, seriam determinadas pela luta de classes, que, para ambos, seria o “motor da história”, como está registrado em outro trabalho de juventude, o Manifesto Comunista

Essa concepção determinista da História foi há muito confrontada, contestada, negada e praticamente excluída das modernas interpretações do processo histórico por muitos intelectuais, historiadores ou analistas dos sistemas políticos, entre eles o grande filósofo da Escola de Viena Karl Popper, notadamente em dois de seus livros clássicos: The Open Society and its Enemies, publicado no imediato pós-Segunda Guerra (1945), e The Poverty of Historicism (1957). O filósofo liberal de origem letã Isaiah Berlin também se pronunciou diversas vezes sobre a inconsistência da interpretação marxista da História, cuja principal contribuição a determinadas concepções políticas acadêmicas foi, paradoxalmente, o reforço da centralidade do Estado nos processos de estruturação política e social das nações. Os argumentos marxianos e marxistas sobre o “ulterior desaparecimento do Estado”, na fase comunista da construção socialista, se revelaram, assim, uma pretensão totalmente contrária ao que ocorreu, de fato, em todas as sociedades “socialistas”; ou seja, a concepção marxista sobre o desenvolvimento futuro do “modo de produção socialista” também estava assentada sobre sua cabeça, isto é, sempre esteve de ponta-cabeça, ou de pernas para o ar.

(...)


Ler a íntegra num destes dois links: 

https://revista.iesb.br/revista/index.php/ojsiesb/issue/view/15 

https://revista.iesb.br/revista/index.php/ojsiesb/article/view/197/174

https://www.academia.edu/116809954/4100_Brasil_um_pa%C3%ADs_de_ponta_cabe%C3%A7a_As_propostas_constitucionais_de_Modesto_Carvalhosa_2022_

segunda-feira, 25 de março de 2024

O Brasil já viveu na MENTIRA do poder. Agora está vivendo novamente na MENTIRA do poder - Editorial Estadão

 Triste é constatar que TODAS as elites brasileiras, com muito poucas exceções, são cúmplices na mentira que beneficia o roubo, a extorsão, a corrupção e a mendacidade.

Já é assim na política externa, porque seria diferente na política interna?

Paulo Roberto de Almeida

Revisionismo sem vergonha

O Estado de S. Paulo

A volta de Lula deu ânimo adicional aos que pretendem reescrever a história da Lava Jato, como se a corrupção durante os governos do PT não tivesse existido. Mas os fatos se impõem

O programa Especial 10 Anos da Lava Jato, levado ao ar recentemente pela TV Brasil, é um documento histórico. Não por reconstituir com imparcialidade a maior ação de combate à corrupção da história do Brasil, porque isso seria impossível numa TV pública convertida em emissora oficial do PT, mas justamente porque retrata com fidelidade a desfaçatez e a mendacidade do partido de Lula da Silva, ansioso por reescrever a história do período em que as entranhas corruptas do lulopetismo ficaram expostas para todo o País. E nesse revisionismo, diga-se a bem da verdade, o PT e Lula não estão sozinhos – têm a companhia de ministros do Supremo, de empresários corruptos ansiosos para limpar o nome e de políticos interessados em desmoralizar a luta contra a roubalheira.

A volta de Lula da Silva à Presidência certamente deu ânimo adicional aos petistas para distorcer os fatos. Afinal, o chefão petista – aquele que alhures disse que “o mensalão nunca existiu” – vive a alardear que a Lava Jato não passou de uma “conspiração” dos EUA para, por meio do então juiz federal Sérgio Moro, tido por Lula como “capanga” dos norte-americanos, “destruir a indústria de óleo e gás deste país”. Nada menos.

Com uma hora e meia de duração, o tal programa da TV Brasil dedicou somente 1 minuto e 53 segundos à corrupção na Petrobras – e apenas para tratá-la como “pontual”, segundo um sindicalista entrevistado. O resto do tempo foi usado para desancar a Lava Jato, com convidados escolhidos a dedo – todos críticos virulentos da operação.

Esse é o padrão do PT. Nem Lula nem os petistas jamais admitiram a corrupção desvendada pela Lava Jato, malgrado as provas irrefutáveis dos desvios de recursos públicos por meio de contratos fraudulentos entre as maiores empreiteiras do País e a Petrobras. Convenientemente, os erros e abusos cometidos pela força-tarefa da Lava Jato foram usados pelos detratores da operação para desqualificá-la como um todo, como se crimes confessos jamais tivessem sido praticados. Eis o grau da desfaçatez.

Esse discurso revisionista, mais orientado pela mudança dos ventos da política nacional do que pelo apego à verdade factual, contaminou até a atuação do Supremo – Corte que outrora chancelou não uma, mas quase todas as ações da Lava Jato que ora pretende desmoralizar, como se os erros cometidos por alguns membros da força-tarefa tivessem o condão de contaminar a operação em todas as suas dimensões, sobretudo sua dimensão fática.

Talvez se sentindo devedor de Lula, cuja prisão classificou como “um dos maiores erros judiciários da história”, o ministro Dias Toffoli também contribuiu para esse esforço revisionista. Com a volta do petista ao Palácio do Planalto, Toffoli decidiu anular as provas de corrupção e suspender o pagamento de multas impostas à Odebrecht e à J&F por considerar que essas empresas teriam sofrido, ora vejam, “coação institucional” para firmar acordos de colaboração premiada. Em audiência pública recente, no próprio Supremo, nem os prepostos dessas empresas admitiram ter sofrido tal violência estatal.

Mas os fatos insistem em se impor. Levantamento feito pelo Estadão com base em acordos firmados entre os investigados e o Ministério Público mostrou que cinco ex-funcionários de alto escalão da Petrobras aceitaram devolver nada menos que R$ 279,8 milhões ao Tesouro e à empresa. Dessa dinheirama, quase 90% se referem a propinas recebidas por aqueles executivos, subornados por algumas das maiores empreiteiras do Brasil interessadas em obter contratos com a Petrobras. Ao que consta, nenhum desses ex-funcionários corruptos foi coagido pela Lava Jato a confessar que havia embolsado milhões em suborno – e igualmente não há notícia de que o dinheiro que devolveram fosse de mentirinha.

É preciso recolocar as coisas nos seus devidos lugares. Quem quiser acreditar na fábula lulopetista de que o PT e seu chefão foram perseguidos por um poderoso consórcio golpista que envolveu até o FBI, que acredite, pois questões de fé não se discutem. Já quem preza a verdade factual, sem a qual não há democracia, certamente espera que a Lava Jato encontre seu melhor lugar na história

quinta-feira, 21 de março de 2024

O Brasil tem parceiros estrangeiros; o PT tem aliados preferenciais: Putin, por exemplo (G1)

Há uma certa confusão, no governo atual, entre aliados políticos e parceiros comerciais. Creio que não se faz muita diferença entre as duas categorias. PRA

PT parabeniza Putin pela eleição na Rússia e chama vitória de 'feito histórico'

Organismos internacionais criticam eleição na Rússia pela falta de transparência e de real competitividade. Para secretário do PT, vitória de Putin 'ressalta a importância do voto voluntário na Rússia'.

G1, 21/03/2024

Em uma carta pública, o secretário de Relações Internacionais do PT, Romênio Pereira, parabenizou o presidente russo Vladimir Putin pela vitória na eleição no último fim de semana. Pereira chamou a vitória de Putin de "feito histórico" e disse que a conquista do novo mandato "ressalta a importância do voto voluntário na Rússia".

A eleição russa é criticada por organismos internacionais pela falta de transparência e pela ausência de real competitividade. 

Putin, que está no poder há 24 anos, não tinha outros concorrentes com real chance de vitória. Os outros três candidatos, todos deputados, eram considerados fantoches do governo — eles votaram a favor da guerra na Ucrânia no Parlamento (sinal de alinhamento a Putin) e já fizeram declarações públicas de apoio ao presidente. 

O país vive uma repressão implacável que sufocou os meios de comunicação independentes e grupos de direitos humanos proeminentes. O mais destacado adversário de Putin, Alexei Navalny, líder da oposição, morreu em uma prisão no Ártico em fevereiro. Outros críticos estão na prisão ou no exílio. 

Putin está no poder há 24 anos e é o presidente mais longevo da Rússia desde Josef Stalin, da época da União Soviética. 

"Acompanhamos com grande interesse o desenrolar do recente processo eleitoral presidencial na Rússia, que resultou na reeleição do presidente Vladimir Putin. Com uma participação impressionante de mais de 87 milhões de eleitores, representando 77% do eleitorado do país, esse feito histórico ressalta a importância do voto voluntário na Rússia". escreveu o secretário de Relações Internacionais do PT.

A carta, apesar de pública e aberta, é endereçada a Dmitry Medvedev, aliado de Putin e presidente do partido Rússia Unida, pelo qual o presidente se elegeu. 

"Renovamos nosso compromisso em fortalecer nossos laços de parceria e amizade, trabalhando juntos rumo a um mundo mais justo, multilateral e plural. Enviamos nossas calorosas saudações à Rússia e seu povo neste momento importante e especial para o país", continua Pereira. 


Silêncio no governo 

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que também é do PT, ainda não se pronunciou publicamente sobre a vitória de Putin. O Ministério das Relações Exteriores do Brasil também não. 

Interlocutores de Lula no Palácio do Planalto afirmam que o presidente mandou cumprimentos privados a Putin pela vitória eleitoral. 

No início do mandato, Lula foi criticado por declarações que conferiam à Ucrânia parte da responsabilidade pela guerra. A Ucrânia foi invadida pela Rússia em fevereiro de 2022, e a guerra dura até hoje. A decisão de invadir foi unilateral da Rússia. 

Depois da má repercussão, Lula moderou o discurso e não mais disse que a Ucrânia é culpada pela guerra. Ele também tenta criar um grupo de países neutros para intermediar negociações de paz.


Não só no Brasil: relações civis-militares também estressadas nos EUA, desde Trump - Alexander Vindman (ademocracy Journal)

 Alexander Vindman begins his recent piece for Democracy with a troubling revelation. “Over the past two decades,” he writes, “there has been a steady erosion of civil-military relations in the United States due to the politicization of the military.”


Vindman knows what he’s talking about. A retired Army lieutenant colonel, he was removed from his position on the National Security Council in 2020 after he told House impeachment investigators that he had heard President Trump ask the president of Ukraine to investigate Joe Biden.

Check out our latest piece, “Civil-Military Relations: Repairing Fractured Ties”→

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In his essay for Democracy, Vindman offers a clear-eyed analysis of the state of relations between our military leaders and civilian authorities. It isn’t reassuring. According to Vindman, growing partisanship within the ranks and politicians’ willingness to capitalize on public respect for the military now pose a threat to our national defense—and our democracy. 

Read on to learn the three things that Vindman believes we can do to “mend the growing chasm and ensure that both civilian and military entities work cohesively to uphold the democratic ideals upon which the United States was founded.”