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sábado, 13 de novembro de 2021

Deu no New York Times; uma carta mais sincera ao Editor - Paulo Roberto de Almeida

 Nestor Forster é (ou pelo menos era) meu amigo. Foi meu aluno no Instituto Rio Branco, quando ali dei aulas de Sociologia Política na segunda metade dos anos 1980, logo depois de voltar do doutorado.  Foi um excelente aluno e revelou-se depois excelente diplomata, discreto, trabalhador, eficiente. Ficamos em contato de forma intermitente, pois na carreira somos por vezes separados durante longos anos, pois quando um está em Brasília, o outro está entre dois postos no exterior.

Mas, eu sabia que ele era profundamente religioso e conservador, até anticomunista decidido. Manteve-se discretamente durante o reinado lulopetista na diplomacia, mas foi um dos poucos que se solidarizou comigo quando eu estava em minha longa travessia do deserto nos mesmos anos, até tentando conseguir-me algum posto de professor, pois sabia que meu salário estava reduzido ao básico, praticamente o mesmo de um secretário em início de carreira. 

Não sabia que ele tinha se aproximado de Olavo de Carvalho, mas soube quando, cerca de sete anos atrás, me ofereceu o livro Jardim das Aflições, do polêmico escritor, de quem já tinha lido O Imbecil Coletivo e dezenas de outros artigos nos blogs com os quais cooperava (Mídia Sem Máscara) ou o pessoal, que mantinha. De todo modo foi uma completa surpresa quando soube, muitos meses depois, que tinha sido ele que tinha levado o então candidato a chanceler EA em visita ao escritor residente na Virgínia, em abril ou maio de 2018, quando Nestor Forster era ministro-conselheiro na embaixada em Washington, comandada pelo embaixador Sérgio Amaral.  

Quando ele foi elevado de ministro-conselheiro a embaixador em Washington, em setembro de 2020, eu escrevi uma carta aberta a ele, cumprimentando-o, e até coloquei essa carta neste meu blog, como informo abaixo: 

3760. “Carta aberta a meu bom aluno, Nestor Forster, embaixador do Brasil em Washington”, Brasília, 23 setembro 2020, 4 p. Cumprimentos ao novo embaixador e rememorando certas convicções do passado. Divulgado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2020/09/carta-aberta-meu-bom-aluno-nestor.html).

Dois dias atrás, um jornalista americano, Jack Nicas, publicou no New York Times um artigo fortemente crítico ao presidente Bolsonaro, "The Bolsonaro-Trump Connection Threatening Brazil's Elections", que eu também publiquei em meu blog, como faço normalmente com todas as matérias que encontro de interesse para a diplomacia e a política externa do Brasil, como informo aqui: 

O modelo Trump-Bannon para a reeleição no Brasil 

Jack Nicas (NYT)

 O NYTimes é um jornal progressista, ou "liberal", no conceito americano de esquerda light, que para a direita é socialista, quase comunista. Não encontrei muita novidade neste artigo, pois tudo o que o jornalista reporta eu já tinha lido em diversas matérias de imprensa, reportagens ou análises e colunas de opinião.

Em todo caso, para os brasileiros, nada do que está dito é estranho ao que nós mesmos observamos daqui, mas isso pode impressionar os americanos.

Paulo Roberto de Almeida

Os interessados em conhecer esse artigo, para mim totalmente anódino, podem fazê-lo neste link de meu blog: 

https://diplomatizzando.blogspot.com/2021/11/o-modelo-trump-bannon-para-reeleicao-no.html

Descubro agora que meu amigo, embaixador em Washington Nestor Forster, se sentiu compelido – ou o fez por iniciativa própria – a enviar uma carta ao Editor do Jornal, que já foi reproduzida em diversas matérias jornalísticas. Transcrevo essa carta logo abaixo, e em seguida eu me permito reescrever uma carta que Nestor Forster, se fosse um homem livre, como eu sou, mesmo sendo diplomata, poderia enviar ao Editor, mais ou menos no mesmo teor, mas de sentido completamente diferente.

Vejamos sua carta, divulgada amplamente: 


Eis a carta que eu escreveria ao mesmo Editor (numa versão em português): 

Mr. Dean Baquet

Executive Editor

The New York Times

Caro Sr. Baquet,

A reportagem "The Bolsonaro-Trump Connection Threatening Brazil's Elections", (Nov. 11) é, felizmente, uma narrativa necessária com o propósito de reforçar e defender as instituições brasileiras, num momento em que muitos brasileiros, e o seu jornal, a partir de um ponto de vista objetivo, consideram que elas são "vulneráveis" a ataques que o próprio presidente do Brasil vem fazendo, sistematicamente, contra a imprensa livre brasileira e estrangeira, muito ao estilo mentiroso que o seu modelo americano, o ex-presidente Trump, um notório agressor das instituições democráticas americanas, e aquele que foi seu assessor de imprensa, o indiciado Steve Bannon, ensinaram a família Bolsonaro a praticar no Brasil, com o mesmo lamentável recurso a FakeNews e mentiras deslavadas. 

Um membro longevo do Congresso Nacional, que ele sempre desrespeitou e envergonhou durante quase três décadas, o presidente Jair Bolsonaro foi eleito em outubro de 2018 com mais de 57 milhões de votos, ou seja, 55% dos votos válidos, resultado que ele obteve com o mesmo recurso à mentira, à fraude, às FakeNews, que foram ensinadas por esses dois notórios destruidores da democracia americana. 

Sua presidência tem sido marcada pelo desrespeito sistemático aos valores e princípios constitucionais e em notória contravenção a todas as regras e normas que regem o direito à livre expressão no Brasil, perpetrando tantas mentiras quanto seu modelo americano. Não apenas ele não respeita a separação dos poderes, como vinha tentando, sistematicamente, minar a credibilidade do Legislativo e do Judiciário, numa aparente tentativa de forçar uma ruptura democrática e governar de maneira autocrática. Como é do conhecimento da grande maioria dos brasileiros, e provavelmente dos leitores do NYTimes, Bolsonaro é um admirador da ditadura militar brasileira, não se eximindo de elogiar os piores torturadores daquele regime.

Bolsonaro é um protótipo de ditador, mas frustrado, pois que totalmente desprovido – felizmente – de qualquer condição de liderar um golpe de Estado, e menos ainda de governar de maneira digna um país relevante como é o Brasil na América do Sul.

A democracia no Brasil corre sérios riscos e por isso eu cumprimento o New York Times pelo esforço que seu jornal vem demonstrando em seguir nossos assuntos internos, assim como nosso papel na região e no mundo, de maneira a manter os seus leitores bem-informados sobre a triste realidade de ameaça institucional que paira sobre o Brasil neste momento.

Cordialmente, 

Em nome do embaixador Nestor Forster

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata e professor

Brasília, 13 de novembro de 2021