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terça-feira, 13 de agosto de 2024

Após 75 anos, qual é a relevância das Convenções de Genebra? - Helen Whittle (Deutsche Welle)

 

Após 75 anos, qual é a relevância das Convenções de Genebra?

Helen Whittle
Deutsche Welle, 12/08/2024

há 12 horas

Com o grande número de vítimas civis e acusações de crimes de guerra nos conflitos atuais, pedra angular do direito humanitário internacional vive momento-chave, com países signatários pressionados a estabelecer limites.

As Convenções de Genebra de 1949 e seus Protocolos Adicionais foram descritos pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) como "uma das conquistas mais importantes da humanidade no século passado". Assinadas por praticamente todos os países do mundo, elas estabelecem limites sobre como uma guerra é travada e protegem civis, médicos e trabalhadores humanitários em conflitos, bem como feridos, doentes, náufragos e prisioneiros de guerra.

Apesar disso, em 2023, as Nações Unidasregistraram mais de 33.443 mortes de civis em conflitos armados, um aumento de 72% em relação a 2022.

No contexto do ataque de 7 de outubro da organização terrorista Hamas e de outros grupos armados contra Israel, da resposta militar israelense em Gaza, da guerra no Sudão e da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia, o secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou que "muitas vezes falta o cumprimento da lei humanitária internacional e da lei de direitos humanos", descrevendo a situação da proteção de civis como "estrondosamente sombria".

"Vimos ataques sem precedentes contra profissionais da área médica, hospitais e civis, todos violando as Convenções de Genebra, com pouquíssimos sinais de constrangimento por parte de quem faz isso", afirma Andrew Clapham, professor de Direito Internacional no Geneva Graduate Institute, na Suíça, e ex-membro da Comissão de Direitos Humanos da ONU no Sudão do Sul.

Para Clapham, o 75º aniversário das Convenções de Genebra é um "momento decisivo" para o direito humanitário internacional, quando os Estados devem decidir se responsabilizam ou não aqueles que violam as Convenções por crimes de guerra. Isso inclui a obrigação dos Estados-membros de deter ou transferir indivíduos sujeitos a mandados de prisão emitidos pelo Tribunal Penal Internacional (TPI).

A Corte começou a funcionar em 2002 para responsabilizar criminosos de guerra, mas muitos países, como EUA, a Rússia e Israel, não reconhecem a jurisdição do tribunal.

"O TPI emitiu mandados de prisão para russos, e há pedidos de mandados de prisão no contexto do conflito entre Israel e os palestinos em Gaza. A seriedade com que isso é levado pelos países ocidentais será um sinal de quão importante as Convenções de Genebra continuam sendo", disse Clapham à DW.

Rashmin Sagoo é diretora do programa de Direito Internacional do think tank britânico Chatham House e, anteriormente, foi consultora da Cruz Vermelha Britânica. Para ela, o 75º aniversário é um lembrete oportuno para que os Estados garantam a ordem em sua própria casa, que estejam se concentrando na implementação das convenções em suas próprias forças armadas e incentivando seus aliados a fazer o mesmo.

"As notícias que vemos em nossas telas são terríveis. Mas o que não podemos perder de vista é que essas são convenções universalmente aceitas, baseadas em valores e princípios universais, que podem dar peso legal e moral quando ocorrem violações. Se não as tivéssemos agora, suspeito que haveria pedidos para criá-las, o que seria difícil nos tempos geopolíticos atuais", diz Sagoo.

"Minha perspectiva é que temos que ser muito cuidadosos nessa discussão, porque, na verdade, as Convenções de Genebra têm sido notavelmente resistentes e flexíveis o suficiente para se adaptarem aos tempos modernos e a essas incríveis novas tecnologias que temos visto, inclusive no ciberespaço, mas a implementação e a aplicação das regras continuam sendo preocupações sérias."

O que são as Convenções de Genebra? 

Foi o empresário suíço Henri Dunant que iniciou as negociações internacionais que deram origem à Convenção para a Melhoria da Condição dos Feridos nos Exércitos em Campo, em 1864, que se tornaria a Primeira Convenção de Genebra em 1949.

Nascido em Genebra, Dunant testemunhou as consequências sangrentas da Batalha de Solferino, no norte da Itália, na qual dezenas de milhares de pessoas foram mortas e feridas. Comovido com a situação dos soldados feridos, Dunant solicitou a formação de sociedades nacionais de socorro para ajudar os serviços médicos militares e acabou fundando o Comitê Internacional para Ajuda aos Militares Feridos, hoje conhecido como Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV).

O Comitê persuadiu os governos a adotar a Convenção para a melhoria da sorte dos feridos e enfermos dos exércitos em campanha, que obrigava os exércitos a cuidar dos soldados feridos, independentemente de sua lealdade, e introduziu o emblema de uma cruz vermelha sobre um fundo branco para representar os serviços médicos.

Foram os horrores da Segunda Guerra Mundial que levaram à conclusão dos quatro tratados das Convenções de Genebra em 1949, ainda que somente após longas negociações e muitas manobras políticas entre os delegados dos 64 Estados envolvidos no processo.

O que dizem as Convenções de Genebra?

As Convenções de Genebra e seus Protocolos Adicionais estão no centro do direito internacional humanitário e buscam um equilíbrio entre a necessidade militar e o princípio da humanidade.

"São tratados internacionais que basicamente aceitam que haverá guerras, mas que são regras importantes para regular a conduta de conflitos armados e limitar a brutalidade da guerra", explica Sagoo.

A Primeira Convenção protege soldados feridos e doentes, além de equipes de apoio civil, e garante tratamento humano, cuidados médicos e proteção contra a violência, inclusive tortura e assassinato. Ela também especifica a neutralidade da equipe e das instalações médicas, e a Cruz Vermelha e o Crescente Vermelho como sinais visíveis de proteção.

A Segunda Convenção protege os feridos, doentes e náufragos das forças armadas no mar. A Terceira Convenção estabelece regras específicas para o tratamento de prisioneiros de guerra, e a Quarta protege civis em tempo de guerra, especialmente aqueles em mãos inimigas ou em territórios ocupados.

Certas violações das Convenções podem ser investigadas e processadas por qualquer Estado ou, em determinadas circunstâncias, por um tribunal internacional.

Qual é a relevância das Convenções de Genebra hoje em dia?

Entre os muitos desafios para o direito internacional humanitário – a proliferação de atores não estatais, tecnologias novas e emergentes, como sistemas de armas autônomas e Inteligência Artificial (IA), além de novos domínios de guerra no espaço – o mais óbvio talvez seja a observância de suas leis.

Porém, o trágico sofrimento em massa e o número de vítimas resultantes dos conflitos atuais não significam que as regras não sejam valiosas ou que as pessoas ou mesmo as nações não se importem com elas, diz Rashmin Sagoo.

"O cumprimento sempre foi um desafio, isso é uma realidade e, além disso, a implementação das regras pelos Estados é, na minha opinião, outra coisa muito importante na qual os países devem se concentrar, e isso é algo que só pode ser feito em tempos de paz", disse à DW.

"É muito difícil realizar os aspectos de implementação em meio ao calor da guerra. Portanto, as bases devem ser estabelecidas com bastante antecedência."

Para Andrew Clapham, a única maneira de garantir que as Convenções de Genebra sejam respeitadas é responsabilizar por crimes de guerra aqueles que as violam e os governos que ajudam outros Estados a violá-las.

"Estamos começando a ver algumas decisões em alguns Estados dizendo: 'Bem, não podemos mais exportar armas para este ou aquele país – obviamente, no contexto de Israel no momento – porque isso facilitará ou contribuirá para uma violação das Convenções de Genebra, que é uma violação de acordo com a lei nacional e a lei internacional", afirma.

"Eu diria que as áreas a serem observadas agora são os processos por crimes de guerra e as exportações de armas – essas são as duas maneiras pelas quais podemos garantir o respeito às Convenções de Genebra."


segunda-feira, 20 de maio de 2024

A interminável novela do acordo Mercosul-UE - Oliver Pieper Deutsche Welle

 O que ainda segue travando o acordo UE-Mercosul

Deutsche Welle, 19/05/2024

A maior zona de livre-comércio do mundo não sairá do papel antes das eleições europeias no início de junho. Enquanto a França aperta o freio, Alemanha apoia ratificação do pacto. Já ambientalistas torcem pelo fracasso.


Se for concluído, o acordo de livre-comércio entre a União Europeia (UE) e o Mercosul será o maior tratado desse tipo no mundo, atingindo um total de 780 milhões de pessoas. Contudo, em visita ao Brasil no fim de março, o presidente da França, Emmanuel Macron, avaliou que o pacto, "tal como está sendo negociado agora, é um péssimo acordo".

A fala de Macron pode ter sido uma tentativa de evitar dar aos partidos populistas de direita franceses – como o Reunião Nacional, de Marine Le Pen – munição gratuita para sua campanha antes das eleições para o Parlamento Europeu no início de junho. Ou uma tentativa de não irritar ainda mais os agricultores franceses, que paralisaram as ruas do país durante semanas com seus protestos.

As palavras do presidente francês ainda ressoam semanas depois, e o acordo entre a UE e países sul-americanos, finalizado há cinco anos, segue até hoje sem ratificação. A história se repete: foi também a França que bloqueou o acordo em 2019 – à época, em resposta ao ex-presidente de extrema direita Jair Bolsonaro e suas políticas controversas na Amazônia.

Alemanha avança, e França freia

Agora, Macron está preocupado com o fato de que a Argentina, o Brasil e o Uruguai possam inundar a União Europeia com carne mais barata – e que os agricultores franceses voltem a fazer barricadas. Por outro lado, o setor industrial alemão está pressionando para que o acordo seja concluído, se necessário por uma maioria qualificada, mesmo sem a ratificação da França.

Grandes empresas químicas, como a Basf e a Bayer, bem como automotivas, incluindo a Daimler e a Volkswagen, veem o acordo como uma grande oportunidade de negócios. A Volkswagen disse à DW que "apoia uma política comercial aberta, livre e baseada em regras, e está defendendo a rápida ratificação do acordo com o Mercosul".

Em Bruxelas, os negociadores permanecem notavelmente calmos, apesar do atraso. "As equipes do [acordo] UE-Mercosul continuam em contato em nível técnico para resolver as questões pendentes. A UE continua se concentrando em garantir que o acordo atenda às metas de sustentabilidade da UE, ao mesmo tempo em que leva em consideração as sensibilidades da UE no setor agrícola", afirma Olof Gill, porta-voz da Comissão de Comércio e Agricultura do bloco.

E assim se desenha mais um capítulo na história aparentemente interminável das negociações entre a UE e o Mercosul. Elas começaram em 1999, com o objetivo de facilitar o comércio entre os dois continentes em determinados produtos e reduzir as tarifas. No entanto, esses 25 anos parecem ter sido uma crônica de oportunidades perdidas. A mais recente foi no final de 2023, quando o clima na França ainda estava calmo, os tratores ainda não passavam pelas cidades francesas, e o momento era de fato muito favorável.

Argentina favorável

Do outro lado do Atlântico, o autoproclamado anarcocapitalista Javier Milei, antes de ser eleito presidente da Argentina, chegou a fazer campanha para deixar o Mercosul e descreveu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva como um "comunista furioso" e um "criminoso". Agora chefe de Estado, Milei não fala mais em sair do bloco sul-americano. Em vez disso, o entusiasta do livre-comércio já sinalizou que poderá assinar o contrato com a UE imediatamente.

"O governo do presidente Milei quer reformar a economia argentina, abrindo-a para um maior comércio e uma presença internacional mais forte", avalia Marcela Cristini, economista sênior da Fundação de Investigações Econômicas Latino-Americanas (FIEL) da Argentina. "Juntamente com os outros países do Mercosul, já foram assinados acordos de livre-comércio com Cingapura e os países da EFTA [Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça]."

Portanto, a surpresa em Buenos Aires é ainda maior porque agora a UE, ou mais precisamente a França, está no caminho. Cada vez mais vozes se levantam na Argentina para que o acordo seja novamente revisto em busca de benefícios para seu próprio país. A União Europeia insiste numa declaração adicional com sanções a quem descumprir os objetivos ambientais do acordo.

Cristini acredita que as exigências ambientais da UE são excessivas. Segundo ela, a pecuária argentina é muito mais ecologicamente correta do que a pecuária europeia. "A competitividade da indústria agrícola do Mercosul é reconhecida mundialmente, e teme-se a concorrência de suas exportações. Ao mesmo tempo, a pegada de carbono dos países do Mercosul em produtos agroindustriais está entre as mais baixas do mundo", afirma a especialista.

China se beneficia de negociações paralisadas

Por sua vez, a China vem acompanhando de perto as negociações paralisadas do acordo UE-Mercosul. "Os países do Mercosul são comerciantes globais, e a China é um dos principais compradores de produtos agrícolas e industriais, o que explica o crescimento dos fluxos comerciais bilaterais", explica Cristini.

"Essa situação não poderá mais ser revertida. No caso do Mercosul, a China é o parceiro comercial número um ou número dois de cada país", acrescenta.

Ambientalistas esperam fracasso

Enquanto isso, Macron é a última esperança para aqueles que se opõem fundamentalmente ao acordo de livre-comércio. Organizações ambientais e de direitos humanos da Europa e da América do Sul vêm lutando contra os planos há anos. Um breve comentário do presidente francês, sugerindo a negociação de um novo tratado que "leve em conta o desenvolvimento, o clima e a biodiversidade", fez com que esses grupos se organizassem.

Na vanguarda da oposição está a advogada de direito ambiental Roda Verheyen. Em um parecer jurídico encomendado pelo Greenpeace Alemanha, ela concluiu que o acordo viola a lei climática internacional.

"Esse acordo não deveria mais ser negociado, porque simplesmente não representa um acordo de livre-comércio moderno e legal, não importa o que eles acrescentem a ele", disse Verheyen à DW. "O acordo UE-Mercosul está simplesmente desatualizado e inadequado, do ponto de vista atual, para combinar proteção climática e abordagens políticas globais."

A advogada ambiental já defendeu com sucesso uma maior proteção climática na Alemanha, perante o Tribunal Constitucional Federal em Karlsruhe, em 2021. Ela afirma que, devido ao aumento do desmatamento e das emissões de gases de efeito estufa, a meta de proteção climática do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a um máximo de 2 graus, de preferência 1,5, está ficando fora de alcance.

Em vez disso, Verheyen exige que, no mundo de hoje, os acordos de livre-comércio se concentrem principalmente na transferência e no compartilhamento de tecnologias.

"Como o acordo com a Nova Zelândia, por exemplo, e acordos menores também, que se concentram na transformação em ambas as direções", diz. "Nosso objetivo certamente não pode ser importar produtos agrícolas do exterior mais baratos e, por outro lado, exportar motores de combustão interna para o exterior. Isso é prejudicial para todos."


sexta-feira, 19 de abril de 2024

Brasil quer emplacar taxação de super-ricos no mundo- Deutsche Welle

 Brasil quer emplacar taxação de super-ricos no mundo

17 de abril de 2024

Governo defende criação de mecanismos internacionais de cooperação tributária e uso de imposto sobre os bilionários para financiar medidas contra pobreza e crise climática. 

Nada é certo nesta vida, a não ser a morte e os impostos, disse Benjamin Franklin (1706-1790), um dos "pais fundadores" dos Estados Unidos. Essa máxima é citada pelo economista americano Joseph Stiglitz no último relatório do Observatório Fiscal da União Europeia sobre evasão fiscal. Ele emenda: "Os bilionários podem não ter alcançado a imortalidade, mas certamente se tornaram mais espertos em evitar os impostos".

A taxação de super-ricos e o aumento da tributação de multinacionais será uma das propostas levadas pelo governo brasileiro para a reunião de ministros das Finanças e presidentes dos Bancos Centrais dos países do G20, que acontece nesta semana em Washington (EUA). Segundo o Ministério da Fazenda, o ministro Fernando Haddad apresentará nesta quarta-feira (17/04) a ideia, ao lado de representantes do Quênia e do Fundo Monetário Internacional (FMI). 

A proposta é a de criar mecanismos internacionais de cooperação tributária e usar um imposto sobre os bilionários para financiar medidas contra a pobreza e as consequências da crise climática. O tema ganhou destaque na reunião do G20 realizada em São Paulo, em fevereiro. O Brasil assumiu a presidência anual do grupo em dezembro de 2023 e estabeleceu entre as prioridades da sua gestão o combate à pobreza e à desigualdade e o desenvolvimento sustentável. 

A autora da proposta, Esther Duflo, vencedora do Nobel de Economia de 2019, falará como convidada do governo brasileiro. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, a economista francesa afirmou que cobrar "2% sobre a fortuna dos super-ricos e aumentar a tributação das multinacionais arrecadaria 500 bilhões de dólares por ano, que poderiam ser aplicados em favor dos mais pobres do planeta, maiores vítimas da emergência climática". 

Em 2023, para corrigir distorções internas sobre a tributação de super-ricos, o governo brasileiro publicou uma medida provisória para taxar em 15% rendimentos de fundos exclusivos – investimentos destinados apenas a milionários –  e sancionou um projeto de lei para tributar offshores, empresas abertas fora do país de residência, geralmente paraísos fiscais, onde a tributação é reduzida ou inexistente. A previsão inicial do governo é de arrecadar cerca de R$ 20 bilhões neste ano com as medidas.

Sistemas tributários regressivos

O Observatório Fiscal da União Europeia pontua que a globalização abriu, nas últimas décadas, muitas possibilidades de evasão fiscal, exploradas pelas multinacionais e pessoas ricas em todo o mundo. Essa disparidade ameaça o funcionamento da democracia, aprofunda as desigualdades e enfraquece a confiança nas instituições. 

O último relatório da instituição, divulgado em outubro de 2023, mostra que os sistemas tributários na maior parte dos países são regressivos, ou seja, os mais ricos pagam uma pequena fração de suas receitas em impostos em comparação com quem ganha menos. No caso dos bilionários, a taxa de imposto efetiva varia de 0 a 0,5% de sua riqueza. 

Pelos cálculos da instituição, se fosse cobrado um imposto de 2% sobre a fortuna de cerca de 3.000 bilionários no mundo, seria possível arrecadar 250 bilhões de dólares por ano. Em contrapartida, países em desenvolvimento precisam de 500 bilhões de dólares por ano para combater os efeitos das mudanças climáticas. 

Há entre os super-ricos quem defenda uma maior tributação. Em janeiro, durante o Fórum Econômico Mundial de Davos, um grupo de mais de 250 bilionários e milionários divulgou uma cartapedindo que a elite política global aumente os impostos sobre suas fortunas, com o intuito combater as desigualdades e possibilitar melhoras nos serviços públicos às populações em todo o mundo.

"Estamos surpresos que vocês fracassaram em responder a uma simples pergunta que fazemos há três anos: quando vocês vão taxar a riqueza extrema? Se os representantes eleitos nas principais economias do mundo não adotarem medidas para lidar com o aumento dramático da desigualdade econômica, as consequências continuarão a ser catastróficas para a sociedade", destaca o texto.

Entre os signatários da carta, estão ricos de 17 países. O único brasileiro na lista é João Paulo Pacífico, fundador do grupo de investimentos Gaia.

JJá a iniciativa europeia Tributar os Ricos recolhe assinaturas para que a Comissão Europeia crie um imposto europeu sobre grandes fortunas. Os organizadores do projeto, entre eles o economista Thomas Piketty e a herdeira da multinacional BASF Marlene Engelhorn, defendem que os recursos arrecados com essa nova contribuição seja destinado à luta contra as mudanças climáticas e as desigualdades.


quarta-feira, 27 de setembro de 2023

"Brasil pode liderar processo de paz entre Ucrânia e Rússia": entrevista com embaixador Andrii Melnyk (Deutsche Welle)

POLÍTICABRASIL

"Brasil pode liderar processo de paz entre Ucrânia e Rússia"

Nádia Pontes enviada a Brasília / com Jean-Philip Struck (Bonn)

Deutsche Welle, 27/09/2023

https://www.dw.com/pt-br/brasil-pode-liderar-processo-de-paz-entre-ucr%C3%A2nia-e-r%C3%BAssia/a-66927851

 

Recém-chegado ao Brasil, embaixador ucraniano Andrii Melnyk pede criatividade a diplomacia brasileira para criar paz duradoura na guerra na Ucrânia. Mas, segundo ele, iniciar negociações agora faria pouco sentido.


Andrii Melnyk é o novo embaixador da Ucrânia no Brasil

 

Recém-chegado a Brasília, o novo embaixador ucraniano Andrii Melnyk pretende mobilizar a diplomacia brasileira a "pensar fora da caixa" e liderar o processo de paz entre as vizinhas Ucrânia e Rússia. Desde fevereiro de 2022, os ucranianos enfrentam a invasão de tropas russas e tentam resistir com ajuda internacional.

Para o representante diplomático do governo ucraniano no Brasil, um dos primeiros passos para essa aproximação entre Kiev e Brasília foi organizar o encontro de mais de uma hora entre Luiz Inácio Lula da Silva e Volodimir Zelenski, em Nova York, na última semana, durante a Assembleia Geral das Nações Unidas. Segundo Melnyk, a conversa franca entre líderes é vista como chance de o mandatário brasileiro entender melhor a situação e se aproximar do país do Leste Europeu.

Durante a entrevista concedida à DW na embaixada da Ucrânia, abrigada numa casa alugada em Brasília, Melnyk argumentou que seria importante receber armas do Brasil, o que, segundo ele, se constituiria numa ajuda humanitária.

DW: Na avaliação do senhor, quais são os maiores equívocos no Brasil sobre a guerra que a Rússia está travando contra a Ucrânia, na sociedade e no plano político? Como planeja combatê-los?

Andrii Melnyk: Os brasileiros sabem que existe o Estado independente da Ucrânia. Mas, basicamente, o conhecimento é muito escasso. Mas não é culpa dos brasileiros, é nosso trabalho que não tem sido feito de forma apropriada nas últimas três décadas.

É nosso trabalho e nossa missão nos aproximarmos da sociedade brasileira e da comunidade política, fazer este contato e explicar nossa causa. Ficamos sem embaixador aqui por um longo período e isso atrapalhou a comunicação sobre o que aconteceu quando ocorreu a grande invasão em fevereiro de 2022.

Essa guerra de agressão, que pode parecer distante dos brasileiros geograficamente falando, afeta também a essência do DNA do Estado brasileiro, e ameaça as fundações da ordem internacional. E o Brasil é um dos países líderes dentro da ONU que tenta fortalecer esta ordem.

Minha segunda tarefa é mostrar para os brasileiros que a Ucrânia é mais do que apenas uma vítima desta guerra terrível. Temos que contar as histórias das pessoas. Ano passado, eu estava em Kiev, eu vivenciei os bombardeios noturnos diários. Muitos amigos meus morreram na linha de combate, muitos se feriram. Civis perderam suas vidas, suas casas. Temos também que contar a história da Ucrânia, o maior país em termos geográficos da Europa. Isso é algo que temos em comum com o Brasil, como o maior país da América do Sul.

Na Alemanha, onde o senhor foi embaixador da Ucrânia de 2015 a 2022, ganhou a reputação de ser franco e de criticar abertamente a classe política do país, incluindo a liderança do governo. O senhor pretende adotar a mesma postura no Brasil?

Honestamente, eu não sei ainda o caminho que eu devo escolher. É fato que não haverá um cenário de 'copia e cola', cada situação é única. Eu me sinto honrado por ter servido na Alemanha, tive o privilégio trabalhar lá por sete anos antes da grande invasão russa.

Eu era muito franco quando a guerra começou. Era um apelo sincero meu. Eu não conseguia entender por que a Alemanha, que se envolveu tanto nas negociações de Minsk e que tentava nos ajudar a resolver a primeira agressão russa com a anexação da Crimeia, em 2014, sabendo de todos os riscos, não nos forneceu armas. Minha convicção pessoal é que isso teria prevenido a atual invasão russa, iniciada em 2022. Tendo esse enorme peso geopolítico e econômico, a Alemanha poderia ter desempenhado outro papel para conter a Rússia ou mesmo evitar a guerra, pelo menos naquele momento. Isso não aconteceu.

No Brasil, a tarefa é diferente porque a conexão, por assim dizer, não é tão forte. Há uma comunidade de imigrantes ucranianos aqui de mais de 130 anos no Paraná, existem mais de 600 mil brasileiros com raízes ucranianas. Mas, basicamente, para a maioria das pessoas aqui, a Ucrânia ainda não parece ter um grande significado por enquanto.

Minha meta aqui é contar a história da guerra. Há muitas coisas que precisam ser faladas. Podemos começar com o sequestro de crianças ucranianas: milhares delas foram levadas à força para a Rússia. Elas são dadas para adoção forçada a famílias russas para serem reeducadas. Isso está acontecendo agora, no século 21. É pura barbaridade. Há prisioneiros de guerra ucranianos sendo torturados.

"Pode-se até permanecer neutro de alguma forma"

Há muitos assuntos práticos que têm significado para nós, não só do ponto de vista político e diplomático. A diplomacia brasileira faz parte das mais fortes do mundo, com grande tradição. O Itamaraty é um templo da diplomacia, com todas as pré-condições para ter orgulho dessa tradição, mas a sociedade, o jornalismo, ativistas políticos, ONGs – todos podem desempenhar um papel para influenciar a liderança russa a libertar crianças, na troca de prisioneiros de guerra.

São questões humanitárias. Pode-se até permanecer neutro de alguma forma. Há muito o que pode ser feito aqui para nos ajudar a aliviar as consequências desta guerra terrível. Há áreas enormes na Ucrânia que estão cheias de minas. O Brasil também poderia ajudar a liberar essas áreas, enviando especialistas que podem ajudar a tornar possível o retorno seguro dos moradores.

Na área de meio ambiente, o Brasil também pode ajudar. Nós estamos falando de crimes de guerra em escala industrial que foram cometidos desde o primeiro dia. Quase ninguém fala sobre os danos ecológicos: florestas destruídas, campos que não podem mais ser cultivados nos próximos anos ou décadas.

Como o Brasil, a Ucrânia é um celeiro mundial importante. Então não é só uma guerra nossa, é uma guerra que tem repercussão em outros países, [é uma] ameaça à segurança alimentar.

Liderança do Brasil e obrigação moral

O Brasil pode nos ajudar a garantir que haverá um julgamento de todos esses crimes humanitários. Todos aqueles que perpetraram crimes de guerra, estupro, tortura, que mataram civis, devem ser julgados. Se isso não for feito, se não recuperarmos as áreas ocupadas, haverá um problema, um mau exemplo ficará para outros países, que poderiam cometer os mesmos crimes de guerra, genocídio, crimes contra a humanidade.

O Brasil tem esta ambição de ter um papel de liderança, que é ancorada em seu tamanho geográfico, demografia, em sua economia, em sua cultura. Acho que é uma obrigação moral estar mais engajado e mostrar esta liderança para que outros possam seguir. 

Em abril, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que a decisão de iniciar a guerra foi tomada tanto pela Rússia quanto pela Ucrânia. Na semana passada, durante seu pronunciamento de abertura na Assembleia Geral das Nações Unidas, ele optou por adotar um tom distante em relação à guerra na Ucrânia, segundo analistas ouvidos pela DW. Ele não mencionou especificamente a Rússia, apenas a guerra na Ucrânia, num contexto de outros conflitos no mundo – segundo os especialistas, não houve ênfase no conflito. Isto pode não ter agradado ao presidente ucraniano Zelenski, que não aplaudiu Lula. Como o senhor vê a posição do Brasil em relação à guerra na Ucrânia? Essa posição é equivocada?

Eu não diria isso. Em sua posição oficial, o Brasil pertence ao grupo, agora composto por 141 países, que, em fevereiro, na Assembleia Geral da ONU, condenou a invasão, condenou a violação das leis internacionais, além de fazer parte da ampla comunidade internacional que tenta nos ajudar a encontrar uma solução pacífica.

Eu estou muito contente e orgulhoso que pudemos organizar este primeiro encontro entre Lula e Zelenski em Nova York na semana passada. Até então, os dois haviam se falado apenas uma vez por telefone em março. Depois disso, houve muitas declarações, muitas emoções, e isso não foi útil. Ninguém se beneficia disso e ninguém conseguia entender o que estava acontecendo – tomando por base a posição oficial do Brasil, segundo a qual o Brasil está a bordo conosco.

Não foi fácil organizar este encontro devido a esse volume de emoções que foram criadas de forma artificial. Eles conversaram cerca de uma hora e dez minutos. Foi uma conversa franca e honesta entre dois líderes muito ambiciosos, sem grandes expectativas, mas com o desejo de entender melhor a posição de cada um. Foi um bom começo. Podemos chamar de grande avanço, depois deste círculo vicioso de concepções e interpretações equivocadas vividas no passado.

"Iniciar negociações agora faria pouco sentido"

Não temos um processo de paz. Nós só temos uma guerra brutal porque Putin não está disposto a negociar. E isso foi um dos tópicos do encontro. Meu presidente tentou explicar para Lula por que iniciar negociações [de paz] agora faria pouco sentido. Não há uma mínima confiança sobre o que o chefe do Kremlin diz ou faz. As promessas que ele faz são palavras vazias.

Nós queremos paz. O Brasil pode ajudar a preparar o terreno para essas negociações. Chegar a um cessar-fogo não é o suficiente para atingir uma paz duradoura. Poderia acontecer o mesmo que ocorreu com o Acordo de Minsk, que não foi implementado, e muitos países negligenciaram as consequências e uma grande guerra se instalou no nosso território.

O senhor então acredita que o Brasil poderia liderar este processo das negociações de paz?

Certamente. Para mim, o Brasil é predestinado a ter um papel mais ativo por diferentes razões. Este tem que ser um processo muito criativo, já que não há um exemplo similar no passado recente. Pela primeira vez, há um membro permanente do Conselho de Segurança da ONU atacando, agredindo, invadindo um país vizinho e com um direito de vetar qualquer decisão política.

É um dos principais problemas da ordem legal atual que está ameaçada pela Rússia e não há um instrumento para forçar o país agressor a parar a invasão. Nosso apelo a todos os amigos e parceiros brasileiros é pensar fora da caixa, pensar de forma criativa. Esse é o maior desafio que a humanidade enfrenta depois da Segunda Guerra, um trauma que continua vivo para nós: na Segunda Guerra, perdemos cerca de 10 milhões de ucranianos.

Como na Segunda Guerra, os civis são os que mais sofrem, porque a Rússia usa táticas sinistras de colocar os civis como alvo, atacando vilas, hospitais, escolas, museus, empresas, portos. No campo de batalha, a Rússia não se mostra como um país com um grande Exército. Parece que, para compensar isso, eles atingem os civis para criar terror, forçar os ucranianos a deixar o país, ou ir para outras regiões mais distantes do conflito.

Atualmente, as estruturas existentes dentro da ONU não oferecem soluções para nos ajudar a parar a guerra por meio diplomático. Estamos pedindo ajuda para pensar nesta solução não só ao governo brasileiro, mas também a think tanks, ONGs, universidades.

O Brasil deveria fornecer armas para a Ucrânia?

Primeiro, é uma decisão de total soberania do governo brasileiro, que tem que cuidar de seus interesses e formular sua própria agenda. Sob o nosso ponto de vista, podemos falar apenas da perspectiva de vítimas, de civis. Gostaria de ressaltar isso novamente, pois uma coisa que não é sempre compreendida aqui é a natureza maligna desta guerra. A propaganda russa diz todo o tempo aqui que se trata de um conflito menor, quase uma guerra civil, que a Rússia está lutando contra o Ocidente, contra a Otan – que seria má – que desejaria invadir o território dela.

E gostaria de repetir esse dado: esta é uma guerra que está sendo travada contra alvos que são 94% civis. Drones, foguetes e todas as outras armas que eles usam são direcionadas para civis em 94% dos casos. Isso muda tudo.

É uma guerra que está sendo travada contra idosos, crianças, mulheres. Se não fosse o sistema de defesa aéreo, fornecido por países como a Alemanha, que abate os drones e foguetes que voam literalmente sobre nossas cabeças na Ucrânia, mais escolas e casas teriam sido destruídas e mais pessoas teriam morrido.

Desse ponto de vista, são um pedido e uma expectativa justos por parte da sociedade ucraniana. O Brasil poderia ter um papel de liderança também aqui na América Latina nesse sentido. Enviar munição para sistemas de defesa como os Gepard, enviados pela Alemanha em 2022, poderiam salvar vidas, não seria participar das hostilidades, ou assumir um lado ou outro do conflito. Eles ajudam os nossos militares a "fechar o céu", deixar as cidades mais seguras.

"Ninguém espera que o Brasil se envolva nas zonas de conflito"

Ninguém espera que o Brasil se envolva nas zonas de conflito, mas que ajude de outras maneiras, como, por exemplo, com a retirada de minas, fornecendo munições para o sistema de defesa aéreo e veículos para transporte de feridos nas cidades bombardeadas. O Brasil também poderia nos ajudar na questão da energia, com geradores e outros equipamentos que poderiam ser enviados às cidades e que ajudariam os ucranianos a sobreviver ao próximo inverno [no Hemisfério Norte], que será uma estação muito difícil.

Por que a Ucrânia até agora praticamente não conseguiu mobilizar um apoio significativo no Sul Global?

É uma pergunta difícil, e ainda não temos uma resposta apropriada. Há muitos fatores que, infelizmente, nós deixamos de lado nestas três décadas depois de termos conquistado novamente a nossa independência.

Nós não investimos muito tempo e atenção em todos os países que agora são chamados de Sul Global, um termo do qual eu não gosto muito porque coloca países muito diferentes numa mesma denominação. Em parte, foi um erro nosso.

Nós estivemos muito concentrados em outras questões importantes, como entrar para a União Europeia e para a Otan. Se fizéssemos parte desta comunidade de defesa, a Ucrânia não teria sido agredida pela Rússia.

Não tínhamos recursos suficientes para prestar atenção a outros países. Agora, essa guerra abriu nossos olhos, tínhamos que ter sido mais ativos na América Latina, Ásia, em outras regiões. Ter uma embaixada não é suficiente. Ao mesmo tempo, os russos têm estado presentes não apenas diplomaticamente, mas com suas missões de negócios e cobertura de mídia.

Agora esta tarefa se tornou, talvez, cem vezes mais difícil. Estamos tentando corrigir isso. Estamos abrindo várias representações diplomáticas na África, mesmo gastando atualmente 60% do nosso PIB com Defesa. Não esperamos resultados rápidos. Precisamos investir pelo menos uma década nesta expansão diplomática, ajudando nossos negócios a estarem mais presentes também nestes países.

Lula disse recentemente que o Brasil não prenderia Vladimir Putin se ele comparecesse à cúpula do G20 no Rio de Janeiro em 2024. Mais tarde, ele disse que caberia às autoridades judiciais brasileiras decidir. O que o senhor acha disso?

Tudo o que eu posso dizer é que Ucrânia gostaria que o presidente Zelenski fosse convidado para a cúpula que reúne todos os grandes líderes das 20 nações mais ricas. É algo que nós já dissemos aos nossos amigos brasileiros.

Nós gostaríamos de nos engajar com a presidência brasileira para que esta presidência do G20 fosse bem-sucedida. E não estamos falando apenas da agenda da cúpula, que inclui combate à pobreza, às desigualdades, aborda questões da Amazônia, mas também de temas como restaurar a ordem mundial. Isso é do nosso interesse.

Se o Sr. Putin estará presente ou não, isso é uma decisão dos nossos amigos brasileiros. Nosso desejo é que, durante a presidência do Brasil, a Ucrânia possa estar entre os participantes, talvez como convidados especiais – já que não somos membros do grupo – para apresentar nossa causa, a de uma guerra que temos que travar por se tratar de uma questão de existência.

A partir desta perspectiva [de manutenção da ordem mundial], penso que seria de interesse do Brasil e de outros países-membros do G20, talvez até para a Rússia, estar presente no Rio para trocar visões. Espero que meu presidente possa visitar o Brasil em 2024 (antes ou durante a cúpula do G20). Seria um sinal de visão ampla sobre essa ordem global e ajudaria o Brasil a nos entender melhor.

Levando em consideração o interesse do Brasil em se tornar membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, que deve ser reformado, o país vai precisar de aliados e amigos no Leste da Europa.

Como o senhor acha que essa guerra vai acabar?

Para mim, como cidadão da Ucrânia, não apenas como diplomata ou como embaixador, pode não haver outra saída do que a Ucrânia libertar todas as áreas que foram ocupadas, incluindo a Crimeia. Ou seja, só quando a Ucrânia tiver restaurado as suas fronteiras internacionalmente reconhecidas a partir de 1991 é que se poderá falar numa paz duradoura.

É importante enfatizar isso porque, como vocês provavelmente sabem e ouviram, e também aqui no Brasil, tem havido algumas discussões sobre possíveis linhas de compromisso, e uma das sugestões é que Crimeia deva ser colocada entre "colchetes" e a Ucrânia apenas tenha que se esforçar para libertar os territórios que foram ocupados depois de fevereiro de 2022.

Se a comunidade internacional permitir que este falso compromisso seja alcançado, isso não garantiria uma paz duradoura. Essa ocupação já dura mais de nove anos. Se a questão da justiça for simplesmente deixada de fora deste futuro acordo de paz – que esperamos que seja universal e global –, qualquer que seja a forma que assuma, isso significaria que dezenas de milhares de crimes de guerra poderiam não ser levados à Justiça e isso não é nada bom para a ordem global.

E a última, mas não menos importante, questão é, obviamente, a questão das garantias futuras. Como prevenir, como garantir, por meios diplomáticos, que a Rússia não iniciará uma nova guerra semelhante ou talvez ainda mais brutal no futuro.