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segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Censura na ditadura e na democracia: Paul Samuelson a Ernesto Lozardo - Elio Gaspari


Paul.Samuelson@edu para Lozardo@gov
Gudin e Campos fingiam discutir meu livro, mas o que eles queriam era bajular o governo, tire o Ipea dessa

Elio Gaspari, colunista do Globo, 23/10/2016

Prezado professor Ernesto Lozardo, ilustre presidente Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Ipea
O senhor me conhece, estudou no meu clássico “Introdução à analise econômica” e viu quando ganhei o Prêmio Nobel. Escrevo-lhe para compartilhar um episódio de 1973 que invadiu minha memória quando li a censura pública que o senhor impôs a dois pesquisadores do Ipea que criticaram os efeitos de uma medida proposta pelo governo que lhe nomeou.
À época, não dei maior importância ao que me aconteceu. Hoje, vejo o papelão em que me meteram. No segundo semestre de 1973 a editora Agir, que publicava meus livros no Brasil, estava traduzindo a nona edição do “Economics”. A certa altura, discutindo o fascismo, mencionei o regime militar brasileiro e seu crescimento de 10% ao ano. Lembrei que todos os regimes semelhantes tinham ido à breca.
O diretor da editora escreveu-me dizendo que não publicaria aquilo. Dias depois, outra carta, desta vez do economista Eugênio Gudin, o grande liberal brasileiro. Passaram algumas semanas e veio a terceira, do economista Roberto Campos. Todos reclamavam do meu texto, da comparação e do tom.
Pareceu-me uma tempestade em copo d’água, pois a minha política era de permitir que os editores expurgassem trechos que pudessem criar problemas com as traduções, sobretudo nos países comunistas. Resultado: quem leu a edição americana aprendeu que o Brasil ia quebrar. Quem leu a tradução da Agir comprou Samuelson e levou Gudin-Campos.
Eu achava que as duas cartas poderiam ser reflexões de intelectuais, dirigidas a um professor. Coisa nenhuma, o que eles queriam era alavancar suas posições junto ao governo do general Ernesto Geisel, que tomaria posse meses depois. Queriam me operar, e operaram.
Digo isso porque toda a correspondência enviada a mim, bem como as minhas respostas a Gudin e Campos, foram parar nas mãos do general Golbery do Couto e Silva, conselheiro de Geisel. A minha decisão foi comemorada pelo dono da editora, o banqueiro Candido Guinle de Paula Machado. Num cartão que enviou a Golbery ele sugeriu: “Se puder, dê um telefonema ao Dr. Gudin, pois ele ficaria satisfeito.”
Encontrei o general Geisel num jantar na casa do compositor Richard Wagner (ele estava com o professor Mário Henrique Simonsen) e perguntei-lhe o que aconteceu. Geisel contou-me que Golbery aceitou a sugestão de Guinle e almoçou a sós com Gudin. Impressionou-me a malquerença do presidente com o patriarca do liberalismo econômico brasileiro. O melhor adjetivo que lhe dá é o de “patife”.
Os autores da Nota Técnica excomungada têm a minha solidariedade e saiba que não a li. Era desnecessário dizer que o texto não refletia a opinião do Ipea. Essa informação sempre está no cabeçalho desse tipo de trabalho. O senhor disse que “a posição institucional do Ipea é favorável à PEC 241”. A “posição institucional” de Gudin, Campos e Paula Machado era favorável ao regime. Direito deles, mas o que a trinca queria era outra coisa. Fiz-me entender?
Converse com o Pedro Malan. Ele foi um servidor do Ipea respeitado pela ditadura e ministro da Fazenda na democracia. É um homem correto e muito bem educado. Pode lhe ajudar.
Cordialmente,
Paul Samuelson.
Elio Gaspari é jornalista

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/opiniao/paulsamuelsonedu-para-lozardogov-20311569#ixzz4O0JSeZpj 

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Regime militar: desencontros Brasil-China - Elio Gaspari

O caso dos nove chineses

Elio Gaspari
O Globo, 2/07/2014

No dia 16 chega ao Brasil o presidente da China, Xi Jinping. Ele governa uma ditadura de vitrine, a segunda economia do mundo, e é o maior parceiro comercial de Pindorama.
Semanas depois, chegará às livrarias O caso dos nove chineses, dos jornalistas Ciça Guedes e Murilo Fiuza de Melo, um magnífico trabalho de pesquisa histórica onde está contada a história de um episódio de vergonhosa marquetagem e histeria do amanhecer da ditadura.
Aconteceu o seguinte:
No dia 3 de abril de 1964, logo depois da deposição do presidente João Goulart, a polícia do governador Carlos Lacerda prendeu no Rio de Janeiro nove cidadãos chineses. Perigosos agentes, comandavam uma rede de 191 pessoas, tinham agulhas envenenadas, bombas teleguiadas e uma lista de personalidades que deveriam ser assassinadas durante a revolução comunista.
Tudo mentira. Dois eram jornalistas da agência estatal e estavam no Brasil desde 1961. Quatro haviam chegado em junho de 1963 para tratar de uma exposição comercial e três vieram em janeiro de 1964, para comprar algodão.
Todos tinham vistos oficiais. Começaram a apanhar no momento da prisão, em suas casas, e depois alguns deles foram espancados pela polícia. Tiveram os apartamentos saqueados e as contas confiscadas (R$ 865 mil em dinheiro de hoje.)
No dia 16, quando Xi Jinping descer em Brasília, completam-se 50 anos dos dias em que os nove chineses estavam trancados em quartéis. Só puderam escrever para as famílias dois meses depois. Só receberam a visita das mulheres (vigiadas por 32 agentes), em agosto.
“O caso dos nove chineses” conta uma história de acovardamento da qual emerge, altaneiro, o advogado Sobral Pinto, que aceitou a defesa dos presos. A Sobral juntaram-se intelectuais como Augusto Frederico Schmidt e jornalistas como Antonio Callado e Carlos Heitor Cony. (Seus destemidos artigos da época, publicados no livro “O ato e o fato”, foram reeditados há pouco.)
Como era tudo mistificação, violência e histeria, em poucos meses o governo ficou com uma batata quente nas mãos. Condenara os chineses a dez anos de prisão, enfrentava uma campanha internacional e não tinha como se explicar. Em fevereiro de 1965, eles foram expulsos e recebidos como heróis em Pequim.
Aí o jogo virou. Desde então, o Império do Meio mostra que tem memória. Não cria caso, mas não esquece. Sempre que surge a ocasião, refere-se ao “contencioso” do episódio. Cinco dos nove estão vivos.
Um deles tornou-se diretor da agência de notícias para a qual trabalhava, outro dirigiu a área de América Latina do Ministério das Relações Exteriores e foi embaixador em Moçambique e Angola. Wang Yaoting chegou a presidente do Conselho para a Promoção do Comércio Internacional. Em 1979, quando o general João Figueiredo visitou a China, ele conversou com um brasileiro:
— Morei um ano no Rio.
— Então o senhor deve conhecer bem o Brasil.
— Conheço muito pouco, porque fiquei aquele ano quase todo preso.
Foram-se os militares, vieram Sarney, Collor, Itamar, Fernando Henrique, Lula e Dilma. Os tempos seriam outros. Talvez, mas até hoje o Império do Meio não recebeu satisfação pelo que sucedeu aos seus cidadãos, nem o dinheiro de volta. Mais: em 1997 (governo Fernando Henrique), um dos jornalistas tentou vir ao Brasil com a mulher, mas não conseguiu visto.

Elio Gaspari é jornalista

segunda-feira, 30 de junho de 2014

Politica externa discreta e diplomacia barulhenta - Elio Gaspari

De R.Guerreiro@org para Dilma@gov
Elio Gaspari
Folha de S. Paulo e O Globo, 30/06/2014

A senhora não lembra de mim, pois ninguém lembra do Ramiro Guerreiro, prova de que fui um bom chanceler

Excelência,
Houve no Itamaraty um embaixador muito inteligente e engraçado, o Araújo Castro. Celebrizou-se pelas piadas com que feria os colegas e fez uma terrível comigo: "O Guerreiro é a única pessoa capaz de dormir durante o próprio discurso". Quando escrevi minhas memórias intitulei-as "Lembranças de um empregado do Itamaraty". Parece que o livro é muito chato. Eu diria que sou monótono.
Escrevo-lhe para dizer que esse funcionário que está hoje na chefia do ministério, o Luiz Alberto Figueiredo, foi um presente que a vida lhe deu. Em 1979, quando assumi o Ministério das Relações Exteriores, ele acabara de sair do Instituto Rio Branco. Era um terceiro-secretário, e foi cuidar de irrelevâncias como meio ambiente.
Outro dia a Corte Suprema dos Estados Unidos recusou-se a apreciar um recurso da Argentina contra uma sentença de um juiz federal que mandava pagar, ao par, aos atuais detentores de títulos caloteados em 2001 que não concordaram com a renegociação feita anos depois. Equivalem a 8% do papelório. A decisão da primeira instância é insana e poderá provocar uma moratória e travar as negociações em futuras e inevitáveis crises de crédito. Tanto é assim que o governo americano advertiu a corte para os riscos resultantes da decisão. Um pedaço da banca e o FMI também pisaram no freio. Ademais, em 1933 os Estados Unidos calotearam a conversibilidade de sua dívida em ouro. Fizeram isso com um voto do Congresso, ratificado na Corte Suprema por maioria de 5 x 4.
Até agora, o Brasil alinhou-se juridicamente com a Argentina, sem barulho. Seu governo fez isso dando voz ao embaixador nas Nações Unidas. O que me levou a escrever-lhe foi a discrição da sua diplomacia. Política externa sem charanga é tudo o que precisamos. A senhora já ouviu falar que em 1983 o presidente Reagan queria invadir o Suriname, estava com tudo pronto e mandou o diretor da CIA a Brasília para pedir apoio? Dissuadimo-lo, ajudamos a resolver a encrenca e não dissemos uma palavra. Imagine a manchete: "Brasil nega a Reagan apoio para invadir o Suriname". E depois: "Reagan cede ao Brasil e não invade Paramaribo".
A senhora imagine que, em 1982, um general megalomaníaco, apreciador de destilados, decidiu invadir as ilhas Malvinas. Nós não podíamos nos meter naquela aventura, mas também não podíamos negar solidariedade à nação amiga. (O Roberto Campos, embaixador em Londres, achava que a primeira-ministra Margaret Thatcher ia amarelar.) Sabíamos que os generais argentinos seriam postos para correr, pois só eram valentes com estudantes amarrados. Tratava-se de tirar a meia sem descalçar o sapato. Conseguimos, porque trabalhamos sem charanga.
A presidente argentina chama os fundos que compraram papéis da velha dívida de "abutres". Por muitos motivos, estamos com ela, mas não precisamos entrar nesse bate-boca. Brigar com a Argentina, só no futebol, se for inevitável.
A senhora conseguiu fazer o certo, sem pirotecnia. O Araújo Castro, incorrigível, chama os especialistas em lances diplomáticos barulhentos de "papagaios de crises". Ele lista todos os nomes. Eu não os menciono.
Respeitosamente, saúdo-a.

Ramiro Saraiva Guerreiro

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Em materia de ofensas, Lula deve ser campeao - Elio Gaspari


O ódio ao PT e o ódio do PT

Elio Gaspari
O Globo, 18/06/2014

Lula tem toda razão. Existe uma campanha de ódio contra o PT. Esqueceu-se de dizer que existe também uma campanha de ódio do PT. Uma expôs-se no insulto à doutora Dilma na abertura da Copa.
Argumente-se que o grito foi típico da descortesia dos estádios. O deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força, influente aliado do candidato Aécio Neves, endossou-o durante um evento do tucanato: “O povo mandou ela para o lugar que tinha que mandar.”
Essa é a campanha de ódio contra o PT. Ela pode ser identificada na generalização das acusações contra seus quadros e, sobretudo, na desqualificação de seus eleitores. Nesse ódio, pessoas chocadas pela proteção que Lula e o partido deram a corruptos misturam-se a demófobos que não gostam de ver “gente diferenciada” nos aeroportos ou matriculada nas universidades públicas graças ao sistema de cotas.
O ódio do PT é outro, velho. Lula diz que nunca se valeu de palavrões para desqualificar presidentes da República. Falso. Numa conversa com jornalistas, chamou o então presidente Itamar Franco de “filho da puta” e nunca pediu desculpas.
O ódio petista expôs-se em situações como a hostilização ao ministro Joaquim Barbosa num bar de Brasília e na proliferação de acusações contra o candidato Aécio Neves na internet. Se a rede for usada como posto de observação, os dois ódios equivalem-se, e pouco há a fazer.
Lula antevê uma campanha eleitoral “violenta”, pois a elite “está conseguindo despertar o ódio de classes”. Manipulação astuciosa, recicla o ódio do PT, transformando-o no ódio ao PT.
Leia a íntegra em O ódio ao PT e o ódio do PT
Elio Gaspari é jornalista.

domingo, 11 de maio de 2014

Eleicoes 2014: Aecio, ou Tancredo Neves 2.0 - Elio Gaspari


Aécio, ou Tancredo Neves 2.0

Elio Gaspari


A indicação da pesquisa Datafolha de que hoje Aécio Neves é o candidato com mais probabilidades de chegar a um eventual segundo turno numa disputa com Dilma Rousseff recomenda que seus adversários estudem a campanha que levou seu avô à Presidência em 1985.
Até agora, Aécio jogou parado. Tudo o que ele precisa é chegar ao segundo turno, sem inimigos de morte e com o máximo possível de acordos. Aécio precisa de votos que há quatro, oito ou 12 anos foram para o PT. Em circunstâncias diferentes, Tancredo precisava chegar a uma eleição direta com o apoio de eleitores da bancada do governo.
Indo para uma eleição direta, Aécio ainda não anunciou um programa substantivo. O avô fez melhor, elegeu-se indiretamente sem anunciar programa algum. Essa mágica foi inteiramente eficaz para o avô, mas é duvidoso que o seja nas condições de hoje. Afinal, só 42% dos entrevistados dizem conhecê-lo, e são exatamente os outros 58% que precisam de motivos concretos para votar nele.

Aécio vem sendo beneficiado pela erosão de Dilma, provocada, entre outros fatores, pelo Lula-volta-Lula-não-volta. Tancredo foi beneficiado pela ambiguidade do presidente João Figueiredo, que alimentou a ideia da própria reeleição e não foi a lugar algum.
Tancredo encarnava o fim de um regime de 20 anos. Aécio quer encarnar o fim de um domínio democrático que pretende durar 16. Com uma diferença: tanto na ditadura, que durou 21 anos, como na República Velha, com seus 36, havia uma real rotação dentro do grupo governante. Com o PT no Planalto jamais houve essa rotatividade.
Rodando o programa Tancredo 2.0, Aécio respondeu a um ataque de Marina Silva (“o PSDB sabe que já tem cheiro de derrota”) com um calmante (“não vou cair na armadilha do PT, que é dividir a oposição”). Até agora, deu certo, pois tudo o que pode dar errado com os adversários, errado dá. Contudo, Lula continua no banco de reservas, com 58% dos entrevistados achando que ele deve ser o candidato do PT.

Elio Gaspari é jornalista.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

No partido dos totalitarios, nada se faz por acaso...

... ou por distração.
Uma matéria antiga, de uma semana atrás, mas é justamente para refrescar a memória sobre quem são os companheiros. 
Nesse antro nada ocorre por acaso. E como na Mafia, a solidariedade entre iguais e mais iguais é de rigor. 
Quanto mais patife, mas fiel servidor, maior a solidariedade tribal. 
Paulo Roberto de Almeida

André Vargas e o PT 2.0

Elio Gaspari, O Globo, 02/04/14 

Quem não se lembra do deputado André Vargas (PT-PR)? Quando o ex-governador gaúcho Olívio Dutra sugeriu que o deputado José Genoino renunciasse ao mandato, o companheiro foi-lhe à jugular:
Quando ele passou pelos problemas da CPI do Jogo do Bicho, teve a compreensão de todo mundo. (...) Ele está sendo pouco compreensivo. Ele já passou por muitos problemas, né?
Falso. Olívio Dutra nunca assinou empréstimos fraudulentos, nunca foi acusado de envolvimento no caso do bicho e jamais foi condenado pela Justiça. Ao contrário, é uma das poucas lembranças da moralidade petista.
Quem não se lembra desse episódio talvez se recorde da cena em que o comissário Vargas, vice-presidente da Câmara, saudou seus companheiros com o punho cerrado, estando ao lado do presidente do Supremo Tribunal Federal. Parecia um Pantera Negra dos anos 60.
Vargas é um representante do PT 2.0. A repórter Andréia Sadi apanhou-o voando para as férias nas asas do doleiro Alberto Youssef, figurinha fácil de inquéritos policiais e poderoso intermediário na Petrobras.
Desde que os jatinhos tornaram-se símbolo de poder e conforto, hierarcas de todos os partidos recorrem a amigos para não voar com a patuleia.
Vargas, contudo, inovou na justificativa. Disse que cometeu uma “imprudência”. Teria sido imprudência se tivesse entrado por engano no avião fretado pelo doleiro, depois de ter sido chamado para embarcar num voo comercial. Não foi imprudência, mas onipotência.
Novo argumento: pediu o jatinho a Youssef porque os voos comerciais estão muito caros. Certo. A escumalha que vai para a rodoviária por esse mesmo motivo merece o desconforto porque não tem doleiro amigo.
O melhor momento do companheiro deu-se quando revelou que conhece Youssef há mais de 20 anos, mas não sabia com quem estava se relacionando. Seria então a única pessoa que não sabe a atividade de um amigo com quem se relaciona há mais de 20 anos.
Youssef fornece jatinhos para amigos poderosos desde 2001. Anos depois, frequentou o noticiário do escândalo do Banestado, passou pela cadeia, refrescou-se colaborando com o Ministério Público, mas não se livrou de uma condenação.
Numa troca de mensagens com Youssef (cuja atividade comercial Vargas desconhecia), o companheiro tratou de um interesse da empresa Labogen junto ao comissário Carlos Gadelha, do Ministério da Saúde. Por coincidência, essa pequena empresa teria sido usada pelo doleiro para remeter US$ 37 milhões ao exterior.
O amigo de André Vargas não é um doleiro petista, mas um operador suprapartidário. Já cedeu jatinhos para gente do PFL e tem relações no PP, pelo menos com o ex-deputado José Janene, um dos ases do mensalão.
A presença de Youssef em negócios da Petrobras, cobrando pedágios a fornecedores, é um sinal de que mudou de patamar. Ele tratava com o diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, a quem presenteou com uma Range Rover. Há um enorme cheiro de outro velho escândalo no ar. Quando por nada, pelas coincidências.
Em 2005 descobriu-se que outro fornecedor da Petrobras presenteara Silvio Pereira, secretário-geral do PT, com uma Land Rover. André Vargas nunca diria uma palavra contra Silvinho, pois sabe quão compreensivo ele foi.

Elio Gaspari é jornalista.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Eleicoes 2014: a volta de quem nunca antes tinha ido... - Elio Gaspari

Vem, Lula

Elio Gaspari
O Globo, 9/04/2014
Quem viu a final do vôlei masculino das Olimpíadas de Londres há de se lembrar. O Brasil ganhara dois sets e faltava só fechar um ponto para levar o ouro, quando o técnico russo botou Dmitry Muserskiy (2,1 metros) na quadra. Resultado: a Rússia fez o ponto, levou os dois sets seguintes e ficou com o ouro. Se o PT achar que a reeleição de Dilma corre perigo, deixará Lula no banco para agradar a seus adversários?
Tudo ficaria melhor se Lula saísse como candidato a presidente. Por cinco razões:
1) Porque é maior de idade e está no exercício de seus direitos políticos.
2) Porque o “Volta Lula” vem enfraquecendo o governo do poste que ele ajudou a botar no Planalto.
3) Porque uma parte do desgaste que está corroendo a doutora Dilma é dele e foi-lhe jogado no colo. Afinal, o mensalão e as petrorroubalheiras nasceram na sua administração.
4) Porque a outra parte do desgaste da doutora está associada ao mito da gerentona, criado por ele. Afinal, é a “Mãe do PAC”.
5) Porque a transformação do PT num aparelho arrecadador de fundos teve o seu permanente beneplácito, tanto durante os oito anos em que esteve na Presidência, como depois. O deputado André Vargas não é um ponto fora da curva, mas uma luzinha dentro da estrela vermelha.
As urnas decidirão se o PT deve receber um novo mandato presidencial. Quatro anos de Dilma mostraram que o poder é mais do partido do que do ocupante do Planalto. Isso não deriva de qualquer malignidade intrínseca do comissariado, mas do fato que ele é o único partido organizado do país. Se os outros não se organizaram e o máximo que fazem é combinar jantares, o problema é deles.
Vitorioso, o PT terá 16 anos ininterruptos de poder. Isso jamais aconteceu na História brasileira e não fará diferença se esse mandato for exercido por Lula ou Dilma. Pelo contrário, para o bem ou para o mal, ele representa melhor a estrela que fundou do que ela, uma convertida tardia.
A entrada de Lula na disputa daria maior clareza à escolha. Se ele é um político prestigiado, com 37% dos entrevistados pelo Datafolha dispostos a votar em quem tiver seu apoio, torcer para que fique no banco de reservas é uma ilusão.
Chegou-se a abril e os dois candidatos da oposição produziram apenas listas de celebridades e palavrório. Sabe-se mais das diferenças entre os prováveis candidatos republicanos para a eleição americana de 2016 do que das plataformas de Aécio Neves e Eduardo Campos.
Há pouco a Câmara aprovou uma medida provisória com centenas de contrabandos. Entre eles, mais uma estia para sonegadores de impostos e um mimo para os planos de saúde que não cumprem os contratos que vendem aos clientes. Isso só foi conseguido por um acordo de lideranças parlamentares, com o apoio das bancadas oposicionistas.
Nas três últimas eleições presidenciais os candidatos tucanos escondiam Fernando Henrique Cardoso, sem explicar por quê. Agora, Aécio Neves e Eduardo Campos escondem que fazem oposição a Lula. Talvez acreditem que só devem falar claro às vésperas da eleição, seguindo protocolos estabelecidos pelos marqueteiros. Nas eleições anteriores fizeram isso e, derrotados, procuraram culpar essa nova modalidade de astrólogos.

Elio Gaspari é jornalista.


terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Golpe de 1964 e ditadura militar: 50 anos - comeca o maniqueismo (Cafe Historia)

Precisamos estar preparados para a nova onda de maniqueísmo que vai assolar o país: os 50 anos do golpe de 1964 (em 31 de março ou 1ro de Abril, como preferirem) e o julgamento peremptório da maior parte dos historiadores no sentido mais convergente com a historiografia corrente, ou seja, de que o golpe foi uma armação da direita brasileira -- ai confundidos capitalistas, ou burguesia nacional, latifundiários, militares e, sobretudo, os perversos imperialistas americanos -- e do Império, para derrocar um governo democrático empenhado em reformas.
Creio que vou escrever algo a respeito, para tentar restabelecer a balança...
Paulo Roberto de Almeida

Do site Café História, 7/01/2014

MURAL DO HISTORIADOR

Ditadura Militar 50 Anos - Parte I
Durante os últimos trinta anos, o jornalista Elio Gaspari reuniu documentos que serviram de base para a edição e a reedição de seus livros sobre o governo militar no Brasil. Entre bilhetes, despachos, discursos, manuscritos, diários de conversas travadas pela cúpula e telegramas do governo americano, seu arquivo pessoal reúne mais de 15 mil itens sobre a ditadura. São registros que se iniciam nos anos anteriores ao golpe de 1964 e seguem até os estertores do regime. Entre eles, há 10 mil provenientes do arquivo do general Golbery do Couto e Silva, como suas apreciações e análises conjunturais redigidas em três momentos distintos, de 1960 a 1968. A partir de fevereiro de 2014 o seu site “Arquivos da Ditadura” passará a disponibilizar uma seleção desse rico material, parte dela presente também na versão em e-book dos quatro volumes da série sobre os “anos de chumbo”. É a primeira vez que esses documentos ficam disponíveis para consulta na internet. Confira aqui.

Ditadura Militar 50 Anos - Parte II
O jornal Folha de S.Paulo inaugurou uma página especial em seu site dedicada exclusivamente aos 50 anos do Golpe Civil-Militar de 1964, o qual jogou o Brasil em uma ditadura que levaria mais de vinte anos. O site foca nos momentos e nas circunstâncias que levaram à deposição do presidente João Goulart. Em destaque: os 53 militares, políticos e civis mais importantes no contexto do golpe militar; os dez momentos em que as Forças Armadas atuaram na política antes do golpe de 1964; uma comparação do contexto econômico, demográfico e cultural de 1964 com os dias atuais. No site, é possível ver também uma cronologia do golpe, hora a hora. Para ver o site, que já se encontra no ar, clique aqui.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

O capitalismo estatal dos companheiros submergiu: adivinha quem paga o prejuizo?

Você caro leitor, eu também, todos nós, pois o BNDES se apropria de parte do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, que seria em teoria nosso (apenas em teoria). Você também paga pela dívida pública que o governo contrai para repassar recursos ao BNDES (280 bilhões nos últimos 3 anos), em juros e principal...
Ou seja, os companheiros afundam o Brasil com seus projetos chineses, e nós pagamos a conta...
Paulo Roberto de Almeida

As campeãs nacionais de desastres
ELIO GASPARI
Folha de S.Paulo, 6/1-/2013

O sonho petista de criar um bloco de empresas financiadas pelo BNDES reeditou um pesadelo
Em 2007, o BNDES ressuscitou o zumbi da anabolização de empresários amigos e anunciou que o governo queria criar um núcleo de "campeões nacionais", inserindo-o no mundo das grandes empresas mundiais. Nesse lance, botou perto de R$ 20 bilhões em empresas companheiras.
Numa mesma semana, dois fatos mostraram o tamanho do fracasso dessa política. O conglomerado da OGX, produção megalomaníaca de Eike Batista na qual o BNDES financiou R$ 10,4 bilhões, está no chão. A "supertele" Oi, produto da fusão pra lá de esquisita e paternal da Telemar com a Brasil Telecom, tornou-se uma campeã nacional portuguesa, fundindo-se com a Portugal Telecom. Em 2010, o BNDES e os fundos de pensão tinham 49% da empresa. A nova "supertele" nasce com uma dívida de R$ 45,6 bilhões. Novamente, receberá recursos do BNDES e dos fundos companheiros. O ministro Paulo Bernardo, das Comunicações, garante que essa fusão é uma "estratégia". Vá lá, desde que ele acredite que o Unibanco fundiu-se com o Itaú.
A carteira de ações do BNDESPar caiu de R$ 89,7 bilhões em 2011 para R$ 72,8 bilhões em 2012. A campeã do ramo de laticínios chamava-se LBR e quebrou. A Fibria, resultante da fusão da Aracruz (chumbada) com a Votorantim, atolou. O frigorifico Marfrig tomou R$ 3,6 bilhões no banco e acabou comido pela JBS, cujos controladores movem-se num perigoso mundo onde convivem a finança internacional e a política goiana. Já o Bertin teve que ser vendido logo depois de o BNDES entrar na empresa. (Até 2013, esse setor recebeu a maior parte dos investimentos do BNDES.)
O BNDES anunciou há meses que abandonou a estratégia da criação dos campeões nacionais. Falta só explicar quanto custou, quanto custará e que forças alavancaram os afortunados. Essa tarefa será fácil para alguns petistas e para o doutor Luciano Coutinho. Eles conhecem a história do banco.

(Folha de São Paulo e O Globo/06Out13)
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Materia da Veja.com, sobre o assunto:

A chamada política das ‘campeãs nacionais’, criada há seis anos pelo governo Lula e executada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), encontra na Oi seu mais novo exemplo de fracasso. A fusão da operadora brasileira de telefonia com a Portugal Telecom, encarada pelo mercado como ‘venda’, deve se concretizar nos próximos meses e criar um gigante com receita da ordem de 40 bilhões de reais. Os investidores estão otimistas com a fusão, afinal, a entrada do capital português poderá ajudar a empresa a investir em infraestrutura e conquistar maior participação de mercado em telefonia móvel e em banda larga. “Para a Oi, é benéfico porque a empresa sai de uma situação de dívida altíssima para uma empresa com uma estrutura de capital bem melhor, além de fazer parte, agora, de um grupo internacional”, diz Pedro Galdi, da SLW Corretora. Contudo, a venda enterra, mais uma vez, o discurso do chamado “capitalismo de estado”, em que empresas são ‘turbinadas’ com dinheiro público para se tornarem multinacionais.

Essa política previa que o estado investisse em alguns segmentos do setor privado por meio do BNDES (comprando participação ou emprestando dinheiro com taxas de juros subsidiadas pelo Tesouro), com o objetivo de criar empresas brasileiras fortes para competir no mercado global. O banco injetou cerca de 20 bilhões de reais em companhias como JBS, Marfrig, Lácteos Brasil (LBR), Oi e Fibria. O resultado, seis anos depois, não é nada animador: LBR pediu recuperação judicial, Marfrig teve de vender a Seara para a JBS para reduzir seu endividamento, enquanto a empresa dos irmãos Wesley e Joesley Batista, apesar de em melhor saúde financeira que a concorrente, também sofre para reduzir as dívidas adquiridas ao longo de seu processo de expansão.

A Oi é um caso de fracasso à parte não só porque envolveu a participação maciça do BNDES. Sua própria constituição foi um exemplo de intervencionismo — e a venda para os portugueses evidencia o plano equivocado. Em 2008, o governo mobilizou todos os seus esforços sob o comando do próprio Lula, da então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e do ministro das Comunicações, Hélio Costa, para mudar a legislação e permitir que a Oi comprasse a Brasil Telecom.

O negócio, visto como prejudicial para os acionistas minoritários porque diluía sua participação e porque eles tampouco concordavam com o preço (5,8 bilhões de reais), foi viabilizado depois de um lobby ostensivo que contou até mesmo com um decreto do presidente mudando as regras do setor. Segundo a legislação da época, um mesmo controlador não podia ser dono de duas concessionárias de telefonia fixa. O problema foi resolvido por meio de um decreto sem que o Congresso sequer participasse da decisão.

O argumento do governo era de que o país não podia deixar todas as suas empresas de telecomunicações nas “mãos de estrangeiros”. E, como a Brasil Telecom vinha sendo assediada por investidores de fora, como o bilionário egípcio Naguib Sawiris, dono da Orascom, houve uma movimentação sem precedentes para que ela fosse adquirida pela Oi. “O discurso era claramente de que o Brasil tinha de preservar a soberania e não deixar um ativo tão importante nas mãos de um estrangeiro”, afirma um executivo que participou da negociação da Brasil Telecom, em condição de anonimato. O BNDES entrou na negociação financiando 2,6 bilhões de reais, enquanto 4,3 bilhões de reais foram aportados pelo Banco do Brasil. Os fundos de pensão Previ, Petros e Funcef, que já detinham participação na Brasil Telecom, passaram a ser donos de 34% das ações da nova empresa.

A história começou a mudar quando, em 2010, numa negociação entre três partes, a Portugal Telecom vendeu sua participação na Vivo para a Telefonica e entrou na Oi. “Quando isso aconteceu, todos esperavam que os portugueses assumissem o controle cedo ou tarde. Era apenas uma questão de tempo”, afirma outra fonte próxima da empresa, que preferiu não ter seu nome citado. Assim, o anúncio da fusão apenas costura o desfecho de uma estratégia que começou errada e, no lugar de criar uma grande multinacional, deu origem a uma tele ineficiente financiada pelo capital do BNDES. “A Oi receberá um novo aporte de 7 bilhões que ajudará a companhia a aumentar investimento e reduzir dívida. Contudo, o aporte não resolve todos os problemas da empresa. Ela precisará montar um plano para reduzi-la”, afirma Arthur Barrionuevo Filho, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

O negócio entre Oi e Portugal Telecom ainda não foi assinado, mas foi chancelado pelo governo e pelo BNDES. Em um ‘mundo perfeito’, essa chancela poderia ser compreendida como um reconhecimento, por parte do PT, de que a estratégia de interferir de forma tão contundente no setor privado não poderia render boa coisa. Mas a realidade é bem outra. O governo continua valendo-se do discurso da soberania, mas com outro objetivo — até mais danoso. Ao tentar forçar empresas estrangeiras de tecnologia, por meio do marco civil, a montar seus datacenters no Brasil, numa ingênua tentativa de ‘espantar’ a espionagem internacional, ele mostra ainda não ter aprendido com certos erros do passado.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

A diplomacia estudantil, segundo Elio Gaspari

Elio Gaspari
 O Globo, 28.08.2013

A doutora Dilma tem dois chanceleres, um no Planalto e outro no Itamaraty. Apesar disso, restou ao Brasil uma diplomacia trapalhona, cenográfica e inepta. A desova do senador Roger Pinto no território brasileiro transformou uma conduta inamistosa do governo da Bolívia numa estudantada brasileira. Custou o lugar ao chanceler Antonio Patriota. Ele vai para Nova York, mas o comissário Luis Inácio Adams continua advogado-geral da União.
O doutor sustentou que, caso um médico cubano peça asilo territorial no Brasil, será devolvido a Cuba. Agradando ao aparelho dos irmãos Castro, ofendeu a História do país e o Direito.
No ano passado o Brasil meteu-se noutra estudantada, expulsou o Paraguai do Mercosul e agora corteja seu governo. É uma diplomacia de palavrório e negócios. Patriota foi um detalhe.
A ideia segundo a qual o encarregado de negócios do Brasil em La Paz contrabandeou o senador até a fronteira com o Brasil porque se apiedou de seu estado emocional é pueril. Se os embaixadores começassem a ser orientados pelos seus sentimentos, seria melhor fechar a Casa.
A boa norma determina que um governo dê o salvo-conduto a um asilado em algumas semanas. No exagero, alguns meses. O presidente Evo Morales não quis fazer isso. Direito dele.
O ex-presidente peruano Haya de la Torre ralou cinco anos numa sala da embaixada da Colômbia em Lima. O cardeal Jozef Mindszenty, outros quinze na embaixada dos Estados Unidos (que não são signatários das convenções de asilo diplomático) na Hungria.
Se alguém pensou que combinou a fuga com Evo Morales, fez papel de bobo e transformou o algoz em vítima. Transferiu o vexame para o diplomata Eduardo Saboia, deixando-o numa posição de franco-atirador.
Coisa parecida, fez no mundo dos negócios, quando transferiu para o embaixador do Brasil em Cingapura uma transação meio girafa que favorecia os interesses do empresário Eike Batista.
A maneira como a diplomacia de Lula e da doutora lidou com o instituto do asilo revela desrespeito histórico com um mecanismo que protegeu centenas de brasileiros perseguidos por motivos políticos. Ele ampara gregos e troianos.
Em 1964, brasileiros asilaram-se na embaixada boliviana. Anos depois oficiais golpistas bolivianos asilaram-se na embaixada brasileira e o governo esquerdista do general Juan José Torres deu-lhes salvo-condutos em 37 dias.
Carlos Lacerda asilou-se por alguns dias na embaixada de Cuba e João Goulart pediu asilo territorial ao Uruguai. Em poucos meses, o governo do marechal Castello Branco concedeu salvo-condutos a todos os asilados que estavam em embaixadas estrangeiras.
Já o do general Médici, vergonhosamente, fechou as portas de sua representação em Santiago nos dias seguintes ao golpe do general Pinochet e dezenas de brasileiros foram obrigados a buscar a proteção de outras bandeiras.
Contudo, nem mesmo Médici deportou estrangeiros para países onde poderiam ser constrangidos. Isso ocorreu durante a gestão do comissário Tarso Genro no Ministério da Justiça, com dois boxeadores cubanos que, posteriormente, voltaram a fugir da Ilha.
O direito de asilo é uma linda tradição. Não se deve avacalhá-lo.

Elio Gaspari é jornalista.

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Sobre o perdao das dividas de paises africanos - Elio Gaspari

Raras vezes concordo com esse jornalista, que geralmemte é superficial e adora fazer trocadilhos sem graça. Desta vez parece que acertou...
Paulo Roberto de Almeida

Dilma, a mãe dos cleptocratas
Elio Gaspari
O Globo, 29/05/2013

Na foto: Denis Sassou Nguesso, presidente do Congo-Brazzaville.

Com a prodigalidade de uma imperatriz, a doutora Dilma anunciou em Adis Abeba que perdoou as dívidas de doze países africanos com o Brasil. Coisa de US$ 900 milhões. O Congo-Brazzaville ficará livre de um espeto de US$ 352 milhões.

Quem lê a palavra “perdão” associada a um país africano pode pensar num gesto altruísta, em proveito de crianças como Denis, que nasceu na pobre província de Oyo, num país assolado por conflitos durante os quais quatro presidentes foram depostos e um assassinado, cuja taxa de matrículas de crianças declinou de 79% em 1991 para 44% em 2005. No Congo Brazzaville 70% da população vivem com menos de US$ 1 por dia.

Lenda. Denis Sassou Nguesso nasceu na pobre província de Oyo, mas se deu bem na vida. Foi militar, socialista e estatizante. Esteve no poder de 1979 a 1992, voltou em 1997 e lá permanece, como um autocrata bilionário privatista. Tem 16 imóveis em Paris, filhos riquíssimos e seu país está entre os mais corruptos do mundo.

Em tese, o perdão da doutora destina-se a alavancar interesses empresariais brasileiros. Todas as dívidas caloteadas envolveram créditos de bancos oficiais concedidos exatamente com esse argumento. As relações promíscuas do Planalto com a banca pública, exportadores e empreiteiras têm uma história de fracassos.

O namoro com Saddam Hussein custou as pernas à Mendes Junior e o campo de Majnoon à Petrobras. Em 2010 o soba da Guiné Equatorial, visitado por Lula durante seu mandarinato, negociava a compra de um tríplex de dois mil metros quadrados na Avenida Vieira Souto. Coisa de US$ 10 milhões.

Do tamanho de Alagoas, essa Guiné tem a maior renda per capita da África e um dos piores índices de desenvolvimento do mundo.

O repórter José Casado chamou a atenção para uma coincidência: em 2007, quando a doutora Dilma era chefe da Casa Civil, o governo anunciou o perdão de uma dívida de US$ 932 milhões.

Se o anúncio de Adis Abeba foi verdadeiro, em seis anos a Viúva morreu em US$ 1,8 bilhão. Se foi marquetagem, bobo é quem acredita nele.

O Brasil tornou-se um grande fornecedor de bens e serviços para países africanos e a Petrobras tem bons negócios na região.

As empreiteiras nacionais têm obras em Angola e na Líbia. Lá, tiveram uma dor de cabeça quando uma revolta derrubou e matou Muamar Kadafi, um “amigo, irmão e líder”, segundo Lula. Acolitado por empresários, seu filho expôs em São Paulo uma dezena de quadros medonhos.

Em Luanda os negócios vão bem, obrigado, e a filha do presidente José Eduardo Santos é hoje a mulher mais rica da África, com um cofrinho de US$ 2 bilhões. Ela tem 39 anos e ele está no poder há 33.

Se o Brasil não fizer negócios com os sobas, os chineses farão, assim como os americanos e europeus os fizeram.

A caixinha de Kadafi para universidades inglesas e americanas, assim como para a campanha do presidente francês Nicolas Sarkozy, está aí para provar isso. Contudo, aos poucos a comunidade internacional (noves fora a China) procura estabelecer um padrão de moralidade nos negócios com regimes ditatoriais corruptos.

A doutora diz que “o engajamento com a África tem um sentido estratégico”. Antes tivesse. O que há é oportunismo, do mesmo tipo que ligava o Brasil ao colonialismo português ou aos delírios de Saddam Hussein e do “irmão” líbio.

Elio Gaspari é jornalista.

segunda-feira, 18 de março de 2013

Ah, essa boa vida do capitalismo promiscuo...

Sempre se deve desconfiar de capitalistas que sobem muito rápido, que figuram nas primeiras colunas das fortunas mundiais e que são exemplos de sucesso...
Geralmente, eles já carregaram ministros em seus jatinhos, lhes deram presentes irrecusáveis e quem sabe até são recebidos em outros lugares que não os gabinetes oficiais?
Algum dia, alguém fica sabendo...
Paulo Roberto de Almeida

Uma trapalhada em Cingapura
Élio Gaspari, 17/03/2013

Está sobre a mesa do chanceler Antonio Patriota uma daquelas encrencas que caem nas costas dos diplomatas e acabam em fritura quando eles ouvem os poderosos do momento. O senador Ricardo Ferraço denunciou que o embaixador do Brasil em Cingapura, Luís Fernando Serra, procurou a direção da empresa Jurong para que ela transferisse seu estaleiro do município capixaba de Aracruz para o Porto do Açu, no norte do Rio de Janeiro. Esse empreendimento pertence ao empresário Eike Batista, que há pouco se associou ao banqueiro André Esteves, do BTG Pactual. A gestão de Cingapura foi confirmada pelos diretores da Jurong no Brasil.
Como se fosse uma brincadeira de cubos, um estaleiro que está com 15% de suas obras feitas, com investimentos previstos para R$ 500 milhões e encomendas assinadas, seria transferido total ou parcialmente para outro lugar. No fundo, trata-se de repassar as encomendas e de absorver um concorrente. Dificilmente uma ideia dessas sairia da cabeça do embaixador. Segundo o senador Ferraço, num contato que teve com Nery De Rossi, secretário do Desenvolvimento do governo capixaba, o diplomata informou que a gestão foi solicitada pelos ministros Guido Mantega, da Fazenda, e Fernando Pimentel, do Desenvolvimento. Os dois negaram que tenham patrocinado a proposta.
Se os ministros pediram a gestão, deveriam tê-lo feito formalmente. Nesse caso, estaria documentada. O que levaria um diplomata lotado em Cingapura a sugerir a transferência de um empreendimento para a carteira de interesses de Batista e Esteves? Não é da tradição do Itamaraty esse tipo de ligeireza. Pelo contrário, em 1980 o embaixador do Brasil no Chile, Raul de Vincenzi, provocou uma situação de barata-voa no Planalto quando um general muy amigo de Augusto Pinochet disse-lhe que a transação de uma hidrelétrica já tinha sido acertada em escalões superiores brasileiros. Quando De Vincenzi narrou o encontro num telegrama oficial e pediu instruções, os hierarcas disseram que nada tinham a ver com a história.
Ricardo Ferraço preside a Comissão de Relações Exteriores do Senado e pediu formalmente a Patriota que explique a história. A ver.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Trapalhadas diplomaticas dos aprendizes de feiticeiros - Elio Gaspari

Ressalvo desde já um elemento essencial dessa brincadeira de estudantes: o que está em causa não é exatamente a diplomacia brasileira, ou o Itamaraty, e sim os amadores que se metem a "traçar os rumos" da política externa brasileira na região. Eles não fazem diplomacia, nunca souberam fazer, e dificilmente vão aprender; fazem política partidária, e da pior espécie: aquela vinculada aos interesses espúrios dessa patota esclerosada do Foro de S.Paulo, que ainda pretende construir não se sabe qual via alternativa à democracia de mercado, ou à dominação da burguesia e do capitalismo. Esse pessoal é muito primário, e sectário, o que aliás rima, mas não tem graça nenhuma...
Paulo Roberto de Almeida 



A leviana diplomacia do espetáculo
Elio Gaspari
Folha de S. Paulo e O Globo, 27/06/2012

A patrulha internacional que atacou Paraguai é impertinente e só serve aos interesses da democracia chavista.
Poucas vezes a diplomacia brasileira meteu-se numa estudantada semelhante à truculenta intervenção nos assuntos internos do Paraguai. O presidente Fernando Lugo foi impedido por 39 votos a 4, num ato soberano do Senado.
Nenhum soldado foi à rua, nenhuma linha de noticiário foi censurada, o ex-bispo promíscuo aceitou o resultado, continua vivendo na sua casa de Assunção e foi substituído pelo vice-presidente, seu companheiro de chapa.
Nada a ver com o golpe hondurenho de 2009, durante o qual o presidente Zelaya foi embarcado para o exílio no meio da noite.
Quando começou a crise que levou ao impedimento de Lugo, a diplomacia de eventos da doutora Dilma estava ocupada com a cenografia da Rio+20.
Pode-se supor que a embaixada brasileira em Assunção houvesse alertado Brasília para a gravidade da crise, mas foi a inquietação da presidente argentina Cristina Kirchner que mobilizou o Brasil.
A doutora achou conveniente mobilizar os chanceleres da Unasul, uma entidade ectoplásmica, filha da fantasia do multilateralismo que encanta o chanceler Antonio Patriota.
As relações do Brasil com o Paraguai não podem ser regidas por critérios multilaterais. Foi no mano a mano que o presidente Fernando Henrique Cardoso impediu um golpe contra o presidente Juan Carlos Wasmosy em 1996. Fez isso sem espetacularização da crise. A decisão de excluir o Paraguai da reunião do Mercosul é prepotente e inútil. Quando se vê que o presidente Hugo Chávez, da Venezuela, cortou o fornecimento de petróleo ao Paraguai e que a Argentina foi além nas suas sanções, percebe-se quem está a reboque de quem. Multilateralismo no qual cada um faz o que quer é novidade. Existe uma coisa chamada Mercosul, banem o Paraguai, mas querem incluir nele a Venezuela, que não está na região e muito menos é exemplo de democracia.
Baniu-se o Paraguai porque Lugo foi submetido a um rito sumário. O impedimento seguiu o rito constitucional. Ao novo governo paraguaio não foi dada nem sequer a palavra na reunião que decidiu o banimento.
Lugo aceitou a decisão do Congresso e agora diz que liderará uma oposição baseada na mobilização dos movimentos sociais. Direito dele, mas se o Brasil se associa a esse tipo de política, transforma suas relações diplomáticas numa espécie de Cúpula dos Povos. Vai todo mundo para o aterro do Flamengo, organiza-se um grande evento, não dá em nada, mas reconheça-se que se fez um bonito espetáculo.
O multilateralismo da diplomacia da doutora Dilma é uma perigosa parolagem. Quando ela se aborreceu, com razão, porque um burocrata da Organização dos Estados Americanos condenou as obras da hidrelétrica de Belo Monte, simplesmente retirou do foro o embaixador brasileiro. A OEA é uma irrelevância, mas para quem gosta de multilateralismo, merece respeito.
A diplomacia brasileira teve um ataque de nervos na bacia do Prata. O multilateralismo que instrui a estudantada em defesa de Lugo é típico de uma política externa biruta. O chanceler Antonio Patriota poderia ter se reunido com o então vice-presidente paraguaio Federico Franco 20 vezes, mas se a Argentina queria tomar medidas mais duras, ele não deveria ter ido para uma reunião conjunta, arriscando-se ao papel de adorno.

domingo, 15 de maio de 2011

PCdoB: Partido Criminoso do Brasil? asi es, si les parece...

Os partidos comunistas, historicamente, estiveram associados às piores ditaduras e regimes totalitários do mundo, desde Átila e seus bárbaros, desde Gengis Khan, superando inclusive Hitler e seu nefando holocausto em número de mortos.
De fato, os totalitarismos comunistas ao redor do mundo, com destaque para a finada União Soviética e a ainda existente República Popular da China foram (ainda são, historicamente) responsáveis por dezenas de milhões de mortos (atenção, eu disse DEZENAS DE MILHÕES), entre Gulag, mortes matadas, fomes endêmicas ou epidêmicas, criminosamente induzidas, guerras e devastações diversas.
O PCdoB separou-se, em 1961, do velho Partidão, porque queria seguir a linha chinesa, mais radical, anti-imperialista e revolucionária do que os velhos aparatchiks do Partido Comunista de afiliação soviética, mais acomodados no reformismo reacionário. O PCdoB tentou uma guerrilha maoista no Araguaia, foi massacrado pelos militares e se reciclou no oportunismo político.

Agora virou barrica de aluguel, ou partido oportunista, que empresta sua sigla a quem quiser, desde que traga votos (e de preferência cargos e dinheiro) para o partido.
Se acostumaram ao capitalismo e se contentam em roubar o Estado, ou seja, os cidadãos, todos nós.
Sua mensagem socialista é patética, e enganam alguns estudantes durante certo tempo.
Os honestos e conscientes pulam fora, quando descobrem a fraude e a mentira.
Os oportunistas ficam, em troca de uma boquinha.
Partido Criminoso do Brasil? Pode ser: abrigando bicheiros e criminosos da escória do Rio merece o título...
Paulo Roberto de Almeida

SAMBA POLÍTICO
O cantor Neguinho da Beija-Flor, puxador de samba da escola, deverá se filiar ao PC do B. No passo seguinte, é provável que seja candidato a prefeito de Nova Iguaçu.
Se isso acontecer e ele for eleito, a família Sessin/Abraão dominará cerca de 1 milhão de habitantes da Baixada Fluminense. Ela já tem a prefeitura de Nilópolis, com Simão Sessin, mais uma cadeira na Câmara e outra na Assembleia. Tudo isso e mais a presidência de honra da Beija-Flor, com o patriarca Anisio Abraão. A escola acumula 12 títulos de campeã do Carnaval, e ele, duas passagens pela cadeia.
Elio Gaspari
Coluna na Folha de S.Paulo, 15/05/2011

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Carro eletrico do (ou no) Brasil: ascensao e queda (antes de ser lancado) de uma ideia...

Raramente concordo com uma linha sequer do que diz "esse" jornalista (com perdão pela discriminação). Eu o acho inutilmente rebarbativo, ridiculamente heterodoxo -- é capaz de usar uma frase de efeito apenas para fazer efeito, sem querer dizer absolutamente nada -- e geralmente se engaja em considerações literárias e julgamentos subjetivos que poucas vezes têm alguma relação com o jornalismo (com os exercícios poéticos, talvez).
Ele também se acha arrogantemente acima do bem e do mal, e se permite julgar governos inteiros apenas por uma medida mal implementada, por um deslize involuntário.
Enfim, feitas minhas observações iniciais, e sem querer dizer que concordo com ele, permito-me transcrever seu artigo sobre o malfadado lançamento (abatido previamente) do futuro, hipotético, eventual, possível, duvidoso carro elétrico brasileiro.
Não sei os motivos do aborto (palavra feia), mas fica a exposição do problema (que certamente terá desdobramentos a partir de agora).
Jornalistas investigativos deveriam cumprir o seu papel, em lugar de ficar comentando o que não sabem...
Paulo Roberto de Almeida

O carro elétrico entre a tanga e a tunga
Elio Gaspari
Folha de S. Paulo, 9/06/2010

Nosso Guia aderiu a um ceticismo em que se misturam ignorância, superstição e medo.

Um vexame. Na semana passada um grupo de empresários estava reunido na antessala do ministro Guido Mantega para assistir ao anúncio das medidas do governo para estimular produção, consumo e pesquisa de carros elétricos no Brasil. Uma divergência com o comissariado do Desenvolvimento cancelou a cerimônia.
Logo depois, Nosso Guia deu sua aula: É carro elétrico pra cá, carro elétrico pra lá, mas não se sabe ainda se alguém vai produzir em grande escala. O carro elétrico não é um zepelim. Ele será produzido em grande escala. O que não se sabe é a partir de quando, mas o Nissan Leaf já está aceitando reservas nos iPhones 4, ao preço de US$ 32.800 sem rebates tributários, ou US$ 25.300 líquidos.
O bilionário Warren Buffett ensina que, diante de uma nova tecnologia, o bom negócio não é investir na novidade, mas fugir da velharia. No início do século 20, surgiram 2.000 fábricas de automóveis nos Estados Unidos e sobraram duas. O negócio não era entrar nesse mercado, mas sair do comércio de cavalos. O ceticismo e a inércia de Lula levam água para a defesa da produção de carruagens.
A reunião do carro elétrico foi cancelada por conta da bagunça de Brasília e porque o assunto está envolto numa mistura de superstição (não vai pegar), medo (daqui a alguns anos corre-se o risco de uma invasão de veículos importados, sobretudo chineses) e ignorância (o carro elétrico mata o mercado dos flex, o que é falso, os modelos híbridos podem reduzir em até 30% o consumo de etanol, mas abrem o caminho para a substituição do consumo de diesel nos ônibus).
Duas coisas parecem certas: dentro de 15 anos o volume de veículos movidos a eletricidade será significativo, mas, até lá, eles custarão caro.
Quem será o Henry Ford desse mercado, ninguém sabe, mas, sempre que o representante de uma montadora levantar dúvidas sobre a conveniência da entrada de novos concorrentes no mercado nacional, será bom lembrar que em 1903 a Associação de Fabricantes de Automóveis dos Estados Unidos tentou proibi-lo de fabricar seus veículos. Em 1952 a matriz da Ford achava que fabricar e montar carros no Brasil era mera utopia. Hoje a indústria automotiva carrega 5,5% do PIB.
Nas discussões dos carros elétricos e dos seus modelos híbridos corre-se o risco de ficar entre a tanga e a tunga. A turma da tanga busca a preservação do status quo, até mesmo em nome da defesa de uma peculiaridade da produção nacional. No século 19, a originalidade nacional era a escravidão. No 20, mais precisamente nos anos 70/80, a ditadura inventou uma política de reserva de mercado para computadores.
A tanga produz ferros-velhos. A turma da tunga admite qualquer mudança, desde que a Viúva subsidie a produção do novo, protegendo o mercado do velho. Quando o governo subsidia os consumidores derrubando impostos, produz progresso. Quando subsidia empresas, engordando gatos, produz cartórios.
Lula, o metalúrgico, é um produto da clarividência de Juscelino Kubitschek. Lula, o Nosso Guia, arrisca tornar-se defensor de uma estrutura anacrônica. Se o Brasil não tivesse sofrido a praga da reserva de mercado dos computadores, poderia ter desenvolvido sua indústria 20 anos antes.