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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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sábado, 5 de novembro de 2016

A educacao de Mauricio Tragtenberg: homenagem a um grande mestre - Paulo Roberto de Almeida (2002)

Como indiquei na postagem imediatamente anterior (neste link), fui aluno, talvez discípulo, certamente amigo do grande mestre Mauricio Tragtenberg.
A despeito da admiração que eu sinceramente sentia pelo grande professor e orientador que foi Tragtenberg, um exemplo para todos nós pela sua coragem e honestidade intelectual, nunca deixei de seguir suas recomendacões primárias: leiam, leiam, leiam, se informem, pensem, reflitam.
E nunca deixei de seguir suas outras recomendações: sempre leiam com espírito crítico, observem a realidade e tirem suas próprias conclusões.
Foi o que sempre fiz, inclusive com respeito ao pensamento do mestre.
Como muitos outros acadêmicos brasileiros, ou de qualquer parte, sobretudo os das humanidades, ele era um anticapitalista, um socialista, mas não da vertente stalinista, ou trotsquista (ainda que reconhecesse que os segundos eram mais inteligentes do que os primeiros), mas sim da vertente libertária, anarco-libertária, eu diria.
Ainda assim, ele tinha seus traços marxistas, que era o de acreditar numa economia planificada, na auto-organização dos trabalhadores, e na superação do capitalismo.
Com base em suas aulas, eu sai do Brasil, continuei a ler, mas sobretudo observei o mundo, e fui conhecer todos os socialismos, reais, surreais, esquizodrênicos.
E cheguei às minhas próprias conclusões, e elas eram simples, como eu disse ao mestre:
Eu conheci o socialismo e constatei que ele não funciona. E além do mais é um regime de opressão.
Simples assim.
Tragtenberg continuou socialista, ou melhor, anarco-libertário, até sua morte, pois reconheço que não é fácil se desvencilhar de determinadas ilusões, sobretudo essas que anunciam alternativas melhores do que o velho e duro capitalismo.
Enfim, independente disso, o mestre era um grande leitor, e fui educado, em certa medida, por ele. Pelo menos fui ler muitos dos livros ou autores que ele recomendava.
Por isso mesmo escrevi uma homenagem a ele neste meu artigo que pode ser lido como uma nota biográfica a dois.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 5 de novembro de 2016

910. “A educação de Maurício Tragtenberg (depoimento pessoal sobre um método político-pedagógico)”, Washington, 16 junho 2002, 22 p. Homenagem pessoal ao grande mestre e amigo. Revisto com base em comentários de Antônio Ozaí da Silva, incorporados em segunda versão de 10.07.02. Publicado na revista eletrônica Espaço Acadêmico (Maringá, a. II, n. 15, agosto 2002, http://www.espacoacademico.com.br/015/15pra.htm). Disponível na plataforma Academia.edu (http://www.academia.edu/29679088/910_A_educacao_de_Mauricio_Tragtenberg_depoimento_pessoal_sobre_um_metodo_politico-pedagogico_2002_). Relação de Publicados n. 351.

A editora da Unesp está publicando alguns de seus livros:
http://editoraunesp.com.br/blog/homenagem-a-mauricio-tragtenberg-
https://www.facebook.com/editoraunesp/posts/1463722260311364

A grande ilusão do socialismo e dos socialistas: Mauricio Tragtenberg - Paulo Roberto de Almeida (2010)

Ao ler algumas recentes homenagens ao velho mestre -- que foi também o meu, que o admirava por sua independência de pensamento, suas vastas leituras -- e informações sobre a republicação de algumas de suas obras, lembro-me que produzi, muitos anos atrás, um texto sobre nossa relação intelectual que também era uma homenagem a Mauricio Tragtenberg, mas que não deixava de assinalar os elementos utópicos de seu pensamento.
Esse artigo, bem longo, se chamava "A educação de Mauricio Tragtenberg", que vou recuperar para indicar o link de sua leitura.
Alguns anos depois, com um outro discípulo do mestre, e editor da revista Espaço Acadêmico, Antonio Ozai, homenageando Tragtenberg num pequeno artigo da revista, resolvi escrever novamente sobre ele, um pequeno artigo que posso reproduzir abaixo.
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 5/11/2016


A grande ilusão do socialismo e dos socialistas - Mauricio Tragtenberg

Paulo Roberto de Almeida
terça-feira, 7 de setembro de 2010

Fui aluno, talvez discípulo, mas certamente amigo de Maurício Tragtenberg, com o qual convivi em meus anos de formação acadêmica. Dele obtive a melhor inspiração de leituras e reflexões, como ocorreu com tantos outros jovens que também foram seus alunos e que com ele conviveram dos anos 1960 aos 1990, nas diversas escolas e faculdades em que ele lecionou. Como todos, eu tinha o maior respeito pelo mestre, pelas suas aulas e ensinamentos, o que não quer dizer que acatei totalmente suas ideias e concepções.
No começo, sim, tendíamos a concordar com ele, pois éramos todos socialistas, quase todos marxistas, alguns libertários, como ele, o que não era difícil no ambiente universitário daqueles tempos – talvez mesmo hoje –, ainda mais no contexto da ditadura militar vivida pelo Brasil dos anos 1960 aos 80.
Estas rememorações me vieram à mente ao ler uma resenha feita por Antonio Ozaí na Espaço Acadêmico de setembro de 2010. Destacou ele um trecho de um dos livros – o qual já tinha lido em edição anterior – agora reeditado graças aos esforços de seus seguidores, alunos, discípulos. Assim reza o trecho:

"É pela socialização dos meios de produção controlados pela classe operária organizada em suas organizações diretamente representativas, que é possível efetuar-se a passagem de uma sociedade liberal capitalista a uma sociedade planificada, evitando o capitalismo de Estado e o totalitarismo, conservando as liberdades básicas do homem."
In: Mauricio Tragtenberg: O capitalismo no século XX (2ª. ed. revisada e ampliada. São Paulo: Editora UNESP, 2010; Coleção Maurício Tragtenberg, 186p.), p.170-171.

Ao ler esse trecho, constato que nesses poucos argumentos estão resumidos, de forma muito transparente, a grande tragédia do socialismo e dos socialistas, incluindo, portanto, o próprio Mauricio Tragtenberg. Rememoro meu último encontro com ele, exatamente como ocorreu, e depois retomo o argumento substantivo.
Fui visitar Mauricio Tragtenberg em sua casa, em meados dos anos 1980, depois de longos oito anos de intervalo, ao ter voltado de minha segunda estada na Europa, e depois de ter conhecido praticamente todos os socialismos reais, aliás, os únicos existentes. Tinha também conhecido um socialismo “surreal’ na Iugoslávia, a última réstia de esperança para aqueles que, como ele, valorizavam não o socialismo burocrático, centralizado, mas a sua vertente auto-gestionária, supostamente mais benigna ou pretensamente mais “funcional” (já que seria isento dos pecados do excesso de centralismo e de burocratismo estatal).
De forma puramente factual, pude confirmar, para decepção do velho mestre, que, em qualquer da modalidades, o socialismo não funcionava como modo de produção econômica, e menos ainda como forma de organização social. O sistema simplesmente não conseguia fornecer à população bens de uso corrente (esqueçamos produtos mais sofisticados), na quantidade e na qualidade requeridas
Se formos, então, analisar seu desempenho na área política, e nessa vertente a questão crucial das liberdades, seria forçoso concluir que TODAS as experiências socialistas redundaram em fracassos absolutos, já que todas elas recorreram à mais violenta das tentativas de remodelação social conhecidas na história, e todas conduziram a sistemas autoritários, quando não totalitários, e a uma opressão ainda maior do que aquela existente nos antigos sistemas feudais ou capitalistas.

Portanto, ao reler o velho mestre, nas linhas selecionadas na resenha, que acreditava que seria:

“...possível efetuar-se a passagem de uma sociedade liberal capitalista a uma sociedade planificada, evitando o capitalismo de Estado e o totalitarismo, conservando as liberdades básicas do homem

o que eu teria a dizer-lhe, novamente – e que já tinha dito diretamente a ele, em minha volta do socialismo – seria que, NÃO, infelizmente, essa passagem não é possível, pois NENHUMA sociedade planificada centralmente, no sentido socialista – ou seja, sem garantir a propriedade privada dos meios de produção – JAMAIS conseguiu preservar as liberdades básicas do homem.

Sorry, velho mestre, mas a História não esteve consigo, nesse particular, ou seja, não caminhou no sentido desejado por tantos libertários e outros sonhadores socialistas. Não se trata de falhas teóricas dos socialistas ou de incapacidade organizacional de seus movimentos de massa, e sim de impedimentos estruturais que têm a ver com as prescrições formuladas para a organização econômica da sociedade, de uma contradição primária, como diriam os “sábios” da academia soviética.
Tudo isso não me impede de saudar a enorme erudição do mestre, agradecer-lhe, sempre, as inúmeras lições intelectuais que recebi dele, as infinitas recomendações bibliográficas e de leitura, e aquele fino gosto pela ironia que era a marca registrada de Mauricio Tragtenberg.
Grato por tudo, velho mestre, mesmo estando do outro lado do processo histórico, do lado da utopia, esta era formulada com a melhor das intenções, e você foi um homem verdadeiramente digno, honesto intelectualmente, uma personalidade admirável. Minha homenagem a um educador exemplar.

Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 8 de setembro de 2010)

terça-feira, 7 de setembro de 2010

A grande ilusão do socialismo e dos socialistas - Mauricio Tragtenberg

A grande ilusão do socialismo e dos socialistas - Mauricio Tragtenberg
Paulo Roberto de Almeida

Fui aluno, talvez discípulo, mas certamente amigo de Maurício Tragtenberg, com o qual convivi em meus anos de formação acadêmica. Dele obtive a melhor inspiração de leituras e reflexões, como ocorreu com tantos outros jovens que também foram seus alunos e que com ele conviveram dos anos 1960 aos 1990, nas diversas escolas e faculdades em que ele lecionou. Como todos, eu tinha o maior respeito pelo mestre, pelas suas aulas e ensinamentos, o que não quer dizer que acatei totalmente suas ideias e concepções.
No começo, sim, tendíamos a concordar com ele, pois éramos todos socialistas, quase todos marxistas, alguns libertários, como ele, o que não era difícil no ambiente universitário daqueles tempos – talvez mesmo hoje –, ainda mais no contexto da ditadura militar vivida pelo Brasil dos anos 1960 aos 80.
Estas rememorações me vieram à mente ao ler uma resenha feita por Antonio Ozaí na Espaço Acadêmico de setembro de 2010. Destacou ele um trecho de um dos livros – o qual já tinha lido em edição anterior – agora reeditado graças aos esforços de seus seguidores, alunos, discípulos. Assim reza o trecho:

"É pela socialização dos meios de produção controlados pela classe operária organizada em suas organizações diretamente representativas, que é possível efetuar-se a passagem de uma sociedade liberal capitalista a uma sociedade planificada, evitando o capitalismo de Estado e o totalitarismo, conservando as liberdades básicas do homem."

In: Mauricio Tragtenberg: O capitalismo no século XX (2ª. ed. revisada e ampliada. São Paulo: Editora UNESP, 2010; Coleção Maurício Tragtenberg, 186p.), p.170-171.

Ao ler esse trecho, constato que nesses poucos argumentos estão resumidos, de forma muito transparente, a grande tragédia do socialismo e dos socialistas, incluindo, portanto, o próprio Mauricio Tragtenberg. Rememoro meu último encontro com ele, exatamente como ocorreu, e depois retomo o argumento substantivo.
Fui visitar Mauricio Tragtenberg em sua casa, em meados dos anos 1980, depois de longos oito anos de intervalo, ao ter voltado de minha segunda estada na Europa, e depois de ter conhecido praticamente todos os socialismos reais, aliás, os únicos existentes. Tinha também conhecido um socialismo “surreal’ na Iugoslávia, a última réstia de esperança para aqueles que, como ele, valorizavam não o socialismo burocrático, centralizado, mas a sua vertente auto-gestionária, supostamente mais benigna ou pretensamente mais “funcional” (já que seria isento dos pecados do excesso de centralismo e de burocratismo estatal).
De forma puramente factual, pude confirmar, para decepção do velho mestre, que, em qualquer da modalidades, o socialismo não funcionava como modo de produção econômica, e menos ainda como forma de organização social. O sistema simplesmente não conseguia fornecer à população bens de uso corrente (esqueçamos produtos mais sofisticados), na quantidade e na qualidade requeridas
Se formos, então, analisar seu desempenho na área política, e nessa vertente a questão crucial das liberdades, seria forçoso concluir que TODAS as experiências socialistas redundaram em fracassos absolutos, já que todas elas recorreram à mais violenta das tentativas de remodelação social conhecidas na história, e todas conduziram a sistemas autoritários, quando não totalitários, e a uma opressão ainda maior do que aquela existente nos antigos sistemas feudais ou capitalistas.

Portanto, ao reler o velho mestre, nas linhas selecionadas na resenha, que acreditava que seria:

“...possível efetuar-se a passagem de uma sociedade liberal capitalista a uma sociedade planificada, evitando o capitalismo de Estado e o totalitarismo, conservando as liberdades básicas do homem

o que eu teria a dizer-lhe, novamente – e que já tinha dito diretamente a ele, em minha volta do socialismo – seria que, NÃO, infelizmente, essa passagem não é possível, pois NENHUMA sociedade planificada centralmente, no sentido socialista – ou seja, sem garantir a propriedade privada dos meios de produção – JAMAIS conseguiu preservar as liberdades básicas do homem.

Sorry, velho mestre, mas a História não esteve consigo, nesse particular, ou seja, não caminhou no sentido desejado por tantos libertários e outros sonhadores socialistas. Não se trata de falhas teóricas dos socialistas ou de incapacidade organizacional de seus movimentos de massa, e sim de impedimentos estruturais que têm a ver com as prescrições formuladas para a organização econômica da sociedade, de uma contradição primária, como diriam os “sábios” da academia soviética.
Tudo isso não me impede de saudar a enorme erudição do mestre, agradecer-lhe, sempre, as inúmeras lições intelectuais que recebi dele, as infinitas recomendações bibliográficas e de leitura, e aquele fino gosto pela ironia que era a marca registrada de Mauricio Tragtenberg.
Grato por tudo, velho mestre, mesmo estando do outro lado do processo histórico, do lado da utopia, esta era formulada com a melhor das intenções, e você foi um homem verdadeiramente digno, honesto intelectualmente, uma personalidade admirável. Minha homenagem a um educador exemplar.

Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 8 de setembro de 2010)